Wednesday, 11 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1317

A apresentadora de belíssimas pernas

A rainha Vitória, da Grã-Bretanha (1819-1901, coroada 1839), depois de sua viuvez, com a morte do príncipe Alberto (1861), ainda relativamente jovem, permaneceu o resto da vida vestida em luto, deixando de aparecer em público e indo raras vezes a Londres.

Autoproclamou-se guardiã dos bons costumes e implantou – em todo o império britânico, com reflexos para o resto da Europa – o que chamamos de moral vitoriana, baseada no puritanismo, mas com princípios hipócritas, onde o mais importante não era ser, mas parecer que se é.

Minha geração (começada nos anos 1940) viveu uma parte dessa moral. Lembro que me era contado por minha mãe que seu avô era um homem sério, que jamais alguém o vira rir, mas ela uma vez o surpreendera passando a mão no recavém da empregada. Pois é não ria, mas dava-se a licenciosidades.

Esse sistema de conduta, sempre mais atenuado, foi-se arrastando até a primeira metade dos anos 1960, quando na Inglaterra apareceram especialmente Mary Quant, com sua minissaia e os Beatles, o primeiro conjunto a dar dignidade à música pop e também liberalizando modas, hábitos e comportamentos. Fica portanto marcada essa época como a da inumação da moral vitoriana.

‘Que não se torne um hábito’

Todavia esta, em pleno século 21 é desenterrada para atacar uma das maiores e mais sérias tradições inglesas, o sistema rádio televisivo a British Broadcasting Corporation (BBC), que se encontra numa situação pouco favorável e desacreditada (ver OI nº 445, ‘A tiazinha está decepcionando os sobrinhos‘)

O alvo é a apresentadora de telejornal Emily Maitlis, diplomada em Cambridge e com excelente conhecimento de cinco línguas, entre estas o dificílimo mandarim, ainda por cima jovem e bonita, mas que desde a semana passada está sendo escarnecida pela imprensa e pelos telespectadores.

Por qual culpa? Na pré-apresentação do noticiário das 22 horas, o mais importante da BBC, ela ‘ousou’ sentar-se na escrivaninha e, pior ainda, cruzou as pernas. Não se viu nada, sua saia a cobria abaixo do joelho, nem um milímetro de coxa. Mas aquelas panturrilhas, saltos altos e finos e seu sedutor sorriso, levaram algo como trinta pessoas a protestar: não é assim que se apresenta um telejornal, não na BBC. ‘Mas ela não deveria ser uma jornalista séria?’ perguntou um telespectador. ‘E então que estava fazendo sentada na escrivaninha com a saia levantada?’; ‘Maitlis queria chamar a atenção, espera-se que isso não se torne um hábito’, escreveram outros.

Nada de escandaloso

A BBC não achou ser necessário responder às críticas, assim como ela também, a principal interessada, está calada. Também não é primeira vez que enfrenta problemas do gênero. O ano passado apareceu em todos os tablóides, pois usava um vestido branco, durante uma premiação na TV, e a roupa escorregou-lhe um pouco e pôde se ver, por menos de um segundo, o bico do seio. No mesmo ano, apresentando um novo noticiário, usava uma saia que foi considerada excessivamente curta.

Fato é que a jornalista, chegada a BBC, vinda da NBC e com uma breve passada pela Sky News, apresenta, além do telejornal, o programa Newsnight, que é a grande aposta do gigante midiático britânico. A moça tem orgulho de sua beleza e tem certeza que isso a ajudou a fazer carreira. ‘Falamos de televisão e é normal que a aparência conte’, disse ela numa recente entrevista ao Guardian.

A realidade é que tem belíssimas pernas. Fossem essas feias, certamente ninguém teria notado aquilo – que, mesmo não sendo usual, nada tem a ver com um comportamento escandaloso. Além do mais, vale lembrar que a rainha Vitória morreu há mais de um século.

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Jornalista. Texto de apoio: Paola De Carolis, ‘Sta seduta sulla scrivania: scandalo alla BBC’, Corriere della Sera (23/8/2007)