Wednesday, 15 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Diretoria eleita com menos de 2% dos votos de jornalistas

De acordo com a pesquisa “Perfil profissional do jornalismo brasileiro”, realizada pelo programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UFSC, em convênio com a Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, tendo o apoio da Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo e Fórum Nacional de Professores de Jornalismo, entre os dias 25 de setembro e 18 de novembro de 2012, apenas 25,2% dos jornalistas são filiados aos sindicatos (mais de 36 mil jornalistas) e 74,8% não querem vínculo associativo (mais de 108 mil jornalistas). A enquete foi feita com 2.731 jornalistas de todas as unidades da federação e do exterior, com participação espontânea. A margem de erro é inferior a 2%, em intervalo de confiança de 95%. Na pesquisa ficou constatado que existe uma população de 145 mil jornalistas brasileiros. A Fenaj representa apenas um quarto dessa população com 31 sindicatos em território nacional.

Entidades sem representatividade

Nos dias 16, 17 e 18 de julho, aconteceram as eleições da Fenaj e Sindicatos dos Jornalistas em diversos estados brasileiros. As eleições foram supervisionadas pela Comissão Eleitoral Nacional (CEN) e Comissão Eleitoral Estadual, formadas por jornalistas sindicalizados eleitos pela Fenaj e sindicatos regionais, dando assim a legitimidade necessária ao pleito.

Se a legitimidade das eleições é inquestionável, a representatividade fica a desejar. O percentual de jornalistas profissionais que compareceram às urnas em julho de 2013, foi inferior a 2% dos jornalistas brasileiros.

Vamos analisar as notícias que saíram nos boletins de notícias dos sindicatos regionais e federação de jornalistas, bem como os números divulgados sobre as eleições:

Eleição para diretoria da Fenaj

Participaram do processo eleitoral para eleger a executiva da Fenaj e diretorias dos sindicatos regionais de jornalistas, 4.365 eleitores. Para a direção da Fenaj foi eleita a Chapa 1 – “Sou Jornalista, Sou Fenaj”, com 2.425 votos. A Chapa 2 de oposição, “Luta Fenaj”, obteve 1.393 votos. Foram registrados, ainda, 80 votos nulos, 107 em branco e 261 foram anulados.

No dia 15/07/2013, o Boletim de Notícias da Fenaj destacou nota com o título: “Hora de decidir – Eleição da Fenaj começa nesta terça-feira.”

“A eleição direta para a nova direção da Fenaj e da Comissão Nacional de Ética dos Jornalistas começa nesta terça-feira (16) e será encerrada às 20 horas de quinta-feira (18). Mais de 10 mil profissionais sindicalizados da categoria estão aptos ao voto.”

“Mais de 10 mil profissionais sindicalizados…”, isso quer dizer que em média 30% dos jornalistas sindicalizados (mais de 36 mil) estavam aptos a votar, porém só compareceram aos três dias de votação, apenas 4.365 jornalistas.

Quatro dias posteriores ao boletim aqui registrado, no dia 19/07 a Fenaj diz em nova nota: “Resultado irreversível – Chapa 1 vence as eleições da Fenaj”

Um dia após o término das eleições (19/07), o presidente reeleito, Celso Schröder diz no Boletim de Notícias da Fenaj:

“(…) Com apoio de 66% dos eleitores, a Chapa 1 – ‘Sou Jornalista, Sou Fenaj’ consagra uma agenda que é fruto direto das demandas dos jornalistas brasileiros apresentadas e vencedoras em Congressos e Encontros da categoria nestes últimos anos…”

Vejamos o que diz o Boletim de Notícias da Fenaj do dia 23/07 divulgando o resultado oficial da eleição com o título: “Agora é oficial – CEN conclui apuração da eleição da Fenaj e confirma vitória da Chapa 1.”

“Participaram do processo 4.365 jornalistas. Para a direção da Fenaj foi eleita a Chapa 1 – ‘Sou Jornalista, Sou Fenaj’, com 2.425 votos. A Chapa 2, ‘Luta Fenaj’, obteve 1.393 votos. Foram registrados, ainda, 80 votos nulos, 107 votos em branco e 261 votos foram anulados.”

Se os eleitores aptos a votar eram mais de 10 mil, como noticiou a própria Fenaj, no dia 15/07, 66% de mais de 10 mil jornalistas, aptos a votar, são no mínimo, 6.600 votos e não 2.524, como ficou registrado no Boletim de Notícias da Fenaj, no dia 23/07 oficializando o resultado final das eleições.

Existe uma diferença enorme entre votos computados, para eleitores aptos a votar, que na ocasião da nota divulgada (15/07) eram mais de 10 mil jornalistas.

Diante das estatísticas divulgadas pela própria Fenaj em seus Boletins de Notícias, chegamos a seguinte conclusão:

A nova diretoria da Fenaj foi eleita por 1,75% dos jornalistas existentes, segundo pesquisa realizada em 2012 – “Perfil profissional do jornalismo brasileiro” que são mais de 145 mil jornalistas;

A nova executiva da Fenaj recebeu apenas 7% de votos dos jornalistas sindicalizados, conforme pesquisa – “Perfil profissional do jornalismo brasileiro”, que são mais de 36 mil jornalistas;

Apenas, 25% dos jornalistas sindicalizados, adimplentes com suas obrigações sindicais, portanto, aptos a votar, que superavam os 10 mil profissionais na ocasião, confiaram seu voto a Chapa 1;

Menos de 13% dos jornalistas sindicalizados (mais de 36 mil), segundo a pesquisa – “Perfil profissional do jornalismo brasileiro”-, compareceram as urnas (4.365 jornalistas votaram nas eleições de 2013);

A Chapa 1 da Fenaj, obteve 58% dos votos válidos, que foram 4.365, nos três dias de eleições.

Vamos analisar os números de votos válidos nas eleições anteriores a 2013:

Segundo o Boletim de Notícia da Fenaj, do dia 02/08/2010, com o título:

“Chapa virar o jogo vence eleição para a Fenaj”, relata que o jornalista Celso Schröder da Chapa 1, “Virar o Jogo: em defesa do Jornalista e do Jornalismo”, foi eleito para dirigir a Federação até julho de 2013, com 2.944 votos contra 1.369 para a Chapa 2. Em julho de 2010, foram computados 4.313 votos válidos.

O jornalista e professor, Celso Schröder, em 2010, obteve 420 votos a mais que em 2013, para sua reeleição.

Em 2004, na primeira gestão do jornalista Sérgio Murillo, como presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, a executiva da Fenaj foi eleita com 3.407 votos registrados, do total de 4.980 válidos.

Vejamos os dados transcritos do Portal Terra, divulgados no dia 20 de agosto de 2004. Na data, o então presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Sérgio Murillo, declarou que a entidade não tinha o controle do número total de jornalistas em exercício no país, porque o registro da profissão era expedido pelas Delegacias Regionais do Trabalho, hoje Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego (SRTE).

“Esse é mais um motivo para se criar o Conselho Federal de Jornalismo. Hoje, não se sabe nem o número de jornalistas nesse país. Como a atuação dos sindicatos é limitada, nós só sabemos quantos são sindicalizados”, afirmou à época. Segundo declarações de Sérgio Murillo em 2004, a entidade tinha 30 mil jornalistas sindicalizados, quando se acreditava que a população de jornalistas brasileiros era de 100 mil profissionais, entre funcionais e aposentados.

Quase uma década depois dessas declarações, a Fenaj não consegue despertar interesse nos jornalistas para a sindicalização e suas eleições contam com a participação de menos de 4% dos jornalistas profissionais brasileiros, votando nas chapas concorrentes.

Colégios eleitorais

Analisemos as eleições em dois colégios eleitorais da Fenaj: São Paulo, o maior colégio eleitoral da Federação Nacional dos Jornalistas e o Ceará, que deu a terceira maior votação a Chapa 1 da Fenaj, “Sou Jornalista, Sou Fenaj”, perdendo apenas para o Rio Grande do Sul, segundo colocado, estado do candidato reeleito, Celso Schröder.

Em São Paulo compareceram para votar 551 jornalistas sindicalizados, 363 votaram na Chapa 1 da Fenaj. O Ceará, estado que deu a terceira maior votação da Fenaj no Brasil em 2013, teve 357 votos válidos, dos quais, 195 foram computados para a Chapa 1 “Sou Jornalista, Sou Fenaj” liderada pelo jornalista e professor Celso Schröder.

Erro na divulgação

Assim como a Fenaj, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Ceará – Sindjorce, também cometeu erro na divulgação do percentual de votos a favor da Chapa 1 – “Jornalistas Unidos, Sindicato Forte”. Vejamos o erro cometido no Boletim de Notícias do Sindjorce. O jornalista que redigiu a nota confundiu votos válidos com o número de jornalistas profissionais naquele estado.

A nota publicada no site do sindicato, no dia 22 de julho de 2013, com o título: “Chapa 1 – ‘Jornalistas Unidos, Sindicato Forte’ vence as eleições do Sindjorce”, relata o seguinte:

“Por 37 votos de diferença, a Chapa 1 – ‘Jornalistas Unidos, Sindicato Forte’, liderada pela presidente em exercício do Sindjorce, Samira de Castro, venceu as eleições para a nova Diretoria Executiva, Conselho Fiscal, Delegados da Fenaj e Comissão Estadual de Ética, gestão 2013/2016. Dos 357 votos válidos, 197 foram para a Chapa 1 e 160 para a Chapa 2 – ‘Jornalistas: O Sindicato Merece Mais’, encabeçada pela ex-secretária-geral da entidade, Mozarly Almeida. A Chapa 1 foi vitoriosa com 55,18% da preferência dos jornalistas do Ceará, contra 44,81% da Chapa 2.”

“A Chapa 1 foi vitoriosa com 55,18% da preferência dos jornalistas do Ceará…”

Bem, os jornalistas do Ceará, são todos os jornalistas sindicalizados com direito (adimplentes, aptos a votar) e sem direito a voto (inadimplentes), somados aos jornalistas não sindicalizados. Portanto, esse número não está resumido a 197 jornalistas em todo o estado.

Consultei diversas buscas para saber quantos jornalistas existem no Ceará e quantos são sindicalizados, mas não encontrei nenhuma informação. Porém, podemos ter uma ideia do número de jornalistas sindicalizados no Ceará pela nota divulgada no Boletim de Notícias do próprio Sindjorce, no dia 12 de julho com o título: “Jornalistas estão convocados a participar do processo eleitoral do Sindjorce e da Fenaj.”

No último parágrafo da nota diz:

“A CEN lembra aos Sindicatos que, conforme o Regimento Eleitoral da Fenaj são eleitores os jornalistas sindicalizados até 16 de abril e em dia com a Tesouraria das entidades. No Ceará, 422 jornalistas estão aptos a votar.”

“No Ceará, 422 jornalistas estão aptos a votar.”

Geralmente, apenas 30% dos jornalistas sindicalizados estão aptos a votar nas eleições por estarem adimplentes. Isso quer dizer, que naquele estado deve ter 750 a 800 jornalistas sindicalizados, os não sindicalizados não podemos precisar.

Se a própria Comissão Eleitoral Nacional (CEN) diz na nota do dia 12/07 do Sindjorce (quatro dias antes das eleições), que 422 jornalistas no Ceará estão aptos a votar e quatro dias depois das eleições (22/07), o próprio Sindjorce divulga o resultado oficial, apresentando 357 votos válidos e proclamando que a Chapa 1 foi vitoriosa com 197 votos e que isso significa 55,18% da preferência dos jornalistas do Ceará, tem algo errado na notícia:

Vamos especificar as estatísticas:

** Se na ocasião existiam 422 jornalistas sindicalizados e aptos a votar, e se todos votassem na chapa 1, por unanimidade, mesmo assim, o número de jornalistas sindicalizados aptos a votar no Ceará (422), não representaria a preferência dos jornalistas do estado, muito menos, os 197 computados para a chapa 1 que foi vitoriosa, conforme divulga a nota;

** No Ceará, foram computados 357 votos válidos. A Chapa 1 obteve 55,18% desses votos e não 55,18% da preferência dos jornalistas do Ceará, como foi divulgado na nota;

** 197 votos para a Chapa 1, significa 46,80% dos votos aptos (422) que a Comissão Eleitoral Nacional (CEN) divulgou no dia 12/07 em nota no site do Sindjorce;

** A Chapa 1 foi legitimamente vitoriosa, com 197 votos, isso é inquestionável. Mas que representatividade tem 197 votos, diante do número de jornalistas existente naquele estado, sindicalizados e não sindicalizados. Essa falta de representatividade ocorrida no Ceará se repetiu nos diversos estados brasileiros e na própria eleição da Fenaj em território nacional.

A Fenaj juntamente com os sindicatos regionais precisa mostrar muito trabalho nos próximos três anos para mudar o quadro que vem sendo registrado na última década de eleições das entidades, que é de total apatia na participação democrática da categoria nas decisões de escolha dos dirigentes sindicais.

A posse da nova diretoria eleita da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) ocorrerá durante o XIX Enjai – Encontro Nacional dos Jornalistas em Assessoria de Imprensa, no Rio de Janeiro, dos dias 22 a 25 de agosto.

Na Comissão Nacional de Ética, os cinco candidatos mais votados foram Sérgio Murillo de Andrade, com 1.542 votos; Elisabeth Costa, com 1.502 votos; Ângela Marinho, com 1.302 votos; Beatriz Barbosa, com 1.230 votos e Mario Messagi Jr., com 1.144 votos.

“A formação política e a capacidade de análise dos jornalistas é débil”, diz pesquisa da USP

Um estudo realizado com 538 jornalistas que trabalham em São Paulo revelou profundas mudanças no perfil da profissão. A pesquisa realizada pela professora da Universidade de São Paulo – USP, Roseli Figaro mostrou que a formação política e a postura crítica dos jornalistas foram prejudicadas nas últimas gerações.

“Uma questão que nos preocupou foi que uma minoria, em torno de 30%, tem noção de que o trabalho do jornalista é fundamental para preservar o direito do cidadão à informação. A maior parte vê a informação como um produto, um negócio. Quando colhemos os depoimentos, alguns deles chamaram a atenção pelo despreparo ou desinteresse desses profissionais com relação aos grandes temas e ao discernimento do papel do jornalista”, aponta Roseli na entrevista concedida por telefone à IHU – Instituto Humanitas Unisonos, Online.

A pesquisa completa, que começou a ser feita em 2010, realizada pela professora Roseli Figaro, junto com os doutorandos Rafael Grohmann e Cláudia Nonatom será lançada em agosto no livro intitulado: “As mudanças no mundo do trabalho dos jornalistas” (Atlas, 2013).

Resumidamente, o que o estudo indica é que os profissionais de imprensa são majoritariamente não sindicalizados, de formação política débil e com pouca capacidade de análise.

“O jornalismo surge justamente no nascimento do racionalismo, na constituição do Estado frente à Igreja, no momento em que se constituem a república, a democracia e os conceitos de liberdade. São essas questões que são pouco vislumbradas por estes profissionais”, avalia a pesquisadora.

Roseli Aparecida Figaro Paulino é professora livre-docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da USP. Possui pós-doutorado pela Universidade de Provence, França. Ela é coordenadora do Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa da USP/Comunicação e Censura e do Grupo de Pesquisa do Arquivo Miroel Silveira. Dedicou seus estudos à comunicação relacionada ao mundo do trabalho. É também autora de outros seis livros, entre eles: Comunicação e Análise do Discurso (São Paulo: Contexto, 2012).

Fontes consultadas

** Pesquisa “Perfil profissional do jornalismo brasileiro (2012)”. Realização: Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UFSC, em convênio com a Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj. Apoio: Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo e Fórum Nacional de Professores de Jornalismo.

** Boletim de Notícias da Fenaj no dia 15/07/2013: “Hora de Decidir – Eleição da Fenaj começa nesta terça-feira.”

** Boletim de Notícia da Fenaj do dia 19/07/2013: “Resultado Irreversível – Chapa 1 vence as eleições da Fenaj.”

** Boletim de Notícia da Fenaj do dia 23/07/2013: “Agora é Oficial – CEN conclui apuração da eleição da Fenaj e confirma vitória da Chapa 1.”

** Boletim de notícia da Fenaj do dia 02/08/2010: “Chapa virar o jogo vence eleição para a Fenaj.”

** Boletim de notícia da Fenaj do dia 10/05/2012: “Após homologação de chapas começa organização da eleição da Fenaj nos estados”

** Boletim de Notícia do SJPMG: “Chapa 1 vence eleições da Fenaj

** Transcrição do Portal de Noticias Terra – Material veiculado no dia 20/08/2004

** Boletim de Notícias do Sindjorce do dia 22/07/2013: “Chapa 1 – Jornalistas Unidos, Sindicato Forte vence as eleições do Sindjorce”

** Boletim de Notícias do Sindjorce do dia 12/07/2013: “Jornalistas estão convocados a participar do processo eleitoral do Sindjorce e da Fenaj.”

** A formação política e a capacidade de análise dos jornalistas é débil. Entrevista especial com Roseli Figaro

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Esperidião Jr. Oliveira é jornalista