Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O Estado de S. Paulo

TELEVISÃO
Thaís Pinheiro

‘Eu não estava mais feliz no SBT’

O primeiro programa de Hebe Camargo em sua nova casa, a RedeTV!, já tem data e hora certa: dia 15 de março, terça-feira, às 22 horas. O anúncio foi feito ontem durante coletiva de imprensa realizada no auditório da emissora, com a presença de mais de 50 jornalistas. Ciceroneada pelo presidente da casa, Amilcare Dallevo, a apresentadora disse que já não se sentia tão feliz no SBT nos últimos anos.

‘Você tem de ficar onde está feliz, e lá tinha muita mudança de horário, o público ficava perdido. E o tempo de programa era muito pouco, só 40 minutos. Mas saí sem raiva ou ódio’, afirmou a loira. As mudanças no horário tanto a incomodavam que chegou a fazer desabafos ao público no programa. ‘Agora estou aqui, na RedeTV!, sempre às 22 horas’, disse ela, arrancando risos do auditório.

Segundo a superintendente Artística da emissora, Mônica Pimentel, o programa Hebe, ‘manterá as características como o sofá e as entrevistas com celebridades, mas terá inovações’, com possibilidade de ser ao vivo ou gravado na véspera.

Da equipe que trabalhava com ela no SBT, Hebe disse que adoraria trazer nomes como a produtora executiva Regina de Souza e o antigo diretor do programa Ariel Jacobowitz, que ainda têm contrato com o SBT.

Para a grande estreia, a emissora está preparando um verdadeiro show. No dia 1.º de março, Hebe receberá 500 convidados, uma orquestra e outras apresentações no estúdio G, o maior da casa, com 1.500 m².

‘Há exatamente um ano, eu estava saindo do hospital e hoje estou aqui. É muito difícil transmitir esta emoção. Continuo me sentindo como se estivesse começando a minha carreira. Estou com um tesão enorme’, disse a apresentadora. Como primeira entrevistada, o sonho seria levar a presidente Dilma Rousseff, ‘mas ela já deve ter muitos compromissos’, diz.

Apesar de ser amiga de Dallevo há 16 anos, Hebe disse não ter participado diretamente das negociações para sua contração. ‘É um prazer muito grande estar aqui hoje, neste momento tão importante para nós. Espero que ela fique aqui por muitos anos’, disse o presidente da emissora. Já o relacionamento com Silvio Santos, a apresentadora jura não ter sido abalado com o fim da parceria de trabalho. ‘Ele ainda não falou comigo. Mas quem tem de me ligar é ele. Se quisesse que eu ficasse lá, não teria me deixado sair.’

Com contrato de dois anos, Hebe tem alguns compromissos antes da estreia. ‘Vou desfilar pela Beija-flor, no Rio, que vai homenagear o nosso rei Roberto Carlos. E depois vou para Salvador, porque a Claudia Leitte disse que quer fazer homenagem pra mim.’

 

LITERATURA
Adam Kirsch

Originais alterados em nome da justiça

Quando a Câmara de Representantes renovada se reuniu no dia 6, a liderança republicana manteve sua promessa de começar a sessão lendo o texto da Constituição em voz alta. Essa quebra da tradição parlamentar teve um propósito polêmico: o representante Robert Goodlatte, republicano da Virgínia autor da ideia, observou que ‘muitos eleitores meus disseram que o Congresso foi além de seus poderes conferidos pela Constituição’.

Se a leitura pretendia vencer por originalidade, eles pisaram na bola no texto do Artigo I, Seção 2, que trata da distribuição das cadeiras da Câmara entre os Estados – e ali se diz que esta se baseia ‘no número total de pessoas livres’ e ‘três quintos de todas as outras pessoas’. Em vez de chamar a atenção para esse eufemismo infame para escravos, os leitores no Congresso decidiram omitir essa parte, porque ela foi superada pela 14.ª Emenda.

Ocorre que essa omissão surgiu dias após uma pequena editora, NewSouth Books, anunciar a nova edição de Huckleberry Finn, de Mark Twain, na qual serão substituídos os usos que o autor faz da palavra ‘nigger’ (negro, com conotação pejorativa) por ‘slave’ (escravo). Também aqui se trata de texto histórico em choque com sensibilidades contemporâneas. Tomados em conjunto, os dois casos mostram a comédia do eufemismo: tentar nos distrair de alguma coisa feia só torna a feiura mais difícil de esconder. Para o novo editor do livro, o especialista em Twain, Alan Gribben, slave é menos ofensivo que nigger; para os redatores da Constituição, ‘todas as outras pessoas’ era menos ofensivo que slave.

A edição censurada de Huckleberry Finn tem sido repudiada. Como escritor, eu percebo a força de todos os argumentos contra manipulações do original, quando menos por ser um terrível precedente: comecem a eliminar tudo de ofensivo na história literária e não sobrará nada. Mas quando voltei ao romance real, comecei a me sentir dividido, pois pude imaginar o efeito que seu dilúvio de epítetos teria sobre um jovem leitor, em especial um jovem leitor negro. (Abra o livro na passagem do segundo capítulo que começa, Strange niggers would stand with their mouths open (em tradução livre, ‘Crioulos estranhos ficavam parados com as bocas abertas’) e veja se conseguiria lê-la para uma classe de alunos da 9.ª série.)

A intenção de Huckleberry Finn era atacar o racismo, é claro. Na cena mais famosa, Huck esconde o escravo fugitivo Jim de caçadores de escravos, e depois se sente culpado. ‘Eu sabia que tinha agido errado’, diz ele, embora o leitor, e Twain, saiba que ele fez a coisa certa. É uma demonstração contundente da maneira como a consciência não é só inata, mas também aprendida, e como é difícil agir certo numa sociedade centrada no errado, os mesmos tipos de perguntas que atormentaram Hannah Arendt no julgamento de Eichmann.

Mas todos aqueles epítetos raciais são lembrete de que, quando Twain os escreveu, o público que ele tinha em mente – a América para a qual escreveu – era segregado. Ele não se incomodou em escrever nigger porque estava escrevendo sobre negros, não para eles. E para muitos leitores, conhecer a literatura clássica significa às vezes ver-se excluído, ou insultado, dessa maneira. Para negros leitores de Twain, com certeza, mas também para judeus leitores de Shakespeare ou Dickens, e para mulheres leitoras, por exemplo, de Platão.

Limitações. Diferentemente do romance de Twain, o texto da Constituição foi escrito na expectativa de que seria corrigido. E ele precisava de correção, ou emenda, por essa razão fundamental: a imaginação dos formuladores sobre o povo que conduziam não era suficientemente plena. Foi preciso uma guerra civil devastadora, cujo sesquicentenário estamos agora observando, para revisar a Constituição na direção da justiça. Quando os leitores na Câmara decidiram pular as partes da Constituição que revelam suas limitações originais, eles estavam amesquinhando essa história, fingindo que nosso documento fundador era impecável desde o começo.

Não, o Congresso não pode ‘ir além’ de seus poderes conferidos pela Constituição, como insistiu o representante Goodlatte. Mas acreditar que as instituições americanas foram sempre perfeitas torna muito fácil acreditar que elas são perfeitas agora. As duas suposições, alguém poderia dizer, pecam contra o verdadeiro espírito da Constituição, que pede que continuemos reimaginando nosso caminho para uma união mais perfeita. / TRADUÇÃO DE CELSO M. PACIORNIK

 

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