Saturday, 05 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Narrativa política sobre a evolução do campo

Desde a antiguidade greco-romana, os processos de comunicação fazem parte do saber institucionalizado. Desbravaram este campo do conhecimento pioneiros, como Aristóteles e Quintiliano. Suas reflexões tiveram continuidade nas sociedades nacionais européias, merecendo registro no mapa cognitivo esboçado na Encyclopédie, por Diderot e d´Alembert (século 18).

Embora os estudos sobre fenômenos midiáticos tenham suscitado precoce interesse acadêmico já no fim século 17, quando Peucer apresenta sua tese pioneira sobre o jornal diário, eles na verdade só vão conquistar o timbre universitário durante o século 20.

A Alemanha e os Estados Unidos ocupam papel decisivo nesse panorama, legitimando o ensino e a pesquisa sobre a comunicação massiva (jornalismo, propaganda, entretenimento). Da mesma forma a comunicação interpessoal (lingüística e pedagogia) vinha desfrutando reconhecimento público desde o século 19, tanto na Europa quanto na América.

Conteúdo e audiência

O século 20 foi marcado por intensos conflitos – políticos, ideológicos, metodológicos, trabalhistas – que inundaram o campus. Aqui, as tensões corporativas encenaram um campo de luta pela hegemonia científica. Quem detinha poder tratava de preservar espaço e privilégios, exercendo tutela sobre as áreas emergentes.

As ciências da comunicação vivenciaram circunstâncias diferenciadas na geopolítica acadêmica. Para marcar posição, lutar pela sobrevivência e arbitrar o conhecimento novo foram constituídas as comunidades acadêmicas.

As primeiras comunidades nacionais surgiram nos Estados Unidos da América, já no início do século 20. Tanto no segmento da comunicação interpessoal (estudos retóricos), quanto no setor da comunicação massiva (estudos midiáticos). Até hoje, elas co-existem de forma pacífica, mas competitiva. As tensões evidentes ocorreram com as ciências sociais, em decorrência da importação de metodologias originariamente exercitada pelas ciências da comunicação.

Nos países europeus, as embrionárias comunidades nacionais gravitaram em torno das empresas estatais de mídia eletrônica, que assalariavam pesquisadores especializados em análises de conteúdo e em estudos de audiência. Mas eram também integradas por estudiosos da imprensa e do cinema, ancorados em organizações sindicais, religiosas, culturais ou comerciais, eventualmente em universidades.

Intercom, Abecom e Compós

A conjuntura do pós-guerra instaura um ambiente de natureza globalizante, motivando o aparecimento de comunidades internacionais no âmbito das ciências humanas, sob a égide da Unesco – Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura. Em 1957, na própria sede dessa agência intergovernamental emerge a nossa comunidade mundial, capitaneada pela IAMCR – International Association for Mass Communication Research.

O Brasil participou desse momento histórico, mas ficou ausente da vida comunitária por falta de uma comunidade nacional organicamente constituída. Não obstante a produção de conhecimento comunicacional remonte a meados do século 19 e a instituição do campo da comunicação seja contemporânea dos acontecimentos do pós-guerra, a realidade é que somente nos estertores do regime militar pós-64 logramos sedimentar a comunidade nacional de ciências da comunicação.

Os marcos fundamentais desse percurso estão fincados na criação da Intercom (1977), congregando os pesquisadores da área, Abecom (1980) e Compós (1990), aglutinando, respectivamente, os cursos de graduação e pós-graduação. A nossa inserção na comunidade internacional foi solenemente proclamada em 1992, quando o Brasil acolhe pela primeira vez o Congresso Latino-americano de Ciências da Comunicação e o Congresso Internacional de Estudos Científicos sobre Mídia e Comunicação.

Conceitos, hipóteses e correntes

Neste começo de século, o campo ainda batalha para completar o processo do seu reconhecimento institucional, seja por parte da sociedade, seja por intermédio da comunidade científica. Não obstante, as conquistas obtidas dão alento suficiente para que a nova geração que ascende à liderança possa dar continuidade à luta e avançar em direção a novos patamares.

Este livro pretende contribuir para balizar a ação dos que se iniciam no campo, estimulando o aparecimento de uma vanguarda conseqüente e coerente, capaz de pavimentar o terreno para os saltos que o Brasil precisa empreender, potencializando o legado até agora acumulado.

Trata-se de obra assinada por um observador participante, alguém que esteve no epicentro de alguns acontecimentos, testemunhando fatos, interagindo com personagens ou influindo através de intervenções em congressos ou artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais.

Por isso mesmo configura uma narrativa política, na forma, no conteúdo e na intenção. O que significa dizer: factual, mas não caolha; objetiva, mas não imparcial; engajada, mas não fanática.

Creio que será útil aos estudantes de Teorias da Comunicação e disciplinas correlatas, complementando dados ou contrapondo argumentos para sedimentar o aprendizado de conceitos, o entendimento de hipóteses e a contextualização de correntes de pensamento.

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Jornalista e professor