
(Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
Chego devagarinho neste espaço de ideias. Aqui, onde o jornalismo é o centro das análises, leio textos inteligentes, perspicazes, críticos. Neles encontro um mundo de questões e provocações que envolvem a profissão que, primeiro, escolhi exercer e, depois, ensinar. Percebo os efeitos das transformações tecnológicas sobre a pragmática jornalística, mas também, e, principalmente, sobre a ética da profissão, seu sentido social, sua dimensão ideológica, seu lugar numa sociedade que vem assumindo, ela mesma e por seus próprios meios, a produção e circulação das informações que lhe interessam. E me sinto compelido a perguntar: qual é o lugar do jornalismo na sociedade midiatizada de hoje ou do futuro que se prenuncia na lógica dos algoritmos e da inteligência artificial?
Moro num sub-bairro, quase rural, quase urbano, na periferia de uma cidade com quase 350 mil habitantes, bem ao sul do Sul brasileiro. A informação local que me interessa e que me afeta diretamente me chega pelo grupo de Whatsapp de vizinhos: cavalo solto na rua; visita da vigilância sanitária; vacinação de pets; troca de iluminação pública; falta de luz; patrolamento das ruas etc. Seria isso jornalismo? E a memória me traz Adelmo Genro Filho e a teoria de que o jornalismo é instituição indispensável porque atenderia às necessidades de informação das sociedades.
É claro que há informação de que necessitamos que transcende o local. Fazemos parte de uma aldeia maior, e o que acontece em outras partes do mundo, com outras pessoas como nós, desperta nosso interesse. Esses acontecimentos, que o jornalismo apura e embala em notícias, passam a compor a paisagem de nosso cotidiano ordinário. Quando as lemos ou as ouvimos, é como se a realidade que reconhecemos se apresentasse restabelecida naquela forma de discurso, naquele contar os fatos e explicá-los. A complexidade do mundo com suas realidades é, ali, ordenada, organizada e reduzida a uma oferta de sentido possível. E como espelho, o jornalismo reflete ou refrata, não a realidade, mas o leitor e a posição que ocupa diante da vida e para a qual foi sendo levado desde a mais remota idade (Bergmann e Luckmann).
Nesse sentido, a relevância do jornalismo para qualquer sociedade está na sua qualidade e capacidade para produzir os discursos que conectam as pessoas com quaisquer acontecimentos que as afetam, sejam locais ou distantes. E não obstante o jornalismo atenda, via de regra, aos interesses das forças sociais hegemônicas, é nele que buscamos, na maior parte das vezes, alguma referência confiável do real ou da verdade quando suspeitamos de uma informação.
É nesse terreno minado, paradoxal, complexo e incerto que adentro quando penso o jornalismo. E cada questão que se apresenta neste cenário – lógicas, ideológicas, pragmáticas, tecnológicas, discursivas, etc. — leva-me sempre à pergunta fundamental: do que estamos falando quando falamos de jornalismo? Aqui mesmo, neste espaço de ideias, onde o jornalismo é o centro das análises, esta pergunta tem muitas respostas. Talvez no garimpo em meio a tantas definições encontremos o denominador comum, aquele elemento ontológico sem o qual o jornalismo não seria.