Sunday, 05 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Suzana Singer

‘Você colocaria fotografias das várias fases do seu filho em um blog? Muita gente diria que não, algumas que sim.

Você tiraria uma foto sorrindo, com o seu filho no colo, para uma reportagem com o título ‘Mães colocam crianças em ‘Baby Brother’ na internet’? Todo mundo, com alguma sanidade, responderia que não.

A Folha, infelizmente, não fez essa segunda pergunta à entrevistada na reportagem publicada no domingo passado (http://bit.ly/fX92Jh). O texto, que falava de blogs maternos, em que mulheres contam o desenvolvimento dos filhos e trocam experiências, condenava, na boca de três especialistas, esses sites.

A foto era da autora do site ‘Nascendo uma Mãe’, Giovana Reobol, 35, com Lucca, 2. ‘Fui procurada para falar sobre blogs com histórias de crianças, não sabia que a discussão era sobre expor intimidades’, reclama Giovana.

A Redação afirma que o texto ‘constatou um fenômeno’ e que a entrevistada foi questionada sobre os prós e os contras dessa prática. ‘A repórter me perguntou sobre privacidade, só que o foco da entrevista não era esse, falei muito pouquinho. A questão foi ‘en passant’’, conta Giovana.

Para os estudiosos ouvidos pela Folha, esses blogs são perigosos, porque podem ser acessados por criminosos, dão margem a ‘bullying’ e podem fazer com que a criança cresça sem noção de intimidade, sem respeitar a própria e a do outro. ‘Por que essa mãe alimenta essa necessidade?’, perguntava uma psicóloga da USP.

‘Ficou a impressão de que sou uma péssima mãe. E ainda uma idiota alienada, que aceita aparecer sorrindo numa reportagem como essa’, diz Giovana, que afirma selecionar as imagens e mensagens postadas para não constranger o menino no futuro.

Não havia na reportagem nenhuma voz dissonante entre os especialistas, o que provocou, com razão, a ira das blogueiras. Em um post no Facebook, decretaram: ‘Maus jornalistas mexeram com a categoria errada: mães’.

Elas afirmam que esses sites ajudam a trocar experiências, a diminuir a insegurança e a fazer novas amizades, além de trazerem dicas práticas sobre gravidez, amamentação, doenças infantis etc.

A empresária Carolina Longo, 31, do blog ‘Mulher e Mãe’, postou que ‘a matéria trata todas nós, mães blogueiras, como se nossa única intenção fosse expor a família’. ‘A mulher que vira mãe é massacrada por julgamentos, como se não bastasse ter de lidar com suas próprias culpas. Além disso, a maternidade gera uma certa reclusão. Junte esses fatores e você terá mulheres angustiadas e sem poder colocar isso para fora. Nos blogs e no Twitter, elas encontraram uma conexão com outras que passam pelas mesmas angústias’, defende.

Tudo indica que a Folha não entendeu as mães blogueiras -ou não deu voz suficiente a elas. Nada contra levantar as possíveis consequências negativas dessa prática, alertar para os riscos, mas a reportagem ficou apenas nisso. Incorreu em alguns problemas clássicos do jornalismo: falta de transparência com o entrevistado, tratamento superficial do tema e visão única dos ‘especialistas’, chamados quase sempre a opinar genericamente, sem examinar os casos enfocados.

A Folha acabou, ao denunciar mulheres que exibem suas crianças na rede, fazendo pior. Expôs injustamente mãe e filho, em um veículo de alcance muito maior que o de um blog de interesse restrito.

Eu amo Fusca

No final de semana passado, a Folha provocou revolta também nos fãs do Fusca. A capa da Ilustrada de sábado começava assim: ‘Era feinho, desconfortável e barulhento. Tinha fama de não deixar ninguém na mão, mas, já em seus últimos suspiros no Brasil, em 1996, era carro de pobre, suburbano, ou nostálgico’. Várias pessoas criticaram a frase preconceituosa. ‘É impressionante ver alguém da imprensa destilar uma idiossincrasia dessas’, escreveu Daniel Marchi, que se define ‘advogado, professor universitário e dono dedicado de seis Fuscas, uma Kombi e uma Brasília’.’