Thursday, 09 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Estações de rádio contra a censura na Coreia do Norte

Num país onde a população não tem acesso à internet e imprensa livre nunca existiu, estações de rádio que transmitem do exterior desempenham um papel único na luta contra a censura na Coreia do Norte. São transmissões feitas de modo quase amador, a partir de Seul, com a ajuda de dissidentes que conseguiram escapar da ditadura comunista e chegar ao lado Sul da península. Ouvir esses programas clandestinos é motivo suficiente para levar um norte-coreano à prisão. Só aparelhos de rádio bloqueados, que sintonizam apenas as estações oficiais, podem ser comprados livremente em cidades como Pyongyang.

O isolamento da Coreia do Norte impede que se saiba qual a audiência das transmissões feitas por rádios como a Free North Korea, Open Radio e Free Asia. Mas, de acordo com dissidentes, a programação que fura o bloqueio do regime de Kim Jong Un, divulgando notícias proibidas e consideradas subversivas, exerce influência sobre quem busca fontes de informação alternativas. É preciso comprar aparelhos de rádio no mercado negro – um comércio cada vez mais comum no país comunista, que vive sob embargo internacional – e se esconder para ouvir as transmissões em ondas curtas. Vizinhos e a própria família podem denunciar o ato de traição ao regime. “Não sabemos o tamanho do nosso público, mas relatos de refugiados provam que somos ouvidos. As pessoas fecham todas as portas de casa para que ninguém mais possa escutar o que diz o rádio. Qualquer informação livre é útil. Os norte-coreanos só recebem mentiras”, diz Sunny Park, locutora da estação Open Radio for North Korea (Rádio Aberta para a Coreia do Norte), baseada em Seul.

A rádio tem 20 funcionários, entre eles seis dissidentes. A organização vive de doações e, além de transmitir notícias e análises sobre a situação da Coreia do Norte, divulga cartas de cidadãos que tentam enviar recados para suas famílias, mesmo que não possam se identificar claramente, o que representaria perigo aos parentes que ficaram. São apenas duas horas de transmissão por dia, à noite. “Lemos cartas de dissidentes que querem contar que encontraram uma vida melhor na Coreia do Sul e que descobriram que tudo o que ouviam antes em seu país era mentira”, afirma a locutora sul-coreana, que diz ter se juntado à Open Radio para ajudar a diminuir o isolamento dos norte-coreanos.

A Radio Free Asia (RFA), fundada em 1996 e custeada por órgãos públicos americanos, transmite para a Coreia do Norte e outros países asiáticos que vivem sob censura, como China, Vietnã e Mianmar. Os programas, que prometem um jornalismo independente, são sempre na língua local e contam com informações passadas às escondidas por colaboradores em cada região. As notícias divulgadas pela rádio, também publicadas online, são frequentemente citadas por veículos do mundo todo. Quem acessar o site da RFA, fica sabendo, por exemplo, qual é a última moda na empobrecida Pyongyang: roupas que imitam as peças de alto luxo, de grifes como Burberry e Chanel, vestidas pela jovem primeira-dama Ri Sol Ju.

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Claudia Sarmento é correspondente do Globo em Tóquio