Thursday, 09 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Quando os repórteres opinam

Bill Grueskin lembra-se de que era editor no Wall Street Journal em 2004 quando o e-mail de Farnaz Fassihi, destinado aos olhos de uns poucos amigos, começou a circular pelo mundo. Farnaz, uma iraniana-americana, era repórter do WSJ e a exposição de suas opiniões, provocativas e incisivas, sobre a situação do Iraque, que se deteriorava, era chocante. Publicada fora dos limites normais de um jornalismo dolorosamente equilibrado, sua mensagem dava aos leitores uma sacudidela de uma realidade sem filtros. “Foi uma leitura inesperada e a reação foi explosiva”, disse Grueskin, atualmente diretor da Faculdade de Jornalismo da Universidade de Columbia.

Desde então, o debate sobre se os repórteres devem ou não expor suas opiniões pessoais ganhou força e velocidade. Esse debate – embora de maneira diferente – apareceu no blogda ombudsman do New York Times há algumas semanas, quando ela escreveu sobre o chefe da filial de Jerusalém do jornal, Jodi Rudoren. Escrevendo no Facebook, Rudoren expressou suas opiniões pessoais sobre os palestinos de uma maneira pela qual, posteriormente, se arrependeu. Mas alguns observadores viram uma lição importante na situação. “As opiniões e as crenças dos jornalistas importam, sim. Basta desse mito da ‘objetividade’”, escreveu no Twitter Jillian York, uma advogada.

Os leitores não querem que as opiniões dos repórteres sejam dissimuladas, mesmo que discordem. O leitor Mark, de Sydney, escreveu no blog da ombudsman: “Acho que o instinto de manter a velha ficção de que os jornalistas profissionais se podem livrar de suas opiniões pessoais e costumes mentais está fadado ao fracasso.”

“Por que esperar menos de jornalistas?”

Numa sociedade cada vez mais polarizada, este é um assunto cada vez mais importante e complexo. A objetividade importa? Vale a pena preservar a ideai de imparcialidade? Reconheçamos, com franqueza, que é um monstro de duas cabeças: em parte, há os preconceitos pessoais que os repórteres podem trazer para seu trabalho; e em parte a reportagem obscurece a verdade em nome da justiça. Jay Rosen, professor de Jornalismo na Universidade de Nova York, acredita que as interpretações tradicionais de uma reportagem imparcial são falsas. Ele acha que os jornalistas deveriam dizer diretamente aos leitores no que acreditam. “Os motivos para confiar estão mudando, pouco a pouco”, disse ele recentemente. “A ‘Opinião de Lugar Nenhum’ está se tornando cada vez mais difícil de confiar, enquanto no ‘Eis aqui de onde eu venho’ é mais provável acreditar.”

No sentido oposto, estão pessoas como Philip B. Corbett, editor administrativo de padrões do NYTimes. “Recuso-me terminantemente a aceitar a noção de que não há jornalismo imparcial e objetivo – que é uma espécie de dissimulação, uma charada e deveríamos simplesmente desistir disso e dar espaço aos nossos preconceitos”, disse. “Pretendemos que os profissionais de qualquer área ponham suas opiniões pessoais de lado quando estão trabalhando – juízes, policiais, cientistas, professores. Por que esperaríamos menos de jornalistas?” Vale ressaltar que nenhum destes jornalistas vê a coisa como questão fechada.

Reportagem imparcial

Rosen não chega ao ponto de dizer que o chefe da sucursal do NYTimes em Washington, por exemplo, deveria ter uma página na internet informando em quem ele votou, ou se acredita no direito ao aborto ou a que partido político é filiado. Embora ache que é o rumo certo para os jornalistas, “também compreendo que há uma porção de problemas de ordem prática, inclusive o simples fato do chefe da sucursal de Washington poder ser atacado por ter dito isso”.

Corbett, por seu lado, não espera que repórteres e editores sejam entidades sem rosto, impessoais. Incentiva-os a participarem de bate-papos na internet nos quais os leitores acabam conhecendo melhor os autores das matérias. Ele apoia que os jornalistas do NYTimes usem o Facebook, o Twitter e outras plataformas das mídias sociais para se comunicarem de uma maneira mais pessoal. Mas isso está longe de serem declarações públicas de opiniões políticas, uma prática que ele acha que iria “corroer a nossa credibilidade e alimentar a falsa noção de que não existem fatos concretos, não existe reportagem imparcial – apenas polêmicas”.

A ombudsman concorda com Corbett ,que a credibilidade do NYTimes seria prejudicada se seus repórteres declarassem suas opções partidárias. Como ele destaca, os leitores já têm dificuldade em aceitar que a reportagem seja imparcial.