Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Os números da violência em SP

Os jornais paulistas informam, em suas edições de terça-feira (26/3), os novos indicadores da violência no estado: o maior destaque vai para o sétimo mês consecutivo de aumento nas taxas de homicídio, e os infográficos mostram um quadro desolador em quase todos os tipos de crimes violentos.

Especialistas citados pelos diários se referem a consequências de longo prazo que ainda refletem erros estratégicos cometidos pelo governo paulista anos atrás, dando a entender que daqui para a frente teremos uma melhora na situação. Mas, como a narrativa jornalística não alcança a vida privada, a leitura dos jornais se limita a um conjunto de dados que escondem o estado de insegurança em que vive a população.

Para entender o que acontece em São Paulo, que regularmente produz notícias desanimadoras sobre os índices de criminalidade e violência, apesar de sua situação privilegiada entre os estados da Federação, é preciso cruzar os dados oficiais com outras reportagens sobre esse tipo de problema.

Por exemplo, na mesma terça-feira, os leitores de jornais ficam sabendo que a Polícia Federal acaba de desbaratar uma quadrilha formada no interior do Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos, prendendo nada menos do que sete investigadores da polícia civil paulista e apreendendo 3 toneladas de cocaína. O grupo vinha atuando como uma quadrilha de traficantes desde 2004, com evidências tão claras de sua ação que fica difícil entender como puderam agir por tanto tempo sem serem molestados.

O caso é exemplar para mostrar como certos indicadores de violência que surpreendem os jornais estão relacionados com a corrupção endêmica na polícia paulista, que não deveria surpreender ninguém, muito menos os jornalistas. Uma polícia contaminada pela corrupção é sempre inoperante, e nenhuma estratégia de segurança pública pode funcionar baseada apenas em algumas ilhas de eficiência.

Com todo o aparato de inteligência à disposição das autoridades, difícil acreditar que uma quadrilha de policiais tenha podido agir com tanta facilidade e por tanto tempo sem ter sido molestada.

As estatísticas enganam

A imprensa observa que, daqui para a frente, o governo passará a divulgar diariamente os dados sobre a violência, com mapas que permitirão observar os casos, rua por rua, para que o cidadão possa ter uma ideia das regiões mais perigosas. Mas alguns dados do relatório mais recente mostram que o problema se espalha por todo o estado: embora as ocorrências continuem se concentrando naqueles bairros historicamente mais problemáticos da capital paulista, aumentam as notícias de crimes em muitos municípios do interior.

É o caso, por exemplo, da cidade de Ribeirão Preto, que teve ataques a ônibus na noite de domingo (24/3), aparentemente organizados como vingança pela morte de um traficante. No entanto, a região de Ribeirão Preto, a 300 quilômetros da capital, foi a única do estado que apresentou queda nos índices de homicídio. Já os 139 municípios da região noroeste do estado, em torno da cidade de São José do Rio Preto, apresentaram uma alta de 42,9% na taxa de homicídios, o que mostra como o fenômeno da violência se espalha para fora da região metropolitana de São Paulo.

Embora recheadas de opiniões de especialistas, as reportagens dos jornais não oferecem um quadro lógico para o leitor entender as razões do aumento da violência. O público típico da mídia tradicional, que se concentra nas regiões com melhores condições de vida, se assusta com a ocorrência de dois casos de arrastão na área dos Jardins, zona centro-sul da capital paulista, também relatados pelos jornais. E a sensação de insegurança invade os redutos de alta renda.

Mas os dados estatísticos podem enganar. Em geral, o noticiário induz o leitor a imaginar que a violência urbana está sempre relacionada à ação de criminosos. E como há décadas o crime vem se sofisticando, a conclusão é que a violência está sempre ligada à atuação de quadrilhas em busca de dinheiro. No entanto, alguns dados, como o aumento constante dos casos de estupro, que não têm relação direta com os crimes contra o patrimônio, indicam que há algo de errado com a sociedade.

Além da dificuldade das autoridades em conter o crime organizado e reduzir a corrupção policial, é preciso lidar com a cultura da violência entre civis. Esse é um desafio que vai além das estratégias de segurança pública.