Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A linguagem fascista de Mussolini a Bolsonaro em livro de professor da UFSCar

(Foto: Arquivo Pessoal)

Carlos Piovezani é professor do Departamento de Letras da Universidade Federal de São Carlos. Pesquisador do CNPq nas áreas de Análise do discurso e Retórica, tem uma série de publicações que tratam do discurso político, da fala pública e de suas relações com saberes e poderes em diversos contextos históricos. É autor dos livros História da fala pública: uma arqueologia dos poderes do discurso (Vozes, 2015), em conjunto com o Professor Jean-Jacques Courtine, da Universidade Sorbonne Nouvelle, e A voz do povo: uma longa história de discriminações (Vozes, 2020). E, agora, lança, pela editora Hedra, “A linguagem fascista”, em coautoria com o Professor Emilio Gentile, da Universidade La Sapienza de Roma. A obra analisa as principais características da linguagem fascista, tanto no contexto de seu surgimento com o fascismo na Europa, a partir dos anos 1920, quanto nas manifestações contemporâneas do discurso da extrema direita no Brasil.

Carlos concedeu uma entrevista por e-mail ao Observatório da Imprensa em que discute a temática de seu novo livro e o papel da imprensa na normalização dessa linguagem. 

Pergunta: Como surgiu a ideia de fazer um livro sobre a linguagem fascista?

A ideia inicial do livro derivou da publicação de dois outros livros: o História da fala pública: uma arqueologia dos poderes do discurso (Vozes, 2015) e o A voz do povo: uma longa história de discriminações (Vozes, 2020).

No primeiro, há capítulos dedicados à longa história da fala pública, desde a Grécia Antiga, passando pela Europa Moderna e pelo Brasil colonial, até a sociedade brasileira contemporânea. Mas, faltava um capítulo consagrado à fala pública dos oradores fascistas, entre os quais, principalmente, Hitler e Mussolini. Identificada essa falta, o Prof. Marc Angenot, da Universidade McGill, do Canadá, quando de uma de suas vindas à UFSCar, me fez a seguinte oferta: contactar um amigo italiano, um dos maiores especialistas na história do fascismo em todo o mundo, para lhe encomendar um texto que tratasse dos discursos de Mussolini. Foi assim que o Prof. Emilio Gentile, da Universidade La Sapienza de Roma, cerca de um ano mais tarde, me enviou esse seu texto inédito dedicado ao exame do Mussolini orador.

Por outro lado, entre o final de 2018 e o começo de 2019, produzi um texto sobre os pronunciamentos eleitorais de Bolsonaro feitos na campanha à presidência da República. Esse texto foi publicado sob a forma de um artigo em uma revista especializada de Barcelona.

A partir daí, enquanto eu traduzia o texto do Prof. Gentile, do italiano para o português, me ocorreu expandir meu texto sobre os discursos de Bolsonaro, seguindo um caminho semelhante àquele seguido por Gentile: acompanhar a trajetória de Bolsonaro, desde sua entrada na vida pública como vereador no Rio de Janeiro, passando por seus vários mandatos como deputado federal, até sua chegada à presidência da República, por meio de seus pronunciamentos e de seus desempenhos oratórios. Foi assim que me dei conta de que a linguagem de Bolsonaro conjuga elementos da retórica populista com usos linguísticos típicos de um neofascismo.

De posse dos dois textos, me restava ainda cobrir as características de linguagem de Hitler e dos nazistas. Fiz isso a partir da leitura de uma série de livros, entre os quais, principalmente, o “LTI. A linguagem do Terceiro Reich”, de Victor Klemperer, o “Introdução às linguagens totalitárias”, de Jean-Pierre Faye, e o “Fascismo eterno”, de Umberto Eco. Com base nessas e em outras leituras, redigi uma longa introdução para o livro, justamente intitulada “A linguagem fascista”. Nessa introdução, exponho as principais características da linguagem fascista, elaboro comparações entre ela, o populismo e a demagogia e advirto os leitores da necessidade de compreendermos essa linguagem para que possamos mais bem identificá-la, criticá-la e desconstruí-la.

Além disso, também pensei em complementar o A voz do povo: uma longa história de discriminações, que publiquei no ano passado pela editora Vozes. Uma vez que nele eu analisei as discriminações sofridas pela fala popular, desde a Grécia e a Roma antigas até o Brasil contemporâneo, me surgiu a ideia de estender a compreensão para outros discursos que também reduzem, manipulam e/ou excluem a participação política dos sujeitos das camadas populares. Isso exigia examinar não só a retórica populista e as falas demagógicas, mas também a linguagem fascista.

Pergunta: Como podemos definir a linguagem fascista?

A linguagem fascista se define fundamentalmente por se tratar da linguagem humana que pretende calar a linguagem humana. Fascistas e neofascistas falam da pureza da raça ou das pessoas de bem para calar a crítica que lhes poderia ser dirigida e para calar e, até mesmo, eliminar a diversidade das formas de vida em uma sociedade. Embora não faça de modo exclusivo, a linguagem fascista fala principalmente às massas populares, que são, de fato, menosprezadas pelos fascistas, para tentar conduzir e calar o povo e seus porta-vozes e para tentar fazê-los apoiar políticas que os desfavorecem. Seu traço mais característico é a violência tanto nas coisas que diz quanto nos modos de dizê-las. Assim, a linguagem fascista fala para justificar e fomentar o aniquilamento do outro, seja ele adversário ou apenas diferente, mas sempre transformado em inimigo. A título de exemplo, pensemos nos discursos de Bolsonaro. Em A linguagem fascista, demonstramos que eles não são apenas racistas, misóginos, homofóbicos e negacionistas, mas também que incitam à violência contra oponentes políticos e grupos sociais marginalizados e que têm um profundo desapreço pela vida humana.

Pergunta: Depois de indicar uma série de características da linguagem fascista na introdução do livro, há um capítulo dedicado aos pronunciamentos de Mussolini e outro aos discursos de Bolsonaro. Por que foram esses os personagens escolhidos para tratar da linguagem fascista?

A escolha de Mussolini e de Bolsonaro se deve ao fato de que o primeiro é o precursor e o maior representante do fascismo mundial, ao passo que o segundo é o líder populista contemporâneo que mais se aproxima do fascismo em todo o mundo. Mussolini, portanto, é uma exigência incontornável, em termos absolutos, porque foi Duce fascista por excelência, e em termos relativos, porque muitas de suas práticas foram mimetizadas por Hitler. Já Bolsonaro é um “fascista wannabe” (em tradução livre: um “quero ser fascista”), na designação do historiador Federico Finchelstein, grande especialista na história do fascismo.
Mas, além disso, como eu disse, o livro também trata da linguagem empregada por Hitler e pelos nazistas.

Pergunta: Há outros líderes políticos que se utilizaram da linguagem fascista?

Sim, os dois maiores expoentes do fascismo e do nazismo mundiais e, portanto, também de suas linguagens foram Mussolini e Hitler. Mas, o fascismo teve outros líderes importantes na Europa, no Brasil e em outros lugares do mundo. Na Europa, Franco, na Espanha, e Salazar, em Portugal, foram líderes fascistas. No Brasil, o fascismo não chegou ao poder na década de 1930, mas se configurou como um forte movimento político, chamado Integralismo. Seu líder era Plínio Salgado. Sua capacidade de linguagem e sua oratória também eram notáveis. Sua ascensão ao poder fora, contudo, barrada, porque havia um Getúlio Vargas no meio do caminho…

Para quem se interessar por esse movimento fascista brasileiro, recomendo os livros de João Fábio Bertonha e, para uma leitura mais amena, o livro Fascismo à brasileira, de Pedro Doria.

Pergunta: Essa linguagem está de volta em nosso atual momento político?

Há atualmente no Brasil e em vários lugares do mundo uma ascensão da extrema-direita. Nessa ascensão, os usos da linguagem desempenham um papel fundamental. Os líderes políticos da extrema-direita valem-se de uma retórica populista e demagógica, à qual agregam ora mais ora menos uma linguagem fascista. Nesse caso, seus discursos expõem a violência anunciada como fator de regeneração social, a perseguição e a segregação de grupos fragilizados, a mobilização exponencial das mentiras e o flerte com as ditaduras. Tudo isso expresso em pronunciamentos cujos modos de dizer são também muito enérgicos, quando não, mesmo violentos, na tentativa de produzir efeitos de autenticidade pessoal e de identidade grupal, de coragem e de virilidade.

Pergunta: O Como você vê a relação entre a linguagem neofascista da extrema direita brasileira e a cobertura jornalística que se faz dela? O jornalismo poderia ter sido mais crítico nesse processo?

Para tentar responder mais ou menos satisfatoriamente à sua questão, é preciso fazer duas considerações. A primeira consiste em ponderar a diferença grosso modo entre dois contextos distintos: o que se estende mais ou menos do pós manifestações de junho de 2013 até o começo do governo Bolsonaro e o que se estabelece desde então até hoje. Essa primeira consideração é importante para pensarmos no fato de que grandes veículos da imprensa brasileira foram indiferentes à ascensão dos discursos de ódio da extrema direita no Brasil naquele primeiro momento. Em algumas circunstâncias, muitos jornalistas desses veículos não só foram indiferentes a esse risco, mas também foram condescendentes e deram até mesmo demonstrações de apoio aos movimentos e às manifestações com potencial violento. Relembremos somente de dois exemplos, que menciono de passagem em A linguagem fascista, quando reflito sobre essa relação entre o crescimento da extrema direita violenta e a cobertura jornalística: o jornal Estado de São Paulo publicou no dia 08 de outubro de 2018 um famigerado editorial intitulado “Uma escolha muito difícil”, no qual equiparava Bolsonaro e Haddad. Já a Jovem Pan em texto intitulado “Bolsonaro fala em ‘marginais vermelhos’, PT veste a carapuça” não só atenuou a violência contida nas declarações de Bolsonaro, quando ele anunciou num atroz pronunciamento eleitoral a perseguição de oponentes políticos e insinuou seu extermínio, mas também as defendeu: “Claro que a frase seguinte, ‘Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria’, era desnecessária e inadequada, porque o banimento da pátria soa autoritário, mas Bolsonaro, além de usar um termo genérico sem individualização, nem sequer disse que ele próprio banirá os marginais, mas que os marginais serão banidos.” (o grifo é meu). Além disso, ainda nesse período, não poucos formadores de opinião direta ou indiretamente por meio desses veículos da grande imprensa ecoaram e difundiram a alucinação de que governos e candidaturas da esquerda, em geral, e do PT, em particular, representavam uma ameaça comunista, conforme fora feito em vários outros contextos da história brasileira. Isso é chamado de “anticomunismo preventivo” por Lincoln Secco, num texto como o mesmo título publicado no site “A terra é redonda”. Portanto, não há dúvidas de que uma cobertura jornalística menos interessada em detratar as esquerdas e mais preocupada em combater os excessos autoritários e violentos do bolsonarismo e afins teria desempenhado um papel importantíssimo na barragem das catástrofes sanitárias e das atrocidades políticas a que temos assistido nos últimos tempos. Esse jornalismo poderia e deveria ter sido mais crítico e menos partidário ao logo desse processo. Se, desde já há algum tempo, cada um pode ser ou se imaginar como um criador de conteúdos, com seu celular, o que se diz, o que se cala e as formas de dizer dos grandes veículos ainda têm um grande poder de formação de opinião pública e de legitimação das ideias, das crenças e até mesmo das alucinações que circulam na sociedade.

Minha segunda consideração diz respeito exatamente à distinção entre esse e outros jornalismos alternativos que surgiram e/ou se consolidaram mais ou menos recentemente. Essa outra tendência jornalística cumpriu como pôde e heroicamente seu papel, em meio a uma espiral de silêncio que recrudescia no Brasil diante do quase consenso a propósito do que se considerava ser a corrupção do PT, a culpa de Lula, a incompetência de Dilma e a inconsistência de Hadadd, juntamente com a decadência ética, o declínio moral e a degeneração sexual que estariam nos arruinando. Não é fácil ser crítico e resistente num contexto tão adverso. Mas, mesmo assim, houve muitos jornalistas e formadores de opinião em sites, blogs, comunidades e perfis minoritários em redes sociais etc. que não se furtaram à crítica e à resistência.

Para finalizar, gostaria de destacar o seguinte: uma das conclusões fundamentais do capítulo que dediquei aos discursos de Bolsonaro, é a de que a indiferença, a condescendência e a ausência de sanções legais foram decisivas para a escalada do discurso de ódio da extrema direita e do bolsonarismo. Nesse processo, por omissão ou conveniência, repetindo, e alterando-os para mais bem conservá-los, tristes padrões da história brasileira, setores da imprensa, da religião, da política e da justiça foram e continuam a ser responsáveis pelo terror sanitário e pelo horror político que está destruindo cada vez mais um projeto civilizatório de Brasil esboçado principalmente desde a Constituição de 1988.

Pergunta: A partir do pós-guerra foram criados mecanismos de comunicação e política para de alguma forma limitar a expansão dos discursos autoritários. Você considera que nos últimos anos esses mecanismos parecem menos eficazes em atingir seu objetivo?

Em todos os contextos históricos tomados como amplamente democráticos, tais como a democracia grega e a república romana na Antiguidade e a assembleia na Revolução francesa, todos eles muito afeitos à liberdade de expressão, sempre houve controle ora mais ora menos institucional das coisas que poderiam ser ditas. Nem sempre foi uma tarefa fácil estabelecer até onde se estendem os limites da liberdade de expressão e onde começam os discursos de ódio e as incitações à violência. Por isso, é que os estados democráticos de direito costumam se valer de legislações que interditam esses discursos e essas incitações. Mas, nem tudo se resume à lei. Há ainda as dificuldades de sua aplicação e, ainda mais profundamente, há o crescendo de aceitação dos discursos odiosos e violentos em diversas sociedades contemporâneas. Não houve nem haverá um estado democrático perfeito e absoluto. A democracia exige lutas e reconfigurações constantes para a conquista, para a manutenção, para a consolidação e para novos avanços de valores e ideais igualitários e libertários. A emergência e os usos cada vez mais amplos e difundidos das redes sociais exigem novos e decisivos passos rumo à aquisição, ao fortalecimento e aos progressos desses valores e ideais.

Pergunta: Qual a relação entre a proliferação das redes sociais e os discursos de ódio? 

As paixões negativas extremas, tal como o ódio, tendem a cegar ou a fazer ver sob prisma favorável suas próprias práticas e como inócuas, prejudiciais ou insuportáveis as alheias. A pertença real ou imaginária a um grupo e a possibilidade de ser ouvido e reconhecido como um dos seus fazem com que a adesão praticamente cega a narrativas falsas e fantasiosas ocorra sem maiores dificuldades. Além da fé cega e da faca amolada digital nas mãos de milhares de anônimos, há ainda o cinismo de membros de elites econômicas, políticas e religiosas, em particular, adeptos e representantes da extrema-direita violenta. Tudo isso somado produz uma poderosíssima força de crença.

Em A linguagem fascista, afirmo que as redes sociais e as empresas de Big Data, tal como a Cambridge Analytica, proporcionam uma politropia hitech. Desde os retores e os sofistas na Antiguidade, já se sabia que discursos segmentados e dirigidos a públicos específicos são mais persuasivos do que os demasiadamente genéricos e destinados a públicos indistintos. A propaganda fascista e nazista se valeu desse recurso, aproveitando-se bastante não apenas de circunstâncias diversas de pronunciamentos dos líderes políticos, mas também e fundamentalmente do rádio e do cinema para fazê-lo. Em nossos dias, com enormes bancos de dados à sua disposição e com a possibilidade de endereçar mensagens muito singulares, específicas e eivadas de crenças agudas e de fortes paixões, os representantes da extrema-direita têm em suas mãos um arsenal poderosíssimo de difusão de discursos de ódio, de perseguição e de incitação à violência. Eles não têm economizado no uso dessas destrutivas armas simbólicas. Antigos e recentes processos e episódios, antigas e recentes práticas e ideias da história brasileira, de extensão e de intensidade distintas, entre os quais mais de três séculos de escravidão, mais de cinco séculos de exclusão e extermínios de negros, de indígenas, de empobrecidos, de homossexuais e de outros tantos marginalizados, várias décadas de massacres a movimentos sociais e de ditaduras, foram recalcados, foram falsa e convenientemente diminuídos e tornaram nosso solo muito fértil às sementes dos discursos do ódio, agora também lançadas com muita eficácia pelas redes sociais.

Pergunta: Hoje percebemos uma recorrência no uso do termo “fascista” para designar o discurso da extrema direita, seja na imprensa ou nas redes sociais. Você acha que há ou não um emprego indiscriminado dos termos “fascismo” e “fascista” em várias ocasiões? 

Sem dúvida, o termo foi, digamos, redescoberto e passou a ser usado com relativa frequência. Mas, isso não é privilégio de nossos dias. Ainda em 1944, o escritor inglês George Orwell já dizia que as palavras “fascismo” e “fascista” estavam por toda parte, eram usadas a torto e a direito e, com isso, perdiam “o último vestígio de um significado”. Porém, devemos ressaltar que o uso mais ou menos indiscriminado dos termos “fascismo” e “fascista” não os descarregam de seus sentidos. Isso porque, em última instância, o que dá sentido não só a essas duas palavras, mas também todas as outras é a posição ideológica dos sujeitos que as empregam. Em todos e quaisquer empregos dos termos “fascismo” e “fascista”, sempre há um significado negativo, algo de pejorativo, certamente. Mas, a depender da posição do sujeito que usa essas palavras, eles podem corresponder a ações e a ideias bastante distintas e até mesmo opostas. Podem designar práticas racistas, misóginas e homofóbicas, por um lado e a justo título, mas também podem se referir a práticas progressistas, igualitárias e inclusivas, por outro, quando empregadas por seus adversários. Nesse sentido, o fascista sempre é o outro, o diferente, com o qual os sujeitos de um determinado grupo não se identificam, concebem como adversário e alçam à condição de inimigo. Essa indeterminação dos sentidos das palavras “fascismo”, “fascista”, mas também de “neofascismo” e “neofascista”, produz debates e dissensos mesmo entre especialistas. Isso, contudo, não significa dizer que não há mais experiências históricas e dados factuais que dão lastro para identificar o que procede ou não no uso desses termos. Muitos historiadores, filósofos, sociólogos e cientistas políticos defendem a ideia de que não se pode falar de fascismo a ser não para indicar os regimes totalitários europeus das décadas de 1920 e de 1930, uma vez que somente ali teria havido “um movimento de massas organizado militarmente, que tomou o poder e transformou o regime parlamentar em um Estado totalitário, ou seja, em um Estado com um partido único que procurou transformar, regenerar ou até criar uma nova raça em nome de seus objetivos imperialistas e de conquista”. Outros especialistas, contudo, são de opinião divergente. Eles sabem que a história não se repete, mas dizem que se pode falar de neofascismo nos contextos em que há ações e discursos nos quais, como eu disse, a violência é concebida como legítima e como fator de regeneração social, nos quais há perseguição e segregação de minorias fragilizadas, nos quais há uso muito difundido de mentiras e nos quais há apologia e aspirações à ditadura. Se no intuito de combater os horrores a que os discursos e as práticas de ódio e de extermínio já conduziram e não cessam de conduzir, houver o risco de uso excessivo desses termos, não tenho dúvida de que se trata de um risco não só aceitável, mas necessário.