Thursday, 09 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Pelo fortalecimento da mídia livre

Revoltados com o abusivo poder exercido pelos grandes grupos comerciais de comunicação, uma série de comunicadores alternativos, ativistas e militantes da causa da comunicação democrática articularam no início deste ano um novo espaço de atuação: o Fórum de Mídia Livre. A iniciativa teve seu primeiro encontro em junho deste ano, no qual reuniu mais de 400 pessoas para debater os desafios da construção de experiências alternativas de comunicação.


Como resultado do encontro, o FML lançou na quinta-feira (23/10) um manifesto ‘pelo fortalecimento da mídia livre, por políticas públicas democráticas de comunicação e pela realização da Conferência Nacional de Comunicação’. O documento recebeu a assinatura de mais de 30 entidades da sociedade civil, entre sindicatos, movimentos sociais e ONGs, e 25 veículos alternativos, de jornais como Brasil de Fato e Le Monde Diplomatique Brasil a agências como CartaMaior e Adital. São também signatários acadêmicos, jornalistas e lideranças da sociedade.


O manifesto aponta a necessidade de realizar na área das comunicações os avanços democráticos obtidos em outros setores da sociedade brasileira. Neste sentido, defende a promoção da diversidade informativa e de pontos de vista, a criação de um novo marco regulatório para as comunicações que privilegie a democratização do setor em detrimento do oligopólio existente hoje, a implantação de um robusto sistema público de mídia e o combate à criminalização dos movimentos sociais e organizações populares na mídia.


‘Por fim, um Estado democrático precisa defender a verdadeira liberdade de expressão e de acesso à informação, em toda sua dimensão política e pública. Um avanço que acontece, essencialmente, quando cidadãs e cidadãos, bem como os diversos grupos sociais, têm condições de expressar suas opiniões, reflexões e provocações de forma livre, e de alcançar, de modo equânime, toda a variedade de pontos de vista que compõe o universo ideológico de uma sociedade’, propõe o texto.


Pauta


O documento lista o conjunto de pautas definidas pelos participantes do FML como centrais para mudar o cenário da mídia brasileira. Uma das principais é a promoção de uma campanha pela democratização das verbas publicitárias públicas com vistas ao estabelecimento de critérios democráticos e transparentes de distribuição dos recursos oficiais investidos em anúncios nos meios de comunicação.


O Fórum questiona os critérios técnicos de alocação destas verbas utilizados pelos governos hoje, como o Índice de Verificação de Circulação (IVC), e argumenta que este montante deve ser aplicado sob a égide de uma política pública de fomento à diversidade, e não apenas a partir da reprodução da lógica mercadológica.


‘O Estado não vende mercadoria, presta serviço público. O critério de veiculação não deve ser o da circulação, pois este está vinculado à lógica da audiência como mercadoria. A mídia comercial vende audiência, isto é, circulação ou pontos de Ibope, remunerando seus fatores de produção em função da receita que o anunciante lhe proporciona devido ao público que pode atingir. Ora, o Estado não precisa se subordinar a tais critérios. O Estado não vende nada, apenas presta contas, logo pode e deve chegar ao cidadão através dos muitos canais pelos quais o cidadão se informa’, afirma Marcos Dantas, professor da PUC-RJ e um dos integrantes do FML.


Outra opção de fomento sugerida no Manifesto é a implementação de um programa de financiamento de experiências de mídia livre a exemplo dos ‘Pontos de Cultura’, desenvolvido pelo Ministério da Cultura. Os ‘pontos de mídia’ seriam articulados às demais experiências de produção de cultura e conhecimento e de inclusão digital, recebendo recursos para implantar infra-estruturas tecnológicas públicas de
produção, circulação e difusão da mídia livre.


Para o escoamento destes conteúdos, o FML promete articular uma rede colaborativa de veículos e iniciativas de mídia livre em torno de um portal que potencialize a visibilidade destas experiências e se constitua como referência informativa para aqueles interessados em uma informação contra-hegemônica. O Manifesto também reforça a importância dos veículos públicos, em especial aqueles mantidos pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC) de abrirem espaço para as produções ‘midialivristas’.


O texto também destaca fortemente a relevância da convocação da Conferência Nacional de Comunicação, pauta que vem aglutinando os movimentos pela democratização da comunicação desde 2007 e que é vista como espaço privilegiado de debate público sobre o cenário totalmente assimétrico da mídia brasileira.


Próximos passos


Nas próximas semanas, representantes do FML devem entregar o Manifesto a autoridades do Executivo Federal, Congresso Nacional e Judiciário. Uma audiência com o presidente Lula está sendo buscada pelos coordenadores do Fórum, bem como com ministros e com os presidentes da Câmara e do Senado.


Próximo ao Fórum Social Mundial, que acontece em Belém em janeiro de 2009, será organizado um encontro para reunir experiências de mídia livre de toda a América Latina. No segundo semestre do próximo ano, um novo encontro do FML será organizado na cidade de Vitória (ES).


Iniciativa inovadora


O Manifesto traz uma articulação que até agora estava restrita aos participantes do FML para dar visibilidade a esta nova iniciativa no cenário das comunicações. Para Antônio Biondi, do Coletivo Intervozes, o Fórum de Mídia Livre é um espaço novo, que busca contribuir com as lutas históricas do movimento pela democratização, ‘mas que também traz pautas próprias e idéias novas e tem sua importância como um espaço que reúne uma grande diversidade de atores, entre veículos de mídia, coletivos de comunicação, universidade e entidades’.


Na avaliação do professor Marcos Dantas, a riqueza do FML está em ultrapassar os limites das organizações profissionais de jornalistas, hegemônicas no movimento de comunicação. ‘Estamos assistindo ao nascimento de um movimento que penetra por vários segmentos da sociedade. A sociedade começa a perceber que ela faz a mídia, não apenas lê’, diz.


Leia aqui a íntegra do Manifesto.

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Do Observatório do Direito à Comunicação