Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Visão estreita de um patrimônio

A atitude da TV Cultura em deslocar o Observatório da Imprensa na TV para as 23h30 demonstra que falta bom senso entre os responsáveis pela grade de programação da emissora. Senão, vejamos:

1. Uma parte razoável dos que assistem ao programa têm alguma atividade na manhã seguinte, o que implica dizer que eles não têm disponibilidade para virar a noite assistindo televisão;

2. O horário diferenciado em relação à geração das imagens ao vivo pela TVE Brasil tira dos paulistas a possibilidade de interação com o programa;

3. A parcela mais significativa de audiência do programa notadamente devia estar justamente no estado de São Paulo, por razões óbvias da razão de densidade populacional por quilômetro coberto pelo sinal da emissora;

4. Se a TV Cultura ainda colocasse na habitual faixa de horário das 22h30 um programa jornalístico, mesmo que ainda se lamentasse a realocação do OI na TV, poder-se-ia até admitir que era uma tentativa de fortalecer a finalidade jornalística da Fundação Padre Anchieta, mas em vez disso entrou um programa de entretenimento – repetindo o formulismo suspeito das emissoras privadas para arrolar audiência;

5. A crescente mercantilização da TV Cultura não pode servir como pretexto para subtrair dos telespectadores do Observatório da Imprensa um horário mais adequado, tentando atender a outros interesses comerciais para a tradicional faixa de programação;

6. A alternância de princípios ideológicos no poder político de São Paulo não pode respingar na programação da televisão pública bancada pelo estado, ferindo o direito que o telespectador tem de ser poupado do resultado de disputas internas e animosidades políticas;

7. O OI na TV é um programa que historicamente tem agido em defesa da televisão pública no Brasil, procurando valorizar os profissionais, o compromisso ético e a programação jornalística destas emissoras. Subdimensionar a importância do programa para a televisão pública é dar um tiro no próprio pé;

8. O projeto Observatório da Imprensa não tem finalidade apenas informativa ou formadora de opinião entre a sociedade civil: ele se tornou uma ferramenta fomentadora de um princípio jornalístico entre os estudantes de Jornalismo que equivale a dizer que se tornou uma extensão do próprio curso, um apêndice necessário para o correto exercício do jornalismo;

9. Se a ‘plástica’ do programa não se encaixa no perfil estético atual da TV Cultura, por que a emissora não oferece alternativas para que se dê mais estrutura ao projeto? Convém lembrar que o Observatório da Imprensa nasceu no estado de São Paulo, dentro de uma das universidades mais respeitáveis do país, a Unicamp. Se a Cultura não pode – por questões burocráticas ou de oportunidade – gerar ela própria o programa, com todos os requintes estéticos que interessam à emissora, por que não oferece ao menos um estúdio fixo para que parte do programa seja transmitido de SP?

O Observatório da Imprensa se tornou um patrimônio da sociedade civil em geral mas, além de ser um instrumento básico da sociedade para o monitoramento dos desvios jornalísticos, também se tornou um termômetro de avaliação imprescindível para os próprios jornalistas comprometidos com a conduta ética profissional.

A Fundação Padre Anchieta precisa reavaliar urgente a importância do OI e responder à sociedade com a pronta ratificação da sua antiga essência jornalística, devolvendo o Observatório ao seu lugar e horário devidos.

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Diagramador e arte-finalista, Porto Alegre