Tuesday, 07 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Quando a pressa atrapalha o jornalismo

Na semana passada, o New York Times publicou artigo revelando a origem de um ataque político sofrido por Caroline Kennedy, que tentou ocupar a vaga de Hillary Clinton no Senado e desistiu por’razões pessoais’ não especificadas ao público. No texto, os repórteres Danny Hakim e Nicholas Confessore acusam o governador de Nova York, David Paterson, de vazar informações confidenciais sobre Caroline à imprensa e de tentar enganar os jornalistas sobre a importância destas informações’em um esforço orquestrado para desacreditá-la’ depois de sua desistência ao cargo.

Segundo Kalim e Confessore, um dia após a decisão tomada por Caroline, a principal estrategista de comunicação do governador, Judith Smith, destacou pelo menos dois funcionários do gabinete para ligar a repórteres e dizer a eles que Paterson estava surpreso com a consideração pública de Caroline ao Senado, que ele nunca teve a intenção de indicá-la ao cargo e que ela desistiu da idéia de concorrer por causa de questões antigas envolvendo impostos e uma babá estrangeira.

Os dois repórteres escreveram que estes dois supostos problemas pessoais, ocorridos nas décadas de 80 e 90, eram argumentos claramente exagerados, pois já foram resolvidos e não seriam considerados itens significativos no processo de análise da candidata pelo governador.

Ir além

Para o ombudsman do Times, Clark Hoyt [8/2/09], o artigo de Hakim e Confessore foi uma peça inteligente e útil sobre a política de Nova York e a credibilidade de um governador como Paterson, que ocupou o cargo’acidentalmente’ – após a queda de seu antecessor, Eliot Spitzer, envolvido em um escândalo com uma rede de prostituição de luxo. Hoyt acredita, entretanto, que o texto deveria ter’ido além’.’Deveria ter examinado o próprio papel do Times na história’, diz o ombudsman, já que o jornalão chegou a’entrar na dança’ ao publicar em seu sítio o vazamento orquestrado e permitir que uma fonte anônima –’próxima ao governador David Paterson’ – fizesse comentários negativos sobre Caroline Kennedy sem provas para corroborá-los.

Hakim recebeu uma das ligações da equipe de Paterson em 22/1, um dia após a desistência de Caroline. Logo depois, foi publicado um artigo no sítio do Times intitulado’Impostos e empregada podem ter minado aposta de Kennedy’, com a citação da fonte anônima afirmando que o governador’nunca teve a intenção de escolher Caroline porque estava claro que ela não estava preparada para o cargo’ e’claramente, não tinha experiência política e não conseguiria lidar com a pressão da arena pública’. O texto não continha maiores informações sobre os impostos ou os problemas com a empregada.

Minuto a minuto

Segundo Hoyt, este caso ilustra uma questão de extrema relevância para o jornalismo atual: com a instantaneidade da internet, a competição dos veículos de comunicação pelas notícias minuto a minuto passou a prejudicar os valores tradicionais cultivados pela cultura do jornal de papel.

O artigo do dia 22/1 gerou críticas dos leitores, que reclamaram que o texto não continha informações que sustentassem a acusação do título. Dentro do próprio jornal, houve quem também não concordasse com a matéria. Jim Roberts, editor responsável pelo sítio do Times, alertou a editora de notícias Kathleen McElroy e o editor de cidades Joe Sexton de que o texto não tinha nada que validasse as alegações. Em meia hora, a notícia online foi reduzida a uma afirmação: Paterson havia ponderado e considerava Caroline despreparada para o posto no Senado.

O editor de padrão do jornal, Craig Whitney, afirmou após o ocorrido que a citação original violava a política do Times de não conceder confidencialidade a fontes quando houver o envolvimento de ataques pessoais ou políticos. Hoyt acredita, no entanto, que a matéria continha problemas mesmo depois de retirada a citação, pois o título foi mantido e não foram adicionadas novas informações sobre impostos ou a empregada.

Hakim alega que pressionou a fonte por estas informações, mas elas não chegaram. Ele então encontrou outra fonte que corroborou as afirmações da primeira, mas não queria nem ao menos ser citada anonimamente. Como é norma no jornal, seus editores tinham conhecimento da identidade das duas fontes, e confiaram nelas. O ombudsman alega que isso não importa, já que, sem provas concretas dos problemas antigos de Caroline, os leitores não tinham a mínima obrigação em confiar no artigo do Times.

Hakim e Confessore admitem que estavam correndo contra o tempo – o New York Post havia furado o Times online por nove minutos na história dos problemas pessoais de Caroline – e se arrependem de ter deixado passar a citação negativa sem dados que a corroborassem. Apenas uma hora depois da divulgação inicial no sítio, a matéria foi atualizada com informações complementares.

Na opinião de Hoyt, o ciclo de notícias do jornal impresso permite que haja mais discussão sobre o tom de uma matéria que no meio online, mas isso não pode permitir que a credibilidade de um veículo seja prejudicada.’O fervor competitivo não é um valor ético justificável’, conclui Bob Steele, especialista em ética do instituto de jornalismo Poynter, na Flórida.’A internet é o futuro do Times. Mas a história de [Caroline] Kennedy é um lembrete de como um jornal que se orgulha de fazer as coisas corretamente deve ter uma grande disciplina antes de publicar uma pauta quente’, ressalta o ombudsman.