Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Último Segundo


EXÉRCITO NO RIO
Alberto Dines


A guerrilha no Rio, 16:06 10/03


‘É evidente que o Ministério Público Federal tem uma penca de argumentos
legais para solicitar o fim da Operação Asfixia empreendida pelo Exército em
diversas favelas da antiga Cidade Maravilhosa. Mas é evidente que o Executivo
dispõe de um acervo ainda maior de alegações para amparar a intervenção branca
no estado do Rio de Janeiro.


A primeira justificativa, mais óbvia, é a recuperação das armas roubadas de
um quartel, a última é gritante: o Rio está abandonado, entregue ao narcotráfico
e a família reinante, os Garotinho, não quer envolver-se com a questão da
violência – por isso dá apoio ostensivo a ação do Exército. A batalha iniciada
na madrugada desta quinta-feira no Morro da Providência, zona central da cidade,
entre soldados, policiais e traficantes demonstra claramente que a intervenção
federal não pode nem deve ser interrompida.


Ao contrário, precisa ser formalizada e intensificada. Se a pusilanimidade do
clã Garotinho transformou o Rio numa cidade aberta e sitiada, o desnorteamento
do Governo Lula, preocupado apenas com a reeleição, situa o problema na véspera
do caos e da ruptura. Certas reações à Operação Asfixia estão desvendando um
problema detectado há anos, noticiado com timidez mas que poucos tem coragem de
encarar, muito menos escancarar: a bandidagem politizou-se.


A arma secreta dos traficantes fluminenses é o apoio de pequenos grupos de
moradores não apenas para fornecer o apoio logístico às suas operações mas para
manter aceso o estopim de um confronto civil. Os dez fuzis automáticos e a
pistola roubados do depósito do Exército em São Cristóvão no dia 3 de Março são
estrategicamente menos importantes para as facções criminosas do que a violenta
reação que o assalto provocaria com os inevitáveis protestos orquestrados pelos
chefões do tráfico.


Esta adesão militante de grupos de favelados ao narcotráfico não se resolve
com a distribuição de folhetos em áreas onde as forças de segurança procuram
reafirmar a presença do Estado de Direito. Este é um desdobramento que exige uma
ação política inteligente, sofisticada e que só um governo cônscio da sua
legitimidade tem condições de acionar.


Não é o caso da atual equipe que comanda o Executivo federal. Há dez meses
assistimos às manobras do governo para legalizar o ilícito do Caixa Dois. A
operação de salvamento dos mandatos de Roberto Brant e Professor Luizinho
enquadra-se numa grande estratégia concebida pelo ministro da Justiça para
descriminalizar a corrupção eleitoral. O Planalto não está pensando em salvar
cabeças de correligionários e aliados mas em tornar corriqueiros e aceitáveis os
vícios institucionais.


Na medida em que se amplia e se consolida a noção de que as transgressões
políticas são inevitáveis, cria-se uma proteção natural para as ameaças que
poderão aflorar nos relatórios finais das CPI’s. Nota dez em matéria de
sobrevivência, nota zero em matéria de legalidade. Mas num panorama marcado por
prevaricações e vacilações na esfera criminal e onde todos estão fragilizados
pela incerteza – inclusive o comando do Exército e o governo central, apesar das
pesquisas de opinião – não convém esperar murros na mesa nem políticas firmes e
duradouras capazes de enfrentar a guerrilha do narcotráfico.


A bandidagem também lê jornal, ouve rádio e assiste à TV. Também ela sabe que
tanto Garotinho como Lula estão mais empenhados nas eleições de Outubro do que
numa política de segurança de longo prazo apta a reverter a hegemonia das
facções criminosas no Rio de Janeiro e que, certamente, produzirá desgastes em
segmentos da população vitais para ambos.


É imperioso proteger aqueles que vivem na terra de ninguém entre o crime e o
Estado organizado. Mas é indispensável reconhecer que as ameaças aos direitos
dos favelados foram iniciadas e são mantidas por aqueles que exploram sua
miséria em benefício do crime.’


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