Tuesday, 14 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Eliane Pereira

‘Para a indústria da comunicação, o ano de 2003 foi como um tradicional filme de terror: tensão constante, muitos sustos pelo caminho mas, no final, o vilão é derrotado e todos (ou quase) se salvam. Ao contrário do esperado – e do que sinalizava o desempenho negativo do Produto Interno Bruto (PIB), que diminuiu em 0,2% -, o mercado publicitário cresceu 12,2% nominais, tendo fechado o ano em R$ 14,8 bilhões (contra R$ 13,2 bilhões de 2002). Levando em conta que a inflação no período foi de 9,3%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), chega-se a um crescimento real de 2,9%, desempenho considerado positivo diante do quadro de estagnação econômica pelo qual passa o País.

Os dados consolidados do Projeto Inter-Meios relativos ao ano passado mostram que os veículos faturaram R$ 10,8 bilhões no período, contra R$ 9,6 bilhões em 2002 (excluídos os valores aplicados em mobiliário urbano e internet, para os quais não há base de comparação de um ano para o outro). Como o Inter-Meios mede 90% dos investimentos em mídia no Brasil (ver Metodologia), calcula-se que o montante faturado pelos veículos tenha atingido R$ 12 bilhões. Na produção de peças publicitárias (anúncios, filmes, spots de rádio), estima-se que sejam investidos 19% do total das verbas de mídia, o que dá mais R$ 2,8 bilhões, chegando-se assim ao valor final de R$ 14,8 bilhões (ver quadros).

Esse número representa 0,97% do PIB brasileiro, que segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi de R$ 1,514 trilhão em 2003. Isso significa que a participação do mercado publicitário no total de riquezas geradas no País se manteve estável, visto que em 2002 o índice foi de 0,98%. Cabe explicar que o cálculo relativo à participação do mercado publicitário no PIB em 2002 teve que ser refeito, já que o IBGE divulgou um valor do PIB referente a esse ano ligeiramente superior ao que havia sido usado para fazer a conta quando da divulgação do Inter-Meios consolidado de 2002.

Apesar de o setor ter apresentado crescimento real num ano considerado muito ruim, a verdade é que esse resultado ainda é insuficiente para compensar ou reverter a contração que o mercado publicitário vem sofrendo sistematicamente desde 2000, em termos reais. ‘Por outro lado, o fato de o setor ter crescido em 2003 enquanto o País caiu, ambos em termos reais, é um claro e animador sinal de que os anunciantes têm procurado pelo menos preservar seus investimentos em comunicação e posicionamento de marcas’, analisa Paulo Novis, diretor geral da Infoglobo (que reúne os jornais das Organizações Globo).

Recuperação

Os números mostram que o que salvou o ano passado foi o último trimestre, único no qual os investimentos em mídia superaram, mês a mês, a marca de R$ 1 bilhão. De fato, o quarto trimestre registrou desempenho 23,5% superior ao terceiro e, na comparação dos dois semestres, as verbas investidas no segundo foram 31,4% maiores que no primeiro. Esse movimento demonstra que, em 2003, o mercado voltou ao padrão tradicional, com o segundo semestre mais forte que o primeiro – situação que havia sido invertida no ano anterior, quando os anunciantes puseram o pé no freio por conta, principalmente, da incerteza em relação ao resultado da eleição presidencial.

Com a vitória do PT, 2003 começou sob o signo da desconfiança, com o mercado praticamente parado esperando para ver qual seria a linha a ser adotada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva. A manutenção de uma política econômica ortodoxa, como a do governo anterior, deu certa tranqüilidade aos anunciantes, que aos poucos voltaram a investir. A situação, de certa forma, beneficiou a TV aberta, que viu sua participação no total das verbas de mídia se ampliar ainda mais – de 58,7% em 2002 para 60,4% em 2003. Já os jornais viram sua fatia do bolo encolher de 19,9% para 18,6%, o mesmo acontecendo, embora de maneira mais tímida, com os meios revista, outdoor e TV por assinatura.

A leitura do mercado é que, em momentos difíceis, os anunciantes colocam suas fichas em um meio considerado mais ‘seguro’ em termos de retorno do investimento. Além disso, a necessidade de gerar resultados no curto prazo fez com que as ações estratégicas, de construção de marcas, ficassem em segundo plano, privilegiando-se as ações táticas e a comunicação de varejo. A expectativa do mercado para 2004 é em princípio positiva, mas ainda cautelosa, mesmo com os bons resultados reportados pelos veículos no primeiro trimestre.

Maior fatia

Para o superintendente comercial e diretor geral interino da Rede Globo, Octávio Florisbal, a força de comunicação da TV aberta, sua cobertura, sua audiência e o acesso a todo o tamanho de verba (nacional, regional e local) fazem dela o meio preferido pelo setor publicitário. ‘O mercado cresceu 12%, a TV aberta 15% e a Rede Globo (TV Globo mais afiliadas) 18%. Tivemos um bom desempenho graças à nossa grade, sua qualidade, suas audiências e um desempenho exemplar da nossa área comercial’, afirma o executivo.

Segundo ele, a Globo teve um bom primeiro trimestre. ‘Entretanto, tudo ainda está muito incerto, dependendo dos rumores da política e da economia’, complementa. Em 2004 a participação da TV aberta pode até crescer, na opinião do diretor comercial do SBT, Cláudio Santos, que destaca os investimentos em programação que todas as redes estão fazendo. ‘Será um ano difícil para as outras mídias, pois a TV aberta deve buscar participação ainda maior’, afirma.

Já os jornais vivem situação inversa, até porque muitos deles tiveram que fazer ajustes em 2003 em função de fatores como queda de receitas publicitárias, aprofundamento da perda de poder aquisitivo da população, desvalorização cambial, fim das linhas de crédito e juros altos. ‘As empresas foram obrigadas a redobrar o foco em produtividade e rentabilidade, em especial na qualidade das vendas, e não só na quantidade. Porém, esses movimentos agregaram ainda mais credibilidade ao setor, o que dará bons frutos a médio prazo’, diz Paulo Novis.

Ele reconhece que houve algum deslocamento dos clientes tradicionais dos jornais para as mídias eletrônicas, especialmente a TV, o que considera normal em anos de crise. E lembra que o setor de jornais é muito pulverizado geograficamente, e muitos deles não participam do Inter-Meios, o que faz com que a parcela do meio seja subdimensionada. ‘A Associação Nacional de Jornais (ANJ) tem se empenhado em fazer com que cada vez mais jornais declarem seus números ao Projeto Inter-Meios. Penso que o meio jornal, a partir de 2004, retomará o crescimento e consolidará seu histórico patamar acima dos 20%’, afirma Novis.

Grandes esperanças

Apesar de ter crescido um pouco menos que a média do mercado, o meio revista manteve sua participação no total dos investimentos e fechou 2003 com faturamento de R$ 1 bilhão, 10,8% a mais que no ano anterior. Para o diretor corporativo de marketing publicitário do Grupo Abril, Alexandre Caldini, se o mercado publicitário cresceu é porque a mídia fez um esforço de reposicionamento para atrair os anunciantes, procurando entender melhor suas necessidades e buscando oferecer soluções diferenciadas. Segundo ele, a Abril cresceu 13% em 2003 e a expectativa é de que volte a crescer acima do mercado em 2004. ‘Os anunciantes estão voltando aos poucos a trabalhar a imagem de marca, e a revista é um grande meio para isso’, raciocina.

O presidente da Associação Nacional dos Editores de Revistas (Aner), Carlos Alzugaray, acha que a manutenção da participação do meio era esperada. ‘Em um período de retração publicitária, a tendência é de um aumento da participação da TV, pois o mercado se torna imediatista, mais varejista. Conforme vai se aquecendo, adota práticas mais construtoras, volta a se preocupar com a imagem do produto – característica que privilegia o planejamento de revistas e melhora sua participação. Eu estou animado. Acho que podemos crescer mais que 5% em termos reais neste ano – se o ambiente político não interferir negativamente no econômico, é claro’, pondera.

O rádio também manteve participação estável e crescimento acima da média (14,4%), chegando aos R$ 501 milhões de faturamento. ‘Não tenho dúvida de que essa será a tendência para 2004 e para os próximos anos. O rádio continuará crescendo na direção de uma participação mais justa nos investimentos publicitários. Os consumidores ouvem rádio todos os dias e agências e anunciantes vêm prestigiando a grande eficiência do meio. Esse crescimento é irreversível, pois é uma questão de puro bom senso’, aposta Rubens Campos, do Sistema Globo de Rádio.

A TV por assinatura, por seu lado, teve um desempenho bastante tímido,ampliando seu faturamento com publicidade em meros 2,8%. Na análise do diretor comercial da Globosat, Fred Muller, o meio obteve seu maior crescimento de 2001 para 2002, saindo de 1,5% para 1,9% de participação, ou seja, 25% aproximadamente. ‘Repetir a mesma performance por dois anos seguidos é difícil, mas mesmo assim houve um pequeno crescimento nominal. Quanto a 2004, temos uma projeção de crescimento de 10%, considerando o quadro econômico que se apresenta até o momento’, arrisca Muller.’



Tela Viva News

‘Verbas para a TV aberta cresceram 15,4% em 2003’, copyright TELA VIVA News, 6/04/04

‘Dados referentes ao mercado publicitário divulgados nesta terça, 6, pelo Projeto Inter-Meios, indicam um crescimento de 15,4% no desempenho de vendas publicitárias na televisão aberta brasileira em 2003 em relação a 2002. O índice é muito superior ao crescimento real do mercado publicitário, que foi de 2,9% no ano, mesmo tendo 2003 sido um ano de queda da atividade econômica. De acordo com o Inter-Meios, o setor de TV aberta faturou um total de R$ 6,5 bilhões, ou 59% de participação no bolo de publicidade do mercado brasileiro, que atingiu um faturamento total de R$ 14,8 bilhões.

Demais mídias

Segundo o Projeto Inter-Meios, todos os segmentos medidos apresentaram evolução, sendo que a chamada mídia exterior foi a que teve o melhor desempenho em 2003, com 17,3% de crescimento (chegando a 2,6% do bolo); em seguida veio a TV aberta, com 15,4% (chegando a 59% do bolo); rádio com 14,4% (totalizando 4,5% do bolo publicitário); revista com 10,8% (atingindo 9,4% do bolo); jornal com 4,6% (18,1% do bolo publicitário) e outdoor com 0,2% (2,3% do bolo). O segmento de Internet é apresentado pela primeira vez, e totalizou R$ 164 milhões em 2003, ou 1,5% do bolo, quase tanto quanto a TV por assinatura . A TV paga, aliás, cresceu 2,8%, chegando a R$ 188 milhões, ou 1,7% do bolo.

Os dados de faturamento são coletados mês a mês junto aos veículos de comunicação, com auditoria da Pricewaterhouse Coopers. Estima-se que os veículos participantes do estudo correspondam a 90% do total dos investimentos de mídia do País. O Projeto Inter-Meios é coordenado pelo jornal Meio & Mensagem.’



GAROTINHO EM AÇÃO
Luiz Garcia

‘Todo lambuzado’, copyright O Globo, 9/04/04

‘Atores que se precipitam para a beira do palco, ávidos pelos aplausos da platéia, correm o risco de tropeçar e mergulhar no poço da orquestra. Alguns dos ansiosos demais somem para sempre, afogados nas gargalhadas dos espectadores.

Correu esse risco na semana passada o secretário de Segurança Anthony Garotinho, que se apressou em entrevistar, diante de jornalistas e câmaras de TV, um suposto assassino confesso – depois transformado em cúmplice confesso. Quando fechávamos os trabalhos desta edição, seu status era de tonto confesso. E Garotinho anunciava ter assumido o monopólio da divulgação de informações sobre o caso. Como se isso fosse atribuição normal de um secretário de Estado.

Para quem está fazendo cursinho de vestibular para presidente da República, pegar carona na elucidação de um crime famoso é um despropósito. E um risco: se as coisas continuarem do jeito que começaram, o leitor pode concluir que não vale a pena dar seu voto ao Inspetor Clouseau – aquele trapalhão que Peter Sellers criou no cinema.

O pior é o fato de que a presença do secretário fez supor que o mistério do crime fora desvendado. Nada disso. Estava longe de estar esclarecido quando foi produzido este texto, no começo desta semana.

Mas dificilmente qualquer fato novo desmentirá a impressão, criada pelas sucessivas versões apresentadas pelo caseiro Jossiel, de que ele pode até matar um batalhão – mas assassino frio, calculista e competente certamente ele não é.

Lição elementar para jovens secretários de Segurança: segundo Confúcio, quando da mesma boca saem diferentes histórias, o provável é que nenhuma seja verdadeira. Quando a troca de versões é espontânea e quase diária, troque-se ‘provável’ por 99% garantido.

Especialistas em criminologia ensinam que confissões espontâneas são perigosas. Confissões voláteis, que mudam de dia para dia, nem se fale.

A morte do casal de americanos concentrou a atenção da opinião pública durante bom tempo. Para a Secretaria de Segurança, era certamente confortável ver TV e imprensa ocupadas com testes de luminol e de DNA, e imaginando homicídios ligados a altos negócios internacionais (igualzinho a um filme) em vez de dedicar tempo e espaço a coisas desagradáveis como balas perdidas, assaltos a prédios na Zona Sul ou descoberta de celulares em penitenciárias humoristicamente rotuladas como ‘de alta segurança’.

Lamentavelmente, depois de algumas semanas de muita manchete e pouca notícia, o assassinato do casal passou para segundo plano.

Mas, de repente, caiu no colo de Garotinho um assassino confesso. O secretário correu para ele como criança para bolo de chocolate.

Pelo visto e ouvido nos últimos dias, saiu todo lambuzado.’



ROCINHA EM GUERRA
Carla Rocha e Cristiane de Cássia

‘Traficantes ameaçam atirar contra jornalistas que cobrem o confronto’, copyright O Globo, 13/04/04

‘Policiais que estavam ontem de manhã num dos principais acessos à Favela da Rocinha interceptaram, através de um radiotransmissor, um diálogo entre traficantes de drogas. Na conversa, eles ameaçavam atirar em direção aos jornalistas que trabalham no local, cobrindo a guerra na comunidade. Os bandidos acusavam os repórteres de estarem passando informações à polícia. Segue o diálogo interceptado:

– Vamos meter bala nos repórteres.

– E qual é, família?

– Eles estão cagüetando nós (sic), ‘cumpadi’. Sabe como é, meu irmão. Depois eu estou trepadão (bem armado), vou ficar sentadão. Negócio é meter bala neles mesmo.

A ameaça aos jornalistas deixou preocupadas as entidades profissionais. Em 2002, o jornalista Tim Lopes, da TV Globo, que fazia uma reportagem sobre bailes funk, foi executado por traficantes da favela Vila Cruzeiro, na Penha.

ABI pede reação mais enérgica do estado

Ontem, o presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Fernando Segismundo, defendeu uma reação mais enérgica do estado como forma de conter essa escalada de violência. Segundo ele, a imprensa é um alvo previsível porque denuncia e, de certa forma, ajuda a sociedade e o estado a combater o tráfico de drogas.

– Depois que o Tim Lopes foi assassinado, sinto que tudo é possível. Quebrou-se um tabu. A imprensa, por seu caráter investigativo, atrapalha os negócios do tráfico e alerta a sociedade para o problema. Temos que nos defender também porque os bandidos estão sendo desmascarados e vão reagir. Não me admira que nós também estejamos expostos aos caprichos e à vontade dos bandidos – disse Fernando Segismundo.

Alberto Jacob Filho, diretor do Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, alertou para a necessidade de os profissionais terem cautela num quadro crítico como o que estamos vivendo. Ele lembrou que os repórteres fotográficos correm risco ainda maior porque precisam acompanhar as operações policiais para fazer imagens.

Repórteres fotográficos são confundidos com bandidos

Alberto Jacob Filho disse que há casos em que os bandidos atiram por confundir os equipamentos fotográficos com armas.

– Muitas vezes, a máquina do fotógrafo é confundida com uma bazuca. Essa é a situação absurda que estamos vivendo. Nós jornalistas somos alvos fáceis. A cidade do Rio de Janeiro virou uma praça de guerra e, como nas guerras, precisamos ter cautela – afirmou o diretor do Sindicato dos Jornalistas.’