A verdadeira avalancha de notícias contraditórias deflagrada nas redes sociais forneceu uma amostra do que nos espera – num futuro não muito distante – em matéria de incerteza informativa. O resultado do segundo turno das eleições presidenciais incorporou um elemento passional às manifestações dos eleitores pela internet, mas o fenômeno da multiplicação de visões divergentes nas redes sociais veio para ficar, para o bem e para o mal.
Nos quatro primeiros dias depois do anúncio da reeleição da presidente Dilma Rousseff ficou claro que redes como o Facebook, Twitter e outras redes já são o ambiente onde as pessoas concordam, discutem e se agridem. O mundo da interatividade interpessoal está migrando irreversivelmente para as plataformas digitais, o que é um elemento positivo porque facilita a troca de ideias, mas também torna possíveis as agressões, disseminação de falsidades e propostas absurdas, como o abaixo assinado pelo impeachment de Dilma ou o pedido postado no site do Exército pedindo a volta dos militares ao poder.
Estamos ingressando na era da incerteza informativa porque nos defrontamos com duas opções pouco tranquilizadoras: de um lado temos a imprensa monoliticamente estruturada em torno de um modelo de negócios e de uma plataforma política, e do outro o caos noticioso na internet. Esta situação não é definitiva porque é inevitável uma redefinição dos papéis dos diferentes protagonistas da arena informativa.
Mas fica uma constatação que deve acelerar a mudança de nossos hábitos e valores na hora de receber noticias e passá-las adiante. Nossa confiança na imprensa como organizadora do nosso cardápio informativo diário está seriamente abalada. Por isso teremos que buscar noutras fontes os dados que viabilizam a nossa vida em comunidades e agrupamentos sociais. O ambiente que ocupa cada vez mais espaços em nossa agenda diária é o da internet e das redes sociais, onde a principal característica é a velocidade, amplitude de disseminação de mensagens e a diversidade de percepções.
A rede mundial de computadores supera todos os demais ambientes informativos analógicos em matéria de liberalização no fluxo de notícias. Mas esta liberdade tem outra face. Para sociedades que sempre conviveram com freios e limites no acesso à informação, a inédita ausência de restrições dá margem a catarses irrefletidas que criam tensão e sérios riscos à tolerância política e social.
O tiroteio noticioso provavelmente perderá intensidade à medida que as emoções pós eleitorais perderem intensidade. Mas a desorientação informativa é um fenômeno com o qual teremos que nos acostumar e saber como lidar. Cada cidadão terá que desenvolver sua “caixa de ferramentas” para lidar com a dúvida e as desconfianças. Dúvidas como a verdadeira origem do inesperado surto de autoafirmação dos nossos parlamentares, cuja imagem ainda está manchada por atentados ao decoro político e à lisura financeira.
Normalmente, o cidadão comum esperaria que a imprensa explicasse o que está por trás dessa atitude, mas ela se limitou a justificá-la como uma vendetta pelo fato de alguns deputados e senadores não terem sido eleitos por falta de apoio do governo federal. Como a maioria já se conformou com a omissão da imprensa, sobrou para os leitores, ouvintes, telespectadores e internautas a indiferença perante os veículos de comunicação e a catarse individual nas redes sociais.
A nossa “caixa de ferramentas” para lidar com a era da incerteza informativa será algo muito pessoal porque cada indivíduo vive num ambiente noticioso diferente. É um esforço que teremos que fazer sozinhos ou com a ajuda de comunidades de informação para separar o joio do trigo em matéria de notícias. Uma das ferramentas é a curadoria de noticias, mas ela dependerá do grau de confiança que teremos na competência e habilidade dos responsáveis pela sugestão de notícias relacionadas aos nossos interesses e necessidades.
Não adianta vituperar contra a internet porque ela também veio para ficar, assim com outras inovações tecnológicas que revolucionaram a história da humanidade. Também não adianta o saudosismo tipo “como era verde o meu vale” porque a história vai para frente, apesar de recuos temporários. É o preço que estamos tendo que pagar por toda a série de maravilhas tecnológicas que mudaram a nossa maneira de viver.