Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Doping revela papel de blogs e Twitter em furos jornalísticos

Jornalistas, como Bob Woodward, do Washington Post, já questionaram se as redes sociais ou a internet têm algo a contribuir para o jornalismo, mas o caso de Lance Armstrong, vencedor da Volta da França, mostra que fontes alternativas, como blogs e o Twitter, podem ter um papel importante em furos jornalísticos.

Mesmo quem não acompanha o ciclismo profissional provavelmente já ouviu falar da quase épica queda em desgraça pela qual passou o ex-super-estrela. Desde a revelação do uso de drogas ilegais para turbinar seu desempenho, ele teve que devolver todos os prêmios que ganhara. Teria sido uma reportagem investigativa ou o trabalho jornalístico de um veículo da grande mídia que provocou a queda desse super-herói do esporte? Como destaca David Carr, especialista em mídia do New York Times, os responsáveis pela revelação foram, na realidade, jornalistas amadores, ou jornalistas-cidadãos, usando o Twitter e blogs pouco conhecidos como plataforma.

Quando as autoridades responsáveis pelo ciclismo profissional decidiram cassar os prêmios de Armstrong e bani-lo do esporte, vários veículos admitiram que suspeitavam de seu desempenho há anos, mas como não havia como provar que ele fizesse uso de doping, não escreveram sobre o assunto. Como nota Carr em seu post, com algumas exceções, “em sua maioria, os jornalistas que aparentemente mais sabiam sobre ciclismo profissional foram os que menos informaram”.

E por que a farsa durou tanto tempo? Um motivo provável é o da história de Armstrong provocar tamanha inspiração – um atleta que supera um câncer e não só recupera a saúde, como se torna campeão mundial.

A utilidade das mídias digitais

O ex-editor-chefe da revista Bicycling escreveu recentemente explicando por que, apesar das amplas suspeitas levantadas por jornalistas que cobriam o esporte, não aprofundou o caso contra Armstrong. Entre outras coisas, disse que “o ônus da prova era imenso” devido à fama de Armstrong e também culpou o “código de silêncio” do ciclismo por não divulgar provas comprobatórias. Mas também reconheceu que se preocupava com as consequências que uma eventual investigação pudessem ter para a revista e sua saúde financeira, considerando o que chamou a “influência do tipo Corleone” que Armstrong tem naquele esporte. “Através de seus vários patrocínios e acordos de apoio, ele podia fazer um anúncio desaparecer num segundo. Capacetes, óculos escuros, rodas, bicicletas, tudo isso representa o sangue que dá vida à revista, que paga meu salário e o da equipe. Se não conseguimos ganhar dinheiro durante os anos da explosão de crescimento, quando conseguiríamos?”

Em alguns comentários no início deste ano sobre a internet e o jornalismo, o repórter super-estrela Bob Woodward, do Washington Post, questionou a validade ou a utilidade das mídias digitais quando se trata de matérias importantes, como o caso Watergate. Segundo Woodward, só o velho tipo de reportagem de rua, gastando sola de sapato, poderia levar à revelação da invasão de Watergate. O veterano jornalista zombou dos estudantes que diziam que “o ambiente político seria tão diferente que ninguém acreditaria em Nixon, com um enxame de blogueiros e tuiteiros, e Nixon renunciaria uma ou duas semanas depois de Watergate”.

A vez dos blogs e do Twitter

Como destaca Carr, foram exatamente contas de Twitter e blogueiros – como @TheRaceRadio e @UCI_Overlord, e um blog pouco conhecido chamado NYVelocity, site de um fotógrafo comercial e ciclista amador – que ficaram em cima de Armstrong e do suposto doping, enquanto a grande mídia esportiva celebrava suas conquistas. Como o fundador do blog, Andy Shen, não tinha qualquer conexão com o ciclismo profissional, ele pôde ir atrás de matérias que o interessavam e outras pessoas recolhiam e redistribuíam seus links e comentários. “Nem todos, na grande mídia, compraram a história. Muitos fizeram um bom trabalho, mas também muitos apenas foram em frente, por medo ou por interesse pessoal. A beleza do blog NYVelocity é que eles conheciam o esporte, conheciam a realidade e não ficaram presos a anunciantes ou aos poderes que existem no esporte. Não tiveram medo de publicar a verdade”, contou a esposa de um ex-colega da equipe de Armstrong a Carr.

Isso é outro exemplo dos benefícios daquilo que foi chamado democratização do conteúdo: o fato de que qualquer pessoa pode publicar e distribuir informação permite o acesso a fontes que nunca antes estariam disponíveis a uma audiência tão ampla – seja o caso de alguém divulgando pelo Twitter, ao vivo, o ataque ao prédio em que estava Osama bin Laden, ou os manifestantes na Praça Tahrir, no Egito. Como disse o professor Jay Rosen, da Universidade de Nova York, embora um comentário possa parecer apenas barulho, o jornalismo como um todo tende a melhorar à medida que mais pessoas se envolvem nele. Informações de Mathew Ingam [GigaOM, 4/11/12].