Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Crime, castigo e celebridades

O.J. Simpson está de volta. A figura mais comentada e analisada pela mídia americana em 1994 reapareceu nas capas de tablóides e nos boletins de TV após invadir um quarto de hotel em Las Vegas e roubar artigos esportivos que, ele garante, eram seus. Um episódio bem mais brando que o duplo homicídio que cometeu em meados dos anos 90, mas ainda assim uma nova chama na saga por fofocas de celebridades que movimentam milhares de organizações noticiosas e milhões de dólares nos EUA. ‘Esta promete ser a primeira série de uma nova temporada’, afirma Robert Thompson, professor de cultura popular da Universidade de Syracuse. ‘O duplo homicídio foi uma tragédia de proporções mitológicas. A seqüela parece ter voltado como sitcom.’

Apesar de ser um caso criminal rotineiro, o fato de envolver O.J. Simpson torna-o magnífico e interessante ao público. ‘As acusações de assassinato não deveriam influenciar essa nova investigação’, disse a apresentadora da Fox News Greta Van Susteren, ‘apesar de 99,9% das pessoas acharem que ele é culpado’ de matar a ex-mulher Nicole e seu amigo Ron Goldman.

No acampamento da mídia do lado de fora do Centro Regional de Justiça da maior cidade de Nevada, dezenas de jornalistas com câmeras e vans com discos para transmissão via satélite se instalaram desde o dia 17/9. A atmosfera, segundo Howard Kurtz [The Washington Post, 18/9/07], logo assumiu um aspecto de reencontro. Jornalistas que cobriram os sórdidos assassinatos se reuniam novamente para cobrir o caso de roubo mais divulgado na história da TV.

A Fox deu o maior volume de cobertura, apresentando dois advogados que discutiam o caso de ângulos opostos. No meio da tarde, exibia o banner nada discreto ‘O.J.: Doente mental ou apenas arrogante?’

Mídia, reflexo do público

De muitas formas, o recente caso envolvendo Simpson é a manifestação de uma cultura obcecada com celebridade e crime. Os assassinatos ocorridos em 1994 elevaram o ex-jogador de futebol americano à condição de celebridade e polemizador racial, uma vez que muito mais negros acreditavam em sua inocência do que brancos.

Os principais ‘personagens’ da saga dos anos 90 foram transformados em, pelo menos, mini-celebridades. Claramente, Segundo Kurz, a tênue linha entre o que é legítimo e o que é sensacionalista foi há muito apagada. Até os meios de comunicação mais sérios cobrem o paradeiro de Paris Hilton e Britney Spears, como foi o caso recentemente da revista Newsweek.

Hoje, ao contrário de 1994, há três serviços de TV a cabo nos EUA, além de milhares de sítios e blogs para esmiuçar qualquer história. Foi o sítio de fofocas TMZ.com que primeiro recebeu e divulgou o áudio do confronto entre Simpson e o comerciante de artigos esportivos Alfred Beardsley. TMZ também apresentou uma entrevista exclusiva com Beardsley, que afirmou ter sido roubado a mão armada.

Alguns, como a editora da revista Star Julia Allison, acham que O.J.Simpson é um fenômeno dos anos 90 e não tem escopo para desbancar estrelas jovens e sexy das capas das revistas, jornais e noticiários do país atualmente. ‘A mídia está presumindo que alcançarão a audiência que tiveram nos anos 90, mas me pergunto se vão mesmo’. Além disso, ninguém gosta de O.J. Simpson, disse Julia. Thompson, o professor de Syracuse, acha que a trama não teve ainda seu desfecho. ‘O julgamento civil não deu a sensação de fim de caso’ em relação ao duplo homicídio, afirmou. ‘Se você ouvir a atual cobertura, percebe que há um frenesi sobre a possibilidade de Simpson pegar mais de 100 anos de prisão.’

Segunda edição

E nada como um novo episódio numa história mal contada para turbinar as vendas do livro de O.J. Simpson. A obra, If I Did It (‘Se Eu Fiz’ em português), está entrando em sua segunda edição e supostamente traz a confissão de assassinato do ex-jogador de futebol americano. Em segundo lugar na Amazon na semana anterior ao novo episódio, a Beaufort Books está preparando mais 50.000 impressões. ‘A prisão trouxe de volta a questão de O.J. e a lei na consciência de todos’, disse Eric Kampmann, dono da Beaufort.

Segundo reportagem de Hillel Italie [Associated Press, 18/9], If I Did It deveria ter sido lançado pela HarperCollins em novembro de 2006 mas foi retirado do mercado pela ira do público e pela garantia dada pela justiça à família de Goldman do valor de US$ 38 milhões, para compensar as perdas judiciais no caso contra Simpson, que havia sido liberado das acusações de assassinato. Depois de assinar novo contrato com a Beaufort, editora bem menor que a HarperCollins, os Goldman re-intitularem o livro If I Did It: Confessions of a Murder (‘Se Eu Fiz: Confissões de um Assassino’).