Saturday, 11 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Francisco Alves Filho e Liana Melo

ASPAS

CASO BOECHAT

"Fogo cruzado", copyright IstoÉ, 1/07/01

"Não há anjinhos no mundo dos grandes negócios. Os últimos lances na disputa pelo bilionário mercado da telefonia, privatizado há dois anos e meio, são capazes de fazer corar qualquer gângster. Na guerra suja pelo controle da Telemig Celular e da Tele Norte Celular, arapongas entraram em ação e gravaram conversas telefônicas do empresário Nelson Tanure, um personagem novo neste setor. Ávido por uma fatia desse mercado, Tanure aliou-se à canadense TIW, que vive às turras com o sócio Daniel Dantas, do Opportunity. Os canadenses querem a todo custo provocar uma alteração no arranjo acionário que vem tirando da empresa estrangeira poder de decisão nas duas teles. Os grampos captaram, em abril, diálogos de Tanure – que também é acionista majoritário do Jornal do Brasil -, do seu assessor Paulo Marinho e do jornalista Ricardo Boechat. O principal assunto das conversas era a estratégia montada para derrubar Dantas. Tanure vai pedir abertura de inquérito policial para identificar os autores do grampo. As primeiras suspeitas recaíram sobre os ombros de um dos assessores de Dantas, o jornalista e ex-governador do Rio Grande do Sul Antonio Britto. Nessa guerra suja, a única vítima registrada até agora foi Boechat, demitido do jornal O Globo no domingo 24.

O colunista aparece nas fitas checando com Paulo Marinho os detalhes de uma reportagem de sua autoria que acabaria sendo publicada em abril sobre a briga das teles. A fonte da notícia era o próprio assessor de Tanure. A matéria tornava pública a tentativa de Dantas de exonerar três representantes dos fundos de pensão da Telemig Celular e da Tele Norte Celular para aumentar seu poder – os fundos são sócios da TIW e do Opportunity nessas empresas. Boechat leu para Marinho a íntegra do texto, que dias depois seria usado numa ação contra a empresa de Dantas. A publicação das fitas pela revista Veja causou sua demissão. ?Ele usou o jornal e a sua influência para fazer uma matéria que favorece um grupo contra o outro?, justifica o diretor de jornalismo de O Globo, Merval Pereira. O colunista se defende. ?O importante é que a matéria era verdadeira. Ouvir fontes que tenham interesse numa notícia para atingir um adversário não é nenhum delito?, argumenta Boechat.

Considerado um dos mais bem informados jornalistas brasileiros, ele estava há 30 anos em O Globo e participava também do telejornal Bom Dia Brasil, da Rede Globo. Seu destino agora deve ser o Jornal do Brasil, e as negociações com esse objetivo já começaram. ?O mercado jornalístico do Rio é um Fla-Flu?, diz ele, referindo-se à polarização entre os dois jornais. Desde a demissão, Boechat, 49 anos, tem sofrido de insônia, fuma sem parar e tem crises de choro.

Sem comentários – Os dois protagonistas dessa disputa se fecharam em copas. Paulo Marinho mediu as palavras: ?Fui vítima de um crime, não quero falar sobre o assunto.? Se os principais envolvidos não se pronunciam, os comentários sobre os possíveis responsáveis pela divulgação das fitas correm soltos. O advogado Sérgio Bermudes, do Opportunity, por exemplo, é um dos citados. Bermudes também não quis comentar o assunto. Já Antonio Britto foi notificado extrajudicialmente há três semanas para responder se sabia da existência das fitas. ?Claro que não tive nada a ver com isso. Apenas comentei com Clovis Carvalho (advogado dos fundos de pensão) que teríamos que tomar cuidado porque o clima da disputa é muito ruim, com muita gente oferecendo dossiês e fitas contra um lado e outro?, explica. Pelo visto, as nuvens negras identificadas por Britto ainda vão provocar muitos raios e trovoadas na briga das teles."

"O Caso Boechat", copyright Coleguinhas, Uni-vos (www.coleguinhas.jor.br), 1/07/01

"Tudo bem? Já acalmou? Legal. O Caso Boechat-Veja-O Globo tem um monte de facetas, daí vou dividir em tópicos para tentar abarcar a maior parte delas, embora tenha certeza de que não vou conseguir dar conta de todas. Antes disso, porém, uma manifestação de Paulo Jabur, fotógrafo que colaborava com o Boechat em sua coluna:

?Como fotógrafo colaborador da Coluna Swann / Ricardo Boechat, venho dar meu testemunho – baseado em um convívio diário de mais de 10 anos – da lisura e retidão da postura profissional do jornalista Ricardo Boechat (e sua equipe) como titular da coluna.

Nesse convívio diário – por certo não isento de discordâncias – pude reconhecer em Boechat um único objetivo: sempre a notícia e o fato jornalístico; nunca qualquer tipo de interesse menor ou vantagem pessoal.

Considero que nos recentes fatos envolvendo seu nome, Boechat foi mais uma vítima – via métodos ilegais – de uma bilionária luta de interesses nebulosos. Ressalte-se que nada do que escreveu sobre o caso foi desmentido ou sequer contestado.

Diante disto, expresso a minha convicção de que sua credibilidade, honradez e honestidade profissional e pessoal permanecem intactas.?

Rio de Janeiro, 28 de junho de 2001.

Paulo Jabur?

Agora, os meus pitacos:

Boechat – Confesso que fiquei triste. Não pela gravação em si, pois ele mesmo defende o crime do qual foi vítima (ler a entrevista de Marcos Sá Corrêa no NO. de 28/06), mas pela fraqueza de argumentos do Boechat em sua defesa. Foi realmente constrangedor vê-lo dizer que vale-tudo para conseguir uma notícia se ela é verdadeira. Quer dizer que um dos nossos mais respeitados jornalistas acha que pode cometer crimes no exercício de sua profissão? Fiquei com vergonha e, ao mesmo tempo, com uma tremenda vontade de vomitar.

Para tentar entender o absurdo da argumentação, recorri até a alguns dos Grandes Livros da Humanidade (Bíblia, Alcorão, I Ching, Bhagavad-Gîtâ) e em nenhum deles encontrei que publicação (ou emissão) de notícia verdadeira acarretasse absolvição moral por crimes cometidos. Na linha de raciocínio de que na defesa do tal ?interesse público? vale o ?pega-pra-capar?, o Boechat – e quem pensa como ele – vai acabar defendendo os policiais que torturam e executam bandidos. Afinal, se o cara matou ou roubou, mas não quer confessar, por que, na defesa do interesse público, não botá-lo no pau-de-arara? Ou se o sujeito é mesmo bandido de longa folha corrida por que não furá-lo com 20 balas dumdum, na defesa do interesse público? No caso de alguns inocentes dançarem por engano às vezes…Bem, isso são cavacos do ofício, né, gentem?

Outra fonte de constrangimento para mim foi a invocação de um suposto ?saldo médio? obtido por 30 anos de bons serviços prestados ao Globo. Ora exatamente por estar há 30 anos naquela empresa, ele devia ter ciência de que ela (como todas as outras) não sabe o sentido da palavra ?gratidão?. Para elas, no momento em que o jornalista não servir mais (por ter ficado com cabelos brancos ou ter sido flagrado fazendo algo esquisito) será defenestrado sem uma lágrima.

O Globo – Posição hipócrita em todo o episódio. Vai querer dizer que ninguém sabia que o Boechat lia matéria para as fontes antes deste caso? Vai dizer que matérias originadas de uma fonte para botar outra em palpos de aranha são proibidas e só saem por cochilo? Vai dizer que ninguém sabia que o Boechat tinha cometido um crime – facilitação de fuga – no caso em que avisou ao bandido que ele ia ser preso pelos federais, a fim de pôr as mãos nos papéis que provavam o superfaturamento na compra das fardas do Exército em 91? É ruim, hein? Estão querendo enganar quem?

Pior, no entanto, foi a desculpa para ter praticamente copiado a matéria da Veja na edição de segunda. Desde quando expôr alguém à execração pública sem direito de defesa é ser elegante para ?preservar um relacionamento de 30 anos?? Se quisesse ser mesmo elegante, O Globo dado 20 centímetros para o Boechat se defender e usado 20 centrímetros para dizer porque o estava demitindo. Aí que o leitor decidisse qual das duas argumentações era a mais inconsistente.

Veja – Assumiu a liderança folgada do Campeonato Brasileiro de Arapongagem. Demonstrou, mais uma vez, que não se detém diante de coisas prosaicas como o Código Penal se for para vender mais algumas centenas de exemplares. Como este é apenas mais um caso do tipo nesta revista, nem vou me alongar. Até porque aquela vontade de vomitar voltou…

Observatório da Imprensa – Como escrevi na CPM, valeu a agilidade para botar o Boechat no ar em cima do lance. Mas alguém poderia me explicar por que varreram para debaixo do tapete a discussão sobre os crimes cometidos pela imprensa a fim de facilitar o trabalho de apuração? O assunto foi puxado pelo Hélio Doyle (lembrando até o caso das microcamêras), mas habilmente jogado para escanteio. De repente, foi porque o Boechat começou a defender a atitude criminosa e isso poderia causar problemas a ele e aos produtores do OI. Afinal, a Rede Brasil é uma empresa pública e ia pegar muito mal a defesa do cometimento de crimes como escuta telefônica, facilitação de fuga e outros que poderiam surgir.

Coleguinhas grampeados – Só para constar: o caso do Boechat foi o terceiro de grampeamento telefônico envolvendo jornalistas de que tomo conhecimento.

Houve um, jocoso, no qual o coleguinha teve que ir à PF para explicar o quê, afinal, era aquele papo com o Clarimundo esqueci-o-sobrenome, presidente do finado Banco Nacional. Na conversa, o coleguinha, que adora falar por meias palavras e código, dissertava sobre certas preferências íntimas de colegas, uma delas com nome estranho. Teve que cortar um dobrado para convencer os federais que aquele era um nome verdadeiro, e a conversa, fofoca rasteira, não alguma troca de idéias sobre fraudes. O susto não adiantou: o coleguinha continua com mania de agente secreto.

Ao outro caso, muito triste, me referi há uns dois anos. Ocorreu com uma coleguinha, também de Economia (campo minado, como se vê) que, em conversa com fonte, falava sobre a possibilidade de fazer um curso de aperfeiçoamento na faculdade dirigida pela fonte. O grampo foi feito pela revista (cujos telefones eram – não sei se ainda são – grampeados) em que trabalhava e usado pelo chefe, que não lhe ia com a cara, para demiti-la, embora, na gravação, a coleguinha deixasse claro que ia pagar o curso do próprio bolso.

?Lei dos Cinco Segundos? – O Caso Boechat demonstra que, para as empresas jornalísticas, o que vale mesmo é a Lei dos Cinco Segundos (citada de memória, ok?):

?Se você ou alguém de sua equipe for capturado ou morto, nós negaremos ter conhecimento de sua missão. Boa sorte, Ethan. Esta mensagem se autodestruirá em cinco segundos?.

Tchan-tchan-tchantchantchan-tchan-tchantchantchan…

Lições – Vamos lá, todos juntos:

1. Jornalista não é juiz; não é policial; não é promotor público;

2. Os fins não justificam os meios porque estes maculam os fins, rebaixando-os primeiro e destruindo-os depois. Ou, como dizia minha vovó, Dona Sinhá, ?de boas intenções o inferno está cheio?.

Picadinho à Coleguinhas

Rainha da Inglaterra – Como diz o hino do Fluzão, ?quem espera sempre alcança?. Carlos Henrique Schroeder sucede Evandro Carlos de Andrade como diretor-geral da Central Globo de Jornalismo. Mas quem vai mandar mesmo são Ali Kamel (JN, Bom Dia, Brasil, Editoria Rio e sucursal BSB) e Amauri Soares (JGlobo, Hoje, Fantástico e Globo Repórter), este muito prestigiado por Lady Vader.

Retroceder, nunca; desistir, jamais – Apesar da resistência de João Roberto Marinho, o nome de Dácio Malta voltará à pedra para a direção de redação de O Globo.

Gugu dadá – Não é apenas um filho adventício que espera o apresentador Gugu Liberato. Ele está de olho numa possível venda da Rede TV!, esperada pelos credores da mesma."

"A notícia que vem pronta", copyright No. (www.no.com.br), 28/06/01

"Ricardo Boechat, um dos recordistas brasileiros de ligações telefônicas em proveito da notícia, foi vítima esta semana do instrumento que deu fama de implacável à coluna diária que assinava no jornal O Globo. Demitido por um grampo telefônico, que o flagrava numa conversa indiscreta publicada pela revista Veja, nem por isso perdeu o faro e o instinto de repórter. Apurando seu próprio caso, ele está na pista das gravações clandestinas que cada vez mais estão por trás das notícias mais ruidosas da imprensa brasileira, como conta nesta entrevista a no.:

O que o colunista Ricardo Boechat faria se lhe caíssem nas mãos gravações dos telefonemas do jornalista Ricardo Boechat?

Ricardo Boechat – Em primeiro lugar, eu trataria de avaliar se as tais fitas continham ou não informações de interesse público. Esse tipo de informação tem origem criminosa. Acho que para pôr as mãos nesse tipo de material o jornalista tem que decidir se o crime que com isso ele denuncia e às vezes evita é mais importante para a sociedade do que o crime original do grampeamento telefônico.

Essa é a opinião da vítima ou do repórter?

Boechat – Mesmo como vítima não deixei der ser repórter. Tenho de reconhecer, mesmo como vítima, que o placar do grampo telefônico ultimamente tem sido favorável à sociedade brasileira. Sa&iiacute;ram dele mais denúncias positivas para a sociedade em geral do que atentados às liberdades individuais que a lei protege.

Quais?

Boechat – Por exemplo, foi assim que estourou a história da manipulação na privatização das teles, desvendou-se parte do esquema Lalau e vazou o escândalo da violação no painel eletrônico do Senado. Eu seria a última pessoa a defender a formalidade legal diante de casos como esses. Mas é preciso notar que todos esses casos têm uma característica em comum: envolviam recursos públicos, administradores públicos, negócios públicos. Nesse fonte, portanto, a sociedade brasileira tem bebido mais água do que veneno. Mas é claro que o grampo está ficando tão banal que passou da hora de discutir a fundo como e quando se pode usá-lo como fonte de informação.

Por quê?

Boechat – É como disse o vice-presidente Pedro Aleixo, ao saber pelo marechal Costa e Silva que o governo militar baixaria o Ato Institucional número 5, acabando com as liberdades democráticas do regime e dando partida a um processo que em pouco tempo afundaria o país no terror: ?Presidente, o problema não é saber o que o Sr. fará com o AI-5. É o que o guarda da esquina fará com ele?. Um instrumento como esse, dependendo das mãos em que cai, pode fazer estragos terríveis. Como vítima, mas tentando ser isento, eu acho que o perigo não está nos mocinhos – e chamo de mocinhos os jornalistas, os promotores, todos nós que estamos usando material de grampo para fazer denúncias. O perigo é o que os bandidos podem fazer com ele.

E como saber se a arma está com o mocinho ou o bandido?

Boechat – Nisso, considero meu caso exemplar. Ali não se tratava de um escândalo de interesse público. Tratava-se de transformar em escândalo público um assunto de interesse privado. Ou seja, os golpes baixos de uma luta entre dois grupos econômicos privados, o empresário Nelson Tanure e o banco Opportunity. E, o que é pior, só se contou um lado da história.

Você recusaria uma história dessas?

Boechat – No caso, recusei. Eu sabia da existência dessas fitas há quase um mês. Na época, ligou para mim o assessor de imprensa de um fundo de pensão, querendo passar uma nota sobre o ex-governador Antônio Britto, que hoje trabalha para o Opportunity, comentando com o ex-ministro Clóvis Carvalho, agora advogado dos fundos, sobre grampos telefônicos em que Tanure comentava vitórias judiciais contra o Opportunity, graças a sua influência sobre setores da Justiça. O mesmo assessor me disse depois que havia nas gravações uma conversa minha com Tanure, em que eu articulava uma notícia contra o Opportunity. Liguei para o Antônio Britto e ele me disse que não usava esse tipo de instrumento. Só admitiu que havia comentado com Clóvis Carvalho os rumores sobre a existência das fitas. Eu desliguei o telefone e esqueci o assunto.

Sua fama sempre foi a de fazer tudo por uma notícia. Já usou gravações de conversas alheias?

Boechat – Como jornalista, tive uma única oportunidade de ouvir uma fita em primeira mão. Foi há cerca de dois anos, não me lembro bem da data. Tratava-se de uma conversa privada do juiz Lalau, em que ele revelava seus contatos políticos em Brasília e reclamava dos senadores que, depois do escândalo nas obras do TRT paulista, viraram-lhe as costas. Mencionava também suas visitas a um escritório do ex-secretário da presidência Eduardo Jorge. Eu ouvi essa gravação dentro de um carro no estacionamento do aeroporto Santos Dumont. Ela me foi mostrada por um assessor do Luiz Estevão, que me autorizou a publicar as informações, desde que não falasse na fita.

O que você fez?

Boechat – Publiquei uma nota na coluna, dizendo que os contatos de Lalau com o Eduardo Jorge haviam ocorrido no escritório que ele usava em Brasília quando se desligou da presidência. Na época, o ex-secretário da presidência dizia que só conhecia Lalau por telefone. Semanas depois, a história saiu em outro jornal. E eu fiz uma reportagem para o Globo, contando que ela vinha de Luiz Estevão.

Qual a diferença entre a fita que o pegou como vítima e a que lhe serviu como fonte?

Boechat – Para começar, o interesse público, que é 100% da diferença. Estamos falando de um escândalo que envolvia um desvio de 169 milhões de reais na construção de um prédio público. E envolvia um juiz, um assessor presidencial, vários senadores. E no caso eu tratei de verificar todos os dados da gravação. Chequei informações para saber se o juiz havia estado no escritório, descobri seu endereço etc. Na reportagem que depois ajudei a fazer para O Globo, publicou-se inclusive o nome do intermediário de Luiz Estevão que oferecia a fita. Chamava-se Fábio Simão, um assessor do senador.

Ou seja: o leitor tem que saber de onde veio a informação?

Boechat – Francamente, para mim não importa o que pretende quem grampeia um telefone se a divulgação da fita serve para impedir um roubo de milhões de reais. Se ele com isso quiser roubar dois milhões, assim que eu souber disso, publico também. Eu não gostaria de ser o responsável por não publicar um grampo que impedisse uma grande falcatrua com dinheiro público. Isso dá ao jornalista excesso de poder discricionário? Sem dúvida. Mas num país que anda à matroca, às vezes isso é inevitável. A imprensa é só a saída desse esgoto

Como assim?

Boechat – Acho que a imprensa brasileira está correndo um risco crescente, com a disseminação da espionagem eletrônica, de transferir o velho papel da reportagem investigativa do velho repórter farejador para o novo araponga profissional. Os espiões cada vez mais produzem informações bombásticas que caem no colo dos repórteres. Qualquer dia, os repórteres não precisam mais sair da redação para dar grandes furos jornalísticos. Aí, jornalista vai morrer mais cedo por excesso de vida sedentária. Não precisará mais caminhar atrás da notícia porque ela estará correndo atrás dele. O risco a meu ver está em pegar essas informações como fonte de reportagens prontas. O repórter que recebe uma informação tirada de gravação clandestina não deve correr para redação e publicar aquilo o mais depressa possível. Deve correr para a rua e apurar tudo de novo. Aliás, precisa apurar mais do que nunca.

Por que o perigo está aumentando?

Boechat – Como repórter e como vítima, falei com dezenas de pessoas nos últimos dias, tentando entender como essas coisas acontecem. Uma das coisas que aprendi é que três empresas praticamente monopolizam o mercado de grampos no Rio de Janeiro e em São Paulo. Oferecem quatro tipos de serviços. Desde o mais simples, que grava o próprio aparelho do grampeado. Esse é um esquema barato, mas vulnerável, porque interfere no sinal e qualquer aparelho de rastreamento denuncia sua presença. Esse é o grampo de pobre. Há um sistema que grampeia as próprias centrais telefônicas, com a participação dos operadores e é bem mais confiável. Enfim, existe o grampo que se baseia em autorizações judiciais. Quando o Ministério Público e a Polícia Federal obtêm judicialmente a quebra do sigilo telefônico de alguém, o mercado paralelo põe os números que interessem a seus clientes na lista que o juiz aprova. É um serviço oferecido pelas três empresas.

Esse é o seu próximo furo de reportagem?

Boechat – O que está por trás da reportagem de Veja não me importa mais. Estou é procurando emprego."

    
    
                     

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