Friday, 04 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Nas ruas e nas nuvens

A história dos computadores pessoais, ou PCs, tem o seu início controverso. Alguns dizem que o Kenbak-1, uma máquina de 256 bytes de memória criada em 1973, é o pioneiro; outros apontam o IBM 5100 ou o Apple II. Debates à parte, uma coisa é certa: o fim está próximo. Especialistas afirmam que a transição para os dispositivos móveis, como tablets e smartphones, é um caminho sem volta e, em breve, notebooks e desktops como existem hoje poderão deixar de existir.

– Nós estamos saindo do paradigma do personal computer para a personal cloud. O PC deixou de ser a máquina central e se restringe a nichos. As pessoas andam nas ruas com servidores nos bolsos e todas as informações estão guardadas na nuvem – afirma Cezar Taurion, diretor de novas tecnologias da IBM Brasil.

Mudança afeta companhias

Um levantamento da iSuppli mostra que, pela primeira vez, a produção de memórias para computadores tradicionais deixou de ser maioria. No segundo trimestre deste ano, elas responderam por 49% do total, com projeção de queda. Por outro lado, chips para tablets e smartphones, apesar de ainda representarem uma pequena fração do mercado, avançam rapidamente.

Essa tendência se reflete no valor de mercado das companhias. Nos últimos 12 meses, as ações de Dell e Hewlett Packard (HP), empresas reconhecidas por seus desktops e notebooks, caíram 37,19% e 38,26% respectivamente. Já Apple e Google, que apostaram em dispositivos móveis e aplicações na internet, cresceram 72,53% e 52,10%.

Tendência de canibalização

De acordo com o analista de tecnologia da Gartner Andrew Neff, o mundo está se tornando cada vez mais “wireless” e o PC está perdendo espaço. Apple e Google partiram na frente e estão em situação mais confortável que outros players.

– Os desktops estão perdendo cada vez mais espaço, se concentrando apenas no mercado corporativo – avalia.

Para piorar, as empresas estão comprando menos por causa da crise econômica e, com isso, as fabricantes de computadores tradicionais estão sendo ainda mais afetadas. Em busca de participação neste novo mercado, a Microsoft, que por muito tempo se concentrou em softwares físicos, migrou para a nuvem com o Office 365 e vai lançar o Windows 8, um sistema operacional focado em smartphones e tablets.

O diretor técnico da ContexTI, Jackson Laskoski, afirma que estamos na “era da computacionalidade”, não dos computadores. Os PCs perderam o papel principal e se tornaram meros coadjuvantes num mundo que valoriza a mobilidade e conectividade.

– A tendência é que, com as aplicações voltadas cada vez mais para o ambiente web, com acesso remoto, as pessoas se preocupem cada vez mais com a praticidade – afirma.
Segundo Laskoski, há pouco tempo o consumidor procurava a performance, máquinas com processadores mais robustos, e as empresas de software e hardware alimentavam essa necessidade, com aplicativos que exigiam computadores cada vez mais potentes. Agora, tablets e smartphones não possuem grandes espaços de armazenamento, mas as aplicações são mais leves e estão na nuvem.

– É um marco na história da computação – diz Laskoski.

No Brasil, a venda de computadores continua crescendo, mas num ritmo mais lento. De acordo com o IDC, no primeiro semestre do ano o mercado cresceu apenas 2% em relação ao mesmo período de 2011, muito abaixo dos 15% alcançados entre 2010 e 2011.

Para a analista de computadores e tablets do IDC, Camila Pereira dos Santos, ainda não é possível falar em canibalização de mercado, mas essa é a tendência.

– No primeiro trimestre do ano foram vendidos 370 mil tablets e no segundo, 606 mil, um aumento de 64%, com perspectiva de crescimento – diz.

Para o presidente da Associação Brasileira dos Distribuidores de TI, Mariano Gordinho, a venda de computadores deve manter os volumes atuais por algum tempo, mas é “inevitável” que a venda de tablets tenha impacto direto no mercado de desktops e notebooks do país.
– Os principais concorrentes desses equipamentos são os modelos com tela de 10”, que podem acoplar a teclados externos – explica.

Apesar do cenário negativo, os PCs ainda devem sobreviver por algum tempo, em busca de novos nichos. Aplicações como edição de vídeo, áudio e imagem exigem telas maiores, espaço de armazenamento e processadores mais potentes. Além disso, existem consumidores que estão acostumados com teclados e mouses.

– Nós estamos em um momento de mudança, mas não quer dizer que os PCs vão acabar. Pelo menos não imediatamente – afirma Laskoski.

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[Sérgio Matsuura, de O Globo]