Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A quem admirar?

 

Eleger a personalidade nascida em solo verde e amarelo mais notável, seja por grandes obras culturais deixadas para deleite da população, por bons exemplos dados à família brasileira, por uma representatividade exemplar na política ou por grandes feitos no campo dos esportes. Eis o objetivo do programa O Maior Brasileiro de Todos os Tempos, do SBT. Acontece que a abertura da votação para um público não especializado, embora positiva do ponto de vista democrático, deixa margem para um certo receio de que, no fim, o tal maior brasileiro não seja alguém que mereça, de fato, o título.

A primeira fase das escolhas resultou numa lista bem diversa e surpreendente. Tudo bem que Michel Teló levou a música popular brasileira para o exterior. Mas daí a poder ser considerado o maior brasileiro de todos os tempos há uma enorme diferença. Creio que houve falha de entendimento entre o ser uma personalidade histórica e o estar em voga simplesmente por ser uma celebridade instantânea.

Xis da questão

No programa semanalmente apresentado por Carlos Nascimento não há jogo ou disputa intelectual. Simplesmente, quem tiver mais empatia com o público ganha o maior número de votos e, assim, mais chances de ser o vitorioso.

Dia desses, ao procurar palavras para defender Ayrton Senna, seu representante disse que o piloto merecia ganhar por ter conseguido fazer toda a nação acordar cedo a cada domingo pela manhã para assistir as suas corridas. No mínimo, um dado inusitado. Outra pessoa opinou que Pelé devia vencer porque, além de toda sua genialidade, está vivo e merece uma homenagem desse nível ainda em condição de presenciá-la. O argumento provocou um fã de Juscelino Kubitscheck, que acabou dando ao fundador de Brasília e ex-presidente da República um status de Elvis Presley: “Isso é injustiça! Juscelino não morreu! Ele continua vivo toda vez que nasce um brasiliense”, disse o emocionado senhor.

Embora haja expectativas sobre o resultado, nutrir ilusões não é recomendado. É bem provável que o escolhido não satisfaça o gosto da coletividade. Particularmente, não enxergo nenhuma personalidade dentre as citadas no programa que possa traduzir a grandeza de um brasileiro singularmente notável por sua contribuição à pátria como Nelson Mandela o foi – e é – para a África do Sul, se tornando assim o maior sul-africano de todos os tempos na versão da atração veiculada por lá. Até quem conhece minimamente a história daquele país considera a escolha merecida.

Aqui, entretanto, quem merece a honraria? Talvez o xis da questão esteja no infeliz e inegável fato de que o Brasil é pobre em referência de heróis e, também, em identificá-los e honrá-los. Daí a dificuldade para os acertos e a facilidade para as confusões numa escolha como a proposta pela atração.

***

[Taís Helena Soares Brem é jornalista, Pelotas, RS]