Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Margareth Sullivan

Na primavera passada, o diretor-executivo da New York Times Company, Mark Thompson, disse que em pouco tempo o Times iria poder vangloriar-se de ter um milhão de assinantes exclusivamente na versão digital. No início deste mês, sua previsão mostrou-se acertada.

É um marco muito importante – algo que nenhuma outra organização jornalística pode reivindicar – e é legitimamente um grande negócio. No entanto, não garante de forma alguma o futuro do Times, que continua enfrentando a erosão de seu tradicional sustentáculo de receita: a publicidade no jornal impresso.

Considerando meu papel como representante dos leitores do Times, fui conversar com Mark Thompson na semana passada e pedi-lhe que avaliasse as perspectivas de negócios do jornal, que têm tanta influência sobre os leitores e os cidadãos. Afinal, embora muitos leitores se queixem das fraquezas do Times, eles também se sentem apaixonados por sua sobrevivência no longo prazo.

“Quero, com sinceridade, que o Times prospere” escreveu o leitor Ed Bramson, de Nova York, na semana passada. Disso que algumas novas iniciativas o desconcertam. Mas, apesar de, às vezes, “nos sentirmos adversários”, disse ele, “eu adoro o Times”. Mesmo entre as reclamações de leitores sobre matérias com conteúdos que visam a atrair atenção para determinada página ou sobre publicidade incômoda, sobre desacordos com novas decisões ou mesmo acusações de parcialidade, há um sentimento que escuto com frequência: “Cuide de sua saúde, New York Times. Nós precisamos de você.”

A audiência internacional é o alvo mais lucrativo

Ao longo de uma conversa sobre assuntos variados em seu escritório no 16º andar, Mark Thompson, um inglês natural de Londres que veio para o Times em 2012 depois de ter sido diretor-geral da BBC, se dispôs a fazer mais algumas previsões e observações. Entre elas, as seguintes:

– Num prazo de cinco anos, a receita digital do Times irá ultrapassar a receita do jornal impresso. “Acho que cinco anos é um prazo viável para atingir esse ponto de virada”, disse ele, considerando o ritmo de crescimento do digital e as perspectivas de acelerá-lo. Atualmente, a publicidade e as assinaturas do jornal impresso respondem por mais de 70% da receita, portanto essa é uma ideia ambiciosa, principalmente se for realizada (como ele me disse que acha possível) sem que uma queda precipitada da publicidade do jornal impresso mude dramaticamente o quadro da receita.

– É difícil imaginar a venda do Times. Ao longo de quase três anos, Thompson teve muitas conversas com membros das famílias Sulzberger e Ochs e “nunca ouvi um sussurro de interesse em qualquer coisa que não fosse o envolvimento total” na conservação do Times. (O Times tem uma estrutura empresarial pouco comum, na qual a família detém uma porção relativamente pequenas de ações, mas controla a diretoria que toma as decisões importantes sobre o futuro da companhia.) É bom ouvir isso.. Porém, como aprendemos com a venda do Wall Street Journal em 2007 para Rupert Murdoch, nunca se pode ter certeza de que um jornal não está à venda até que os donos recebam uma oferta pública plausível; até o momento, isso não ocorreu no caso do Times.

– A audiência internacional é o alvo mais lucrativo para o crescimento das assinaturas digitais. “Falando estritamente em números, é uma lagoa bem grande para pescar.” Os números são prova disso, disse Thompson. Há um ano e meio, 10% das assinaturas digitais eram internacionais; agora são 13% de um total maior. (Uma editora, Lydia Polgreen, vem comandando os esforços da redação para atrair uma audiência global maior.)

Os “dólares impressos” e os “centavos digitais”

O dinheiro gasto com o jornalismo – cerca de 300 milhões de dólares por ano, um aumento de 50% desde 2008 – vale a pena. “A coisa mais preciosa que temos é a qualidade das reportagens e a abrangência de opiniões”, disse Thompson. “É por isso que as pessoas estão preparadas para pagar muito dinheiro” pelas assinaturas. O publisher do Times, Arthur O. Sulzberger Jr., e sua diretoria foram inteligentes, disse ele, ao “não abrirem mão, obstinadamente, da ideia de uma redação realmente grande e com investimentos adequados”, enquanto outras organizações jornalísticas se afastavam dessa opção. “A profundidade e amplitude que daí decorrem são o trunfo do Times. Mudar isso seria autodestrutivo.” (Apesar dos remanejamentos do ano passado, a equipe de jornalistas continua do mesmo tamanho – cerca de 1.300 – devido às contratações feitas em áreas como a de desenvolvimento de audiência.)

Mudanças e turbulências são suposições. “Até que a tecnologia e o comportamento dos usuários se estabilizem”, a vida no Times continuará dando a sensação de “uma montanha russa emocional”. Mark Thompson elogiou o editor-executivo, Dean Baquet, por ser aberto às inovações e por ter jornalistas trabalhando de maneira próxima com o lado comercial, embora sempre mantendo a ética do jornalismo.

No final, disse Thompson, o fundamental é um crescimento digital acelerado. No último trimestre, tanto a receita publicitária digital quanto a receita das assinaturas digitais tiveram um aumento de 14%. Ele vê esses números em ascensão. (Vale ressaltar que a receita total apresentou uma queda no último trimestre porque a publicidade do jornal impresso caiu. A empresa continua sendo lucrativa, mas não tanto assim: o lucro líquido foi de cerca de 16 milhões de dólares no último trimestre, de uma receita total de 383 milhões de dólares.)

“Precisamos crescer a um ritmo em que o digital supere o inevitável declínio do lado impresso”, disse Thompson. Nesse meio tempo – e num futuro previsível – o jornal impresso irá continuar se pagando exclusivamente pela receita da circulação. Ele discorda da ideia de que “os dólares impressos” de ontem nunca poderão ser comparados aos “centavos digitais” de hoje, e certamente que também não com os “centavinhos dos aplicativos móveis”. “Não acho uma ideia acertada”, disse ele. “O percentual de receita pode tender a acompanhar o percentual de tempo gasto” enquanto os anunciantes decidem gastar seu dinheiro onde os leitores estão – em seus smartphones.

Nem todas as experiências são bem-sucedidas

O Times vem trabalhando para incentivar a publicidade pelos aplicativos móveis, inclusive com um vídeo publicitário com conteúdo jornalístico [native advertising]. Este tipo de publicidade pretende simular a aparência e sensação do conteúdo jornalístico. Portanto, fazê-lo com integridade significa rotulá-lo com clareza que é publicidade; no longo prazo, novos padrões éticos são fundamentais.

E empreendimentos com o Facebook e a Starbucks, entre outros, estão em vias de se realizarem. É evidente – como o Times divulgou no ano passado quando iniciou vários novos aplicativos e depois recuou – que nem todas as experiências são bem-sucedidas.

Pouca coisa é uma certeza, exceto que os desafios são grandes e as paradas também. Se os negócios não derem certo, menos será gasto com o jornalismo e o valor dos leitores cai – e o modelo, em seu total, pode desmoronar. “Eu quero que o New York Times esteja por aqui até onde a vista alcança”, disse-me Mark Thompson. Tenho certeza de que a maioria dos leitores concordaria.

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Margaret Sullivan é ombudsman do New York Times