Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Entre a vida de um espião e o direito à informação

Recentemente, a Associated Press publicouuma reportagem sobre Robert Levinson, ex-agente do FBI desaparecido desde 2007. Depois de segurar a informação por três anos, a AP revelou que Levinson trabalhava para a CIA quando foi enviado ao Irã como espião em uma missão que não deu certo. Logo depois da agência ter publicado a matéria, oWashington Post fez o mesmo e, no dia seguinte, o New York Times.

Muitos leitores ficaram curiosos não somente sobre as notícias envolvendo Levinson, mas também sobre a decisão de segurar a história por tanto tempo. Segundo a editora-executiva do Times, Jill Abramson, “segurar uma matéria é algo raro. A situação mais comum é segurar um nível de detalhamento, e estas decisões são dolorosas”. No caso em questão, a razão para segurar a matéria não foi apenas um pedido do governo envolvendo questões de segurança nacional, mas respeito à família de Levinson. “O que nos fez segurar a matéria foi uma profunda preocupação de que ele poderia ser morto”, diz ela.

Nesses casos raros, editores devem fazer o teste do equilíbrio, pesando o valor da notícia e o direito do público à informação contra o potencial perigo ao indivíduo e o prejuízo à segurança nacional. As qualificações para tomar essa decisão vêm da Primeira Emenda da Constituição. “Os fundadores acreditavam que uma imprensa livre é um baluarte crucial contra o poder do governo central. Isso significa que os jornalistas têm tanto a liberdade quanto a responsabilidade de fazer julgamentos difíceis”, afirma.

Confusões e promessas

Quando uma organização de notícias sabe de algo que não vai divulgar, as coisas podem ficar um pouco confusas. O Times diversas vezes informou, sem atribuir fontes, que Levinson teria ido ao Irã em uma viagem de negócios quando foi capturado. Duas dessas menções foram em editoriais. Em outros casos, a alegação de viagem de negócios foi creditada a membros da família ou ao governo. Segundo Jill, essas declarações foram “lamentáveis”.

Em 2008, depois de uma investigação interna, diversos funcionários da CIA foram expulsos ou punidos por lidar mal com o caso Levinson. Isso poderia ter estimulado a divulgação do caso, mas nada vazou na imprensa. “Eu queria que tivéssemos focado mais a discussão nisso na época”, lembra Jill.

Barry Meier, primeiro repórter do jornal a tomar conhecimento do caso, em 2007, nunca ficou em dúvida de sua convicção de que a decisão de publicar a informação pertencia principalmente à família, cujos membros, compreensivelmente, continuavam a temer que tornar públicos os laços de Levinson com a CIA poderia resultar em sua morte.

Meier questiona se chegou o momento certo, especialmente com as novas conversas entre EUA e Irã, sob o governo do presidente Hassan Rouhani, eleito em junho. Segurar uma matéria importante por anos, especialmente envolvendo um escândalo da CIA, contraria qualquer princípio jornalístico. Mas com uma vida em risco e uma promessa implícita do repórter à família do envolvido, não há uma resposta certa. Para Meier, o jornal agiu corretamente.

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