Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

No silêncio, a cumplicidade

Os escândalos e as transações nebulosas que, incessantemente, nortearam o futebol, nunca foram novidade para os torcedores dos países da América Latina. Qualquer brasileiro com o mínimo de afeição por esse esporte tem a sensação de que alguém, em algum lugar, sempre tirou proveito financeiro do jogo de forma ilícita.

Para arquitetar um grande conjunto de mal feitos, dirigentes utilizam como base o sentimento de paixão que cada um nutre por seu clube do coração. Esse amor sincero é o combustível que faz girar uma engrenagem capaz de despejar milhões de dólares no bolso de alguns, criando uma disparidade econômica entre o mundo real e o mundo do futebol.

Usam a imagem dos clubes – e principalmente dos jogadores – para cobrança de direitos de transmissão em um círculo vicioso, onde todos ganham. Neste jogo, não há perdedores. Um verdadeiro negócio da China, descoberto na década de 1970 por um ex-presidente da Fifa, o brasileiro João Havelange.

A partir de então, o poder foi crescendo. A entidade responsável por gerir o futebol em todo o mundo se comporta como se estivesse acima do bem e do mal. Joseph Blatter, que comanda a Fifa desde 1998, ganhou status de chefe de Estado. É reverenciado e recebido por grande parte dos presidentes em todo o mundo de forma suntuosa. A postura em seus discursos dá a entender que, sem a Fifa, não existiria futebol. Na verdade, um grande jogo de cena, cujo objetivo é apenas faturar.

Porém, o esquema pode ter sua corrente comprometida se aqueles que investem se sentirem incomodados em ver sua marca associada a tanto lamaçal. Patrocinadores podem não estar isentos, mas se deixarem de lubrificar a máquina vão enfraquecer o sistema.

Não há indignação

Não há temor maior para uma empresa do que ver sua imagem se transformar em uma prospecção de valor negativo. Marco Polo Del Nero, ciente de que o momento é extremamente adverso, concedeu entrevista na sala de imprensa da CBF sem os painéis – conhecidos como backdrops – que trazem os patrocinadores que investem na Seleção Brasileira. Em todas as entrevistas coletivas realizadas pela confederação desde a inauguração do novo prédio, os atuais 13 patrocinadores sempre estiveram estampados neste painel. Foi o caso, por exemplo, da entrevista após a posse de Del Nero, que aconteceu no dia 16 de abril. Uma imagem sucinta da crise, que expõe com profundidade o quanto está abalada a cartolagem nacional.

Enquanto isso, os clubes estão cada vez mais falidos e endividados, recorrendo a empréstimos junto ao setor Público para sobreviverem. Pagam salários astronômicos, mas não conseguem – ou não querem – se desvencilhar dos métodos que assolam o futebol em todo o mundo.

Não é difícil de analisar que as agremiações são usadas pelos dirigentes, que por sua vez dependem de empresários para a contratação de atletas.

Desde a fatídica manhã de quarta-feira, nenhum cartola de time brasileiro se pronunciou. O silêncio mostra que não há indignação. Todos quietos, cúmplices dos criminosos.

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Enio Franco é jornalista