Friday, 10 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Em busca de espaço no sinal aberto

Criadas com a regulamentação da TV a Cabo em 1995, as TVs Comunitárias vêm por quase 15 anos lutando para conquistar espaço nos canais abertos, onde predominam as grandes redes comerciais. A transição da TV analógica para o sistema digital, em curso no Brasil desde de dezembro de 2007, abre a possibilidade de superação deste obstáculo pode estar próxima. No entanto, para que isso aconteça, é necessário um forte apoio do governo federal e dos outros órgãos do Estado.

Esta foi a principal conclusão do 6º Congresso da Associação Brasileira de Canais Comunitários (Abccom), realizado nos dias 20 e 21 de dezembro, em São Paulo. O encontro debateu como os canais comunitários devem entrar no novo ambiente da TV digital e os caminhos para garantir esta presença. ‘A chegada da TV digital é uma oportunidade pelo fato deste novo sistema multiplicar canais e abrir espaços para novos agentes. Para que isso ocorra, as políticas públicas relacionadas à transição para esta nova tecnologia devem incluir as TVs comunitárias. Vamos fazer esforço para encorajar o governo em direção à abertura de espaços para a TV Comunitária neste novo ambiente’, afirmou Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre, de Brasília.

Para obter êxito nesta empreitada, as TVs comunitárias vão buscar junto ao governo e às emissoras públicas espaços em seus canais digitais. Em novembro, foi assinado um protocolo para a construção de uma infra-estrutura comum de transmissão envolvendo as TVs Brasil, Câmara, Senado e Justiça, além do Ministério da Educação e do Ministério das Comunicações, que ficará responsável pelo Canal da Cidadania previsto no Decreto que criação do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (SBTVD-T).

Raia própria

É este canal a chance mais provável de as TVs comunitárias passarem a participar do sistema de televisão aberta até o momento. Todavia, representantes do Ministério das Comunicações já declararam que ele não será a simples transição destas emissoras para o sinal aberto, mas sim que o Canal da Cidadania deverá incorporar conteúdos delas em parte de sua programação. Nos bastidores, os responsáveis pelo projeto na pasta têm afirmado que tal participação deverá se dar com a veiculação de cerca de três horas diárias da grade do novo canal.

‘A participação no Canal da Cidadania em tempo integral será muito difícil, porque ele é dedicado a outras finalidades previstas no decreto, como os legislativos locais, e tende a haver uma concorrência pelo horário’, especula Paulo Miranda, 1o vice-presidente da Abccom. O Decreto 5820/2006, que criou o SBTVD-T, estabelece que o canal da cidadania deve, além de veicular as atividades da comunidade local, assegurar a ‘divulgação de atos, trabalhos, projetos, sessões e eventos dos poderes públicos federal, estadual e municipal’.

Frente a este quadro, uma alternativa seria pleitear uma das programações do Canal da Cidadania para as TVs comunitárias. ‘Para nós, o melhor seria correr em raia própria, aproveitando o espaço criado por esta infra-estrutura comum das TVs públicas, que deve ampliar fortemente seu alcance até 2010’, acrescenta Miranda. Como o congresso da Abccom não chegou a uma resolução sobre o assunto, as emissoras associadas deverão finalizar uma proposta nos próximos meses para apresentar ao governo.

Parcerias

Outro caminho aventado é a busca de espaço nos canais digitais das emissoras públicas. Em uma das mesas, dirigentes das emissoras comunitárias defenderam que a TV Brasil abrigue no seu canal digital as TVs comunitárias como uma das programações. A sugestão foi recusada pelo representante da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), mantenedora da TV Brasil, presente ao Congresso, José Roberto Garcez.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia, anunciou que tentará, em seus últimos dias no cargo, articular uma parceria entre as emissoras comunitárias e a TV Câmara para a veiculação de conteúdos produzidos por aquelas na emissora da casa legislativa. ‘Quem sabe através da TV Câmara a gente possa também abrir um espaço para as TVs comunitárias, instrumentos importantes para a democratização da informação’, disse Chinaglia.

Para o presidente eleito da Abccom, Edivaldo Farias, as possibilidades de parceria são sinais positivos de importantes avanços no ano de 2009. ‘Estas parcerias propostas pela TV Câmara e pela TV Brasil são ótimos sinais que, no ano de 2009, nós estaremos no sinal aberto na TV digital’, avaliou.

Em suas falas durante o congresso, ele repetiu a recorrente crítica do setor sobre a contradição das TV comunitárias, que devem atender a comunidade, estarem restritas apenas ao cabo, estando limitadas apenas às pessoas que podem pagar por este serviço.

Regulamentação

Como não existe na legislação a figura de TV comunitária na radiodifusão aberta que possa embasar legalmente a presença destas emissoras na TV digital, a Abccom também deve voltar seus esforços à intervenção no Congresso Nacional neste ano. Durante o congresso, foi discutida uma proposta de lei, elaborada pelo engenheiro e pesquisador na área Takashi Tome, para instituir no marco regulatório da comunicação o serviço de televisão comunitária.

O texto prevê um serviço com cobertura máxima dos limites geográficos do município, mas que poderia ser desmembrado para operar em uma área menor. A definição da área de operação ficaria a cargo de Conselhos Municipais de Comunicação e a outorga seria dada pelos poderes municipais. Os canais seriam operados por entidades criadas para tal fim, compostas por associações de bairro, sindicatos, escolas públicas e organizações não-governamentais (ONGs).

A programação privilegiaria o debate sobre os temas locais, garantindo a pluralidade de visões e opiniões no jornalismo e nos outros tipos de programas. O financiamento seria feito por meio de publicidade, patrocínio e apoio cultural que poderiam ser dados apenas por micro e pequenas empresas, órgãos estatais e organizações não-governamentais.

Nova diretoria

Segundo Paulo Miranda, o congresso conseguiu qualificar a organização da Abccom, definindo uma agenda para o ano e elegendo uma nova diretoria. Ela é composta por Edivaldo Farias, da TV Com de Belo Horizonte, como presidente; Paulo Miranda, da TV Cidade Livre de Brasília, como 1º Vice-Presidente; Lilia Gallana, da TV Comunitária de São Paulo, como 2ª Vice-presidente; e Oscar Plentz, da TV Comunitária de Porto Alegre, como Secretário-Geral. ‘Nosso desafio agora é dar maior organicidade, melhorar a organização e a mobilização das TVs comunitárias’, aponta Miranda.

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Do Observatório do Direito à Comunicação