Thursday, 09 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Em despedida, Bill Gates prevê nova década digital

Leia abaixo a seleção de terça-feira para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Terça-feira, 8 de janeiro de 2008


TECNOLOGIA
Folha Online


Gates anuncia segunda década digital


‘O presidente e fundador da Microsoft, Bill Gates, 52, abriu anteontem a CES (Consumer Electronics Show) em Las Vegas (EUA) confirmando que essa foi sua última aparição no evento -um dos mais importantes do setor de tecnologia- e proclamando o início de uma segunda década digital, ‘mais focada em conectar pessoas’.


Gates já tinha anunciado que em julho deixará de forma efetiva o trabalho de gestão da Microsoft para concentrar-se em suas tarefas filantrópicas na Fundação Bill e Melinda Gates. O casal Gates já doou mais de US$ 25 bilhões para a entidade, e o megainvestidor Warren Buffett prometeu, em 2006, doação de US$ 31 bilhões .


Durante seu discurso, o americano, que, segundo a revista ‘Forbes’, é o homem mais rico do mundo, com US$ 59 bilhões, qualificou os últimos dez anos como a ‘primeira década digital’ e disse que o período viveu um grande sucesso tanto no desenvolvimento de aparelhos como em suas aplicações.


Gates disse que haverá três elementos-chave na nova década digital. O primeiro foi definido por ele como ‘experiências em alta definição’, tanto de vídeo como de áudio. O segundo elemento é que todos os aparelhos eletrônicos ‘estarão conectados por serviços’, o que permitirá compartilhar a informação entre uma multidão de usuários sem a necessidade de estabelecer pontes entre os aparelhos eletrônicos.


E o terceiro elemento, que Gates qualificou como ‘o mais subestimado’, são as novas formas de interação com computadores, telefones e outros aparelhos eletrônicos.


‘Desde que eu comecei a falar sobre a década digital, em 2001, é impressionante a velocidade com que a tecnologia digital se tornou parte central da maneira como trabalhamos, aprendemos e jogamos’, afirmou. ‘Mas, em muitas casos, estamos ainda bem no começo das transformações que os softwares nos permitirão. Durante a próxima década digital, as tecnologias tornarão nossas vidas mais ricas, mais produtivas e mais completas de maneira profunda e excitante.’


Entre as previsões de Gates para o futuro, os monitores de todos computadores, vídeo games, TVs e telefones celulares serão de alta definição. As casas terão tantas telas que as paredes também serão uma -cada uma delas podendo mostrar programas diferentes. Os smartphones ficarão mais inteligentes, usando o reconhecimento de voz para, por exemplo, escrever textos e mostrar vídeos.


Ele anunciou também acordos da Microsoft com a Disney, a NBC Universal e a MGM para aumentar suas vendas de vídeos on-line e intensificar a concorrência com a loja virtual iTunes, da Apple.’


 


LULA E CHÁVEZ
Augusto de Franco


Lula, o ‘venezuelano’


‘SE NOSSO IDH fosse mais próximo de 0,9 (em vez de 0,8), Lula jamais governaria o Brasil. Quem garante seus votos e liderança é a pobreza. É por isso que Lula não ganha eleição para prefeito de São Bernardo. É por isso que não ganha para governador de São Paulo nem de qualquer Estado do Sul (talvez com exceção do Paraná, que só é governado pelo chavista Requião por concentrar a maior pobreza da região).


São os bolsões de pobreza que garantem a eleição de populistas. Lula quer acabar com a pobreza? Não, o que quer é mantê-la, transformando as populações pobres em beneficiárias passivas e permanentes dos programas assistenciais. Ele gosta, sim, do povo, mas como massa informe de pré-cidadãos Estado-dependentes.


Façam uma análise dos levantamentos existentes, resultantes da aplicação de vários indicadores de desenvolvimento. A votação de Lula aumenta nos lugares em que esses indicadores (inclusive o IDH) diminuem. Isso não pode ser por acaso, pode? Só acontece porque Lula é um ‘venezuelano’. Em Caracas, nosso presidente viveria feliz como pinto no lixo.


O PIB da Venezuela vem crescendo a taxas próximas de 10% nos últimos anos. Apesar disso, a Venezuela tem muitos pobres. Seu IDH é 0,784 (72º lugar no ranking mundial). Com o dinheiro do petróleo, Lula poderia fazer um super ‘bolsa-esmola’ para economista-áulico nenhum botar defeito.


A noção de democracia de Lula casa perfeitamente com o regime político venezuelano. Lá, não vigora mais essa besteira de rotatividade (ou alternância) democrática. Autorizado, como Chávez, por uma ‘lei habilitante’ (muito melhor do que medida provisória), Lula poderia criar, numa penada, não uma, mas meia dúzia de TVs governamentais. Poderia tirar a Globo do ar e empastelar a revista ‘Veja’.


E, sobretudo, poderia continuar no poder indefinidamente, convocando plebiscitos e referendos para dizer que não está fazendo nada mais do que obedecer à vontade da maioria.


Lula, o ‘venezuelano’, acha que democracia é o regime da maioria (e não o das múltiplas minorias). Não sou eu que estou dizendo.


No dia 20/4/2005, Lula discursou em um congresso de trabalhadores: ‘É importante saber o que nós éramos há três anos e o que nós somos agora… O que aconteceu no Brasil… o que aconteceu no Equador, o que aconteceu na Venezuela, que foi já um pouco mais para frente (sic), e o que pode acontecer na evolução política de outros países do continente…’.


No dia 29/9/2005, em outro discurso, este no Palácio do Planalto, disparou: ‘Eu não sei se a América Latina teve um presidente com as experiências democráticas colocadas em prática na Venezuela. Um presidente que ganha as eleições, faz uma Constituição e propõe um referendo para ele mesmo; faz um referendo e ganha as eleições outra vez. Ninguém pode acusar aquele país de não ter democracia. Poder-se-ia até dizer que tem excesso’.


No dia 7/6/2007, numa entrevista a esta Folha, na embaixada do Brasil em Berlim, Lula disse: ‘O fato de ele (Chávez) não renovar a concessão (da RCTV) é tão democrático quanto dar. Não sei por que a diferença entre dois atos democráticos’.


E no dia 14/11/2007, em outra entrevista, no Itamaraty, ele reafirmou: ‘Podem criticar o Chávez por qualquer outra coisa. Inventem uma coisa para criticar. Agora, por falta de democracia na Venezuela, não é’.


Seria preciso dizer mais? Muita atenção, porém: Lula é um ‘venezuelano’ que quer, mas não pode se comportar como Chávez. Se tentasse ‘chavecar’ por aqui, o problema estaria resolvido. Nossa sociedade, bem mais complexa, rejeitaria de pronto o tiranete. Lula é o Chávez possível nas condições do Brasil.


Dizendo de outro modo, o Brasil não é uma ditadura -nem mesmo uma protoditadura (como a Venezuela)-, mas uma democracia formal parasitada por um regime neopopulista manipulador, em que um grupo privado que ascendeu ao poder pelo voto, com base na alta popularidade de seu líder, tenta permanecer no poder sem violar abertamente a legalidade democrática, mas pervertendo a política e degenerando as instituições para manipular a opinião pública e as leis a seu favor.


Não ter entendido a natureza desse governo e o caráter do seu líder foi a desgraça das nossas oposições. Até Fernando Henrique, o mais lúcido dos oposicionistas partidários, alimentou a estranha crença de que ‘o conteúdo simbólico da sua liderança (de Lula) é um patrimônio do país que não deve ser destruído’. Pois é. Não destruíram mesmo.


Preservaram, blindando Lula, infelizmente, contra a democracia.


AUGUSTO DE FRANCO , 57, analista político, é autor, entre outras obras, de ‘Alfabetização Democrática’. Foi membro do comitê executivo do Conselho da Comunidade Solidária durante o governo FHC (1995-2002).’


 


PROPAGANDA
Fernando Barros de Mello e Catia Seabra


Governo paulista vai gastar 45% a mais com publicidade


‘O governo José Serra (PSDB) abriu no dia 18 de dezembro nova licitação para publicidade no valor de R$ 88 milhões anuais. Essa previsão é 45% maior do que os dois contratos que, hoje em vigor, somam R$ 60 milhões em doze meses.


Além do aumento do orçamento para o publicidade, o novo modelo prevê a contratação de três agências em vez de duas. Em junho de 2007, o governo renovou por 12 meses os dois contratos com as agências DPZ, Duailibi, Petit, Zaragoza Propaganda (R$ 28,750 milhões) e Lua Branca Propaganda (R$ 31,250 milhões).


Agora, segundo o edital, serão abertas três contas: de R$ 34,6 milhões, R$ 30 milhões e R$ 23,4 milhões anuais. Na disputa, vence aquela agência que apresentar a melhor proposta de campanha para três diferentes temas: nota fiscal eletrônica, etanol e segurança pública.


O aumento das despesas com publicidade, segundo explicou a assessoria de comunicação do governo, acompanha a evolução dos investimentos.


‘O aumento se justifica pelo incremento dos investimentos do governo do Estado de São Paulo. Em 2007 o orçamento para investimentos foi de R$ 7,9 bilhões. Já para 2008, os investimentos previstos são de R$ 12,1 bilhões, um crescimento de 53%. A variação do valor previsto para o próximo contrato de publicidade é inferior, portanto, ao crescimento dos investimentos do estado’, explicou, por e-mail, a assessoria.


O Orçamento do Estado passou de R$ 84,98 bilhões em 2007 para R$ 96,87 bilhões este ano, um aumento de 14%. Os orçamentos de algumas secretarias diminuíram sua participação no total, em 2008. Os orçamentos das secretarias da Educação e Saúde, por exemplo, representavam 14,12% e 10,10% do total em 2007. Este ano apresentaram queda e equivalem a 13,88% e 9,64%.


‘É preciso ressaltar que o valor do novo contrato de publicidade representa 0,09% do total do orçamento do Estado para 2008’, disse a assessoria.


O resultado deverá ser divulgado ainda no primeiro semestre deste ano. Segundo a Secretaria de Comunicação, há necessidade de nova licitação porque foi esgotado o limite de 25% fixado por lei para ampliação dos contratos em vigor.


No dia 19 de dezembro, foi publicado no ‘Diário Oficial’ o décimo segundo termo de aditamento do contrato do governo com a Lua Branca. O mesmo DO trazia o oitavo termo de aditamento com a DPZ. Os contratos foram originalmente assinados em 2005.’


 


MÍDIA
Folha de S. Paulo


CNBC faz acordo com New York Times


‘A CNBC, um dos principais canais de TV de notícias econômicas dos EUA, e o ‘New York Times’ anunciaram a realização de uma parceria para troca de conteúdo. Pelo acordo, a CNBC, que pertence à General Eletrics, irá fornecer vídeos para o site do jornal americano, e o ‘New York Times’ tornará disponível seu material de tecnologia e negócios. Ao comprar o ‘Wall Street Journal’, Rupert Murdoch disse que combinaria o material do jornal com o do seu canal de notícias, o Fox Business.’


 


INTERNET
Luisa Alcantara e Silva


Jeremias vai à Justiça após aparecer bêbado no YouTube


‘O pernambucano Jeremias José do Nascimento, famoso depois que uma reportagem ‘protagonizada’ por ele -em que dava entrevista embriagado- foi parar no YouTube, está processando oito empresas de comunicação, o buscador Google (dono do YouTube), duas pessoas físicas e uma loja de camisetas. O vídeo virou um dos hits do site.


Ele alega ter sofrido danos morais. Em um programa transmitido pela TV Jornal Caruaru (afiliada do SBT), o repórter fala com Jeremias, levado à delegacia por dirigir uma moto alcoolizado.


A conclusão inicial do Tribunal de Justiça de Pernambuco, de agosto, foi que a ‘exploração da imagem do autor passou a ter caráter mercantilista’ e pede que os denunciados não utilizem mais as imagens, sob pena de multa diária de até R$ 10 mil.


Para o advogado Manoel Affonso Ferreira, especialista em direito jornalístico, não há motivo para a ação. ‘Se falou espontaneamente, não há razão para tal.’


A TV Jornal Caruaru contesta a ação, dizendo que a reportagem foi gerada por terceiros. O Google afirmou que ainda não foi notificado.’


 


TELEVISÃO
Laura Mattos


TV paga tem mais canal erótico do que educativo


‘A TV paga brasileira tem mais canais eróticos do que educativos. São seis dedicados ao sexo contra três exclusivamente voltados à educação.


O número consta do ‘Anuário Pay TV 2008’, o mais respeitado levantamento do mercado de TV por assinatura no país, editado há 11 anos.


Os seis canais eróticos atualmente disponíveis são For Man, Playboy TV, Private, Sexy Hot, Vênus e Canal Adulto. Os educativos, Canal Autodesenvolvimento (AD), Futura e SescTV. Não estão incluídos aí os que apresentam também conteúdo educativo, mas são vendidos com outras categorias, como infantil (TV Rá Tim Bum, por exemplo) ou de documentários (Animal Planet, Discovery Channel etc.).


O número de canais eróticos é maior também do que o de musicais (são cinco: a MTV, o VH1 e suas variações).


Outro dado relevante do ‘Anuário’ é que existem na TV paga brasileira 106 canais ao todo, dos quais 27 (ou 25%) são programados no Brasil.


Made in Brazil


A constatação se dá no momento em que se discute na Câmara Federal projeto de lei que impõe cotas à televisão por assinatura. O texto diz, entre outras exigências, que em um pacote 50% dos canais devem obrigatoriamente ser programados por empresas nacionais.


Isso não quer dizer que os canais terão necessariamente conteúdo brasileiro. O Universal, por exemplo, que tem como acionista a programadora Globosat (das Organizações Globo), é especializado em séries e filmes estrangeiros. Outro da Globosat, o Sexy Hot, traz também ‘conteúdo’ de outros países. A proposta também tem cotas para ampliar o conteúdo nacional, o que desagrada as empresas de TV por assinatura.


Outras categorias


O ‘Anuário Pay TV’ traz o números de canais de filmes/ séries (28), jornalísticos/informativos (9), esportivos (11), animação/infantil (9), documentários (8), variedades/entretenimento (10), cidadania (3), agribussiness (2), meteorológico (1), étnicos (6), estilo de vida (4) e televenda (1).’


 


Marco Aurélio Canônico


Filme traz visão de Jano sobre o Rio


‘‘Cidades Ilustradas’ foi a bem-sucedida série de HQs em que artistas estrangeiros (e alguns nacionais) deram suas visões sobre metrópoles brasileiras como São Paulo (por David Lloyd) e Belo Horizonte (por Miguelanxo Prado).


O Rio de Janeiro ficou a cargo do francês Jano, que visitou a cidade no fim de 2000, e um subproduto desta visita foi este ‘Rio de Jano’, dirigido por Anna Azevedo, Renata Baldi e Eduardo Souza Lima.


Antecipando o turismo ‘favela chic’, que se tornaria obrigatório para os visitantes estrangeiros, Jano sobre o morro, vai a um baile funk, visita o Maracanã em dia de jogo do Flamengo (o que rende uma de suas melhores ilustrações) e passa por diversos pontos pouco turísticos em busca do Rio de Janeiro ‘real’.


Se ele o encontra ou não, é questionável. Certo é que o resultado de seu álbum é superior ao do documentário, cujo atrativo maior é justamente o traço de Jano -célebre por dar feições animais (especialmente de ratos) a seus personagens (mesmo os humanos), o que casa bem com sua visão do Rio.


Para quem quiser aproveitar melhor a experiência, recomenda-se a leitura da HQ -ou assistir ao DVD, onde há extras com entrevistas em que Jano explica sua técnica, detalha suas influências e mostra desenhos e esboços.


RIO DE JANO


Quando: amanhã, às 19h30


Onde: Canal Brasil’


 


CINEMA
Bruna Bittencourt


Funk e dub são temas de filmes


‘‘É engraçado, o gringo vem ao Brasil fazer um filme sobre funk, e os brasileiros vão para fora fazer um filme sobre o som deles’, ironiza Bruno Natal sobre ‘Favela on Blast’, documentário sobre o funk carioca dirigido pelo americano Diplo e por Leandro HBL, e o seu ‘Dub Echoes’, sobre a vertente mais lisérgica da música jamaicana.


Com percursos inversos, os dois documentários focam em gêneros periféricos da música e fazem da internet uma aliada para divulgação e lançamento.


Diretor de ‘Desconstrução’, registro sobre as gravações do último disco de Chico Buarque, Natal aborda o dub por sua influência no nascimento da música eletrônica e do hip hop. ‘Ficava surpreso de ver como essa ligação não era muito comentada, mesmo em livros sobre reggae.’ Já ‘Favela on Blast’ joga luz sobre os principais personagens do funk carioca, dos bailes ao dia-a-dia nas comunidades.


Conhecido por sua pesquisa sobre batidas marginais, Diplo visitou o Rio em 2003, quando escrevia uma matéria sobre o funk para a revista americana ‘Fader’. Em 2004, voltou à cidade para filmar o clipe de uma de suas produções como DJ, dirigido por Leandro HBL.


Das filmagens, nasceu o esboço da pesquisa do documentário, que contou com MIA, então namorada de Diplo, em suas excursões pelas comunidades cariocas. ‘Leva-se um tempo para ser aceito, elas têm regras próprias’, diz Leandro HBL. Desde lá, a equipe visitou mais de 60 comunidades e entrevistou mais de 50 artistas da cena -nomes como Mr.Catra, Deize Tigrona, Duda do Borel, DJ Sany Pitbull-, além de Gilberto Gil, que faz sua análise sobre o gênero.


No mesmo ano em que ‘Favela’ ganhava suas primeiras imagens, surgiu a chance de Natal e Chico Linhares, que assina a pesquisa de ‘Dub Echoes’, irem à Jamaica para produzir um catálogo de moda. A dupla usou o pagamento para estender sua estadia em Kingston e entrevistar nomes cruciais da história do dub.


Na volta, conseguiu apoio de uma companhia aérea para terminar as entrevistas nos EUA e na Europa. Expoentes da música eletrônica e do hip hop como 2ManyDJs, Basement Jaxx e Roots Manuva têm depoimentos intercalados com Sly & Robbie, Mad Professor e Lee Perry -o nome mais associado ao dub foi, ironicamente, a última entrevista feita, depois de três anos de espera.


Um dia depois do trailer de ‘Echoes’ chegar ao YouTube, o documentário ganhou menções nos blogs das respeitadas revistas ‘Wired’ e ‘XLR8TR’. Dois meses depois, chegou o convite do festival dinamarquês CPH:DOX -que também o encontrou via YouTube-, no qual o filme fez sua estréia.


‘Favela’


‘Favela on Blast’ segue a mesma cartilha. Seus vários trailers, que dão dimensão da amplitude do documentário, assim como o depoimento de Gil, estão disponíveis no site, o que Leandro HBL acredita que possa ajudar na captação de recursos, até agora bancados por Diplo e ele. O diretor tenta hoje viabilizar uma parceria com uma produtora de filmes internacional para a venda de ‘Favela’ por meio do iTunes, seguindo o modelo de compra de música on-line, depois que ele for apresentado em festivais.


Antes de chegar ao Brasil, ‘Echoes’ será exibido no sueco Music Doc e no Reggae Film Festival, na Jamaica. ‘Desde o início do projeto, há uma vontade grande de mostrar aos jamaicanos a força que a música deles tem no mundo’, diz Natal, o que ‘Favela’ pode repetir por aqui para além da periferia.’


 


GREVE EM HOLLYWOOD
Folha de S. Paulo


Greve cancela 65ª festa do Globo de Ouro


‘Está cancelada a cerimônia de entrega do Globo de Ouro, segundo prêmio de cinema mais importante de Hollywood, que aconteceria na noite deste domingo no hotel Hilton de Beverly Hills.


A associação de críticos estrangeiros de Hollywood, que organiza o evento, cedeu à pressão dos grevistas do Writers Guild of America, sindicato dos roteiristas americanos, que anunciaram planos de montar piquete em frente ao hotel.


‘Estamos muito decepcionados que nossa cerimônia tradicional não acontecerá este ano. Nos consolamos com o fato de que pelo menos os vencedores serão anunciados na data prevista’, disse Jorge Camara, presidente da associação responsável pelo Globo de Ouro, em comunicado oficial.


No lugar do jantar de gala e do tapete vermelho, haverá uma coletiva de imprensa com o anúncio dos vencedores em 25 categorias em cinema e TV.


Um comunicado divulgado ontem pela NBC, rede que transmitiria o evento, adiantou planos da emissora de substituir o programa tradicional por uma cobertura jornalística: primeiro iria ao ar um especial sobre os indicados ao Globo de Ouro, depois uma retrospectiva das produções do ano, seguida do anúncio dos vencedores, numa entrevista coletiva.


A equipe de jornalismo da NBC não pertence ao sindicato de roteiristas e estaria desimpedida de trabalhar, mas os grevistas se opuseram à exibição dos especiais, ameaçando retomar protestos.


Na última sexta, o Screen Actors Guild (SAG), sindicato dos atores de Hollywood, anunciou o boicote à festa por parte dos mais de 70 atores, entre indicados e apresentadores, que não seriam vistos ultrapassando a barreira de grevistas.


Executivos da emissora tentaram resistir às mudanças até a manhã de ontem, em negociações com grevistas e membros do sindicato dos atores.


A empresa responsável pela produção do programa, a Dick Clark Productions, tentou sem sucesso um acordo com os grevistas nos mesmos moldes que aquele fechado entre David Letterman e os roteiristas de seu talk-show, mas a categoria rejeitou a proposta.


Uma reportagem publicada ontem no ‘New York Times’ especula que um acordo entre os grevistas e a Dick Clark foi vetado porque daria passe livre à NBC, um dos principais alvos dos roteiristas, para promover o filme ‘Jogos do Poder’, indicado ao Globo de Ouro de melhor filme e distribuído pela Universal, ligada à NBC.


Primeiro acordo


Em meio à disputa para manter a festa dos prêmios intacta, foi anunciado ontem o primeiro acordo dos roteiristas em greve com um estúdio cinematográfico. A categoria voltará a escrever roteiros para filmes da United Artists, produtora independente do ator Tom Cruise. A empresa é ligada ao estúdio MGM, que, seguindo a linha de outros grandes estúdios, não cedeu nas negociações.’


 


 


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O Estado de S. Paulo


Terça-feira, 8 de janeiro de 2008


DIRCEU NA PIAUÍ
Clarissa Oliveira e Eugênia Lopes


Após falar em caixa 2 no PT, Dirceu faz crítica à imprensa


‘O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu atacou ontem a imprensa pelo tratamento dado à entrevista concedida por ele à revista Piauí deste mês. Em seu blog na internet, o deputado cassado disse que a mídia empenhou-se em explorar apenas as informações que permitissem gerar ‘intensa polêmica’, apesar de a matéria ser um ‘simples, bem feito e, no geral, correto relato’ de seu trabalho atual como consultor de empresas.


Segundo reportagem da revista, Dirceu afirmou que a sede do PT em Porto Alegre foi feita com recursos de caixa 2. Além disso, traz menções ao filho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Fábio Luis Lula da Silva, e críticas a petistas gaúchos e a senadores da base.


‘A reportagem da Piauí tem nada menos que 11 páginas, mas como sempre o que interessou foi um único trecho sobre o PT gaúcho que possibilitou à mídia explorar as divergências internas no nosso partido e desencadear intensa polêmica’, registra o blog. Ele voltou a dizer que a reportagem contém algumas ‘imprecisões’, apontadas por ele em nota distribuída na semana passada. Repetiu que não fez nenhum tipo de denúncia ao falar sobre caixa 2 no Rio Grande do Sul e disse que apenas mencionou acusações da oposição durante o governo do também petista Olívio Dutra.


Dirceu também reiterou sua versão sobre a menção ao filho do presidente, ao afirmar que se referia ao jornalista Luiz Costa Pinto, apelidado de Lula. Fábio Luis ganhou espaço no noticiário quando a empresa da qual é sócio, a Gamecorp, recebeu investimentos da Telemar.


CPI


O presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), anunciou ontem que o partido começará a recolher assinaturas para criação de CPI que investigue a declaração de Dirceu sobre caixa 2 no PT gaúcho.


O deputado informou ainda que o partido deve encaminhar ao Ministério Público Federal cópia da entrevista para que o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, inclua no inquérito do mensalão que está no Supremo Tribunal Federal.’


 


TECNOLOGIA
Brian Bergstein


Gates prevê nova década digital


‘AP – A Microsoft talvez não seja a gigante imbatível que já pareceu ser, mas o fundador da empresa, Bill Gates, faz questão de mostrar que suas tecnologias estão ficando ainda mais flexíveis e poderosas à medida em que se infiltram em automóveis, salas de estar e redes de televisão baseadas na internet.


Poucos meses antes de abandonar seus deveres diários na Microsoft para se dedicar só à filantropia – ele já anunciou que se aposenta em julho -, Gates usou seu tradicional discurso de abertura da Consumer Electronics Show (CES), a maior feira de produtos eletrônicos do mundo, para ressaltar como a Microsoft está estendendo o alcance de seus softwares além de computadores de mesa e servidores, incorporando meios de controle alternativos como voz e tato, em substituição ao mouse. ‘A primeira década digital foi um grande sucesso’, disse. ‘Isso é apenas o começo. Não há nada que nos impeça de ir mais depressa e mais longe na segunda década digital.’ Que, segundo ele, começa agora.


Programas tradicionais para PCs tiveram menos espaço que nos discursos anteriores. Esse contraste foi gritante levando-se em considerando não apenas a reação morna ao sistema operacional Windows Vista, como também a forma como os aplicativos baseados na internet estão ameaçando o domínio da Microsoft nos computadores.


Em vez disso, Gates saltou de carros – a tecnologia Sync da Microsoft para tocar música e fazer chamadas telefônicas deve estar disponível em todos os modelos 2009 dos veículos Ford, Mercury e Lincoln – para a sala de estar. Gates e Robbie Bach, que gerencia a divisão de entretenimento da Microsoft, anunciaram uma expansão de filmes de Hollywood em alta definição e programas de televisão que podem ser descarregados por meio do serviço online do videogame Xbox.


Gates também explicou como a Mediaroom, a plataforma de televisão baseada na internet que a Microsoft criou para ser vendida pelas empresas de telecomunicações, funcionará com as redes TNT e Showtime para permitir que os usuários selecionem seus próprios ângulos de câmera quando estiverem assistindo competições esportivas. Por exemplo, um fã da Nascar poderá manter a visão constante do carro do seu piloto favorito ou conectar-se a uma determinada tomada na primeira fila de uma luta de boxe.


DESPEDIDA


A possibilidade de ver a última apresentação de Gates na CES fez com que milhares de pessoas começassem a fazer fila para o discurso mais de quatro horas antes do seu início. O que eles não esperavam – e que evidentemente apreciaram – foi o vídeo de despedida autodepreciativo no qual Gates brinca com a idéia de que estaria tentando desesperadamente encontrar coisas para fazer depois da aposentadoria como o principal arquiteto de softwares da Microsoft.


O vídeo mostra um atordoado Gates tentando levantar pesos, implorando por uma participação no U2 e fazendo lobby para entrar na cédula de candidato à presidência. As pontas no vídeo de gente como Jay-Z, Barack Obama, Hillary Clinton, Al Gore, Steven Spielberg e George Clooney provocaram gargalhadas – o que não é uma ocorrência comum numa conferência sobre tecnologia.’


 


TVs de alta definição ganham papel central


‘A japonesa Panasonic foi um dos destaques da abertura, ontem, da Consumer Electronics Show (CES), em Las Vegas, a maior feira de produtos eletrônicos de consumo do mundo. A empresa apresentou uma TV de plasma de 150 polegadas – 47 polegadas a mais que o maior televisor produzido anteriormente pela empresa. Além do tamanho e de algumas evoluções tecnológicas – a resolução é cerca de quatro vezes maior que a das TVs atuais de alta definição -, o aparelho da Panasonic também é capaz de receber, sem cabos, sinais de alta definição vindos de aparelhos como câmeras de vídeo, uma tecnologia que só deve chegar ao mercado em 2009.


O anúncio da Panasonic acabou eclipsando o de outra gigante das TVs de tela plana, a também japonesa Sharp, que apresentou o maior televisor de tela de cristal líquido (LCD) do mundo – um aparelho de 108 polegadas. Essa TV deve chegar ao mercado, segundo a Sharp, até o final deste ano.


Esses lançamentos exemplificam um dos principais temas que dominam a feira de Las Vegas este ano: experiências de alta definição sem fios. As empresas estão dispostas a explorar ao máximo o crescente apetite dos consumidores por televisores de tela plana de grandes dimensões e todos os equipamentos periféricos desenhados para alimentar esses aparelhos.


Gary Shapiro, diretor da Associação de Eletrônica de Consumo dos EUA, calcula que, este ano, as vendas de eletrônicos no país devem crescer 6%, atingindo a cifra recorde de US$ 171 bilhões. E, segundo ele, são produtos como TVs planas de alta definição que estão alimentando esse espetacular crescimento, apesar da turbulência econômica vivida pelo país.


E a Panasonic, como todos os demais fabricantes, se prepara para ganhar com o desejo dos consumidores americanos. O presidente da empresa, Toshihiro Sakamoto, afirmou que essas TVs estão se convertendo no ‘coração digital’ do século XXI – em torno do qual se concentram cada vez mais famílias e ao qual destinam um tempo cada vez maior.


Segundo Shapiro, a segunda grande tendência na feira são os produtos destinados ao uso em automóveis. Os grandes destaques, nesse caso, são os navegadores GPS. As vendas de sistemas de navegação para carros cresceram 41% nos EUA em 2007, e já representam hoje 25% de todas as vendas de produtos eletrônicos de consumo para automóveis.’


 


TELEVISÃO
Keila Jimenez


Estréia sem alarde


‘A troca da apresentadora Glória Maria por Patrícia Poeta não surtiu nenhum efeito na audiência do Fantástico, pelo menos por enquanto. A atração dominical da Globo, que contou com a estréia de Poeta anteontem, registrou média de 25 pontos de ibope no horário, mesma média alcançada nas edições passadas.


A Globo sonha com a retomada de audiência do programa, que chegou em seus tempos áureos a registrar 35 pontos de média.


Patrícia estreou timidamente, e foi ganhando espaço ao longo da atração. A maior parte do programa foi ancorada por seu colega de Fantástico, Zeca Camargo.


Patrícia Poeta disse no ar que era sua estréia no comando do programa, sem dar maiores explicações.


Mas o que chamou mesmo a atenção não foi a nova âncora do programa, e sim a ‘coincidência’ de pautas entre o Fantástico e seu clone da Record, o Domingo Espetacular. O assunto da vez: touradas.


O Fantástico exibiu matéria sobre a formação de toureiros mirins, enquanto a Record apostou no treinamento de touros na Espanha, desde pequenos. O tom de surpresa das reportagens também era parecido.’


 


CINEMA
Luiz Carlos Merten


Os 80 anos do gênio chamado Kubrick


‘Stanley Kubrick morreu em 1999, aos 71 anos. Isso significa que, em 2008, ele estaria completando 80 anos. A data não vai passar em branco na cidade. Embora o dia exato seja 26 de julho, o Centro Cultural São Paulo antecipa-se às comemorações que, com certeza, vão se realizar em todo o mundo e inicia o ano mostrando justamente um ciclo dedicado aos 80 anos do grande Kubrick. Conta a lenda que o sonho do cineasta era realizar a obra definitiva de todos os gêneros do cinema. Kubrick não conseguiu realizá-lo pelo simples fato de que nunca fez um western – Marlon Brando despediu-o do set de A Face Oculta -, nem um musical nem um melodrama. Com exceção do último, alheio ao estilo cerebral do artista, é muito provável que até nos gêneros que não freqüentou ele pudesse ser bem-sucedido. Para não perder tempo com suposições, vamos logo ao que interessa – Kubrick fez obras-limite em gêneros tão distintos quanto o filme de guerra (Glória Feita de Sangue), o de terror (O Iluminado), a ficção científica (2001, Uma Odisséia no Espaço) e a sátira política (Dr. Fantástico).


Mesmo que ele não tivesse muito apreço por Spartacus, pelos problemas que teve com o ator e produtor Kirk Douglas, o filme virou uma referência no gênero épico e histórico. As cenas de batalhas – e de arena – permanecem imbatíveis, bastando comparar com o recente Gladiador, de Ridley Scott, que venceu o Oscar (e também trata, lá pelas tantas, do processo de preparação física de um lutador da arena). E o que dizer da suntuosidade audiovisual de Barry Lyndon? Ou das imagens perturbadoras do noir A Morte Passou por Perto, especialmente as cenas dos manequins, que um cinéfilo carrega pela vida toda?


Kubrick foi, como gostam de lembrar alguns críticos, o homem de cinema no seu estado mais puro. Se você fizer uma lista, não importa quão sucinta ela seja, dos diretores que fizeram avançar a linguagem ou que a trabalharam com rara força e intensidade, Kubrick terá de ser citado junto a Orson Welles, a Jean-Luc Godard e a Leni Riefenstahl, para só citar um grupo bem pequeno. Filho de um médico, ele foi atraído pela imagem primeiro como fotógrafo – o próprio pai se encarregou de estimular seu interesse – e aos 17 anos já trabalhava na revista Look. Aos 25, assinou seu primeiro longa, Fear and Desire, que possui cenas brilhantes – e é, em geral, uma alegoria contra a guerra travestida de drama existencial, sobre quatro pracinhas perdidos por trás das linhas inimigas, sem que o inimigo e o país sejam identificados -, mas se ressente da inexperiência.Todo Kubrick já está aí presente. A inovação, a inquietação, o pessimismo, mas o filme parece mais um rascunho feito por um cineasta talentoso do que a grande obra a que Kubrick talvez já aspirasse.


Naquela época, 1953, ele já resolvera a grande equação conceitual em sua cabeça. Segundo Kubrick, os diálogos, nos filmes, vêm da literatura, a interpretação, do teatro, e a imagem, da fotografia. O que transforma tudo isso em cinema é a montagem. É curioso como Kubrick, norte-americano de nascimento e vivendo numa sociedade capitalista, tenha chegado à mesma conclusão de dois russos geniais, que, nos primórdios da revolução comunista, também fizeram da montagem a pedra de toque do seu cinema. Para Sergei M. Eisenstein, filmar era organizar as imagens no inconsciente do público, o que só a montagem pode fazer. Vsevolod I. Pudovkin também acreditava no valor revolucionário da montagem, mas ele a trabalhava buscando a emoção. Em Kubrick, ela é cerebral, estabelecendo uma maneira de trabalhar a linguagem e os signos, o próprio tempo. Ele difere, de filme para filme, ora acelerado, ora lento, ajustado às necessidades dramáticas de cada história.


Essas histórias tratam de assassinatos, assaltos perfeitos, da luta de escravos pela liberdade, de um computador que enlouquece e assume o controle de uma nave, de um escritor que ‘‘enguiça’’ como o computador e também se torna uma ameaça para a família, num hotel deserto, ou de soldados preparados para se transformar em máquinas de matar. Não importa a história nem a época, seja passado ou futuro. O tema de Kubrick é sempre a palavra. É a palavra que trai Hal, o supercomputador, assim como é o fracasso diante dela que desencadeia a fúria homicida do escritor Jack Nicholson, faz renascer a palavra enlouquecida do Dr. Fantástico (quando o sistema que une o Pentágono a seus bombardeiros entra em pane). A palavra enlouquecida prepara os homens para a morte no cinema de Kubrick – não é outro o sentido da retórica brutal de palavrões do sargento de Nascido para Matar.


Em todos os seus filmes, Kubrick, na verdade, está propondo, como disse aqui mesmo, no Caderno 2, o crítico José Onofre, uma glacial exposição do fim do mundo pela dissolução do único elo que organiza e une os homens – a palavra. Este é o tema dominante de sua grande obra, mas nos quase 50 anos decorridos entre o primeiro curta, Day of Fight, de 1951, e o último longa, De Olhos Bem Fechados, no próprio ano de sua morte – Kubrick morreu antes da estréia -, o cineasta se dedicou obsessivamente à sua arte, aprimorando continuamente a técnica para mostrar sua visão negativa, mas que para ele era realista, do homem.


Federico Fellini dizia que ele era um visionário e Luís Buñuel declarou que Laranja Mecânica, de 1971, era seu filme favorito por ser o único ‘‘sobre o que o mundo moderno significa.’’ Kubrick fez 15 filmes, sendo 13 deles longas. Os dois primeiros, Fear and Desire e A Morte Passou por Perto, não contam, porque ele ainda estava se exercitando. Spartacus também não contava para ele, embora conte para seus admiradores, porque ele não pôde reescrever o roteiro que Dalton Trumbo havia desenvolvido para o diretor original, que Kubrick substituiu, Anthony Mann. O ciclo do CCSP apresenta nove dos 13 longas. A Morte Passou por Perto, O Grande Golpe, Glória Feita de Sangue, Spartacus, Dr. Fantástico, 2001, A Laranja Mecânica, Barry Lyndon e O Iluminado. Stanley Kubrick nunca recebeu o Oscar nem a Palma de Ouro, o Leão de Ouro. Em 1997, Nicole Kidman recebeu por ele um Leão de Ouro especial. Veneza impediu que um dos maiores gênios do cinema fosse, no limite, um dos diretores menos premiados do mundo.


Serviço


Kubrick, 80 anos. Centro Cultural São Paulo. Sala Lima Barreto (110 lug.). R. Vergueiro, 1000, tel. 3383-3402. Hoje, às 16 h, A Morte Passou por Perto; às 18 h, O Grande Golpe; às 20 h, Glória Feita de Sangue. Até o dia 13/1. Entrada franca.’


 


TEATRO
Beth Néspoli


O autor contemporâneo em foco


‘Peça que valeu a Bosco Brasil os prêmios Shell e APCA de autor em 2002, Novas Diretrizes em Tempos de Paz é um dos textos mais tocantes da dramaturgia brasileira contemporânea. Coloca frente a frente dois personagens num porto nacional em 1945: um ator polonês que, depois de ter vivenciado os horrores da guerra na Europa, deixou de acreditar na força do teatro e decidiu tornar-se agricultor no Brasil. E um fiscal da Alfândega, ex-torturador da polícia de Getúlio Vargas, que desconfia de suas mãos sem calos. Ao descobrir sua verdadeira profissão, o embrutecido fiscal lança-lhe um desafio. Ele terá dez minutos para fazer o fiscal chorar, do contrário voltará no mesmo cargueiro.


Por meio dessa fábula, aparentemente singela, Bosco cria um texto potente, uma ode ao teatro e ao poder do diálogo. Não por acaso, ele foi o autor escolhido para ser o primeiro brasileiro a integrar a coleção Palco sur Scène, lançada em parceria entre o Consulado da França e a Imprensa Oficial, cujo objetivo é publicar textos teatrais brasileiros em edições bilíngües. O primeiro volume da coleção foi lançado em 2005, com peças do autor francês Jean-Luc Lagarce. Amanhã, no Centro Cultural São Paulo, será lançado o volume, que traz as peças Novas Diretrizes em Tempos de Paz e Cheiro de Chuva, de Bosco Brasil.


O lançamento será feito em grande estilo, dentro de um amplo evento intitulado Novas Dramaturgias Brasileira e Francesa em Debate. A programação começa hoje com a estréia de uma montagem mineira, dirigida por Fernando Couto, de Novas Diretrizes. Amanhã será a vez de estrear Cheiro de Chuva, dirigida pelo próprio Bosco Brasil, com as atores Marcelo Escorel e Tânia Costa, atriz também responsável pela tradução francesa das peças de Bosco publicadas em Palco Sur Scène. Cheiro de Chuva põe em cena dois personagens, uma professora de dança e salão e seu aluno, uma forte atmosfera que os atrai, e muitos não-ditos. Os sentimentos que eles não revelam são expressos através do corpo, dos climas e, como recurso dramatúrgico, por suas imagens refletidas no espelho da sala de aula.


Mas o evento que tomará conta do Centro Cultural São Paulo vai permitir bem mais do que conhecer essas duas peças. Debates envolvendo especialistas brasileiros e franceses e ainda dramaturgos vão permitir aprofundar o conhecimento sobre a dramaturgia contemporânea de ambos os países. E, sobretudo, saber um pouco mais sobre autores como Philippe Minyana ou Michel Vinaver, franceses que vão integrar a coleção (veja programação completa nesta página). ‘Queremos envolver todas as etapas da criação em torno de uma obra própria ao teatro: o texto, sua tradução e publicação, leituras, montagens e encontros para a reflexão teatral’, diz Marinilda Bertolete Boulay, coordenadora da coleção Palco Sur Scène.


Por motivos óbvios, Bosco Brasil é o autor em destaque no evento que tem início hoje. Na sexta-feira, a reportagem do Estado foi encontrá-lo no hotel onde está hospedado para uma conversa sobre dramaturgia.


Você inicia a carreira de dramaturgo na década de 80, a chamada era dos encenadores, quando era muito comum a frase: não há mais autores. De que forma isso o afetou?


O discurso era esse, no mundo não há mais dramaturgia, e eu dizia que não era verdade. Hoje a gente está pagando royalties para a dramaturgia de alta qualidade feita fora do Brasil nas décadas de 80 e 90. Meu sangue espanhol me faz impertinente. Começou uma conversa quero saber a sua posição para ser contra. Tive brigas que hoje lembro rindo. Na época, fundei o Teatro de Câmara (na Praça Roosevelt) só para encenar dramaturgia brasileira e a editora Caliban, para publicar textos de autores contemporâneos. Mas havia uma necessidade que era coerente e bem-vinda de renovação cênica. Como todo movimento de transformação, veio com a síndrome do manifesto – tudo o que veio antes não vale. Se por um lado foi ruim porque não pude estabelecer um diálogo no palco com minha geração, por outro eu vi grandes textos encenados.


Por exemplo?


Nunca teria visto A Vida É Sonho (do espanhol Calderón de la Barca)e sou grato ao Gabriel (Villela) por ter feito; Leonce e Lena (do alemão George Büchner) do William Pereira, e tantos outros. Estou falando de amigos, colegas de geração e até de classe. Quando Antunes começou a trabalhar com Nelson Rodrigues, eu era aluno de Sábato Magaldi na ECA (onde ingressou em 1982) e uma de suas propostas de trabalho foi comparar as adaptações do Antunes com as textos originais. Antunes dizia que tirou a gordura naturalista de Nelson e eu fui verificar que gordura era essa. Também sob orientação de Sábato fiz um trabalho sobre um grupo de autores da geração 69: Leilah Assumpção, Consuelo de Castro e Antonio Bivar entre eles. E um outro no qual comparava duas peças em cartaz, Mão na Luva, de Vianinha, e De Braços Abertos, de Maria Adelaide Amaral. Aprendi demais fazendo isso – em plena era dos encenadores. Eu era obcecado por Strindberg e, de repente, descobri Zé Vicente. Pensei: caramba, Santidade é Strindberg aqui no Brasil. Hoje nem digo mais isso, Zé Vicente não precisa de comparação, é o Zé Vicente. Não foi uma morte. Foi uma passagem, uma preparação. Sofrida? Sim, mas hoje temos uma geração consistente de dramaturgos que não pára de crescer, com um espectro de temas amplo e instigante. Foi uma discussão boa para os dois lados, apurou argumentos, levou à busca de uma dramaturgia mais teatral.


Você consegue distinguir um traço comum às suas peças, uma marca em sua dramaturgia?


Sou muito permeável às influências. Desde Além da Imaginação até Strindberg, estou topando tudo. Minha paixão pela filosofia não tem nada de sistemática, pelo contrário, prefiro os filósofos assistemáticos. Sofro influências variadas e até conflitantes. Mas se tem uma coisa com a qual me deparo, em todas as minhas peças, é com a alteridade. Esse encontro com o outro sempre me fascinou. Claro que se pode dizer que o teatro como um todo é isso…


Sim, mas se tomarmos O Acidente como exemplo, sua abordagem é sobre duas pessoas que primeiro têm de se livrar de idéias preconcebidas para realmente chegar ao outro e não simplesmente estar ao lado, conversando.


Exatamente. Essa é desde sempre a perseguição. A variação está em quanto eu consegui me aproximar disso. Esse tipo de reflexão, as projeções sobre o outro, permeia minha busca.


Em Cheiro de Chuva isso volta a estar claramente presente e de novo pela via do afeto ou do encontro entre casais. Mas Novas Diretrizes é diferente, não? Ganha um viés político.


Há um momento de expansão em Novas Diretrizes que estou buscando desde o começo, que é o outro não só individual. Toscamente falando, seria a presença do público no privado, quando o público invade o privado, que é o que mais me interessa. Novas Diretrizes é a tentativa de buscar um tu maior, que é também político, que tem a ver com a comunidade. A potencialidade do dialógico perturba-me muito e pode ser o instrumento para romper uma armadilha na qual minha geração caiu.


O individualismo?


O niilismo. Crescemos imensamente em termos técnicos, dramatúrgicos, em modos de abordagem, de temática, mas para isso a gente precisou abraçar o niilismo. Só que deveria ser ponto de passagem e a gente está com dificuldade de ir adiante. É uma crítica que eu faço a mim mesmo. Acho que minha geração está incorrendo nisso. Quase como se o monstro criado pela pós-modernidade, termo que reluto em usar, tivesse nos engolido. Como ela é basicamente estética, nos engoliu, como se só pudéssemos fazer a crítica através dessa estética. Cheiro de Chuva, num certo sentido, é uma preparação para Novas Diretrizes porque já tem ali a discussão sobre o corpo. Opto pela dança de salão em que há o toque do corpo.


Num dado momento tudo ficou muito na cabeça, não?


Descobri que eu escrevo com o corpo. Parece óbvio, mas não é. Escrevo com o pâncreas, o fígado, o estômago. Se tem uma coisa da qual me orgulho é a de sempre deixar espaço aberto para a intuição na minha dramaturgia. O equilíbrio de que fala Nietzsche, entre o dionisíaco e o apolíneo, são polaridades atuais com as quais se pode trabalhar muito. O problema é que as pessoas confundem o dionisíaco só com festa. É pulsão de vida. É o prazer, mas também a dor. É tudo o que é vida, tudo o que é vivo; abarca a explosão de alegria e o sentimento trágico. São polaridades válidas, mas se entendidas no corpo, no âmbito do humano. E me parece que hoje, quando já se começa a falar no pós-humano, essa discussão é cada vez mais atual e é no teatro que se vai dar.


Acompanhe a Programação


HOJE


21 h – Estréia da montagem mineira de Novas Diretrizes em Tempos de Paz


QUINTA


21 h – Estréia montagem dirigida por Bosco Brasil de Cheiro de Chuva


22h30 – Lançamento da edição bilíngüe de duas peças de Bosco Brasil na Coleção Palco Sur Scène


DIA 15


Videopalestra do crítico francês Jean Pierre Thibaudat


DIA 16


Exibição do documentário A Secreta Arquitetura do Parágrafo: Encontro com Philipe Minyana (26 min) e do vídeo da adaptação da peça de Minyana, Inventários (48 min)


DIA 22


Newton Moreno e Rodrigo de Roure Leitura dramática de trechos das peças Agreste, de Moreno, e Últimos Dias de


Gilda, de Roure


DIA 23


Jean-Claude Bernardet e Rubens Rewald falam sobre O Teatro de Michel Vinaver Leitura dramática da peça A Procura de Emprego, de Vinaver


DIA 29


Bosco Brasil e Alberto Guzik


A Influência do Movimento da Praça Roosevelt na Dramaturgia Nacional e seus Rumos Leitura Dramática de trecho da peça Cheiro de Chuva, de Bosco Brasil


DIA 30


Philipe Ariagno – Adido Cultural da França O Teatro Francês


Contemporâneo Leitura Dramática de Apenas o Fim do Mundo,


de Jean-Luc Lagarce


Perfil


PALCO: Bosco Brasil nasceu em Sorocaba, em 1960, e mudou-se para a capital de São Paulo aos 3 anos. Leitor voraz, começou a ler peças ainda jovem, mas a paixão pelo teatro foi despertada aos 13 anos, ao ver uma montagem de Antígona. Em 1977, entrou para o curso de teatro da atriz Berta Zemel. Na década de 80, forma-se em Teoria do Teatro – dramaturgia e crítica – pela Escola de Artes Cênicas da USP. Ainda na década de 80, escreve seriados radiofônicos. Sua primeira peça a repercutir é Jornal das Sombras, apresentada no Teatro Off, sala experimental criada por Celso Cury. Em 1994, ganha seus primeiros prêmios como autor, Shell e Molière, pela peça Budro, dirigida por Emilio de Biasi, com o ator Jairo Mattos no elenco, um de seus muitos parceiros artísticos. Logo depois funda o Teatro de Câmara, na Praça Roosevelt, onde ele próprio dirige seu texto Atos e Omissões. Em 1996, funda a Caliban Editorial e lança a coleção Teatro Brasileiro de Bolso, dedicada à dramaturgia contemporânea brasileira. As dificuldades de manutenção desses dois projetos o levam a aceitar o convite do amigo e escritor Alcides Nogueira. Assim, passa a escrever novelas, sem jamais abandonar o teatro. Entre suas peças mais recentes estão O Acidente, encenada com direção de outra parceira desde os tempos de juventude, Ariela Goldman, com Denise Weinberg e Genézio de Barros no elenco; Os Coveiros, com Jairo Mattos e Eric Novinski, dirigida por Hugo Possolo; e Cem Gramas de Dentes, dirigida por Georgette Fadel com o ator Jorge Vermelho. Há quatro anos Bosco Brasil mudou-se para o Rio, onde mora.’


 


 


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