Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Como se livrar de um repórter

Deputados e assessores da bancada do PT na Câmara receberam um manual do partido para orientar os parlamentares da nova legislatura em como lidar com a imprensa e também dá dicas sobre o funcionamento da Casa. O livreto é crítico em relação aos veículos de circulação nacional, chamados de “imprensa tradicional” no texto, e recomenda ao deputado falar pouco durante entrevistas, deixando nas entrelinhas que a pauta da reportagem pode ser uma “tese” na qual a direção do jornal, da rádio ou da TV querem ver comprovada de qualquer maneira.

“A pauta vale mais do que a realidade. Mesmo que o fato não corresponda a ela, acaba prevalecendo no noticiário de determinados veículos a versão previamente preparada pelas chefias ou mesmo uma fonte com interesse específico em distorcer a realidade”, diz o manual.

O documento, nominado “PT na Câmara – Guia de Funcionamento da Câmara dos Deputados e da Liderança do PT”, recomenda ao deputado distinguir o jornalista – “o trabalhador assalariado” – da empresa para qual trabalha para evitar conflitos desnecessários no relacionamento entre parlamentares e os profissionais da imprensa. Ainda assim, afirma o manual, o repórter é influenciado de várias formas pelos interesses dos que controlam os meios de comunicação.

“Normalmente, o repórter escreve a notícia a partir de uma pauta. A pauta pode partir da chefia imediata, quando o repórter tem mais possibilidade de influir, ou pode vir fechada da direção do jornal, com poucas chances de alteração.”

O texto sugere duas alternativas caso a fonte, o parlamentar petista, discorde da tese: não conceder a entrevista ou tentar derrubá-la com argumentos. “Nesse último caso, é preciso ter paciência, mas pode surtir efeito (derrubar a entrevista), especialmente nos casos mais flagrantes de distorção premeditada. Na regra, porém, prevalecem as ‘teses’ das redações.”

Para os petistas, desde 2003, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito, a imprensa tenta colocar a opinião pública contra os governos do partido, e cita que o que se viu nos últimos anos é uma população “vacinada contra manipulações”. O manual diz também que o poder da internet e das novas mídias e as redes sociais têm esvaziado o poder de manipulação da imprensa tradicional. “No caso das mídias sociais e dos blogs alternativos, o parlamentar tem chance de dar um recado mais direto, sem o filtro ideológico imposto pela grande mídia.”

Para o PT, de tudo que acontece no Congresso Nacional pouco é publicado pela grande imprensa, principalmente medidas que afetam segmentos mais pobres. “Às vezes, decisões importantes, que vão refletir o dia a dia do cidadão, ficam no anonimato. Decisões que impactam positivamente a vida das camadas mais pobres da sociedade ou são ignoradas ou, quando saem, às vezes têm um viés preconceituoso.” O partido diz que boa parte do que é publicado tem enfoque negativo e generalista.

Os principais pontos da cartilha

1 – Fale pouco, a entrevista pode ser uma tese contra você para distorcer a realidade

2 – Saiba distinguir o jornalista da empresa para qual ele trabalha

3 – Se discordar do tema não dê entrevista ou derrube a pauta com argumentos

4 – Dê preferências a blogs alternativos e redes sociais para dar um recado sem filtro ideológico

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Evandro Éboli, do Globo