Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Um documentário semanal obrigatório

Todo domingo assisto ao programa Terra, na TV Cultura, e raramente mudo de canal após seu final. Geralmente fico escutando o programa seguinte (Cultura Mundo) enquanto preparo algo para comer. Faz algumas semanas que percebi que a Cultura tem passado o mesmo programa das 19 às 20 horas. Trata-se de um documentário apresentado por David Attenborough que trata do aquecimento global e das consequências de nossas ações presentes num futuro provável. O documentário mostra o cotidiano de uma família hipotética cujos hábitos diários contribuem para o aquecimento global.

O documentário é até interessante. Mas não entendo por que a Cultura tem mostrado ele todo domingo. O que posso fazer é levantar algumas hipóteses.

Talvez a Cultura queira atingir o maior número de pessoas. Mas para saber se a repetição atingiu o efeito desejado, seria necessário conhecer a evolução da audiência naquele dia e horário durante o período em que o programa foi repetido. A finalidade também pode ser fixar profundamente a mensagem do documentário nas consciências dos mesmos telespectadores. Neste caso, devo dizer que o efeito pode ser exatamente o oposto. Toda vez que vejo aquela típica Família Carbono suburbana, começo a desejar que eles se afoguem na sujeira que produzem. Hoje (3/7), fiquei até satisfeito com as perspectivas sombrias mostradas no documentário. A catástrofe climática vai destruir completamente vários habitats e tornar inviável a vida em algumas cidades? Excelente. Desde que aquela Família Carbono sofra as consequências de seus atos, ficarei contente em aceitar minha cota de sofrimento global.

A sociedade tem que tomar providências

O grande desempenho da insignificante Marina Silva na última eleição presidencial é bem conhecido. Com sua mensagem ecológica vertida numa fala irritante, a candidata conseguiu mais votos do que merecia. Mas ela não explicou satisfatoriamente a quantidade de verdinhas que empresas poluidoras despejaram na sua campanha. O combustível de aviação que Marina Silva queimou para singrar os céus do Brasil acrescentou toneladas e toneladas de carbono na atmosfera, mas não vi um só jornalista questioná-la em razão da contradição entre seu discurso verde e sua atividade poluidora. De qualquer maneira, imagino que Marina deve ficar satisfeita ao ver a repetição insistente do referido documentário todos os domingos. Querendo ou não, a Cultura está assustando a população e com isto permitirá a formação de um curral eleitoral ecológico para Marina Silva.

A TV Cultura é pública. Portanto, deveria no mínimo explicar aos contribuintes o porquê da insistente repetição do mesmo documentário de David Attenborough. Se estiver fazendo isto por razões econômicas, e não político-partidárias, a sociedade tem que saber para poder tomar as providências. Quais foram os governadores que deixaram nossa melhor TV pública em tamanha penúria a ponto de obrigá-la a repetir o mesmo programa todo santo domingo?

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[Fábio de Oliveira Ribeiro é advogado, Osasco, SP]