Saturday, 11 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Abuso dos formadores de opinião

É lamentável, após tantos anos de luta para conquista e respeito ao direito indígena, me deparar com uma reportagem tendenciosa, preconceituosa, como a matéria publicada na revista Veja nº 2163 (5/5/2010), intitulada ‘A farra da antropologia oportunista’.

Os jornalistas Leonardo Coutinho e Igor Paulin e a jornalista Julia de Medeiros ao reportarem a situação da etnia guarani, principalmente na região da grande Florianópolis, cometeram um erro básico na construção de uma reportagem investigativa – verificar a idoneidade e a legitimidade da fonte de informações.

O Sr. Milton Moreira (foto na página 158-159) não representa as comunidades Guarani de Santa Catarina e por opção vive fora das comunidades indígenas, estabelecendo uma forte relação com o não indígena, empresário local, que tentou de várias formas deslocar a comunidade do Morro dos Cavalos no município de Palhoça para atender interesses econômicos próprios.

A quem interessa?

É uma pena que os autores desta reportagem, em passagem por nossa região não se interessaram em conhecer os verdadeiros representantes da cultura guarani, e prestaram este desserviço a todo trabalho desenvolvido pela Comissão Nhemonguetá, que reúne representantes de todas as aldeias do litoral de Santa Catarina, sempre apoiados e acompanhados nas suas decisões e reivindicações pelo Ministério Público de Santa Catarina, que confere a veracidade dos fatos, a origem das solicitações e o fundamento jurídico das solicitações, sejam elas fundiárias, sociais, antropológicas ou de bens e serviços.

Nós não precisamos provar quem somos. A própria história, construída pelos não indígenas, identifica o povo guarani como etnia tradicional desta terra. O povo guarani nunca desrespeitou a propriedade alheia; ao contrário serem foram usurpados de suas terras, impedidos de desenvolver seu modo de vida e cultura.

Esta situação se arrasta há 500 anos, desde a invasão portuguesa. Isso ocorre por ainda encontrarmos na sociedade brasileira pessoas com o mesmo ‘pensamento’ que os autores desta matéria. Utilizam meios de comunicação de abrangência nacional, como esta revista, sem dar oportunidade aos seus leitores de construção de um pensamento crítico, devido a parcialidade da mesma, muitas vezes incorrendo com a verdade.

Então me pergunto: a quem interessa todo este movimento? O porquê das informações não terem sido verificadas?

‘Origem paraguaia’

Hoje, o povo guarani com uma população de mais de 50 mil pessoas ocupa menos que 0,05% das terras destinada aos povos indígenas no Brasil, e quase sempre em locais improdutivos e não adequados ao nosso modo de vida… Nossos antepassados chorariam se nos vissem em tal situação… Será que choraremos daqui a alguns anos, vendo nossos filhos e netos derrotados e aprisionados em pequenos pedaços de terra, vivendo como em guetos, segregados e espoliados de seus direitos, mesmo sendo os representantes legítimos da família tradicional do Brasil, que vivem nestas terras há muito mais que quinhentos anos?!

Desafio esta revista e os autores desta reportagem a estarem juntos as nossas aldeias e conhecerem nossos jovens e anciãos para repensarem ‘a origem paraguaia’ de nossa Nação Guarani.

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Cacique da T.I. M´Biguaçu, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Litoral Sul, coordenador da Comissão Nemonguetá, graduando em Direito na Universidade do Vale do Itajaí (Univali)