Wednesday, 15 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Veja

CAMPANHA
Alexandre Oltramari

Ele agora cobra 12 milhões

‘Desde que ajudou a eleger o presidente Lula, em 2002, uma maldição se abateu sobre o publicitário baiano José Eduardo Cavalcanti de Mendonça, o Duda Mendonça. Supersticioso e excêntrico, mas celebrado como um mago das urnas até pelos adversários mais críticos, Duda foi preso dois anos depois da eleição acusado de participar de um campeonato de briga de galos – hobby ilegal que ele praticava no Rio de Janeiro, mas que era pinto diante do que estava por vir. Em 2005, em depoimento à CPI que investigou o escândalo do mensalão, Duda admitiu a participação em um crime muito mais grave. Ele confessou ter recebido 10,5 milhões de reais do PT em uma conta clandestina nas Bahamas, como parte do pagamento pelo trabalho na campanha do presidente Lula. Supostamente decepcionado com a sujeira na política e réu por lavagem de dinheiro e evasão de divisas, Duda, na época, prometeu abandonar as campanhas eleitorais, mas logo mudou de ideia. Após ensaiar um retorno como consultor em 2006, o marqueteiro elegeu 2010 o ano de sua volta ao mundo das refregas eleitorais. Duda já se insinuou para dois presidenciáveis (Dilma Rousseff e Ciro Gomes), negocia com sete candidatos a governador e já está trabalhando para um deles. Entre os que pagarão pelos seus talentos deve figurar até mesmo o presidente da CPI que o investigou, o senador petista Delcídio Amaral.

O marqueteiro só não voltará na crista da onda porque foi vetado pelo presidente Lula para comandar a campanha de Dilma Rousseff, com quem chegou a se encontrar no fim do ano passado. Sua área de influência, porém, está longe de ser desprezível, e seu passe, apesar de todos os problemas, parece que só se valorizou depois do escândalo. O pacote de campanha estadual está sendo oferecido por 12 milhões de reais – o dobro do que cobram outras estrelas do ramo e muito mais do que custou oficialmente a campanha presidencial de 2002 (7 milhões de reais). Há duas semanas, Duda esteve no Maranhão gravando os comerciais regionais do PMDB. O trabalho já é parte do pacote negociado com a governadora Roseana Sarney, que disputará a eleição em outubro. Caro? ‘Não conheço os valores porque a contratação foi negociada pelo partido. O governo não tem nenhuma relação com essa negociação’, garante o secretário de Comunicação de Roseana, Sergio Macedo. Ninguém disse que tinha, mas, numa de suas idas ao Maranhão para acertar detalhes da contratação, Duda foi recebido pelo próprio Sergio no palácio do governo. Explica o secretário, que, por alguns segundos, sofreu de um lapso de memória: ‘Reunião?… Ah!, É verdade. Mas ele veio aqui por outros motivos. Duda tem amigos no Maranhão, e nos encontramos só para bater papo’.

O processo de fusão entre a política e a polícia tem atrapalhado um pouco o retorno de Duda Medonça ao Olimpo das campanhas eleitorais. Um dos primeiros clientes a fechar com o marqueteiro, o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, foi preso em fevereiro passado. Com o mandato cassado, ele não poderá concorrer à reeleição. Outro empecilho é o valor de seus honorários. No Pará, a governadora Ana Júlia Carepa, que disputará a reeleição em outubro, tentou contratar Duda, mas desistiu quando viu a conta salgada. O senador Marconi Perillo, do PSDB, candidato ao governo de Goiás, tomou um susto quando Duda lhe apresentou o custo de seus préstimos. Os dois almoçaram recentemente em Brasília. ‘Ele tem ideias muito interessantes, mas ainda não há nada definido’, explica o tucano. Duda também está negociando com os candidatos ao governo Zeca do PT, de Mato Grosso do Sul, João Alves, de Sergipe, Gim Argello, do Distrito Federal, Paulo Skaf, de São Paulo, e José Fogaça, do Rio Grande do Sul. Se for bem-sucedido, espera faturar 84 milhões de reais em sete eleições para governador.

A campanha mais curiosa que Duda está prestes a comandar é a do senador Delcídio Amaral, do PT de Mato Grosso do Sul. Em 2005, quando Duda revelou ao país que recebeu dinheiro ilegal do PT, Delcídio Amaral estava sentado ao seu lado. O senador era o presidente da CPI dos Correios, cuja investigação levou ao indiciamento de Duda por sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. ‘Há uma negociação para o Duda ser o marqueteiro de uma chapa que inclui governador e senador. Como eu sou o candidato ao Senado, ele inevitavelmente seria o marqueteiro da minha campanha também’, explica Delcídio Amaral. Algum constrangimento em razão das proezas de Duda Mendonça reveladas pela CPI, senador? ‘Absolutamente. Apesar do que aconteceu, Duda é reconhecidamente um publicitário brilhante. Além disso, nas reuniões que já tive com ele, Duda sempre fez questão de deixar claro que as coisas serão feitas com a mais absoluta transparência.’’

 

LÍNGUA
Nataly Costa

A multiplicação das palavras

‘No sábado 10, o programa de TV Caldeirão do Huck exibiu a etapa final de um de seus quadros fixos, o Soletrando. Nele, estudantes de 5ª a 8ª série devem provar seus conhecimentos da língua portuguesa ao soletrar palavras sorteadas. O vencedor leva 100 000 reais. O estudante mineiro Daniel Coutinho, de 13 anos, perdeu o prêmio por pouco. Atrapalhou-se ao soletrar a palavra kirsch, nome de um tipo de aguardente à base de frutas. O termo é alemão, mas, por encontrar-se difundido entre os apreciadores de bebidas no Brasil, figura como verbete no Aurélio, dicionário da língua portuguesa que serve de base para a competição. O episódio ilustra uma mudança profunda ocorrida nos últimos tempos na forma de incorporação de palavras estrangeiras ao português falado no Brasil. Antes, os vocábulos estrangeiros só eram dicionarizados depois de ter seu uso consagrado entre os brasileiros por pelo menos uma década. Hoje, a população adota uma quantidade crescente de palavras estrangeiras – e os dicionários correm para transformá-las em verbetes, sob o risco de se tornarem obsoletos. Diz Valéria Zelik, editora do Aurélio: ‘O idioma já teve mais tempo para adquirir novas lexias. Atualmente, a velocidade das informações vindas de diversas áreas do conhecimento é algo impressionante, e elas trazem novos vocábulos’.

Para se ter uma ideia da agilidade desse processo de transformação da língua, os editores dos dicionários Aurélio, Houaiss e Larousse usam um programa de computador desenvolvido para pesquisar continuamente palavras estrangeiras que aparecem nos jornais, revistas e sites brasileiros. Quando o uso de uma palavra se torna frequente, é sinal de que pode ser a hora de dicionarizá-la. A ideia de que é preciso aportuguesar os vocábulos estrangeiros, segundo os especialistas, está ultrapassada. O que determina o aportuguesamento ou não de palavras estrangeiras é a forma como a população se familiariza com elas. De acordo com a lexicógrafa Thereza Pozzoli, da equipe do dicionário Larousse, alguns vocábulos, graças à semelhança com a morfologia e a fonética brasileiras, são adaptados para o idioma com naturalidade. É o caso de blecaute, ateliê, quiosque e surfe. Outros termos mantêm a forma do idioma original, como marketing, design e réveillon. Há palavras aportuguesadas que figuram no dicionário, mas não vingam no dia a dia, como esqueite (skate) e leiaute (layout). ‘Nem sempre optamos pelo aportuguesamento, pois o uso do vocábulo em sua língua original se mostra preponderante’, explica Renata Menezes, da equipe do Aurélio.

A multiplicação das palavras estrangeiras no português pode apavorar os puristas do idioma, como o deputado Aldo Rebelo, cuja luta para proibir os estrangeirismos no país já se tornou folclórica. Para estes, o exemplo a ser seguido é o de Portugal, que tenta traduzir tudo para a língua nativa – o mouse do computador, por exemplo, é chamado de rato. Os grandes linguistas brasileiros, contudo, concordam que os termos estrangeiros servem para enriquecer o idioma, não para prejudicá-lo. ‘Se o estrangeirismo fosse nocivo, a própria língua trataria de expulsá-lo’, pondera o gramático Evanildo Bechara, da Academia Brasileira de Letras.

A história mostra que é da natureza dos idiomas incorporar vocábulos estrangeiros e que, nesse processo, eles evoluem. Na Idade Média, a língua portuguesa contava com apenas 15 000 palavras. Hoje, são mais de 400 000, muitas delas importadas, através dos séculos, do árabe, do italiano, do francês e do inglês. O linguista americano Noah Webster (1758-1843), considerado ‘o pai da educação’ em seu país, costumava lembrar que o idioma vive e pulsa no dia a dia da população, e não nos gabinetes dos intelectuais. Dizia ele: ‘A língua não é uma construção abstrata dos sábios, ou dos dicionaristas. Ela nasce do trabalho, das necessidades, das relações humanas, das alegrias, afeições e experiências de muitas gerações’. O termo alemão kirsch, que derrubou o estudante Daniel Coutinho na TV, poderá um dia soar natural para seus filhos.

Língua viva e veloz

No passado, os dicionaristas esperavam dez anos para verificar se uma palavra estrangeira fora adotada plenamente no país. Hoje, com a rapidez com que os estrangeirismos são incorporados ao português, esse prazo é de um ou dois anos. A seguir, vocábulos que serão incluídos na próxima edição do Dicionário Aurélio*

Tecnologia

Smartphone – Celular com alguns recursos de computador

Pop-up – Janela que se abre em página da internet para propaganda

MP3 – Forma de compactação de arquivos de áudio

Antispam – Programa que previne publicidade eletrônica não solicitada

Bluetooth – Tecnologia para conectar dispositivos sem o uso de cabo

Gastronomia

Blanquette– Guisado de carne branca

Chutney – Tipo de geleia de origem indiana

Muffin – Pão fofo doce assado em pequenas fôrmas

Sashimi – Prato da culinária japonesa que consiste em fatias de peixe cru

Bock – Tipo de cerveja adocicada e de teor alcoólico forte

Pierogi – Prato da culinária polonesa que consiste em pastéis cozidos com diversos tipos de recheio

Comportamento/Esportes

Bullying – Violência psicológica ou física praticada repetidamente

Antidoping – Tipo de exame que busca identificar substâncias de uso proibido no sangue dos atletas

Barwoman – Mulher que prepara drinques profissionalmente

Off-road – Diz-se de veículo próprio para trafegar em terrenos acidentados

Brake-light – Luz de freio dos veículos

 

TELEVISÃO
Marcelo Marthe

Fracassos modernos

‘O noveleiro Bosco Brasil passou os últimos dois meses enfurnado em seu apartamento, no Rio de Janeiro, no meio de uma batalha inglória: a busca de uma salvação para a periclitante Tempos Modernos, seu primeiro trabalho como autor principal na Globo. Ao estrear, em janeiro, Tempos Modernos se anunciava como um folhetim inovador – mais um daqueles flertes com a experimentação nos quais a Globo às vezes se lança na novela das 7. O edifício ‘inteligente’ em que se passa a história seria uma entidade com vida própria sob comando de Frank, um computador. O núcleo dos roqueiros dava pretexto para pontuar o enredo com referências à música pop e aos gibis. Até agora, porém, o resultado é um vexame idêntico ao de antecessoras que também apostavam em fórmulas pretensamente transgressoras, como As Filhas da Mãe (2001), narrada em ritmo de rap, ou Bang Bang (2005), ambientada em um Velho Oeste de fancaria. Tempos Modernos amarga os piores índices de audiência do horário na década. Lançada após a bem-sucedida Caras & Bocas, a novela registrou pífios 22,8 pontos de média na Grande São Paulo em seus oitenta capítulos iniciais; a Globo esperava ao menos 30 pontos. O sucesso de Walcyr Carrasco era estrelado por uma macaca-pintora – sua substituta, em compensação, tem um computador que se revelou um verdadeiro mico.

Em suas sondagens com donas de casa, a Globo constatou o óbvio: cheia de pedantismos modernosos, a trama não tinha os ingredientes essenciais a um melodrama. Frank – um genérico de Hal 9000, o computador do filme 2001 – Uma Odisseia no Espaço (1968) – revelou-se um penduricalho sem graça que só dificultava a identificação do público com seu mentor, o magnata Leal (Antonio Fagundes). Decidiu-se, então, silenciar o computador, que perdeu a fala depois de ser contaminado por um vírus. Seu dublador, Márcio Seixas – que, nos anos 70, deu voz a Hal 9000 –, pode perder o emprego. ‘Faz tempo que não gravo. É triste’, diz. (Fagundes, ao contrário, deve estar numa alegria só: o ator andava constrangido de dialogar com as paredes.) Além da poda de firulas tecnológicas, investiu-se mais nas tramas românticas. Até Deodora, a vilã robótica interpretada pela ex-Big Brother Grazi Massafera, começou a se ‘humanizar’. Apaixonada pelo personagem chatonildo de Felipe Camargo, já mostra até sinais de remorso. Aparentemente, as telespectadoras não gostaram de ver a atriz afastar-se do costumeiro figurino de boa moça. Grazi, aliás, anda com pé-frio. Estreou como mocinha em Negócio da China (2008), a mais malfadada trama das 6 dos últimos anos. E agora vive sua primeira antagonista no fracasso da década.’

 

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