Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Um acordo que não é de paz

ANTI-SEMITISMO

O filme Gentlemen Agreement (acordo de cavalheiros), de Elia Kazan (1947), conta a história de um jornalista que finge ser judeu ao se mudar para Nova York. O protagonista escamoteia uma discriminação cuja principal inovação é o fato de não ser verbalizada, de ficar no ar. Qualquer acusado de preconceito ficaria envergonhado, mas o mal se mostra extremamente penetrante até nas mais refinadas camadas sociais.

Na história americana, o termo "acordo de cavalheiros" também se refere a pactos diplomáticos silenciosos e informais. Na opinião de Seth Lipsky [The Wall Street Journal, 31/10/01], ultimamente parece que um novo acordo desse tipo está se firmando. Para ele, este é um tempo de misturas perigosas, que combinam o clássico anti-semitismo com diplomacia internacional. E o acordo que está em prática agora visa isolar Israel durante o julgamento da guerra contra um terrorismo que, entre outros objetivos, pretende justamente isolar Israel.

Todos vêem o que está acontecendo, mas ninguém está disposto a chamar o fenômeno pelo nome. Nos últimos dias houve casos espetaculares de jornalistas soltando os cachorros contra os que passeiam por entre idéias anti-semitas. A título de exemplo, ocorreu o histórico debate entre Judith Miller, repórter do New York Times especializada em bioterrorismo, e Dana Suyyagh, produtora da TV árabe al-Jazira. Judith pôs a corda no pescoço de Dana quando esta admitiu que quando sua emissora noticia os ataques nos EUA refere-se aos suicidas árabes como terroristas e, ao descrever homens-bomba igualmente suicidas que atingem civis israelenses, usa o termo "mártir".

É cada vez maior o número de editores e repórteres que reconhecem esse tipo de hostilidade antijudeus e anti-Israel. Há outros numerosos exemplos de anti-semitismo despontando na mídia, citados no artigo de Lipsky. A resposta de alguns jornais mostra que as pessoas estão começando a enxergar mais profundamente e perceber que ainda existem os velhos ódios e preconceitos vivos há séculos. E, na opinião de Lipsky, isso é suficiente para gerar pelo menos alguma esperança de que, desta vez, o acordo entre cavalheiros não seja tão cavalheiresco.

REVISTAS DE COMPORTAMENTO

Carrie Tuhy, editora-executiva da Real Simple, está satisfeita com a edição de novembro da revista. Lendo na diagonal as reportagens à luz dos ataques terroristas, achou todos os artigos muito apropriados, segundo David Handelman [The New York Times, 29/10/01]. Entre eles, um sobre uma monja zen-budista que fala sobre tornar as más experiências em lições de vida positivas; um dossiê sobre os medos femininos; uma reportagem sobre compra de velas; e a página de frases inspiradoras focadas na palavra "bênção".

A fórmula de trazer mensagens de conforto em tempos conturbados como estes está surtindo efeito entre os leitores ? e não é exclusividade da Simple Real. Uma porção de outras revistas parece estar amenizando a situação, em tempos difíceis para a economia e em especial para o mercado editorial, ao estimular em seus artigos a sensação de acolhimento.

Pouco antes dos ataques, a Country Living, da Hearst, patrocinou um estudo feito pela Yankelovich Partners que mostra que os americanos já estavam demonstrando vontade de simplificar as coisas e saudades de laços afetivos. O resultado da pesquisa inspirou a nova campanha de venda da revista: "Venha para casa para ter conforto." O retorno foi bom. As páginas de anúncio da revista em 2001 tiveram baixa pequena, principalmente se comparada a outras publicações americanas, cujo número de páginas comerciais caiu, em média, 10% neste ano.

"Enquanto as pessoas querem ler notícias, revistas deste tipo se sairão bem no clima atual porque o público está precisando de um apoio", afirmou Michael Clinton, vice-presidente executivo da Hearst. Comparando a missão de um semanário noticioso como a Time com a Real Simple, "a primeira informa o que aconteceu, a segunda diz como tentar viver com o que aconteceu", afirma Tuhy.

TAIWAN

Enquanto as eleições legislativas se aproximam, acadêmicos e observadores de mídia de Taiwan encorajam jornalistas a serem mais cuidadosos em matérias sobre os candidatos. Segundo Tsai Ting-I [Taipei Times, 29/10/01], o país tem quatro canais a cabo de notícias 24 horas, três grandes jornais e muitas pequenas publicações competindo por um público de 23 milhões de pessoas. Enquanto a disputa pela notícia se acirra, os candidatos entendem que o meio mais barato de fazer publicidade é provocar controvérsia.

Críticos de mídia argumentam que as acusações feitas pelos políticos muitas vezes não são verificadas e logo esquecidas após as eleições. É dever dos meios de comunicação noticiar assuntos levantados pelos candidatos que mereçam publicação, diz Chen Ping-hong, professor da Universidade Nacional de Taiwan. "Mas a mídia tem também a responsabilidade de examinar a credibilidade do candidato e apurar suas declarações."

O professor lembra o caso de Chen Chih-chung, filho do presidente Chen Shui-bian. Um político declarou que o jovem recebia tratamento privilegiado em campo militar, vivendo em um quarto particular e sob os cuidados de oficiais graduados. Muitos veículos repetiram a afirmação sem procurar confirmá-la, ainda que o político não apresentasse qualquer prova. Pouco tempo depois, um oficial do exército da base reagiu à denúncia, mostrando aos repórteres que Chih-chung estava instalado no mesmo alojamento de outros 161 recrutas, e negou que recebesse tratamento especial.

O professor de jornalismo Hu Yu-wei, colega de Ping-hong, comenta que outro problema é o fato de a imprensa prestar muita atenção à plataforma dos candidatos e freqüentemente negligenciar o que se passa na mente dos eleitores. Relatar o que os políticos têm a dizer sobre si mesmos não é o suficiente, defende Yu-wei.

    
    
                     

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