Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Diário Vermelho


MST & MÍDIA
Cláudio Gonzalez


Grande imprensa promove ‘cruzada anti-MST’ após ação na Aracruz


‘O jornalista Marco Aurélio Weissheimer acertou em cheio ao afirmar que a
ação promovida na quarta-feira (8/3) pelo Movimento das Mulheres Camponesas
(MMC), ligado à Via Campesina, contra um laboratório e viveiros da Aracruz
Celulose em Barra do Ribeiro (RS) foi o ‘presente’ que a grande mídia queria
para ‘colocar suas tropas em ação’ e promover uma ampla campanha de demonização
do MST.


O próprio Weissheimer relata, em artigo publicado no site da Agência Carta
Maior, uma das primeiras iniciativas neste sentido: ‘Na noite de quarta-feira, o
programa ‘Conversas Cruzadas’, da TV COM de Porto Alegre, do grupo RBS, convidou
o governador em exercício do Rio Grande do Sul, Antonio Hohlfeldt, para discutir
o episódio. Hohlfeldt e o apresentador Lasier Martins sapatearam e dançaram em
cima do significado político da Conferência (da FAO), do Ministério do
Desenvolvimento Agrário e dos próprios movimentos sociais. Sem direito a nenhum
contraponto e sem nenhuma sutileza. Aliás, os intervalos do programa traziam
anúncios da Aracruz.’


As manchetes de primeira página e editoriais desta sexta-feira dos principais
jornais do país e a maioria dos telejornais do dia seguinte ao episódio,
seguiram a mesma toada do programa da RBS e não economizaram adjetivos
pejorativos para qualificar a atitude das camponesas militantes da Via
Campesina. Lideranças do MST foram o alvo preferencial dos ataques da imprensa,
que também procurou, o quanto pode, envolver o governo Lula na polêmica.


Em editorial com o sugestivo título de ‘Cangaço Revolucionário’, a Folha de
S. Paulo afirmou que a ação foi movida por ‘2.000 delinqüentes’, que ‘poucas
vezes se viu manifestação tão obtusa’ e ‘é com polícia e processo judicial que
se ‘dialoga’ com quem invade e destrói’.


O Estadão deu manchete de primeira página dizendo que ‘Líder do MST apóia
vandalismo’.


O conservador diário gaúcho/catarinense Zero Hora (imagem ao lado) também
colocou na primeira pagina o assunto, destacando que a ação teve influência
estrangeira, prejudicou investimentos prometidos ao Rio Grande do Sul e que as
‘mulheres invasoras debocharam dos estragos’.


O jornal O Globo foi mais comedido na cobertura do episódio. Com um sutil tom
acusatório, registrou os diversos lados. Mas, em contrapartida, abriu espaço
para que o jornalista de ultra-direita Reinaldo de Azevedo (editor do site
Primeira Leitura) ocupasse as paginas do Globo com um artigo virulento que
começa afirmando que ‘O lugar de João Pedro Stédile, o líder de um movimento
fantasma chamado MST, é a cadeia’ e chega, de forma absolutamente leviana, a
acusar o Incra de ter patrocinado e incentivado a ação no laboratório da
Aracruz.


Já o Jornal Nacional, também das organizações Globo, colocou sua ‘própria
gente’ para desqualificar o protesto e as entidades que lutam pela reforma
agrária. O ancora William Waack fez questão de imprimir um tom dramático à
narração da reportagem que destacava a ‘dor e a indignação’ da pesquisadora ‘que
teve o trabalho de duas décadas destruído num ataque dos sem-terra’. voltou à
cena do crime. ‘Ela se indignou ao ver o misto de orgulho, alegria e até
desfaçatez com que integrantes do movimento narraram a onda de vandalismo’,
disse Waack.


O Jornal da Globo também providenciou a gravação, com uma câmera escondida,
de declarações de mulheres que participaram da ação e que, para o jornalista
global, ‘se divertem ao lembrar do que fizeram’.


O coordenador do MST, João Pedro Stédile, também foi citado pela reportagem
de forma pejorativa.


A rádio CBN, uma das mais ouvidas no eixo Rio-SP, repercutiu o fato
entrevistando ninguém menos que Luiz Antônio Nabhan Garcia, presidente Nacional
da União Democrática Ruralista (UDR), concedendo-lhe mais de quinze minutos para
que desfiasse todo seu arsenal reacionário contra o MST, a luta pela reforma
agrária e o governo Lula.


Outras violências


O presidente da empresa Aracruz Celulose, Carlos Aguiar, também foi muito
procurado pela imprensa. Ao jornal Zero Hora de ontem, ele afirmou que ‘Jamais
esperava este tipo de violência’.


Aguiar e a imprensa -tão eficaz na condenação do protesto promovido em Barra
do Ribeiro talvez precisem ser lembrados que no dia 20 de janeiro deste ano, a
empresa Aracruz Celulose S/A mobilizou helicópteros, bombas, armas e 120 agentes
da Polícia Federal do Comando de Operações Táticas (COT), vindos de Brasília,
para destruir duas aldeias e expulsar 50 pessoas dos povos Tupiniquim e Guarani
de sua terra tradicional, no município de Aracruz (ES).


Sem sequer receber uma ordem de despejo, os Tupiniquim e Guarani foram
surpreendidos com o violento ataque. A ação, que resultou na prisão arbitrária
de duas lideranças e deixou outras 12 pessoas feridas, teve todo o apoio
logístico da Aracruz. Os 120 agentes da Polícia Federal receberam hospedagem e
utilizaram o heliporto e os telefones da multinacional.


Durante a ação ilegal da Polícia Federal – condenada inclusive pela Comissão
de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados -, tratores da multinacional
destruíram totalmente duas aldeias Tupiniquim e Guarani. Todas as casas foram
derrubadas e muitos índios não puderam retirar seus pertences de dentro
delas.


No noticiário das grandes empresas de mídia, não se viu nenhuma mãe
Tupiniquim ou Guarani com seus filhos chorando, nenhum ministro do governo
condenando a ação ou mesmo o dono da empresa lamentando a violência.


Mas se por aqui as grandes empresas de mídia não repercutiram o crime
cometido pelo aparelho repressor do Estado e a empresa Aracruz Celulose S/A, a
família real da Suécia resolveu vender suas ações da multinacional devido às
denúncias e fortes pressões contra a violação de direitos humanos cometidos e o
desrespeito ao meio ambiente no Brasil.


Como disse o jornalista Cristiano Navarro, do Conselho Indigenista
Missionário, era de se esperar que a ação da Via Campesina fosse rechaçada por
‘rapinas e oportunistas’, representantes do mundo da tecnologia e da propriedade
privada, dois pilares do capitalismo. ‘Mas é assim que avançam as lutas
populares no Brasil. O povo organizado vai à frente tomando porrada de todos os
lados e respondendo as urgências do dia-a-dia , enquanto busca aqui, ali e acolá
os seus aliados – hoje tão difíceis de serem encontrados’.’


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