Sunday, 05 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

A mídia explicadora

Diante da atual crise econômica da Europa e dos Estados Unidos, a política nunca mais será a mesma. Porque a mídia nunca mais será a mesma. A crise está revelando uma nova e decisiva função da mídia. Veio para ficar. Depois da mídia investigativa dos últimos vinte anos, floresce a mídia explicadora. Uma não exclui a outra. Somam-se. Na verdade, temos vários tipos de mídia: eletrônica (internet, Orkut, email, Facebook etc.), impressa (jornais, revistas, livros, etc.) televisiva (aberta, a cabo, vídeo, etc.).

Considere-se também que a mídia, na história, foi sempre exercendo funções novas. Concomitantes e não sequenciais. Primeiro era apenas impressa, elitista e discursiva, mas fez a república, e derrubou o império. Foi fundamentalmente informativa, circulando informações quando surgiram telégrafos, telefones, telex, fax, satélites. Passou a ser depois mobilizadora, colocou os intelectuais como articulistas e o povo na rua. Derrubou o regime autoritário. Mobilizou a causa verde e os direitos humanos. Em seguida veio a era da mídia investigativa e derrubaram Nixon e Collor e até hoje derrubam ministros aqui e em todo o mundo. Chegamos agora no apogeu da mídia explicadora.

Cada função da mídia tem correspondido historicamente a um profissional diferente. A mídia informativa e investigativa vive dos bons repórteres. A mídia mobilizadora, dos grandes editorialistas, colunistas e articulistas. Na mídia explicadora são os especialistas que veem além da notícia e os comunicadores que dialogam com o público. Explicam conversando, descomplicando. O objetivo maior da mídia explicadora é explicar o simples que existe por trás do complexo. Bem como o valor ético e social que se escondem ou se revelam por trás do fato.

Entender é preciso

Na verdade, o principal alvo da mídia explicadora é a política, seja a política representativa sejam as políticas públicas, mas sobretudo a política econômica, como egoísmo ou engano. Como propriedade de apenas alguns. Dos 0,1%. O alvo da mídia explicadora é os 99,9%, que estavam fora do processo decisório de suas nações em parte por irresponsabilidade, descuido e muito por ignorância, desconhecimento e entendimento.

Informar somente não é formar. Não basta. Há que explicar. Às vezes até didaticamente. Revelar o íntimo da política e o complexo da economia. Quando forem escrever a história desta crise econômica, ou da primavera dos árabes, ou dos movimentos sociais contra Wall Street, com certeza este será um dado explicativo precioso. As pessoas estão entendendo mais de economia e política porque a mídia está explicando mais.

Não adianta dizer como nos Estados Unidos que não precisa taxar os muito ricos, pois são poucos e não levantaria o dinheiro necessário. São poucos, mas se pagassem como pagavam antes, em 2020 diminuiria o déficit americano em 1 trilhão de dólares como explica o Comitê de Orçamento americano. Como não adianta dizer ao eleitor, que para salvar os países tem que mudar de primeiro-ministro, sem mudar a gestão dos bancos que emprestaram mal. Como não adianta exigir que a China abra seus mercados, quando americanos e europeus estão fechando os seus. Etc… etc…

Explicar hoje é democratizar. Navegar não é preciso, como diria Fernando Pessoa. Entender é preciso.

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[Joaquim Falcão é mestre em Direito pela Universidade Harvard (EUA), doutor em Educação pela Universidade de Genebra (Suíça) e professor de Direito Constitucional da FGV-Rio]