Saturday, 05 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Um rosário de frustrações

 

Os principais jornais do país saem por linhas diversas, nas edições de quinta-feira (21/6), ao comentar o documento final que deverá ser assinado pelos chefes de governo presentes à Conferência das Nações Unidas pelo Desenvolvimento Sustentável.

Entre os diários de circulação nacional, apenas o Globo leva em conta as dificuldades naturais para a busca de medidas concretas diante de um cenário de crise nos principais mercados do mundo, destacando algumas perspectivas que se abrem para os defensores do meio ambiente e de mudanças relevantes no modelo econômico predador e socialmente injusto.

Os demais jornais fazem coro aos manifestantes que ocuparam as ruas do Rio de Janeiro para protestar contra os termos do acordo.

O Estado de S. Paulo chamou o resultado, em editorial, de “consenso do quase nada”, dando razão às duras críticas das organizações não governamentais e às restrições feitas pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, ao texto que representa o compromisso dos países presentes no evento. Para o jornal paulista, trata-se de um ajuste tipicamente diplomático, observando que os profissionais da negociação consideram um triunfo o fato de se chegar a uma versão aceita por todos os participantes, seja qual for ela. No caso da Rio+20, sugere o jornal, a qualidade do acordo obtido seria o fato de que a única alternativa para ele era a falta de acordo. Mas , segundo o editorial, as propostas que levaram ao consenso  “de nada valem”.

Desafio global

A Folha de S. Paulo, na mesma linha, foi ainda mais contundente ao iniciar seu editorial com a frase: “Malogrou a Rio+20”. Citando explicitamente o secretário-geral da ONU, que desejava um documento final mais ambicioso, a Folha não encontrou palavra mais adequada do que “fracasso” para definir os termos do compromisso que os representantes dos países membros da conferência deverão assinar até o encerramento do encontro, marcado para sexta-feira (22).

A única qualidade vista pelo jornal foi o esforço do Itamaraty, representando o país anfitrião, para evitar que o evento terminasse como a conferência de Copenhague, em dezembro de 2009, que foi considerada pela imprensa mundial como um grande fracasso.

O Globo apresenta uma visão diferente. Para o jornal carioca, o principal mérito do documento que deve encerrar a cúpula é o de evitar o fracasso do encontro e manter os líderes mundiais mobilizados e comprometidos com a negociação de temas urgentes e complexos, como a necessidade de se criar um modelo de desenvolvimento sustentável e consolidar as bases do sistema produtivo e negocial que vem sendo chamado de “economia verde”.

Mais realista que seus concorrentes, o Globo observa também em editorial que não seria um encontro dessa natureza que iria resolver toda a questão da sustentabilidade, como metas e fontes de financiamento, ainda mais num contexto de crise econômica aguda na Europa e em ano eleitoral nos Estados Unidos.

Entre os pontos positivos, o jornal carioca destaca o fato de que a versão final do documento registra, já no primeiro parágrafo, que “a erradicação da pobreza é o maior desafio global e uma exigência indispensável para o desenvolvimento sustentável”.

Visão parcial

De fato, para muitos especialistas que participam há décadas do movimento por mudanças fundamentadas nos princípios ecológicos, um dos principais desafios tem sido o de deslocar os debates das preocupações puramente ambientalistas e expandi-los para a questão da desigualdade social e das perversidades do sistema econômico concentrador de riqueza.

Essa busca, aliás, tem provocado críticas dos setores mais conservadores que têm acesso à imprensa, os  quais acusam os militantes ambientalistas de serem na verdade esquerdistas dissimulados sob uma bandeira verde.

Os jornalistas que cobrem o setor há mais tempo sabem que só haverá mudanças significativas quando se consolidar a consciência de que o mundo precisa de novas formas de produção e distribuição de bens, alimentos e serviços que não apenas respeitem o meio ambiente, mas também contribuam para acabar com as iniquidades e reduzir a violência associada às desigualdades sociais e à corrupção.

Os especialistas sabem que um modelo como esse poderá oferecer até mesmo ao capital financeiro melhores condições operacionais, pela redução dos riscos em todos os negócios.

O pessimismo dos editoriais revela uma visão parcial do desafio mais complexo que a humanidade já enfrentou.

 

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Imprensa da Europa fala em decepção

Assis Moreira, de Genebra # reproduzido do Valor Econômico, 21/6/2012

 

A imprensa europeia reagiu com decepção ao acordo minimalista da Rio+20, embora já alertasse para um “fiasco anunciado”.

O jornal Le Soir”, de Bruxelas, fala de “acordo julgado fraco e pouco ambicioso pelos europeus”. O influente jornal Le Monde, de Paris, procura uma explicação e considera que “a crise pesou sobre esta conferência decepcionante”.

O El País”, de Madri, acha que saiu o acordo “possível”. Já o jornal francês conservador Le Figaro sinaliza um eventual culpado, em título: “Brasil, líder sem influência”.

Na Alemanha, o Bild, o jornal mais popular do país, repete a “decepção” e “fortes críticas” por parte de ambientalistas. O jornal de economia Handelsblatt vê uma luta entre “resultado fraco e grandes objetivos”. Para o Sueddeustche Zeitung, o resultado da Rio+20 é “uma derrota para o ambiente”. O Frankfurter Allgemeine Zeitung preferiu publicar uma página sobre “ameaça” à Amazônia.

Na Itália, o respeitado Corriere della Sera, de Milão, resume o texto final da conferência como “débil, pouco corajoso e inútil”. Para o La Repubblica, de Roma, somente o ministro italiano Corrado Clini se mostrou satisfeito: “Há muitos pontos interessantes”, diz ele.

No Reino Unido, os jornais também repetem as críticas de ambientalistas. O The Guardian abriu um blog direto da Rio+20, e destaca uma entrevista do professor dinamarquês Bjorn Lomborg, autor de Sceptical Environnmentalist. Para ele, um fiasco da Rio+20 pode até ser uma boa coisa. Ele acusa a ONU de ter privilegiado “questões da moda”, como aquecimento climático e economia verde, quando temas ambientais mais banais seriam muito mais importantes. Exemplifica que, para cada pessoa morta por causa do aquecimento do planeta, outros 210 morrem por causa de poluição do ar ou da água.