Tuesday, 14 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Folha de S. Paulo

INTERNET
Fernanda Ezabella

Cinco anos depois, Huffington Post dá lucro e cala críticos

A grega Arianna Huffington tem no sobrenome um sinônimo para jornalismo na internet. O Huffington Post, que reúne o trabalho de 6.000 blogueiros voluntários e tem uma equipe de 195 pessoas, diz receber 24 milhões de visitas únicas por mês, mais do que sites de jornais como ‘Washington Post’ e ‘Los Angeles Times’.

E, pela primeira vez desde seu lançamento em 2005, tornou-se lucrativo no segundo trimestre deste ano, calando os críticos que a perseguem desde que ela chegou aos EUA e passou a dar pitacos na política nacional.

Arianna, 60, lançou recentemente seu 13º livro, ‘Third World America’ [algo como ‘EUA do Terceiro Mundo’].

Ela estará no Brasil neste mês. Em quatro dias, ela deve visitar Rio, São Paulo e Brasília para ‘encontrar com políticos eleitos, líderes empresariais e membros da mídia’, disse a cofundadora e chefe de Redação do Huffington Post em entrevista à Folha por e-mail.

Formada em economia em Cambridge, Arianna se mudou para os EUA nos anos 80 e ficou conhecida nas rodas sociais pelos livros de sucesso que publicou, uma biografia sobre Pablo Picasso e outra sobre Maria Callas.

Ao se casar com o magnata americano do petróleo Michael Huffington, eleito ao Congresso anos depois, Arianna entrou para o mundo da política como uma comentarista conservadora, embora tenha mudado de partido após um divórcio escandaloso em 1997 (Michael afirmou ser bissexual).

Blogueira, ativista política e ambiental nos anos 2000, Arianna afirma que quis criar o Huffington Post como uma resposta liberal a sites de notícia conservadores como o Drudge Report.

Lançou o projeto em 2005 e conseguiu reunir contribuições de personalidades como Norman Mailer e David Mamet, ganhadores do Pulitzer, além de celebridades como Gwyneth Paltrow. Hoje, tem entre seus colaboradores o cineasta Tim Burton.

Na época, a iniciativa foi recebida com um balde de água fria dos críticos, talvez por inveja ou talvez por posts esquisitos como um sobre orgasmo feminino assinado pela própria Arianna. Mas, com o tempo, o site construiu sua reputação, como na cobertura do desastre do furacão Katrina.

Ela é cofundadora ao lado de Kenneth Lerer, ex-executivo da Time Warner/AOL. Segundo a revista ‘Forbes’, cada um levantou US$ 2 milhões para lançar o site, que neste ano deve gerar receita de US$ 30 milhões.

 

‘Leio sete jornais’, afirma empresária

Arianna Huffington, cofundadora do Huffington Post, diz estar animada com sua primeira visita ao Brasil. Aos 60 anos, ela afirma que assina sete jornais, que gosta de ler pela manhã, enquanto toma café. A seguir, trechos da entrevista feita por e-mail.

Folha – Por que o Brasil?

Arianna Huffington – Nunca fui à América do Sul, o que me deixa muita animada com essa viagem. Quero ver de perto a vibrante economia brasileira e o jeito como os partidos políticos, apesar de terem ideologias diferentes, conseguiram se unir para reduzir a desigualdade. Estou interessada em me encontrar com aqueles que tiveram um papel em transformar energia alternativa em parte da política nacional.

Em seu novo livro, a senhora afirma que os EUA correm o risco de se transformar num Brasil ou num México, com mais pessoas vivendo em condomínios fechados. Por quê?

Os EUA estão caminhando para se tornarem um país de Terceiro Mundo. Neste momento, 100 milhões de americanos estão em pior situação do que seus pais quando tinham idade parecida. Há algo de destrutivo acontecendo ao sonho americano.

Acabou o sonho americano?

A mobilidade social foi sempre o centro do sonho, uma promessa de que, se você trabalhar duro e jogar as regras do jogo, vai se dar bem e seus filhos terão a chance de fazer ainda melhor. Essa promessa morreu.

Resgatar a classe média não vai ser fácil. Serão necessárias iniciativas ousadas.

O presidente Barack Obama tem ainda como retomar suas promessas?

Ele precisa trabalhar agressivamente para corrigir o seu maior erro, que foi não colocar a criação de postos de trabalho no centro das prioridades. Ele não deu a mesma urgência para salvar a classe média e reconstruir nossas comunidades que deu para resgatar Wall Street e os grandes bancos.

A senhora ainda lê jornal de papel?

Sim, absolutamente. Adoro ler o jornal pela manhã, tomando café. Assino sete.

Desde que o Huffington Post foi lançado, muitas novas tecnologias ganharam força. Qual foi a mais complicada para abraçar?

Inovação sempre esteve no DNA do HuffPost. Então nunca olhamos para essas novas tecnologias como problemas a resolver. Ao contrário, vemos como oportunidades para serem abraçadas.

Como a qualidade do jornalismo foi afetada por essa revolução midiática e consequente declínio financeiro de empresas tradicionais?

Estamos vivendo uma era de ouro para os consumidores de notícias que podem navegar na internet, usar ferramentas de busca, acessar as melhores histórias ao redor do mundo.

A internet nos deu controle sobre as notícias que consumimos.

E o crescimento explosivo de mídia social está também mudando nossa relação com a notícia.

Não é algo que tomamos mais de forma passiva. Somos todos parte da evolução da história, expandindo com comentários e links para informações relevantes, adicionando fatos e pontos de vista diferentes.

O jornal já deu lucro? Qual a expectativa para 2011?

Sim, o HuffPost se tornou lucrativo neste ano. Queremos continuar expandindo o site, contratar mais repórteres para focar em produção de material original.

Rupert Murdoch está investindo US$ 30 milhões para criar um jornal só para iPad. Qual será a resposta do Huffington Post?

A estratégia do HuffPost é focar no nosso aplicativo. Queremos algo poderoso, atraente e nativo ao iPad.

 

TELECOMUNICAÇÕES
Telebrás deve ser incorporada a projeto da rede de TV digital pública

O megaprojeto do governo federal de implantar a rede pública de TV digital deve ser modificado. Em vez de contratar um satélite privado para levar a programação dos estúdios às torres de transmissão, em 273 municípios, o governo federal cogita usar a rede de fibra óptica da Telebrás.

A mudança foi admitida à Folha pela presidente da EBC (Empresa Brasil de Comunicação), Tereza Cruvinel. Segundo ela, isso reduziria custos.

O governo previu gastar até R$ 2,8 bilhões, em 20 anos, para custear a transmissão dos canais estatais em sinal digital. A rede será construída por parceria público-privada.

A minuta do edital de licitação internacional para escolha da empresa ou consórcio para construir e operar a rede foi colocada em consulta pública em dezembro de 2009.

A EBC planejava inaugurar a transmissão em São Paulo e no Rio de Janeiro ainda no governo Lula, mas questionamentos do TCU e as eleições inviabilizaram o cronograma.

Pelo menos um consórcio internacional foi formado para disputar a licitação. Ele reúne as empresas brasileiras Engevix (de engenharia) e Linear (fabricante de equipamentos de transmissão) e as japonesas Marubeni e NHK, que opera rede semelhante no Japão.

 

WIKILEAKS
Andrea Murta

Site expõe ‘espionagem direta’ dos EUA

A avalanche incessante de informações vinda à tona com o vazamento de documentos dos EUA no site WikiLeaks expôs ao menos uma evolução importante das práticas da diplomacia americana: a expansão das tarefas de espionagem direta.

Diplomatas foram orientados a coletar dados biométricos, números de cartões de crédito e até DNA de autoridades estrangeiras.

Os pedidos foram requisitados a diplomatas alocados em diversos países, e chegaram até à ONU, onde a prática é expressamente proibida por convenções.

As ordens foram feitas em nome da secretária de Estado, Hillary Clinton, e da embaixadora do país na ONU, Susan Rice.

As revelações estão no seio dos cerca de 250 mil despachos diplomáticos sigilosos dos EUA que estão sendo publicados gradualmente no WikiLeaks há uma semana.

Não surpreende que diplomatas façam coleta de dados -é parte intrínseca do trabalho-, mas ficou claro que os limites entre diplomacia e espionagem estão em uma zona cada vez mais cinzenta.

‘Posso dizer que nunca recebi nem ouvi falar de um pedido desse tipo em meus 36 anos no Departamento de Estado’, disse à Folha o diplomata americano aposentado Howard Schaffer, 81, atual conselheiro do Instituto para Estudo da Diplomacia da Universidade Georgetown.

‘Claro que pediam informações, mas não esses dados. Me parece algo novo.’

Para alguns analistas, o esforço dos EUA em grampear amigos e inimigos é uma resposta à perda gradual de poder e influência.

Seumas Milne, colunista e editor do ‘Guardian’, afirma que as ações ‘mostram como o império americano começou a perder o rumo quando o momento do mundo unipolar pós-Guerra Fria passou, Estados antigamente dependentes como a Turquia resolveram andar sozinhos e poderes regionais como a China começaram a fazer sua presença global mais sentida’.

Fred Burton, ex-membro dos serviços de segurança diplomáticos e atual analista da empresa de inteligência Stratfor, diz que a avaliação tem limites. ‘Varia de acordo com as relações diplomáticas com cada país.’

O Departamento de Estado dos EUA tentou minimizar o impacto das revelações. ‘Nossos diplomatas não são ativos de inteligência’, disse o porta-voz P.J. Crowley. ‘Eles coletam algumas informações, como fazem diplomatas de todos os países.’

Há quem argumente que o caso apenas escancarou uma prática antiga. ‘As linhas entre a diplomacia e a espionagem sempre foram tênues’, disse James Lindsay, vice-presidente sênior do Council on Foreign Relations.

‘Alguns tipos de dados não eram possíveis de ser coletados no passado, a diferença está aí.’

Roberto Abdenur, ex-embaixador do Brasil nos EUA, diz que sempre falou ao telefone e fez comunicações em Washington ‘partindo do princípio de que estava tudo grampeado’.

Segundo ele, é ‘notório que os EUA são particularmente ativos em espionagem internacional’.

O fato de que espionam aliados também seria normal. Para Burton, ‘não existe processo de inteligência amigável’. ‘Nessas horas, não existem aliados.’

 

WikiLeaks perde conta para doações

O serviço de pagamentos via internet PayPal desativou na madrugada de ontem a conta utilizada pelo site WikiLeaks como um dos principais canais para receber as doações usadas no financiamento de suas atividades.

A empresa americana afirmou ter desativado permanentemente a conta do WikiLeaks por causa de violações à sua política de uso.

A PayPal pertence ao site de leilões eBay e afirma operar em 190 países realizando comércio e transferências de dinheiro por meio de cartões de crédito na internet.

‘Nossos serviços de pagamento não podem ser usados para nenhuma atividade que estimule, promova, facilite ou instrua terceiros de se envolverem em atividades ilegais’, disse nota divulgada no blog oficial da empresa.

‘Nós notificamos o dono da conta a respeito desta ação’, acrescentou.

Em resposta, o WikiLeaks publicou um texto em seu Twitter afirmando que a PayPal se rendeu à ‘pressão do governo dos EUA’.

Desde 28 de novembro, quando o WikiLeaks começou a divulgar um lote de mais de 250 mil documentos secretos da diplomacia americana, governos e empresas privadas liderados pelos EUA intensificaram ações para silenciar a organização.

A ação mais recente, anteontem, foi da empresa americana EveryDNS, que fornecia o endereço da organização na internet.

A empresa interrompeu o serviço alegando ter sido alvo de ataques e obrigou o WikiLeaks a migrar para um endereço na Suíça, e depois para a Alemanha, a Holanda e a Finlândia.

O chanceler da Austrália, Kevin Rudd, informou que a Polícia Federal abriu uma investigação contra Julian Assange e não descartou a possibilidade de que o governo suspenda o passaporte do criador do WikiLeaks, nascido no país.

Atualmente é possível acessar o site no endereço wikileaks.ch ou com os domínios .de, .nl e .fi.

Apesar do bloqueio da conta no PayPal, a organização ainda possui outros canais para levantar recursos, entre eles a fundação Wau Holland Stiftung, na Alemanha, contas bancárias na Suíça -uma delas destinada a financiar especificamente a segurança pessoal de Assange- e na Islândia, além de um endereço na Austrália.

Segundo o jornal ameri cano ‘New York Times’, o Datacell, um site semelhante ao PayPal, porém baseado na Suíça e na Islândia, ainda está recebendo doações online para o WikiLeaks.

PROTESTO

A Organização Repórteres Sem Fronteiras divulgou ontem nota sobre o caso afirmando estar chocada com o posicionamento dos EUA e da França contra a liberdade de expressão e comparou os dois países à China.

 

Nelson de Sá

‘Anarquista’ para uns, site tem atuação de órgão jornalístico

Um mês antes de iniciar a divulgação do Cablegate, Julian Assange declarou para a revista ‘Forbes’ que, desde que criou o provedor australiano Suburbia, duas décadas atrás, atua como publisher e, de vez em quando, como repórter.

Alertou contra o esforço ‘deliberado’ de desqualificar o WikiLeaks como publicação ou jornalismo, para tirar do site a proteção legal em países como os EUA. E disse que até o ‘New York Times’ incorria na desqualificação, mas por ‘medo de ser regulado ou investigado se incluir nossas atividades como publicação’.

O ‘Times’ não linka as páginas do WikiLeaks. Do material do Cablegate, seleciona o que quer noticiar e submete os originais que vai reproduzir a uma edição ou ‘redaction’, no jargão do jornalismo americano. Também ouve o Departamento de Estado, que solicita ‘redaction’, que o jornal aceita ou não.

No caso, o ‘Times’ repassou os pedidos de edição feitos pelo Departamento de Estado ao próprio WikiLeaks. Mas o WikiLeaks não é um ‘parceiro de mídia’ do ‘Times’, diz o editor-chefe, Bill Keller. ‘É uma fonte de material bruto. Como toda fonte, tem suas motivações.’

Um colunista do ‘Times’ foi além. David Brooks descreveu Assange como ‘anarquista da velha guarda’, contrário ‘às instituições de poder’. Criticou a publicação supostamente sem ‘filtro’ do WikiLeaks como contrária ao jornalismo. Outros colunistas americanos ecoaram que o WikiLeaks ‘não é uma organização noticiosa’.

E a expressão ‘anarquista’ foi parar na boca do porta-voz do Departamento de Estado, ao justificar que o WikiLeaks ‘não é uma organização de mídia’ -e Assange ‘não é um jornalista’.

Mas o fato é que o WikiLeaks vem atuando como organização jornalística. Já na publicação dos documentos do Afeganistão, em julho, procurou evitar os que continham nomes de pessoas que pudessem sofrer represália. Nos documentos do Iraque, em outubro, passou a fazer edição de todos os textos.

Agora, para o Cablegate, enviou carta ao Departamento de Estado pedindo sugestões de edição, dois dias antes. O pedido foi recusado, mas o Departamento de Estado solicitou ao ‘Times’ que repassasse ao WikiLeaks suas solicitações de corte.

E assim vem sendo feito, daí os textos surgirem no site do WikiLeaks com ‘XXXXX’ no lugar de nomes, em ‘redaction’ realizada tanto pelas cinco publicações envolvidas, ‘Times’, ‘Guardian’, ‘Der Spiegel’, ‘Le Monde’ e ‘El País’, como pela própria redação do WikiLeaks.

Julian Assange fechou a primeira semana respondendo aos leitores do ‘Guardian’: ‘embora ainda escreva, pesquise e investigue, meu papel é o de publisher e editor-chefe, que organiza e dirige outros jornalistas’.

 

Vaguinaldo Marinheiro

Criador do WikiLeaks só não fala de si

Julian Paul Assange, criador do site WikiLeaks, é um mistério.

O homem que consegue ser o inimigo nº dois dos EUA (atrás de Osama bin Laden) e o super-herói da ‘geração anti’ (anti-EUA, anti-G20, antiglobalização, antiguerra, antibancos…) adora revelar o segredo dos outros, mas mantém a vida a sete chaves.

Até sua idade é motivo de controvérsia. Uma vez questionado sobre isso, disse: ‘Prefiro deixar os bastardos tentando adivinhar’.

Sua mãe, Christine, também não dá detalhes do passado do filho e alimenta a confusão: diz que muito do que se fala são inverdades.

O pouco que se sabe sobre Assange é graças ao jornalista Raffi Khatchadourian, que o perfilou para a revista ‘The New Yorker’ quando ele ainda não era um pop star.

Segundo a reportagem, Assange nasceu em 1971 na cidade de Townsville, na Austrália. Não há informações sobre seu pai.

A mãe viveu primeiro com um diretor de teatro, depois com um músico, com quem teve um segundo filho.

Se separaram em seguida e, com medo de perder a guarda do filho mais novo, ela pegou as duas crianças e fugiu. Viveram como nômades, sem informar ninguém sobre seus destinos.

Assange não frequentou escolas regulares, por causa das mudanças, mas também porque a mãe achava que o ensino formal acabaria com o espírito livre do filho.

Christine o educava em casa, e ele virou uma espécie de rato de biblioteca, lendo tudo o que caia em suas mãos.

Seu conhecimento diverso fica claro em algumas entrevistas, quando consegue discorrer sobre história americana, leis britânicas, literatura, matemática ou física.

Ainda adolescente, Assange se interessou por computadores e por maneiras de invadir sistemas e mostrar suas vulnerabilidades. Chegou a ser detido em 1991, na Austrália, por agir como hacker.

Aos 18 anos, teve um filho com a namorada com quem morava numa casa invadida por um grupo de jovens.

Quando se separaram, repetindo um pouco a história da mãe, se lançou numa batalha judicial pela guarda do filho. Foram cinco anos de processos, sem sucesso.

Dizem que foi nesse período que seu cabelo, que era castanho, ficou grisalho.

Hoje, depois de anos com o cabelo branco, Assange resolveu pintá-lo e reassumir o castanho original.

Em 2006, lançou o WikiLeaks. A ideia era criar um canal onde as pessoas pudessem colocar documentos que mostrassem irregularidades de governos e empresas.

Houve denúncias contra governantes do Quênia, e- -mails pessoais de Sarah Palin e de climatologistas, lista de membros de um partido neonazista britânico…

Em 2010, o foco foram os EUA. Vieram a público um vídeo de soldados num helicóptero atirando contra civis em Bagdá, relatos das guerras do Afeganistão e do Iraque e, desde a segunda-feira passada, mensagens de diplomatas norte-americanos.

Assange é descrito pelos amigos atuais como um trabalhador compulsivo. Passa horas sem se levantar da cadeira e espera que alguém o traga comida.

Quando aparece para entrevistas, está sempre arrumado. Muitas vezes de terno. Mas os amigos dizem que não liga para a aparência. Quando podia viajar, levava apenas computadores, poucas roupas e muitas meias.

Por razões de segurança, troca o número do telefone celular e o e-mail com frequência. Em hotéis, muitas vezes se registrava com nomes falsos.

Agora, está de fato escondido. Dizem que em algum lugar perto de Londres.

Desde o dia 20, está na lista de procurados da Interpol, a política internacional.

A Justiça da Suécia quer ouvi-lo no inquérito em que o acusam de estupro.

Ele nega e diz que isso é fruto de perseguição e de uma campanha orquestrada pelos EUA para difamá-lo.

O suposto estupro teria acontecido em agosto, em Estocolmo. As vítimas, duas voluntárias que trabalhavam para o WikiLeaks.

ALTOS E BAIXOS

Não há dúvidas de que Assange e seu WikiLeaks sejam um sucesso de público. Desde segunda-feira, seu nome está na capa dos principais jornais do mundo.

É bastante para alguém que, segundo sua mãe, nunca quis estar na ribalta.

Na sexta-feira, o jornal ‘The Guardian’ abriu um canal para que os leitores pudessem fazer perguntas a ele. Teve de suspendê-lo quando passavam de 900.

Alguns ofereciam dinheiro e até um quarto caso ele precisasse se acomodar.

O WikiLeaks vive de doações e hoje faz campanhas para arrecadar dinheiro para a defesa de Assange.

Mas o sucesso também fez crescer o número de detratores, não apenas entre as vítimas do WikiLeaks.

Alguns de seus antigos colaboradores abandonaram o site e o acusam de ser autoritário e ególatra. Dizem que transformou um projeto coletivo em algo personificado e com um alvo fixo, os EUA.

Em entrevistas, Assange diz que esses antigos colaboradores são ‘idiotas’ que ‘devem ir para o inferno’.

A Folha esteve numa entrevista com Assange no final de outubro. Foi uma de suas últimas aparições públicas. Ainda não havia a ordem internacional de prisão.

Mesmo assim, ele parecia amedrontado e respondia rispidamente a muitas perguntas. Principalmente quando questionado sobre a possibilidade de colocar a vida de pessoas em risco com suas revelações.

Assumia um tom messiânico e dizia que essa era sua missão para transformar o mundo em algo melhor.

Agora, ele acredita que é sua própria vida que está em risco. Aponta o dedo para os Estados Unidos.

Se alguém de fato está tramando contra sua vida, com certeza está tomando cuidados extras para não deixar rastros que possam aparecer no WikiLeaks ou em algum dos seus filhotes.

 

TELEVISÃO
Keila Jimenez

Na cobertura do conflito no Rio, helicópteros foram as estrelas

Relegados a coberturas de acidentes, trânsito e enchentes, os helicópteros passaram a peça-chave das TVs nas últimas semanas.

As cenas de traficantes fugindo da Vila Cruzeiro, captadas pelo helicóptero da Globo, tiveram tanta repercussão que, no dia seguinte, a polícia proibiu imagens aéreas na região.

O diferencial, no entanto, tem um (alto) custo. O modelo mais usado pelas emissoras é o Robinson RH 44, que não precisa ser adaptado e pode sair da fábrica já com as câmeras instaladas.

Com o preço médio de US$ 1,5 milhão (R$ 2,55 milhão), o helicóptero tem um custo operacional (combustível e manutenção) de R$ 1.500 por hora de voo.

A bordo, costumam ir piloto, cinegrafista e repórter.

Isso quando tudo não se concentra em um único profissional, como o famoso comandante Hamilton, hoje na Band. ‘Eu mesmo corro atrás da informação’, diz ele.

No Rio, as imagens da Globo foram captadas por seus dois helicópteros, equipados com câmeras HD, cujas lentes têm capacidade de aumento de 800 vezes. E foi justamente esse poderoso zoom que permitiu o voo a 2,5 quilômetros do conflito, garantindo a segurança sem prejudicar a nitidez das imagens.

A Rede TV! possui um helicóptero próprio e a Record, dois. Já SBT e Band alugam o equipamento.

com SAMIA MAZZUCCO

 

Lucas Neves

Séries e novelas ‘importam’ dramaturgos

O dramaturgo Camilo Pellegrini, 33, não podia nem ouvir falar em TV ao chegar ao Rio, vindo de Brasília. Em suas peças, desancava o veículo. Nas coxias, praguejava contra o descompromisso de colegas que trocavam ensaios por testes televisivos.

Em 2005, entretanto, ao ser sondado pela Record, não hesitou. ‘Passei perrengues no teatro. Sobrevivia fazendo filipeta, participações como ator, luz em peça de amigo.’

Estranhou as jornadas de dez horas pregado à cadeira, o peso dos horários e da disciplina, a distância da ‘coisa meio boêmia’ do teatro. ‘Mas, depois, comecei a ver prazer em entrar na casa das pessoas, ainda que com uma linguagem mais leve.’

Juntos, os dois atos ilustram um movimento cada vez mais recorrente de dramaturgos em direção à TV. O investimento da Record em dramaturgia e as apostas de canais como Multishow, MTV e Futura em programas de humor, atrações ‘teen’ e séries aqueceram a ‘importação’ de escribas teatrais.

A fluência de seus diálogos, com ecos de ‘Seinfeld’, ‘Friends’ e ‘Monty Python’, é a grande cartada. ‘É uma turma virgem de TV, com um olhar menos formatado, que imprime aos programas dinamismo e uma possibilidade de improviso, porque traz essa habilidade teatral de sentir a reação da plateia e mudar’, avalia Tatiana Costa, gerente de programação e novas mídias do Multishow.

RIO

O trânsito de autores entre palco e tela vem dos anos 60, na carona de Dias Gomes e Lauro César Muniz. Nos anos 80, Alcides Nogueira visita a TV, uma década antes de Maria Adelaide Amaral. Recentemente, João Falcão e Bosco Brasil cruzaram a divisa.

Agora, é sobretudo o teatro do Rio que empresta profissionais à televisão, por causa da concentração, na cidade, de estúdios de teledramaturgia e produtoras que vendem conteúdo para canais pagos. Mas escritores paulistas como Sérgio Roveri, 50, também se aventuram.

Em 2009, ele foi um dos roteiristas de ‘Norma’ (Globo), com Denise Fraga. Hoje, desenvolve outro seriado:

‘Você precisa entender que aquilo vai ser visto por muita gente, de vários estratos e formações. Não escreve para os seus’, diz ele. ‘O teatro permite certas referências, piadas internas, construções. Na TV, não tem isso. O desafio é não deixar de lado a ambição, conseguir servir isso a um público maior.’

Roveri afirma também ter aprendido a ser mais cauteloso com os rumos do enredo: ‘Não acaba em uma hora, 1h30, como uma peça. Posso limitar um personagem daqui a três episódios dependendo do que fizer com ele agora’.

E precisou se virar para resolver cenas com imagens em lugar de palavras. ‘Nos primeiros episódios, cheguei com filme iraniano, e era uma corrida de F-1’, brinca.

Para Leandro Muniz, 32, que fez carreira no teatro carioca antes de se juntar ao time de roteiristas da série ‘Junto e Misturado’ (Globo), a chave para a ‘aclimatação’ é ‘ter um certo desapego, saber abrir mão de boas ideias em prol de outras melhores’.

Doses reforçadas de objetividade também vêm a calhar. ‘No teatro, posso passar dez minutos sem entender direito o que se passa; na TV, o tema tem de estar claro em quatro falas, no máximo.’

O palco, observa Roveri, é ‘mais generoso’ com respostas indiretas, tempos dilatados. ‘Não há esta ameaça constante de troca de canal. É mais liberto de pressões, mais dono do próprio nariz.’

A televisão, em contrapartida, tem mais poder de fogo para fazer ideias saírem do papel. ‘A produção dá conta de uma cena de astronauta’, deleita-se Muniz.

Faz coro Rodrigo Nogueira, 31, autor da peça ‘tempo. Depois’, chamado a colaborar em novela da Record e que depois emplacou uma novela adolescente no Multishow. ‘Pensei numa cena com um avião como o de ‘Casablanca’ e, duas semanas depois, ela era gravada.’

Depois da experiência na TV, ele mudou o fim de sua peça ‘Play’. ‘Vi que precisava dar mais ferramentas, concretude ao público. Não larguei meu jeito de escrever, continuo a deixar significados em aberto e a misturar realidade e ficção. Só alterei a forma de apresentar isso.’

 

Segurança financeira da TV afasta de vez alguns autores dos palcos

A trajetória de Maria Adelaide Amaral, 68, mostra que se pode cumprir o traslado entre teatro e televisão conservando as marcas autorais e, ao mesmo tempo, criando histórias de amplo alcance, comunicação imediata.

De uma primeira dramaturgia revestida de preocupações sociais, ela saltou para crônicas de desencontros amorosos e ensaios sobre a alma feminina. Na TV, depois de colaborações em novelas, firmou-se como autora de minisséries históricas elogiadas pela crítica e bem recebidas pelo público.

A exceção foi ‘Os Maias’ (2001), adaptação da obra de Eça de Queirós, que teve audiência abaixo do esperado:

‘Me irritei nesta época. Mas nada a ponto de pensar em voltar para o teatro, mesmo por que não há caminho de volta. Como viver de uma atividade que desde os anos 90 se limita a três ou quatro sessões por semana?’, questiona ela, por e-mail.

Maria Adelaide diz que continuou a escrever teatro, mas cada vez menos, sobretudo depois de se tornar autora titular, em 1997. ‘Sobra pouco tempo para outras atividades’, argumenta.

O caminho também parece não ter volta para Camilo Pellegrini, que emenda uma novela na outra há cinco anos. ‘O fator financeiro é determinante. Não consegui mais escrever para teatro. Tenho duas peças inacabadas há dois anos. Não tive mais o ímpeto, porque demora uns três meses’, ele diz. ‘O teatro é uma delícia, mas ficou inviável para mim.’

Sérgio Roveri reverbera a preocupação. ‘Com uma peça indicada a três prêmios Shell em cartaz por três meses, ganhei R$ 300. É duro falar isso, parece mercantilista. Quando você vê que a nova cena se faz de gente que escreve nas horas livres, é triste. Ainda assim, não dá para deixar de fazer a outra parte [teatro], aquela vocação inicial que fez com que o resto acontecesse.’

 

Clarice Cardoso

Mulheres colocam Viva entre os dez mais

Elas têm mais de 25 anos, pertencem às classes A, B e C e são, em sua maioria, casadas. Priorizam a família e querem acesso a conteúdos de culinária, saúde, moda e educação. Juntas, ajudaram a colocar o Viva, um canal recém-nascido, entre os dez mais sintonizados da TV por assinatura em outubro.

Aos seis meses -estreou em 18 de maio-, a emissora ocupa o nono lugar no ranking do Ibope -que não divulga pontos de audiência para TV paga.

Está atrás de infantis (Discovery Kids, Disney Channel, Cartoon Network, Nickelodeon), noticiosos (Globonews), esportivos (SporTV) e filmes (TNT e TCPipoca). Ou seja: é o único declaradamente ligado à audiência feminina. Que comparece.

‘Na criação do Viva, notamos que uma parcela desse público ainda não se sentia suficientemente atendida pela TV paga’, diz a diretora do Viva, Leticia Muhana, sobre a composição do canal.

Segundo ela, 32% da audiência ao longo do dia são de mulheres com aquele perfil, sendo que, na TV paga em geral, elas são 19%. ‘Ou seja, conseguimos atrair mais mulheres do que a média da TV por assinatura: 13% a mais’.

CLUBE DA LULUZINHA

Para isso, a isca é uma combinação de produções a que, em tese, o público já está familiarizado: são programas da Globo, como novelas, minisséries e humorísticos, telefilmes, realities e títulos exibidos em outros canais Globosat.

Tanto que, entre os dez títulos mais vistos (leia mais ao lado), sete foram exibidos originalmente na última década na TV aberta.

Uma exceção vistosa é ‘Vale Tudo’: novela de 22 anos que, em pouco menos de um mês, virou o quinto programa mais visto e se tornou hit de uma geração conectada. E que, seja reunindo grupos em casa no horário dos capítulos, seja comentando-os no Twitter, trouxe de volta Odete Roitman em toda a sua glória.

‘Não há como medir os públicos que vão assistir aos programas pela primeira vez ou os que já os viram antes, mas observamos seus movimentos nas redes sociais, por exemplo’, afirma Muhana.

O desempenho da trama tem sido marcante para os resultados da emissora. De acordo com ela, a estreia da novela gerou um crescimento de mais de 200% em audiência na faixa -das 0h45 à 1h45-, o que deixou o canal na liderança no horário.

‘Nas faixas ‘vizinhas’ também houve crescimento, com aumento de cerca de 70% em audiência na exibição de filmes (à 1h45). Já na de minisséries, às 23h45, ele foi de cerca de 25%’, completa.

 

Vanessa Barbara

Marechal Rondon é o cara

Nesta quinta-feira, dia 9, vai ao ar o último episódio de ‘15 Minutos’, principal atração de humor da MTV (seg. a qui., às 21h45, livre). Segundo a emissora, o apresentador Marcelo Adnet irá comandar um novo programa em 2011.

Há dois anos e meio, o jovem comediante vem interpretando a si mesmo num estúdio que reproduz seu quarto em Humaitá, no Rio de Janeiro. De bermuda, camiseta e chinelo, lê e-mails dos fãs, divaga sobre assuntos do noticiário, faz paródias de celebridades e imitações retumbantes de José Wilker.

É o único humorístico da TV aberta que tem audiência aqui em casa, talvez porque Adnet não tente ser engraçado de forma explícita. Ele usa um tom quase formal para tratar dos assuntos mais tolos, simulando a empáfia das personalidades televisivas.

Pode começar, por exemplo, mandando um ‘alô para o cachorro-quente com ervilha, ovo de codorna, molho rosé e queijo ralado, e também para o Ary Barroso’. Em seguida, parte para sua especialidade: imitar Cid Moreira, Pedro Bial ou Dinho Ouro Preto, por meio de sátiras musicais.

Outro dia, parodiou Elis Regina cantando o hino do Corinthians no chuveiro, Caetano Veloso solfejando ‘They Don’t Care About Us’ e ‘Cai Cai Balão’ no estilo dos concorrentes de ‘Ídolos’ (Record).

O programa já teve ‘Sweet Child O’ Mine’, do Guns N’ Roses, na voz de Silvio Santos, e ‘Garganta’, num dueto de Ana Carolina e Dercy Gonçalves. Entre as composições próprias, destacam-se o ‘Funk do Mosquito’, a ‘Micareta Metal’ e a ‘Bossa Nova do Cocô’.

Adnet consegue se transformar em tudo: faz um bispo evangélico à perfeição, tem recorrentes ‘surtos de Ivete Sangalo’ e compôs uma canção de sátira às boy bands: ‘Furfles Feelings’.

Nas estantes, há um boneco do Gorbachov, um exemplar do Alcorão, uma chinchila, uma flâmula da Taça Rio e um cartaz com a inscrição ‘Marechal Rondon é o cara’.

Além disso, há placas com os dizeres: ‘ÓUAÊAÍÓ’, ‘Não cumprimente o pinguim’ e ‘Não cuspa’.

Espera-se que o novo programa de Adnet seja tão incoerente e desnecessário quanto ‘15 Minutos’.

Com sorte, ele irá abrir a atração com um de seus instigantes versos: ‘Em homenagem ao meu mamilo/ eu vou de repente, do nada, mudar de estilo’.

 

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