Wednesday, 15 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Joaquim Falcão

ELEIÇÕES 2002

“Política cultural e eleições”, copyright Folha de S. Paulo, 20/08/02

“O debate eleitoral está tomado pela discussão financeira, como única responsável pela vida ou sobrevida do país. Pelo passado e pelo futuro. É como se o Brasil de repente fosse apenas um imenso déficit. Um passivo imobilizado. Sobra pouco tempo e espaço para outras questões, também fundamentais, como a da cultura, por exemplo.

Ao desenhar nova política cultural, o primeiro desafio de um novo presidente poderia ser avaliar se a atual organização do governo federal -instituições e legislação- é ou não adequada aos novos tempos. Por motivo simples: vivemos ainda a matriz implantada em 1937, no Estado Novo, por Getúlio Vargas e Gustavo Capanema. E fragmentadamente modificada pela reforma dos anos 70, com a então Fundação Nacional Pró-Memória, pela Lei Sarney, hoje Rouanet, e pela criação do próprio Ministério da Cultura.

Será esta matriz capaz de lidar com as imensas transformações que ocorreram nas últimas duas décadas? Pelo menos três grandes transformações ampliaram as dimensões e a importância da cultura para o governo e para o país.

Primeiro, cultura é comunicação. Um viés tecnológico limitou a questão da comunicação social no Brasil ao Ministério das Telecomunicações. Limite grave e danoso. Não se pode pensar a cultura brasileira hoje sem o fundamental papel da televisão. E televisão não são apenas concessões, cabos e fios. É, sobretudo, conteúdo. E conteúdo é cultura. Não se pode pensar a televisão sem pensar o impacto que ela provoca em nosso ser, saber e fazer. Sem pensar na proteção e no estímulo governamentais a um conteúdo televisivo brasileiro.

O Ministério da Cultura não tem recursos, instrumentos ou diretrizes para nenhuma ação nesse sentido. É quase um telespectador anônimo. Nestes tempos de globalização, talvez esteja nesse conteúdo o sucesso ou o fracasso da identidade cultural do país. A França lamenta até hoje uma política cultural errada. Tenta agora, talvez tarde, desesperadamente, desamericanizar sua televisão. Estavam substituindo o ?savoir faire? pelo ?american way of life?, em nome de uma globalização que é apenas americanização.

Segundo, cultura é emprego. Não se separa mais o potencial econômico da cultura da defesa e expansão de nossos valores, nossas artes, nosso patrimônio, nossa música, teatro e cinema, nossa gastronomia, nosso saber e nosso fazer. Hollywood que o diga e exemplifique, um produto cultural de exportação dos Estados Unidos de inestimável valor econômico e estratégico.

Celso Furtado disse certa feita que a cultura de um povo expressa a qualidade de seu desenvolvimento. Ou seja, a perspectiva econômica nos diria da dimensão quantitativa do desenvolvimento, e a perspectiva cultural, da dimensão qualitativa. Faces da mesma moeda. Infelizmente, não temos nem mesmo dados estatísticos para orientar uma ação. Salvo o esforço de pesquisa de José Álvaro Moisés e a excelente disposição da Fundação Casa Rui Barbosa em ser um ?Ipea? do Ministério da Cultura, estamos a pé e no escuro. Diógenes sem lâmpada.

Finalmente, cultura é democracia. E democracia é mobilização e participação dos cidadãos na produção e difusão cultural de sua comunidade. Uma linguagem meramente burocrática e administrativa diria que é preciso descentralizar a gestão cultural federal. Isso é outro problema. Não cabe ao Estado fazer cultura. Cabe ao país e, sobretudo, às nossas comunidades. Cabe ao governo criar condições para mobilizar a comunidade. Isso é mais do que uma reforma administrativa. Para tanto é necessário que a comunidade se organize através das entidades do terceiro setor. E o governo viabilize a existência e a expansão dessas nossas entidades de cidadania.

A cultura como um grande movimento, capaz de entusiasmar não só as grandes empresas, mas também o cidadão comum, as casas, os bairros, as comunidades, a cidade e o país, é o maior desafio. É consolidar a democracia. Receio que o governo federal, quando tem essa visão, não tem os instrumento necessários. A Lei Rouanet, como está, não estimula essa participação democrática. Ao contrário, proíbe o cidadão individual de ser um ativo financiador de sua comunidade.O debate cultural eleitoral é o momento propício para as reivindicações legítimas dos grupos de interesses, mas deve ir além. É também o momento para o país avaliar a adequação ou não entre as instituições e instrumentos do governo federal na área cultural e a invenção, criação e consecução do novo, que todos queremos. E de que precisamos. A partir daí, é elaborar as propostas que conjuguem o ideal com sua prática possível. (Joaquim Falcão, 58, mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA), é professor das faculdades de direito da UFRJ e da FGV-RJ. Foi secretário-geral da Fundação Roberto Marinho.)

 

“Perto da eleição, rede evita política às 19h”, copyright Folha de S. Paulo, 15/08/02

“O personagem de Marco Ricca na próxima novela das sete da Globo, ?O Beijo do Vampiro? -que estréia dia 26-, ia ser um prefeito. Mas, às vésperas das eleições, a emissora decidiu transformá-lo em promotor para evitar problemas durante a campanha.

O autor da trama, Antônio Calmon, explicou que o promotor, Augusto, defende a parte antiga da fictícia cidade de Maramores. ?Com Armando [Eduardo Galvão], que defende a moderna, ele tem problemas políticos?, disse, em entrevista coletiva, anteontem, no Rio. Em seguida, em tom mais baixo, falou diante de um grupo de jornalistas que o cercava com gravadores: ?Políticos não, porque a gente não pode falar de política até o fim das eleições?. E seguiu contando a história.

O autor negou à Folha, minutos depois, que esteja evitando a política na trama em razão das eleições e que tenha recebido essa orientação da emissora. ?Você acha que eu ia colocar política em uma novela de vampiros?!? Mas e a declaração dada ao grupo de jornalistas? ?Eu não disse nada disso. Nego veementemente. Por que vocês [da Folha] sempre vêm com esse tipo de pergunta? Não quer saber nada da história??

No ano passado, a Globo teve problemas com o ex-senador Antonio Carlos Magalhães quando exibia ?Porto dos Milagres?. Na época em que ACM enfrentava denúncias, a novela mostrava a história de um senador corrupto, interpretado por Lima Duarte, que teve uma conversa gravada secretamente por um adversário.

?O Beijo do Vampiro? é uma novela de humor. Tem a intenção de readequar o horário das sete para o público infantil, já que a novela atual, ?Desejos de Mulher?, tem cenas fortes de violência, com assassinatos, sequestros e personagens alcoolizados.

?Os vampiros só mordem em último caso?, disse Calmon.”

“TRE-SP considera texto de Folha de S. Paulo ofensivo”, copyright Revista Consultor Jurídico, 19/08/02

“O jornal Folha de S. Paulo terá que publicar na sua edição desta terça-feira (20/8) direito de resposta do candidato Paulo Maluf. A determinação é do desembargador do Tribunal Regional Eleitoral, Paulo Shintate. O direito de resposta será publicado na coluna de Marilene Felinto por causa de um texto considerado ofensivo pela Justiça Eleitoral.

No texto, ela simula conversa com uma faxineira. Em um dos trechos indaga: ?Você sabia que Maluf, Collor, Garotinho, a mulher dele, Rosinha, são populistas? Sabe o que é um político populista??. E responde: ?É gente que se aproveita da falta de estudos dos mais pobres para mentir, fingir que está do lado deles. São os candidatos da ignorância?.

O desembargador acatou a tese dos advogados Ricardo Tosto, Eduardo Nobre e Patrícia Rios de que o texto ofende a honra de Maluf.

?Pode-se admitir a crítica severa e injusta, mas não ofensiva. Deve-se distinguir a crítica política legítima, ainda que injusta e severa, da ofensa descabida e maledicente que autoriza o direito de resposta?, afirmou Shintate.

O TRE-SP entendeu que o texto pode abalar a reputação do candidato e causar danos no período eleitoral.”