Sunday, 12 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Ministério tira do ar portal com críticas ao governo


Leia abaixo a seleção de segunda-feira para a seção Entre Aspas.


 


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 21 de junho de 2010


 


GOVERNO


Planejamento tira do ar portal que fazia críticas ao governo


‘O Ministério do Planejamento tirou do ar, na sexta-feira, o portal de internet que tinha a pretensão de organizar ‘o conjunto da ação do governo em 53 temas que devem representar as políticas públicas de interesse nacional’, como informava na página inicial do site, acessado no endereço portalspi.planejamento.gov.br.


O ministro Paulo Bernardo confirmou que o motivo da retirada do conteúdo foi a seção ‘reflexões críticas’, na qual programas governamentais eram debatidos por técnicos da pasta.


A questão é que várias das ações do governo foram abordadas de maneira crítica, como a política de reforma agrária (apresentada como incapaz de alterar a estrutura fundiária ou a garantir a devida assistência aos assentados) ou educação, campo em que documentos ali publicados relatavam pouco avanço desde 2003.


A Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos divulgou nota oficial para rebater trechos que suscitaram polêmica -inclusive em outros ministérios.


No caso da reforma agrária, a nota diz que trata-se de uma ‘inflexão’ no apoio aos camponeses assentados e que não diz respeito apenas ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.


Bernardo marcou para hoje uma reunião com os responsáveis pelo portal, mas já está decidido que acesso a ele, se a página voltar ao ar, terá três níveis diferentes de acesso ao conteúdo disponível: um para o público em geral, outra para a imprensa, e o terceiro destinado apenas a gestores públicos.’


 


 


COPA


Eduardo Arruda, Martín Fernandez, Paulo Cobos e Sérgio Rangel


Dunga dá alfinetada na imprensa


‘Dunga estava de bom humor ontem e, como de hábito, não perdeu a oportunidade de provocar e alimentar sua rixa com os jornalistas.


Ao ser questionado se iria dar folga para o time após a vitória de ontem sobre a Costa do Marfim, ele respondeu: ‘Não adianta dar tempo livre a eles porque, se a gente faz isso, vocês vão atrás deles. E isso não é folga, é trabalho’, falou o técnico, que se estranhou com o comentarista da TV Globo Alex Escobar.


‘O que foi? Algum problema aí?’, perguntou o treinador, rindo. ‘Não, nenhum, não estava olhando para você’, respondeu Escobar.


No ‘Fantástico’, a emissora reproduziu a cena e mostrou momentos da entrevista em que, com o microfone aberto, Dunga proferiu palavrões. O narrador, então, criticou o técnico pelo ‘comportamento não compatível’.


Dunga se referia aos dias livres do time em Johannesburgo. Até agora, foram duas folgas, antes da estreia na Copa. Em ambas, parte dos jogadores foi passear em um shopping. Foi lá que Robinho quebrou regra imposta por Dunga e deu entrevista à Globo. O episódio irritou o técnico, e o atacante teve de pedir desculpas aos colegas.


Ontem, o médico José Luiz Runco, ao responder a uma pergunta sobre a contusão do meia Elano, falou que o time não treinaria hoje. A CBF não divulgou a programação, mas o mais provável é que a equipe, já classificada para as oitavas, tenha folga.


Sobre Kaká, expulso ontem, o treinador afirmou que ainda vai resolver quem o substituirá no duelo de sexta, às 11h, contra Portugal.


‘O Kaká não era só pela questão física, mas ele estava melhorando, ganhando confiança, e seria bom para dar continuidade’, disse Dunga.


‘Mas a coisa positiva é que agora, com a próxima fase, os jogos ocorrem em um intervalo mais curto e pode ser bom para ele [Kaká], que vinha de muito tempo sem jogar uma partida inteira.’


Em relação a Elano, Dunga afirmou estar confiante.


‘Nós temos muitas opções para a posição, como o Daniel Alves e o Ramires, mas espero contar com ele contra Portugal’, concluiu.’


 


 


Rodrigo Mattos


Scolari ataca de comentarista e arranca risos


‘Em transmissão do canal sul-africano Supersports de Brasil x Costa de Marfim, o novo técnico do Palmeiras, Luiz Felipe Scolari, exibiu todo seu repertório de gestos, bufadas e brincadeiras como comentarista da rede.


Logo após a partida, a câmera focalizou o técnico rindo pela vitória.


‘Duas mãos não é falta. Tocar a mão na bola uma vez é falta. Tocar duas vezes, não. É uma nova regra’, disse sobre o gol de Luis Fabiano, no qual ele tocou duas vezes o braço na bola antes de marcar. Gerou risadas no canal.


Logo depois, um colega comentarista lembrou a Scolari que o árbitro era francês. ‘Ele teve uma ideia do Thierry Henry’, ironizou o brasileiro, recordando o lance irregular que classificou a França para a Copa de 2010.


Nos momentos em que seu inglês travava, o treinador recorria a gestos para ganhar os colegas.


Para explicar que os marfinenses estavam cansandos, repetiu bufadas.


O ex-treinador da seleção fez muitos elogios para o Brasil, deixando as críticas de lado. E classificou como brilhantes Kaká, Robinho e Luis Fabiano.


‘O Brasil joga melhor contra time complicado. Se pegar a Espanha na próxima [fase], irá ainda melhor.’’


 


 


Marcos Augusto Gonçalves


TV mostra erros, mas não explica conversinha do juiz com jogador


‘A televisão, que está dando show de imagens, mostrou o lance: a bola passeou pelo braço -ou pelos braços- do Fabuloso. Todo mundo viu. ‘O gol foi lindo, mas ilegal’, disse o Arnaldo Cézar Coelho, na Globo.


Essa expressão ‘ilegal’ não é legal no futebol. Era boa na boca do Mário Vianna, um cara divertido.


O que faltou explicar foi a grande imagem do dia, a da conversinha do juiz com o Fabuloso após o gol. O que foi aquilo? Muito estranho!


Rizek, no Sportv, concordou com a expulsão do Kaká. Fala sério. Já o PVC, meio no muro, na ESPN Brasil, achou que o meia brasuca foi expulso ‘de maneira rigorosa’.


Na verdade, como disse o PC Vasconcellos (que uma amiga só chama de ‘moringa marajoara’), o juiz não estava à altura do espetáculo.


Mas todos concordaram que o Brasil melhorou. Até o Juca, na ESPN, já começou a gostar da seleção!’


 


 


TELEVISÃO


Laura Mattos


Antony não é pedófilo nem gay na novela, revela autor


‘Autor de ‘Passione’, Silvio de Abreu revelou à Folha com todas as letras: o personagem de Marcello Antony na novela das oito da Globo não é gay nem pedófilo, apesar das insinuações dos capítulos da semana passada.


Na lua de mel, Gerson (Antony) deixava a mulher (Diana/Carolina Dieckmann) sozinha para acessar a internet.


Em uma cena, entregou uma bola a uma garotinha na praia, passou a mão no cabelo da menina e fez aquela cara que pode dizer tudo, a depender da interpretação.


Em seguida, disse à mulher, categórico, que não queria ter filhos nunca. Ele tranca a porta do quarto para ligar o computador e olha a tela com cara enigmática.


‘Tudo o que estão falando sobre o Gerson [Antony] é especulação. Ele tem um segredo ligado ao computador, mas não é pedófilo, nem gay, nem estéril, como andou saindo por aí [na imprensa]’, afirmou Abreu à Folha.


Como o mistério é uma das características das tramas do autor, ele preferiu não ir além: ‘Qual é o segredo não vou revelar e não quero dar mais pistas’. Abreu não respondeu quando a Folha perguntou se Gerson é hacker.


Após advertência do Ministério da Justiça, ‘Passione’, que tem sexo e drogas, mudou a classificação.


De 10 anos, passou a recomendada a maiores de 12.


Cala a boca, Galvão A Copa da alta definição está aumentando o número de televisores ligados nos horários das partidas, apesar da transmissão em internet, celulares e miniTVs. As maiores variações ocorrem durante as manhãs, quando normalmente menos gente vê televisão. No sábado, dia em que a audiência costuma ser mais baixa, o aumento chegou a quase 40%.


Fama de mau A cena em que Frederico (Reynaldo Gianecchini) foi a uma concessionária Kia escolher um carro após dar seu grande golpe, em ‘Passione’, foi aprovada pela direção da montadora. O fato de ele ser vilão, o que normalmente afasta merchandising, não pesou desta vez. A avaliação da Kia, que se tornou ‘habitué’ nas novelas das oito, é de que o mais importante é a visibilidade dele na trama.


Criatividade 1 Rede TV! e Band estreiam programas protagonizados por… ônibus. Em 25 de julho, entra no ar na Band o ‘Busão Brasil’, apresentado por Edgard Piccoli. O ônibus sai de Fortaleza com 12 candidatos em direção à emissora, em São Paulo. Quem sobrar, após várias provas, leva R$ 1 milhão.


Criatividade 2 A Rede TV! estreia em 8 de agosto ‘O Último Passageiro’, ancorado por Mário Frias. É uma competição entre alunos do ensino médio. Os vencedores ganham uma viagem de formatura. Dentre os colégios que participarão, representados no palco por um ônibus escolar, estão os tradicionais Dante Alighieri, Salesiano e Marista Arquidiocesano. A mesma produtora, Endemol (de ‘Big Brother’), emplacou os dois programas de ônibus.’


 


 


Gustavo Villas Boas


Episódio perdido de ‘Big Bang Theory’ aparece na internet


‘O fenômeno da comédia ‘The Big Bang Theory’ começou duas vezes.


A primeira, o episódio de teste que nunca foi ao ar, era um mito entre fãs radicais. Era. As redes on-line de trocas de arquivo, neste mês, derrubaram o mito. ‘Big Bang Theory – The Unaired Pilot’ está na internet.


Sheldon (Jim Parsons) e Leonard (Johnny Galecki), os físicos amantes da cultura nerd que protagonizam a série, estão no original concebido por Chuck Lorre (‘Two and a Half Men’).


O próprio Lorre já desdenhou do capítulo (‘uma droga’), feito cerca de um ano antes de a série emplacar em 2007, mas ressaltou a sintonia entre os dois atores.


Dupla que não teve, neste começo, a companhia da garçonete Penny (Kaley Cuoco). Katie (Amanda Walsh), mais problemática e menos doce, completa o trio.


E, para desespero de Sheldon, ela não é, como Penny, só a vizinha atraente. Katie vai morar com os cientistas.


Mas a surpresa para quem seguiu as três temporadas oficiais (a quarta começa em setembro, nos EUA) é outra.


No capítulo perdido, Sheldon, conhecido pela ojeriza a humanos, relata uma relação sexual. Uma convenção de ‘Star Trek’ criou o clima para a situação que acabou, nas palavras dele, em cópula.’


 


 


Bruce Headlam, do NYT


Seriado faz NY se sentir mais segura


‘Em 1990, quando estreou a internacionalmente aclamada série de televisão ‘Law & Order’, 2.245 pessoas foram assassinadas em Nova York, e várias dessas vítimas se tornaram símbolos da violência insensata e aleatória que atingia a cidade. Brian Watkins, jovem turista do Estado de Utah, foi morto ao tentar impedir que uma gangue atacasse sua mãe no metrô. John Reisenbach, executivo de 33 anos, levou um tiro de um sem-teto enquanto usava um telefone público no bairro de West Village. No ano seguinte, balas perdidas mataram 92 pessoas, incluindo muitas crianças. A Grande Maçã estava ‘apodrecendo’, declarou uma capa da revista ‘Time’; um editorial do ‘New York Times’ naquele ano falou de ‘uma nova Beirute’. Até o escritor Pete Hamill, grande defensor da cidade, escreveu: ‘Nova York está morrendo’. Mas ‘Law & Order’, seriado retransmitido em todo o mundo -Brasil incluído-, ajudou a modificar as percepções e a trazer os turistas de volta à cidade. Durante os 20 anos de carreira do programa, que terminou recentemente, Dick Wolf, seu criador, ganhou prêmios e centenas de milhões de dólares para a rede de televisão NBC, enquanto trazia milhares de empregos para Nova York. Mais que outros autores e cineastas associados à cidade nessa época, porém -Tom Wolfe, Richard Price, Martin Scorsese-, Wolf também criou a narrativa popular de uma era em que a criminalidade caiu em um ritmo sem precedentes. Se a autora Edith Wharton é identificada com a era de ouro da cidade, Wolf é o principal cronista de sua era da recuperação, quando Nova York tornou-se novamente segura. Considere o início de um típico episódio de ‘Law & Order’: algumas pessoas fazem suas tarefas nas ruas de Manhattan -sejam nova-iorquinos tarimbados ou turistas perdidos-, quando tropeçam em uma vítima. ‘Esse era o formato de Dick’, disse Ed Zuckerman, ex-redator do programa. ‘Um sujeito estava passeando com o cachorro e encontrava um corpo na lata de lixo.’ O crime parece aleatório -um corretor da Bolsa, um aluno de escola particular ou uma dona de casa encontrados assassinados em uma parte perigosa da cidade- e, para os nova-iorquinos, totalmente identificável. Mas, enquanto os roteiros de ‘Law & Order’ parecem assustadoramente familiares -Wolf muitas vezes diz que sua bíblia do roteiro era a primeira página do jornal ‘New York Post’-, algo muito diferente acontecia sob a superfície. O programa superou o realismo duro de ‘Hill Street Blues’ e o fatalismo operístico de ‘Homicide: Life on the Street’. Seus detetives, Logan, Briscoe e os demais, não espancavam suspeitos, aceitavam propina ou pulavam na cama com as vítimas. Em vez disso, entrevistavam os suspeitos, liam seus direitos, esperavam por relatórios de balística e verificavam sua matemática. Eles eram tiras modelos dos anos 90 -frios, profissionais e intercambiáveis. E, ao puxar os cordões do caso, um padrão e um motivo sempre apareciam. Ao contrário da Nova York real, quase não há um crime de rua puro em ‘Law & Order’. Em um programa obcecado pela estrutura de classes da cidade, era muito mais provável alguém ser assassinado por seu assessor financeiro do que por um traficante de drogas. A criminalidade não tem uma causa única, o programa parecia argumentar, mas os crimes sim, e podem ser solucionados um a um. ‘O público teme pessoas totalmente estranhas’, disse Andrew Karmen, criminologista e autor de ‘New York Murder Mystery: The True Story Behind the Crime Crash of the 1990s’ (Assassinato misterioso em NY: a verdadeira história por trás da queda dos crimes na década de 90). ‘E, se você examinar os casos solucionados, é mais provável alguém ser morto por uma pessoa conhecida.’ O procedimento central do programa vinha das páginas finais do manual do Manhattan Institute, centro de pesquisa conhecido por seu pensamento sistemático sobre a criminalidade. ‘A segunda parte do programa’ -quando os promotores ocupavam o centro do palco- ‘não poderia existir sem a primeira’, disse James Sanders, arquiteto e autor de ‘Celluloid Skyline: New York and the Movies’ (Horizonte de celuloide: Nova York e o cinema). ‘Se Nova York desmorona um pouco na primeira meia hora, a segunda é a da recuperação.’ Wolf retratou uma cidade em que não havia crimes sem sentido, somente crimes que ainda não haviam sido compreendidos. Ele pegou as convenções da novela policial e as colocou em uma cidade ingovernável. Ao fazer isso, para um público internacional, ele retirou o aspecto aleatório da violência em Nova York. ‘No final do programa’, disse Karmen, ‘eles davam uma falsa impressão no sentido de que o crime não compensa e que o braço da lei agarra os criminosos’.’


 


 


LUTO


Ranier Bragon


Corpo de Saramago é cremado em Lisboa


‘‘Não há palavras. Saramago levou-as todas.’ A leitura da frase pela ministra da Cultura de Portugal, Gabriela Canavilhas, na Câmara Municipal de Lisboa, encerrou as homenagens ao escritor e deu a largada a um trajeto que culminou na cremação de seu corpo, ontem de manhã, na capital lusa.


Parte da imprensa local criticou a ausência do presidente Cavaco Silva, que era primeiro-ministro quando Saramago saiu do país rompido com o governo.


Em férias nos Açores, Cavaco disse que não tinha relações pessoais com o escritor, morto na sexta-feira, aos 87 anos, na ilha espanhola de Lanzarote. Afirmou ter cumprido seu papel ao emitir nota de condolências.


Vinte mil pessoas passaram pela praça do Município, onde fica a Câmara, desde sábado, segundo a polícia municipal -número possivelmente superestimado.


CRAVOS NA DESPEDIDA


Ao final do velório, a viúva do escritor, a jornalista espanhola Pilar del Río, e a filha dele, Violante, foram à sacada da Câmara atirar um cravo. No peito do escritor, foram deixados dois cravos, símbolos do movimento que derrubou o salazarismo.


O corpo de Saramago foi levado ao cemitério do Alto de São João, onde centenas aguardavam, flores e livros do escritor à mão. Havia muitos militantes comunistas.


Após a fala da viúva, o caixão entrou no crematório. Quando a fumaça começou a sair da chaminé, a multidão reagiu com aplausos, gritos do nome do escritor e choro.


As cinzas de Saramago ficarão em Portugal, disse Pilar a agências de notícias.’


 


 


INTERNET


Ronaldo Lemos


Cala a boca, Twitter


‘O FENÔMENO ‘Cala Boca Galvão’ tomou conta do Brasil e do mundo.


Isso não é mais novidade para ninguém. Só estou falando disso aqui porque ele dá o que pensar sobre a relação da internet com outras mídias.


Em muitos casos, a internet funciona como ‘caixa de ressonância’ da mídia tradicional. Um artigo sai publicado no jornal ou um programa de TV vai ao ar e os internautas vão atrás, difundindo o assunto na rede.


Mas no ‘Cala Boca Galvão’ foi diferente. O fenômeno surgiu na internet, no dia da abertura da Copa. E daí a mídia tradicional foi quem teve de correr atrás.


Mesmo depois de cinco dias da piada bombando no Twitter, ainda dava para ver artigos de jornal tratando o caso como novidade.


E depois de o ‘Cala Boca Galvão’ aparecer em jornais gringos importantes, como o ‘New York Times’, até a TV foi atrás, com direito ao próprio Galvão dando declarações de apoio.


Dá para pensar em algumas coisas a partir disso.


A primeira é que piada de internet só tem graça mesmo na internet. Tentar explicar em outras mídias pode até ser informativo para quem estava desconectado, mas não tem nem de longe a mesma graça.


O humor da rede faz piada com suas próprias características: o fato de os ‘trending topics’ do Twitter terem sido dominados, as múltiplas campanhas inventadas rapidamente com Photoshop, a desinformação espalhada em 140 caracteres sobre o significado do bordão e assim por diante.


O outro ponto é que o ‘Cala Boca Galvão’ é um caso raro de ‘meme’ genuinamente brasileiro que ganhou o mundo. ‘Memes’ são comportamentos e ideias que se reproduzem por imitação (‘mimesis’). Alguém vê e quer espalhar ou fazer igual.


O Brasil é um grande consumidor de ‘memes’, como o ‘lolcats’ (bit.ly/4x6Niu). É também um bom produtor de ‘memes’, como o ‘tenso’ (bit.ly/db7e0Z).


Mas, até então, nenhum ‘meme’ brasileiro tinha se tornado tão global.


Há muita gente orgulhosa disso. E outro tanto com vontade de gritar ‘cala a boca, Twitter’.’


 


 


COETZEE


Alan Cowell, do NYT


Literatura une censor e censurado na África do Sul


‘PARIS – Quando os regimes totalitários sucumbem, às vezes deixam, sem querer, pistas documentais que revelam o sombrio ofício da opressão.


Após a queda do Muro de Berlim, em 1989, para citar um só exemplo, muitos alemães descobriram nos arquivos que filhos ou cônjuges os haviam espionado para a Stasi (polícia secreta da Alemanha Oriental). E, na Romênia, o economista Doru Pavaloiae soube que um amigo, cantor popular em sua cidade, era informante -codinome: Menestrel- da temida Securitate.


Tais epifanias dificilmente seriam possíveis se os regimes não fossem tomados por uma obsessão por acumular dados sobre seus cidadãos.


Assim foi com o Nobel sul-africano de Literatura J.M. Coetzee, como ouviu recentemente uma plateia na Universidade Americana de Paris, quando ele contou suas experiências a alunos, professores e a pelo menos um ícone americano -o poeta Lawrence Ferlinghetti, 91, que por coincidência também estava na cidade.


‘Até quando eu tinha 50 anos de idade, meus livros só podiam ser lidos por meus compatriotas sul-africanos depois de terem sido aprovados por um comitê de censores’, disse Coetzee, 70.


Mas só por volta de 2008 um pesquisador acadêmico se ofereceu para mostrar a ele arquivos que havia descoberto, relativos a três obras do escritor na década de 1970 e começo da de 1980.


Na época, o apartheid dominava o país, prescrevendo onde as pessoas podiam viver e trabalhar, onde nasciam e morriam, como viajar, a quem amar; a chamada Lei da Imoralidade criminalizava a miscigenação. Mas um arquivo, relativo a ‘No Coração Desta Terra’ (1977), aparentemente conseguiu burlar tais restrições pseudomorais, argumentando que ‘embora sexo através dos limites de cor seja descrito’, o livro ‘será lido e desfrutado apenas por intelectuais’.


Em ‘À Espera dos Bárbaros’ (1980), concluía outro censor, 22 trechos poderiam ser considerados indesejáveis, mas o conteúdo sexual do livro ‘não provoca a luxúria’. Um terceiro censor opinava que ‘Vida e Época de Michael K.’ (1983) ‘contém referências e comentários depreciativos sobre as atitudes do Estado, e também à polícia e aos métodos que eles empregam no cumprimento de seus deveres’.


Invariavelmente, os censores se opuseram à proibição.


De certa forma, era o mesmo tipo de vigilância ambígua mostrada no filme alemão ‘A Vida dos Outros’, em que um agente com fones de ouvido passa a se solidarizar com as vítimas de escutas secretas.


Esses censores sul-africanos eram acadêmicos -colegas, suspeitava Coetzee, que em casa ouviam Mozart enquanto liam Austen e Trollope, e que acreditavam estar ‘fazendo um bom trabalho’.


Uma leitora secreta, lembra-se Coetzee, convidou-o para um chá, e os dois mantiveram ‘uma longa discussão’ sobre literatura. ‘Eu não tinha a menor ideia de que ela era uma dos meus censores.’


Na época, Coetzee era professor de literatura inglesa na Cidade do Cabo.


‘A comunidade intelectual não era grande’, disse ele. ‘Permanece o fato de que eu estava ombro a ombro na vida cotidiana com pessoas que em segredo estavam fazendo julgamentos sobre se eu poderia ou não ser publicado e lido na África do Sul.’


É claro que nem tudo na África do Sul do apartheid se reduzia a mocinho e bandido, bom e mau, preto e branco.


Os dirigentes do apartheid ansiavam por serem vistos como parte de uma remota sociedade ocidental, e não de um continente que eles descreviam como cruel e bárbaro. Se um censor notasse que uma obra seria lida só por ‘intelectuais’, aparentemente havia a suposição de que essa gente não iria querer derrubar o Estado.


Os leitores secretos, disse Coetzee, se viam como ‘um certo tipo de herói anônimo’. ‘Os censores que liam os meus livros viam a si mesmos como guardiões da República das Letras também’, disse Coetzee à plateia. ‘Aos seus olhos, eles estavam do meu lado.’’


 


 


 


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