Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

A presidente e a imprensa livre

‘Uma imprensa livre, pluralista e investigativa é imprescindível para um país como o nosso (…) Devemos preferir o som das vozes críticas da imprensa livre ao silêncio das ditaduras’, disse a presidente Dilma Rousseff no evento comemorativo de 90 anos da Folha de S.Paulo. Não é a primeira vez que a chefe de governo faz profissão de fé na imprensa livre, fundamento básico da democracia. Essas mesmas palavras ela já havia dito quando, recém-eleita, concedeu a sua primeira entrevista coletiva. E voltou a repetir o compromisso, sempre que oportuno. Mas o pronunciamento feito na Sala São Paulo diante de uma plateia de 1.200 convidados tem um significado especial e relevante.


Primeiro, pelo inequívoco sentido de alerta, quase uma palavra de ordem sobre a postura que os governantes devem manter em relação à imprensa, claramente explicitada na presença de todos aqueles com quem Dilma divide a responsabilidade de governar. E também, não menos importante, por tudo o que pode significar o simples fato de a presidente da República comparecer naquele evento e afirmar o que afirmou. Pode significar o resgate das relações de respeito e de compreensão mútua dos respectivos papéis que devem caracterizar a convivência entre o poder público e a mídia numa sociedade democrática.


É com otimismo, portanto, que, com mais esse vigoroso pronunciamento, se constata que o passado recente de permanente beligerância do poder central contra a imprensa livre é página virada.


Consciência cívica


Seguidores fiéis do ex-presidente Lula, como o fez há pouco o ministro Gilberto Carvalho, têm sistematicamente desdenhado os elogios a Dilma Rousseff por parte de quem, como este jornal, não poupa críticas a Lula quando julga que as merece. Argumentam que o que se pretende é ‘desconstruir’ a imagem do ex-presidente. Na verdade, não fazem mais do que repetir o que o próprio Lula tem afirmado sempre que surge a oportunidade. Mas não há como deixar de registrar, e aplaudir, a enorme diferença, que não é apenas de estilo, entre as posições firmadas por Dilma numa questão fundamental como esta, a da liberdade de imprensa, e as insistentes diatribes de Lula e seus prepostos contra o trabalho dos jornalistas e a favor do ‘controle social’ da mídia.


A verdade é que há muitos anos não se ouviam, por parte do chefe da Nação, declarações tão auspiciosas sobre os fundamentos da pluralidade democrática e o verdadeiro papel da imprensa. Afirmou Dilma Rousseff:




‘A multiplicidade de pontos de vista, a abordagem investigativa e sem preconceitos dos grandes temas de interesse nacional constituem requisitos indispensáveis para o pleno usufruto da democracia, mesmo quando são irritantes, mesmo quando nos afetam, mesmo quando nos atingem. E o amadurecimento da consciência cívica da nossa sociedade faz com que nós tenhamos a obrigação de conviver de forma civilizada com as diferenças de opinião, de crença e de propostas’.


Compromisso real


Em sua intervenção, o diretor de redação do jornal, Otavio Frias Filho, lembrou que, em nome do leitor, os jornalistas exercem a função de fiscais do governo, tendo sempre um compromisso com a democracia e com o desenvolvimento do País.


Essa alusão aos pesos e contrapesos que mantêm o equilíbrio da convivência democrática acabou estabelecendo uma feliz relação dialógica com o discurso da presidente da República, o que abre nova e promissora perspectiva para o futuro da imprensa no País. Pois, se a mídia conhece a extensão de sua responsabilidade social e sabe que essa responsabilidade deve ser cobrada pela sociedade, cabe ao poder público ser fiador do ambiente de liberdade indispensável ao exercício pleno da atividade jornalística.


Dilma Rousseff demonstrou firme convicção nesses princípios ao reiterar seu ‘compromisso inabalável com a garantia plena das liberdades democráticas, entre elas a liberdade de imprensa e de opinião’. E foi além:




‘Um governo deve saber conviver com as críticas dos jornais para ter um compromisso real com a democracia. Porque a democracia exige, sobretudo, este contraditório, e repito mais uma vez: o convívio civilizado, com a multiplicidade de opiniões, crenças, aspirações’.


Um discurso realmente novo.