Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Staub pede padrão
de TV Digital brasileiro


Leia abaixo os textos de terça-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Segunda-feira, 13 de março de 2006


TV DIGITAL
Sonia Racy


‘TV digital tem que ter tecnologia brasileira’


‘Eugênio Staub, presidente da GradienteENTREVISTAEm meio a uma acalorada discussão sobre qual sistema de TV digital será adotado pelo Brasil, o empresário Eugênio Staub, da Gradiente, coloca na mesa algumas questões importantes. Primeiro, por que a pressa? Ante a rápida evolução tecnológica, tudo indica que seria mais sensato aguardar mais um pouco.


‘A pressa é inimiga da perfeição’, observou em entrevista ao Estado, na sexta-feira, lembrando que tampouco ‘se pode estender esta questão para sempre.’ Indagado, Staub diz não ter notícia de que o governo Lula já teria optado pelo sistema japonês. Mas avalia que, dos três, ele é o melhor. E avança: ‘Acredito que qualquer dos três sistemas, adaptados à tecnologia desenvolvida por acadêmicos brasileiros, poderá atender os atuais e futuros clientes nacionais.’


É essa a tese que Staub defende: mais tempo para negociar com os fornecedores, e qualquer que for a escolha, atualizá-la por meio de soluções desenvolvidas no Brasil para o mercado brasileiro.


Na América Latina, a problemática da TV digital começou com a precipitação do governo Menem ao se decidir pelo padrão americano, que até hoje não foi implementado na Argentina.


No Brasil, houve discussões no governo FHC que se afunilaram na viabilidade dos três sistemas – americano, europeu e japonês. O presidente FHC preferiu deixar a decisão para seu sucessor. No governo Lula, foi o ex-ministro das Comunicações, Miro Teixeira, a envolver a comunidade acadêmica e na definição do tema. ‘Estou advogando que se continue nessa linha dinamizada pelo ministro Hélio Costa, até o fim. Mas sem excessivo açodamento’.


Sobre política, Staub, um dos primeiro empresários de peso a aderir à candidatura Lula, não fala. ‘Só na outra encarnação’, diz.


Porque tanta pressa em definir o modelo de TV digital no País? Não seria mais fácil assistir primeiro à convergência tecnológica, facilitando assim o processo?


Neste caso, a pressa é inimiga da perfeição. A evolução da tecnologia é um processo constante, nunca pára. Por outro lado, não podemos esperar para sempre e não tomar decisão nenhuma. A decisão não deveria ser tomada agora, mas também não podemos deixar para o ano que vem.


Quais seriam os principais condicionantes nessa tomada de decisão?


Definida uma classificação inicial dos três sistemas, o Brasil deveria escolher aquele que melhor atenda a um conjunto de objetivos do governo brasileiro que busca o interesse do País . Devemos observar também que o sistema de TV Digital não é tão abrangente como se propaga. A decisão está restrita a um sistema de transmissão terrestre, sendo que existem os sistemas digital de cabo e de satélite.


Mas qual o melhor sistema?


Tecnicamente, o melhor é o japonês. Mas o Brasil, por meio do mundo acadêmico, financiou o desenvolvimento de tecnologia cuja contribuição é importante e viável na atualização de qualquer um dos três sistemas. Trata-se de uma necessária atualização tecnológica, visto que o sistema americano tem 15 anos, o europeu mais de 10 anos e o japonês, apesar de ser mais recente, tem 4 anos. Todos eles, se tivessem de começar hoje de novo, fariam melhor. É o que devemos fazer. Grande parte do trabalho já foi feito pelos técnicos brasileiros , financiados pelo governo. É só ter mais um pouco de paciência.


Quais as questões a serem consideradas na tomada de uma decisão?


Certamente a política industrial, a política tecnológica, a política de telecomunicações e de radiodifusão, o papel importantíssimo dos provedores de conteúdo (emissoras), a questão das relações exteriores e de comércio exterior, principalmente com os nossos vizinhos da América Latina, o melhor uso do espectro eletromagnético, que é finito, e o desejo do consumidor. No que diz respeito às políticas de telecomunicação e radiodifusão, é preciso definir o papel da emissoras e qual o papel das operadoras de telecomunicação. Essas últimas podem contribuir para a inclusão digital, através dos canais de retorno.


E do ponto de vista do cidadão?


Nas questões sociais, temos de considerar o interesse e a importância da TV de alta definição e a importância de acessar, em aparelhos móveis (celulares), a televisão. Imagine como será diferente a vida de um cidadão que passa de três a quatro horas por dia dentro de uma condução, se ele pudesse assistir os seus programas favoritos de televisão? Isso será uma mudança relevante no comportamento e na informação. Imagine a situação de um cidadão que possa reagir, através do celular, a um programa que exija sua opinião, seu voto, ou mesmo sua decisão de compra. Uma integração perfeita entre emissoras e operadoras de telecomunicações, respeitadas as especificidades do campo de cada uma, e preservadas as respectivas bases de receita. Os europeus não contemplaram, no início de seu sistema, a TV de alta definição, e cometeram um grave erro. Agora estão correndo atrás desse prejuízo.


E a negociação com os fornecedores?


Ela é fundamental. O poder de barganha do Brasil é imenso e precisa ser usado com competência para conseguirmos os nossos objetivos, nos campos econômico, industrial, tecnológico, de mercados externos e de participação nas empresas e centros de tecnologias nacionais. É importante dizer que nos últimos 60 dias o governo, por meio de um processo coletivo, tomou as rédeas do processo e age com competência. As pressões para que a decisão seja imediata são enormes e deve se resistir a elas.


A decisão do governo sobre o sistema digital será política?


Terá de ser política também. Essa decisão não se baseia apenas em tecnologia. Tem dimensões técnicas, de política industrial, de comércio exterior. Tem dimensões físicas, já que está se discutindo como se reparte o espectro eletromagnético e como melhor usá-lo. Tem dimensões também de política de comunicações, de cooperação com países vizinhos. Existem até questões sociais, já que o processo poderá aumentar a inclusão digital. É nesse sentido que é política, não de política partidária.


Fala-se, no entanto, que o sistema europeu é o mais adequado e menos custoso para o consumidor. E, ao que tudo indica, já dada a escolha do modelo japonês, permite controle do conteúdo para as televisões. Isso não é uma decisão política em tempos de campanha eleitoral?


Do ponto de vista tecnológico, os três sistemas atendem ao País. O melhor nesse parâmetro é o japonês. Decisão inteligente é aquela que, após o processo de negociações, melhor atenda os objetivos do Brasil , que devem ser predefinidos. Isso nada tem a ver com eleição.


O ministro das Comunicações, Hélio Costa, está sendo acusado de ser mais lobista que ministro. O senhor concorda?


A decisão do sistema é do governo coletivamente, como convém. É legitimo que um ministro tenha suas convicções e que as externe. Hélio Costa teve o mérito de colocar o assunto na mesa e fazer a agenda avançar.


O sr. se arrepende de ter apoiado a candidatura Lula com tudo isso que está acontecendo? O sr. se decepcionou?


De política , a não ser a industrial e tecnológica, só falo na próxima encarnação.’


EUA / GRAMPOS & VAZAMENTOS
O Estado de S. Paulo


Identidade de agentes da CIA é encontrada na internet


‘A identidade de 2.600 funcionários da Agência Central de Inteligência (CIA) e a localização de cerca de 20 locais de trabalho secretos da agência nos EUA podem ser facilmente encontrados na internet, segundo uma investigação do jornal Chicago Tribune. O jornal não publicou os nomes nem detalhes sobre os funcionários para não os pôr em perigo..


Nem todas as 2.653 pessoas que o jornal disse ser capaz de identificar como funcionários da CIA têm funções secretas – como a agente Valerie Plame, cujo nome foi vazado para a imprensa em 2003.


Algumas, na verdade, são analistas e executivos, cuja identidade não é protegida por lei, como o ex- diretor da CIA George Tenet. Mas o jornal disse que mostrou alguns dos nomes levantados à CIA e a agência admitiu que a lista continha funcionários encobertos.


‘A proteção é uma questão que nos preocupa o tempo todo, e sempre estamos tentando melhorá-la’, disse o porta-voz da CIA, Tom Crispell, à Associated Press.


Por meio de provedores, o jornal disse que identificou pessoas por listas telefônicas, transações imobiliárias, registros eleitorais, registros de impostos imobiliários e outros documentos financeiros e jurídicos.


A investigação revelou também telefones de escritórios internos da agência e endereços de mailing protegidos usados por agentes secretos.


‘A proteção é uma questão complexa que ficou ainda mais complexa na era da internet’, disse outra porta-voz da CIA. Jennifer Dyck, ao jornal. ‘Algumas coisas que funcionavam antes não funcionam mais.’ O Tribune localizou também duas dezenas de instalações da CIA em Chicago, norte da Virgínia, Flórida, Ohio, Pensilvânia, Utah e Estado de Washington. Algumas instalações são fortemente protegidas, enquanto outras parecem residências particulares sem nenhuma relação óbvia com a CIA. AP’


PUBLICIDADE
O Estado de S. Paulo


Em busca da agência ideal


‘Uma grande empresa está à procura de uma grande agência. Decide procurar aqueles publicitários mais conhecidos, mais destacados. Mas será que esta grande agência e este publicitário estão preparados para oferecer o serviço que o cliente espera? Será que conhecem o seu mercado e a sua realidade, estão acostumados a atuar com o orçamento dessa empresa?


É para responder a essas dúvidas, que afligem desde pequenas até as grandes empresas, que respeitados homens de comunicação se juntaram para criar a SPGA – Sales, Periscinoto, Guerreiro, Fontoura & Associados. Mais que selecionar agências, esses profissionais querem auxiliar executivos em tomadas de decisão e a administrar conflitos – as crises que podem afetar a imagem de um executivo ou de uma empresa.


Ex-diretor de Marketing da Ford e ex-presidente da Leo, Burnet, Sérgio Guerreiro diz que a seleção de agências é crucial para que o investimento publicitário retorne em resultado para as empresas. ‘É uma prática comum no exterior, que estamos implantando aqui e que também ajuda as agências, evitando que gastem fortunas na montagem de um circo de apresentações, sem necessidade.’


Guerreiro cita como exemplo a concorrência para a escolha de agência pela Brasil Telecom, que foi assessorada pela SPGA. ‘Pedimos apenas a apresentação da idéia, limitando o número de peças e substituindo filmes prontos por storyboards (o filme desenhado). O que vale na escolha é a idéia. E reduzimos o número de agências participantes a oito, optando pelas que melhor se encaixavam no perfil desejado pelo cliente.’ No final, a Brasil Telecom ficou com duas agências, a Leo, Burnett e a Neogama BBH. ‘Esse tipo de processo traz transparência ao negócio da propaganda’, diz Alex Periscinoto, o homem que fundou a Almap ao lado de Caio de Alcântara Machado e é uma lenda viva do mercado publicitário brasileiro.


A equipe da SPGA, que conta ainda com Luiz Marcelo Sales e Walter Fontoura, está se colocando no mercado como auditora de estratégias de comunicação e oferecendo serviços para empresas em momentos de crise. ‘A comunicação é a chave do mundo dos negócios e pode tanto trazer lucros quanto prejuízos às empresas. É aí que entramos, analisando como evitar os prejuízos e como garantir resultados positivos’, diz Sales.


‘Muitas agências não entendem o que fazemos até que mostramos que, nos Estados Unidos, 70% dos anunciantes já usam serviços de consultores especializados em ‘agency search’ para selecionar novas agências’, diz Guerreiro. Periscinoto diz que a adequação da agência ao cliente é fundamental para o relacionamento, que eles também se dispõem a intermediar, procurando mapear as estratégias das empresas. ‘E que ninguém duvide, esse tipo de serviço tende a crescer no País’, prevê Periscinoto.’


TELEVISÃO
Keila Jimenez


Estréias em clima de guerra : Globo X Record


‘Globo e Record estréiam hoje duas produções em clima de guerrilha. Na Globo, o destaque é o remake de Sinhá Moça, trama de Benedito Ruy Barbosa que entra no lugar da bem-sucedida Alma Gêmea. No enredo: o amor impossível da filha de um barão escravocrata e um jovem abolicionista, mais uma aposta da rede no gênero de época, que tem obtido ótimos resultados no horário das 6.


No elenco, nomes como Osmar Prado, Zezé Motta, Vanessa Giácomo, Bruno Gagliasso e Chico Anysio, em participação especial. Os protagonistas são Débora Falabella (Sinhá) e Danton Mello (Rodolfo). O ator, por sinal, só não migrou para a concorrente – a Record tinha assediado Danton – por conta da oportunidade na Globo. Se aceitasse, Danton seria mais um entre os tantos ex-globais que compõem o cast de Cidadão Brasileiro, estréia misteriosa da Record.


Misteriosa porque até a sexta-feira à noite a rede não sabia informar como ficaria sua grade de programação após as 19 h. A única certeza era que Cidadão, texto de estréia de Lauro César Muniz na Record, iria estrear às 20h30. A dúvida da emissora era se coloca o novo folhetim seguido de Prova de Amor, que vai muito bem em audiência, jogando o Jornal da Record para mais tarde, ou se faz o famoso sanduíche de programação utilizado com sucesso pela Globo: novela/noticiário/novela.


A rede pretende manter o suspense até o último instante. A Globo, por sua vez, está de olho na grade da concorrente para esticar ou condensar o Jornal Nacional.


O folhetim que marca o início do segundo horário de novela na Record, Cidadão, traz no elenco: Gracindo Jr., Paloma Duarte, Lucélia Santos, Gabriel Braga Nunes e Cecil Thiré, entre outros.’


INTERNET
Pedro Doria


Reacionários e progressistas


‘Embora tenhamos por hábito dividir as pessoas politicamente entre a esquerda e a direita, existe uma classificação mais útil: entre reacionários e progressistas. Um reage às mudanças; o outro as acolhe. O que difere um do outro é o medo do novo, do diferente. Nos momentos da história em que as inovações ficam particularmente intensas, os reacionários mostram suas garras – mas às vezes não é óbvio percebê-los.


A Inquisição Católica foi, a seu modo, uma resposta reacionária às intensas mudanças sociais e tecnológicas do fim da Idade Média e início da Renascença.


Em uns dois séculos, o mundo saiu dos feudos e chegou à América, Marco Polo de cascateiro virou herói, os livros deixaram as penas dos monges e aumentaram o ritmo nas prensas de Gutenberg: perspectiva, astrolábio, telescópio e o mundo ficou decididamente redondo.


É engraçado pensar nesse período entre o século 14 e o 16 como de intensas e violentas mudanças, mas é isso que aconteceu. De certa forma, os séculos 17 e 18 serviram mais à consolidação daquelas mudanças, à aceitação e à compreensão delas do que a novidades. E muita bruxa foi queimada no caminho.


Já nos séculos 19 e 20, máquinas a vapor, telégrafo, fotografia, trens, carros, telefones, luz elétrica, computadores. A grande revolução tecnológica atual não começou com os computadores dos anos 40. Começou em algum ponto, ali, entre a eletricidade de Edison e Tesla e o telégrafo de Morse.


Marshall McLuhan já dizia há quase meio século que, quando a tecnologia muda, o homem muda. Mudanças de percepção são movidas por novidades tecnológicas. Não é difícil compreender. O imperador dom Pedro II demorava um dia viajando do Rio a Petrópolis, hoje é coisa de 40, 50 minutos. Nossa percepção de o que é longe ou perto é bem diferente da de alguém no oitocentismo. Um dia, para nós, é a distância para qualquer país do mundo: o único limite é o do cartão de crédito.


Da mesma forma, a pílula anticoncepcional – outra inovação tecnológica – alterou por completo a percepção de seu corpo pela mulher. Não tinha mais uma ameaça, podia fazer mais coisas. Podia experimentar com o prazer. Quatro décadas depois da pílula, um papa baixa uma encíclica dizendo que o prazer sexual é legítimo. Bento 16 até que foi rápido – seu antecessor demorou cinco séculos para dizer que era Galileu quem estava certo.


Mas instituições são, por natureza, reacionárias: é claro, são elas que representam o ‘status quo’, portanto são elas as menos interessadas em mudanças. Não vale apenas para a Igreja Católica. Vale para os aiatolás iranianos, para a Sony Music, vale para cada sindicato. É o caso do mais famoso de todos os sindicalistas: Ned Ludd.


Em princípios do século 19, Ludd liderou artesãos da indústria têxtil britânica em vários ataques a fábricas cujas máquinas estavam os substituindo. Daí vem o termo ludita, o sujeito avesso à tecnologia. (Hoje, os historiadores acreditam que Ludd tenha sido uma figura mítica, inventada pelos operários para aterrorizar o patrão.)


Muitas vezes, é possível compreender e até simpatizar com o reacionário. Bento XVI é um intelectual refinado e crê, sinceramente, que as mudanças de percepção da sociedade vão levar à selvageria desregrada. Sindicalistas muitas vezes estão defendendo sua capacidade de botar comida na mesa: sua viabilidade econômica. É o mesmo que faz qualquer distribuidora de livros, músicas ou filmes. Defende a própria viabilidade econômica.


Mudanças são difíceis – no íntimo, todo mundo sabe. Todo o aparato tecnológico à volta está mudando a economia que nos sustenta. Informação, seja de que forma for, é vista cada vez mais como algo gratuito. Você pode até pagar pelo suporte – o papel do livro, o disco -, a percepção pública da informação é de que ela é gratuita. Desde o rádio, a tecnologia está construindo essa idéia.


Vale também para jornalistas: quem vive de escrever e não sabe fazer outra coisa tem que torcer para o encontro de outros modelos para o sustento.


No fim, é simples: mudanças vêm. Você pode reagir a elas e talvez diminua sua velocidade. Ou pode tentar compreendê-las, descobrir qual seu novo papel e dar um passo à frente. A história ainda não deu seu veredicto para a esquerda e a direita. Quanto aos reacionários, esses sempre perdem.


*pdoria@nominimo.com.br’


Ricardo Anderáos


Analfabeto digital


‘Em algum canto da minha memória repousa uma frase de Nelson Rodrigues dizendo que o brasileiro só é solidário no câncer. Mas, nos últimos dias, descobri que o brasileiro é solidário em mais uma coisa: no branco.


Semana passada contei aqui sobre o branco que me deu na hora de escrever esta coluna, logo após o carnaval. Voltava de uma temporada num local isolado, sem telefone, automóvel nem computador. Sem nem um causo tecnológico para contar, resolvi transformar o branco em assunto.


Surpreendentemente, o retorno dos leitores via e-mail e as citações em blogs e outros sites foram acima do normal. Amigos e colegas se identificaram com o problema. E numa dessas conversas, diante da solidariedade de um conhecido ante a minha dificuldade em escrever, pensei em associar o branco ao câncer rodrigueano.


A tal frase sempre me pareceu inesquecível, daquelas que obrigam a gente a se colocar contra, a favor ou muito pelo contrário. Como todo cronista de sucesso, Nelson é um mestre nessas tiradas dramáticas.


Mas, para não falar bobagem e checar se a frase estava correta, resolvi pesquisar no Wikiquote. Um site irmão da enciclopédia online Wikipédia, exclusivamente dedicado a citações, que fica no endereço http://pt.wikiquote.org.


Entrei na homepage, escrevi as palavras ‘brasileiro’, ‘câncer’, dei um clique e caí na página de Otto Lara Resende. Lá, dizia que a frase ‘o mineiro só é solidário no câncer’ na verdade era atribuída a ele por Nelson Rodrigues. Já na página do Nelson, entre muitas outras citações, estava lá novamente a mesmíssima frase, mas agora como se fosse de autoria dele.


Como no Wikiquote a gente encontra as frases secas, sem citação de sua fonte, fiquei um pouco confuso. E, acima de tudo, incomodado com a sucessão dos meus erros. No conteúdo, trocando brasileiro por mineiro. E no autor, trocando o nome de Otto pelo de Nelson. Ou seria o contrário?


Para acabar de vez com as dúvidas, recorri ao Google. Na caixinha de pesquisa escrevi a frase entre aspas, pois assim a busca só retorna as páginas da internet que têm as palavras exatamente nessa ordem: ‘o mineiro só é solidário no câncer’.


Vieram 164 resultados. Logo nos primeiros, pude matar a charada. Para brincar com o amigo, Nelson Rodrigues deu à peça Bonitinha mas Ordinária o subtítulo de Otto Lara Resende. A tal frase foi atribuída ao escritor mineiro por uma personagem. Depois do grande sucesso da peça, de nada adiantou Otto jurar que nunca disse nada parecido. Assim, após alguma pesquisa, descobri que a Wikiquote, afinal, estava certa.


Entre as páginas que apareceram como resultado da minha pesquisa, uma no site www.releituras.com trazia frases de Nelson selecionadas por Ruy Castro para o livro Flor de Obsessão, publicado pela Companhia das Letras em 1997. Afinal, o melhor de dois mundos! A facilidade e a rapidez de pesquisa das novas mídias online, somada à confiabilidade e à possibilidade de conferir as fontes das tradicionais mídias impressas, como o livro ou o jornal.


O fato é que para garimpar informação na internet, para separar o joio do trigo, a gente precisa de paciência, esforço e atenção. E, acima de tudo, uma capacidade de avaliar a confiabilidade das fontes dessa informação que não é ensinada em nossas escolas. Essa é a verdadeira alfabetização para os nossos tempos hi-tech.


Na década de 50, a Unesco definia como analfabeto alguém que não consegue ler ou escrever algo simples. Vinte anos depois, surgiu o conceito de analfabeto funcional. Uma pessoa que sabe ler e escrever frases simples, mas que não possui as habilidades necessárias para satisfazer as demandas do seu dia-a-dia e se desenvolver pessoal e profissionalmente. Resumindo: alguém que não consegue entender direito o que lê.


Arrisco aqui uma definição: analfabeto digital é aquele que não consegue entender o valor daquilo que aparece debaixo do cursor do seu mouse. Você pode propor uma definição melhor do que essa?


anderaos@estadao.com.br’


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 13 de março de 2006


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


No Haiti


‘Abrindo a escalada do ‘Fantástico’:


– Guerra! Como o Exército está ocupando os morros.


Lá pelo meio da reportagem, diz uma mulher:


– Eu tô me sentindo no Haiti.


A cobertura ganha ares de guerra, ela também, com correspondentes ao vivo e tiros ao fundo na rádio Band News.


E com as câmeras gravando cenas como as do ‘Fantástico’, com tiros traçantes ou soldados invadindo barracos. Da escalada do ‘Jornal da Band’, sábado, no mesmo tom:


– Pânico no Rio. Morro da Providência vira praça de guerra entre as tropas do Exército e traficantes. Soldados respondem aos tiros do alto da favela.


E na CBN, ontem:


– No protesto contra o Exército na favela da Metral, militares deram tiros para o alto e bandidos armados, que participaram, fizeram disparos.


A manifestação era manchete também no Globo Online.


De volta ao ‘Fantástico’, que registrou sem maior atenção a aparente retirada:


– Os militares saíram do morro da Mangueira e do conjunto de favelas do Alemão. A estratégia do comando do Exército agora é não se concentrar em pontos fixos e dar mais mobilidade às tropas.


Já O Dia Online, quase todo voltado à operação, trouxe como enunciado:


– Tráfico comemora desocupação da Providência.


Foi com ‘uma grande queima de fogos’.


Colapso


O acordo nuclear fechado por George W. Bush com a Índia dividiu os jornais americanos. Ontem o ‘Washington Post’ trazia na coluna de Robert Kagan a defesa do acordo, dizendo que os EUA ‘têm mesmo dois pesos’ em sua política externa. Quanto ao temor maior:


– Estou inclinado a duvidar que o acordo possa encorajar, digamos, o Brasil ou a África do Sul a retomar seus programas de armas nucleares.


Passe livre


Não é o que pensa Thomas L. Friedman, célebre colunista de política externa do ‘New York Times’. Ele escreveu no final da semana que o acordo pode levar ao ‘derretimento’ do Tratado de Não-Proliferação Nuclear e questionou:


– Japão, Brasil e Argentina cederam ao tratado e optaram por desistir das armas para ter acesso à tecnologia nuclear. O que vão pensar se a Índia conseguir passe livre?


Joquempô


Sexta foi dia de histeria na disputa tucana, a ponto de levar o tema de volta à escalada dos telejornais, caso da Record:


– Mistério na novela.


A obsessão entrou pelos blogs petistas, com os Amigos do Presidente Lula criticando ‘a cidade inundada -e Serra e Alckmin em campanha’. Outros, como o Bué de Bocas, atacaram a falta de ‘representatividade’:


– Abrigados em suntuosos apartamentos nas zonas nobres, entre eles, cinco ou seis…


O blog de Soninha, na Folha Online, propôs que os dois decidam no ‘joquempô’.


Ainda o acordão


Kennedy Alencar, também na Folha Online:


– Injustamente, as duas absolvições foram creditadas a um acordão entre PT e PFL. Foi um acordão do Congresso, de todos os grandes partidos.


No PSDB, além do líder na Câmara, até Alckmin ‘atuou em favor’ do pefelista.


TV SEM LIMITE


Em contraste com o debate sobre a TV digital por aqui, o ‘New York Times’ deu longa reportagem, ontem, para a explosão dos canais on-line. Numa única empresa, são três novas emissoras por semana, voltadas a assuntos de audiência restrita. Tem o canal de esportes náuticos, tem o de cultura pop -que, quando foi deixado de lado pela DirecTV, mudou para a web.


O Discovery está entrando na área, também ESPN e até Amazon. Boa parte das plataformas oferece canais do mundo inteiro, caso da JumpTV, que vai do vietnamita VTV4 ao brasileiro Amazon Sat.


Segundo o blog de mídia Romenesko, os críticos de TV dos jornais já começam a tratar da produção feita para a rede, em especial aquela no serviço You Tube.’


ELEIÇÕES 2006
Daniel Castro


Globo e Band definem datas de debates


‘O primeiro debate com os candidatos à Presidência da República será feito pela Band, em 3 de julho. O último será na Globo -em 28 de setembro e, se houver segundo turno, em 27 de outubro. A Band não abre mão de levar ao ar o primeiro embate. A Globo faz questão de exibir o ‘decisivo’.


O calendário de debates da Globo já está fechado e, numa reunião recente, representantes dos principais partidos assinaram uma ata com as informações -o que significa que estão de acordo com as datas.


Já o calendário da Band será apresentado hoje aos partidos, numa reunião em SP. Ou seja, algumas datas podem mudar, conforme Fernando Mitre, diretor de jornalismo da emissora.


A Record e o SBT também pretendem fazer debates, mas ainda não definiram datas. A Record já iniciou negociações.


No primeiro turno, a Globo só fará debates em setembro (dia 26 para candidatos a governador e 28 para presidenciáveis). Nos Estados com segundo turno, o debate será em 26 de outubro.


A Band planeja três rodadas de debates: 3 de julho, 4 de setembro e 16 de outubro para presidenciáveis; 10 de julho, 5 de setembro e 17 de outubro para postulantes a governos estaduais.


Na Globo, os debates do segundo turno repetirão o formato de arena, que a emissora inaugurou em 2002, em que dois candidatos se confrontam em um palco.


OUTRO CANAL


Perseguição 1 O ministro Hélio Costa (Comunicações) está sendo acusado de ter mandado a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) fechar uma TV educativa de Ouro Preto (MG) por interesse político -supostamente para agradar a um grupo aliado que não se sentiria confortável com o jornalismo do canal.


Perseguição 2 Retransmissora mista educativa (canal que retransmite a TVE e gera algumas horas de programação própria), a TV Uni-BH Inconfidentes foi lacrada na quinta-feira à noite. Na sexta, soltou nota oficial dizendo que ‘estranha tal ato extremo’, ‘sem direito a defesas prévias e prazos de regularização’.


Perseguição 3 A assessoria de Hélio Costa nega. Diz que o ministério apenas enviou à Anatel denúncia de irregularidade que recebeu. E que a Anatel descobriu um link entre o estúdio e o transmissor, o que não é permitido para esse tipo de estação.


Férias Fabiano Augusto, garoto-propaganda das Casas Bahia, está fora da atual campanha da rede na TV, de caráter mais institucional. Mas ele vai voltar. E aproveita a folga para ‘descansar a imagem’.


Velório Com os dias contados, o ‘Tudo a Ver’, da Record, está usando cenário virtual. É que o estúdio do programa foi ocupado por 15 carros que serão sorteados numa promoção para atrair audiência para ‘Cidadão Brasileiro’.’


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O Globo


Segunda-feira, 13 de março de 2006


JORNALISMO & CINEMA
Joaquim Ferreira dos Santos


Vampirizar Capote


‘Truman Capote acabara de escrever seu célebre diálogo com Marilyn Monroe, aquele em que tentava erguer a voz acima dos gritos das gaivotas no píer de Nova York e se perguntava, dias depois daquela menina linda ter se suicidado, por que a vida precisa ser sempre essa merda colossal. Estava deprimido. Bêbado. Truman Capote era vocalmente bêbado. Tinha a voz trôpega como uma foca Disney atrapalhada num trigal, uns ganidos afinados em mi como se antecipasse em meio século um quadro de bicha do ‘Zorra Total’. Quando tirava a capa da máquina de escrever, virava bicho. Transformava-se no maior escritor da América, o leão sagaz que em seguida colocaria no papel as linhas fundamentais para a formação de todos os jornalistas das próximas gerações. Desta vez, no PJ Clark’s, Truman Capote mostrava não só a voz, mas o corpo trôpego. Tremelicavam-lhe todos os pêlos. Quem quer que estivesse uma dezena de mesas depois, para o norte ou sul de Manhattan, sabia. Capote tinha motivos para deixar subitamente calada, em banho-maria dentro de si, a costumeira doidivana-fofoqueira das colunas sociais. Um estafeta havia jogado com ares burocráticos, e em seguida pediu para o escritor autografar o certificado de entrega da correspondência, uma sentença de morte sobre sua mesa no bar. Não era outra gracinha de Marlon Brando. O ator mais macho de Hollywood ameaçava transformar Capote num suflê Furstenberg desde o perfil ‘O duque em seus domínios’, quando, já no primeiro parágrafo, o selvagem da motocicleta, jogado num sofá de hotel em Kyoto, confessava a Capote que as japonesas o matavam – ‘e os guris também’. Desta vez não era o ódio do macho pedindo errata dos dotes de sua virilidade na próxima edição. Era o bafo da morte chegando apodrecido após uma longa viagem postal. Os pêlos de Capote tremelicavam com razão.


Sozinho com suas gotas de lavanda inglesa, seus botões de madrepérola, ele comia um hambúrguer de três dedos de altura. Havia migalhas no tampo da mesa. Moscas-varejeiras em verde e azul recolhiam o que podiam do chão. Uma dúzia de farelos emporcalhados, besuntados pela gordura, salpicava de amarelo as linhas do terno de riscas de giz do autor de ‘Ouvem-se as musas’, mestre supremo em deixar que ficção ou não-ficção, real ou imaginação, ficasse tudo com a mesma deliciosa cara. Ketchup, mostarda no punho da camisa, Capote não estava nem aí. Não há pose possível quando acabou de ser anunciada a morte próxima. O garçom que sempre lhe atendia no salão dos fundos do PJ, um negro alto, chamava-se Marcel Proust – mas também não havia espaço para risinho cinco minutos depois de um envelope de aparência banal ter cravado em seus olhos a informação crua. Prepare-se. Já era. Perdeu. Como dizia o namorado brasileiro: apanhei-te, cavaquinho.


A última história publicada por Capote na revista ‘New Yorker’ era o relato, escrito em forma de diálogo, sobre um serial killer que já havia riscado dez pessoas do mapa de uma pequena cidade do Oeste. Agora, ali no boteco de intelectuais que ganhava pátina do tempo para servir de cenário a Woody Allen décadas depois, era a vez de ele receber o mesmo pequeno embrulho daqueles tristes mortos. A estrela da não-ficção virava coadjuvante no ritual de um criminoso difícil de imaginar. Dentro do envelope vinha um caixão de madeira e, dentro do caixão de madeira, a foto da vítima – no caso aquela escandalosa feita por Cartier-Bresson, uma peça de primor gay, com Capote esparramado num banco de jardim, publicada na contracapa de ‘Other voices, other rooms’. O primeiro a receber o caixão, um fazendeiro, dias depois abriu o carro e não teve tempo de gritar ‘shit’ quando nove cascavéis caíram do teto famintas de carne azeitada com sangue. Uma mulher, a oitava, morreu afogada. Truman Capote havia acabado de publicar essa história em ‘Caixões entalhados à mão’, um daqueles contos-reportagens que mudariam para sempre o texto de todos que estivessem interessados no circuito entre a literatura e o jornalismo. Era sua vez de receber o mimo fúnebre e, ei, Proust, mais uma vodca, aguardar como os outros o desfecho que o bandido, diretor de cena, havia desenhado para seus dias.


Truman Capote tinha medo de sapos reais em jardins imaginários e do som dos passos caminhando pelos corredores da mente. Julgava-se culpado pela morte de Perry Smith, assassino da família Clutter, a quem seduziu e abandonou depois de ter recolhido a história de ‘A sangue frio’. Também achava que podia ter salvado Marilyn Monroe de ser apenas a piranha morta na cama dos Kennedys. Essas velhas paranóias juntavam-se agora ao caixão na mesa do PJ e ele fez imediatamente o que lhe era de costume nessas horas de aflição. Refrescava os olhos e o fundo do poço que eles iluminavam com o espelho negro guardado no bolso do blazer. Van Gogh e Renoir tinham o truque, necessidade técnica entre os pintores – e se houve alguém capaz de pintar com palavras, este pincel é de Truman Capote.


Era um recuerdo dado por uma negra aristocrática da Martinica. Durante a apuração do conto-reportagem ‘Música para camaleões’, ela entregou a Capote o espelho escuro que Gauguin usava para descansar os olhos da extravagância de suas musas multicores. Capote lançava mão do presente nos momentos em que precisava mergulhar a alma em algum bálsamo aconchegante. Do mesmo jeito que os gourmets reavivavam o palato com um sorbet de citron entre os pratos, os pintores enxugavam no vidro preto os olhos das cores anteriores. Truman Capote, Alice-no-país-das-maravilhas do novo jornalismo, usava o espelho profundo para sintonizar o nada e esconder a angústia de morrer picado por uma cobra moccasin em meio ao próximo gole de vodca no PJ. Seria uma história espetacular, as baleias parariam de assobiar acalantos e se renderiam humildes à imaginação daquela trama. O escritor morto pela própria história. Só de pensar que Norman Mailer, o arqui-rival, pudesse reconstituí-la na ‘Esquire’, deixava Capote nauseabundo, com vontade de tomar pílulas e antecipar, sem glamour, o trabalho das minhocas venenosas … – mas, sorry , era só um pesadelo de estilo, brincadeira de um cronista do futuro. Um mané-joaquim qualquer tinha acabado de ver o filme sobre o escritor, relido a história dos caixões e as outras da nova edição de ‘Música para camaleões’. Embaralhou tudo e mais uma vez, como dezenas de outros de sua geração, tentou vampirizar Capote em seu estilo genial. Não conseguiu. Continuaria tentando.’


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Agência Reuters


Segunda-feira, 13 de março de 2006


MÍDIA NA COPA
Mark Ledsom


Fifa libera publicação de fotos da Copa na internet


‘BERN, Suíça (Reuters) – A Fifa deixou de lado seus planos de restringir o uso de imagens da Copa do Mundo em sites de jornalismo na internet, após uma reunião entre o presidente da entidade, Joseph Blatter, e o chefe da Associação Mundial de Jornais (WAN, na sigla em inglês), Timothy Balding.


Em comunicado divulgado pela Fifa nesta segunda-feira, Blatter afirmou que fotografias de órgãos de imprensa credenciados podem ser usadas imediatamente, da mesma forma como os textos.


‘Entendemos que a publicação de imagens e textos devem ser tratadas da mesma maneira para que se mantenha uma política transparente de informação que respeite a liberdade de imprensa’, disse Blatter. ‘Estou satisfeito que conseguimos retificar a posição anterior e reconhecer os pedidos justificados da WAN.’


A Fifa havia inicialmente determinado que o número de fotos nos sites da internet seria limitado. Além disso, as fotos não poderiam ser publicadas com menos de duas horas após o encerramento da partida.


A WAN, representando os jornais afiliados e uma série de agências de notícias, incluindo a Reuters, argumentou que esta decisão interferia na liberdade de reportagem da imprensa.’


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