Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Marcelo Beraba

‘Foi uma semana de pesquisas de intenção de voto e de avaliação administrativa. O leitor não tem mais dúvida: estamos em período eleitoral e as pesquisas vieram para ficar. É bom, portanto, acautelar-se.

A Folha publicou as suas ao longo de toda a semana. A principal foi no domingo, manchete do jornal: ‘Serra lidera isolado em São Paulo’. Tinha também uma avaliação da administração Marta Suplicy (PT), ambas feitas pelo Datafolha.

Na segunda-feira saiu, também do Datafolha, uma avaliação do governo Alckmin (PSDB). Na terça, todos os jornais deram as pesquisas de intenção de voto do Ibope em São Paulo (‘Ibope aponta liderança de Serra em SP’, resumiu a Folha) e no Rio (‘Maia lidera no Rio com 18 pontos de folga, diz Ibope’).

Na quarta, o Ibope teve de se explicar. A pesquisa que fizera entre os dias 15 e 18 de junho, paga pelo PT, dava um empate técnico entre os três principais candidatos em São Paulo: José Serra (PSDB) com 22%, Marta Suplicy (PT) com 21% e Paulo Maluf (PP) com 18%. A pesquisa publicada na terça tinha sido feita entre os dias 25 e 27 de junho, dez dias depois da primeira, foi paga pela TV Globo e deu um resultado bem diferente: Serra já liderava com 30%, Maluf tinha 21% e Marta, 16%.

É estranho uma mudança tão grande em tão pouco tempo. Segundo o instituto, a grande diferença entre as duas pesquisas era resultado da influência dos programas eleitorais no rádio e na TV. A pesquisa do PT foi realizada depois do programa do partido, e a pesquisa da Globo, depois das propagandas gratuitas de Serra e Maluf.

Na quinta-feira, saiu no ‘Estado’ a pesquisa do Instituto GPP/ InformEstado, realizada praticamente no mesmo período da do Ibope e com resultado um pouco diferente: Serra tinha 33,1%, Maluf, 26,8% e Marta, 15,2%. A pesquisa do Datafolha, publicada na Folha de domingo, também era do mesmo período (24 e 25 de junho) e com outro resultado para a candidata do PT: Serra tinha 30%, Maluf, 24% e Marta, 20%.

São diferenças numéricas às quais os institutos não dão muita importância porque consideram que estão dentro da margem de erro. A margem de erro é determinada pelo número de eleitores pesquisados. O Datafolha ouviu 1.083 eleitores (margem de erro de 3 pontos percentuais), o Ibope, 1.001 (margem de 3,1 pontos percentuais) e o GPP/ InformEstado, 606 (margem de 4 pontos). Além disso, explicam, as três pesquisas têm metodologias diferentes.

A rodada de pesquisas da semana continuou. Na quarta, os jornais publicaram o levantamento da CNI/Ibope que avaliou o governo federal. Títulos dos diários de maior circulação: ‘Aprovação de Lula cai de 34% para 29%’ (Folha); ‘Ibope mostra governo Lula em queda há 15 meses’ (‘Estado’); e ‘Ibope: popularidade e confiança em Lula caem’ (‘Globo’).

Na quinta-feira, o ‘Estado’ publicou, com a pesquisa de intenção de voto, a avaliação do governo Marta. E novas discrepâncias surgiram, agora fora da margem de erro.

O Datafolha e o GPP/InformEstado fizeram suas pesquisas, como informei, praticamente nas mesmas datas: 24 e 25 (Datafolha) e 26 e 27 (GPP). No Datafolha, Marta tem 29% de ótimo/bom, 37% de regular e 33% de ruim/péssimo. No GPP, ela tem 18,6% de ótimo/bom (dez pontos percentuais a menos), 39,6% de regular e 41,5% de ruim/péssimo.

É verdade que as pesquisas não podem ser lidas como uma verdade absoluta: são apenas flagrantes de um determinado momento. Mas as diferenças saltam aos olhos e incomodam.

Os institutos têm explicações metodológicas para quase tudo, mas há problemas que não podem ignorar. Fazer uma pesquisa logo após a realização de comerciais do partido que a está pagando é, no mínimo, passível de questionamento.

Para os partidos, isso deve ser ótimo, porque passam a impressão de uma vantagem que, sabem, é artificial e não será mantida. Mas, para os institutos e, principalmente, para os meios de comunicação, é colocar em jogo a credibilidade porque sobre eles pesará a suspeita legítima de manipulação.

Os jornais devem se preocupar em abrir para os seus leitores todas as informações essenciais para que entendam as pesquisas e possam questioná-las.’

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‘Para ler as pesquisas’, copyright Folha de S. Paulo, 4/7/04

A melhor forma de enfrentar as pesquisas é saber lê-las. A Abep (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa) criou para esta eleição um guia que ajuda a entender como são feitas. Há uma recomendação aos meios de comunicação para que publiquem o máximo de informações sobre sua metodologia e produção. O respeito a essas normas não elimina a possibilidade de fraudes ou manipulações, mas diminui as chances. O guia pode ser lido e copiado no endereço eletrônico da Abep (www.abep.org).

Relaciono abaixo as recomendações mais importantes. A Folha tem informado, também, o número do registro obrigatório da pesquisa no TRE (Tribunal Regional Eleitoral).

‘O público deve ter acesso a todas as informações necessárias para entender, interpretar e avaliar os dados publicados de forma adequada.

Itens de inclusão recomendada na publicação e divulgação de pesquisas eleitorais:

a. Nome da empresa de pesquisa responsável pela realização do estudo;

b. Nome do patrocinador/ solicitante do estudo;

c. Universo representado;

d. Tamanho da amostra e sua cobertura geográfica;

e. Datas de realização de campo;

f. Erro amostral/margem de erro (essa informação não substitui a necessidade de especificação do tamanho da amostra);

g. Método de amostragem;

h. Método de coleta da informação;

i. Critérios de ponderação, caso existam;

j. Sempre que os resultados divulgados disserem respeito a algum segmento da amostra e não à sua totalidade, isso deve ser explicitado;

k. Sempre que houver divulgação dos resultados de determinado segmento (ex: faixa etária, sexo, região etc.), indicar o número de entrevistas que deu origem ao resultado (base);

l. Explicitar a taxa de ‘não resposta’, ou seja, a porcentagem de respostas ‘não sabe’, sempre que ela puder afetar significativamente a interpretação do resultado;

m. Informações sobre o número de cidades, locais ou pontos amostrais.

Os itens listados acima devem estar disponíveis em qualquer divulgação. Situações em que não seja possível fornecer todos os dados (rádio ou TV, por exemplo) devem prever e indicar espaço adequado para esse detalhamento mínimo (ex: site da empresa de pesquisa ou do veículo divulgador). Os itens de a) até e) são obrigatórios em qualquer tipo de divulgação, seja em mídia impressa ou eletrônica.’’