Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Quem diz o que quer…

Um grande banco multinacional distribui a uma parte de seus clientes uma informação altamente questionável: a de que, se Dilma Rousseff for reeleita, a economia do país irá piorar. A informação é questionável por uma série de motivos, entre eles um da maior importância: o ético. Há, especialmente em Economia, a profecia autorrealizável. Imagine que a imprensa noticie que um banco está prestes a quebrar. A informação fará com que muitos clientes fechem suas contas, se espalhará rapidamente (cada cliente contará a seus parentes e amigos que a coisa vai mal) e a notícia, mesmo que inicialmente falsa, vai acabar virando verdade.

Há outros motivos para que esse tipo de informação não seja divulgado – inclusive porque economia é algo extremamente complexo, que nem sempre se comporta como se prevê. Se não fosse assim, o Lehman Brothers não teria quebrado, George Soros teria perdido sua aposta contra o Banco da Inglaterra, o mercado de derivativos seria totalmente isento de riscos. Só que não é.

Um caso interessante é o do lulômetro, criado pelo Banco Goldman Sachs para prever o tamanho da queda do real caso Lula fosse eleito presidente da República, em 2002. Se as previsões deram certo ou não, isso não tem lá muita importância. O fato é que se imaginava que a desvalorização do Real seria uma tragédia para a economia. O Real se desvalorizou por algum tempo – e isso ajudou a impulsionar as exportações (sim, não há dúvida de que deve ter havido outros fatores, que economistas acrescentarão a esse texto). Depois de certo tempo, o Real se acomodou num nível mais baixo, que o setor exportador, aliás, acha baixo demais. Como sempre disse o professor Delfim Netto, para os exportadores o valor da moeda nacional, seja qual for, está sempre 30% acima do recomendável.

O banco falhou feio na comunicação: primeiro, divulgou maciçamente uma informação que, na verdade, por melhores que sejam seus cálculos, é no máximo um palpite bem embasado. Segundo, divulgou nota oficial, após o vazamento da comunicação, que parece aqueles discursos de político a respeito de convergências divergentes com banda endógena autóctone: garante que a instituição adota critérios exclusivamente técnicos, sem viés político ou partidário, mas que a comunicação “pode permitir interpretações que não são aderentes a essa diretriz”. Se a comunicação pode permitir dupla interpretação, por que então enviá-la? Não houve tempo para uma releitura crítica? Se o banco não tem cuidado sequer com a redação de uma nota potencialmente explosiva, que mexe com as economias de seus clientes, como se comportará analisando as múltiplas variáveis econômicas?

 

Velhos e moços

O excelente Ennio Pesce costumava dizer que as pessoas, quando completam 60 anos de idade, perdem o nome. Passam a ser “sexagenárias”. Se tomarem um tombo, é “sexagenário cai na calçada”. Se passarem um conto do vigário, é “sexagenário engana o turista e entrega cruzeiros novos em troca dos dólares”.

Leão, um esplêndido goleiro, desde muito jovem tinha cabelos brancos, e os pintava de louro. Por quê? Porque, explicava ele, se tomasse um frango e estivesse com os cabelos pintados, teria engolido um frango. Se tomasse um frango e não tivesse pintado os cabelos brancos, estaria velho para continuar jogando.

E essas besteiras continuam. Ainda outro dia, uma coluna esportiva criticava o novo técnico do Flamengo, Vanderlei Luxemburgo, por sua idade (62 anos). Luxemburgo já ganhou muitos títulos, perdeu outros tantos, mas não ganhou nem perdeu por causa da idade. Alex Ferguson, aos 61 anos, ganhou pela terceira vez a Premier League da Grã-Bretanha, com o Manchester United.

Preconceito com idade é coisa de gente que não sabe o que fala. Aos 69 anos, Winston Churchill assumiu o poder na Inglaterra para liderá-la com êxito na Segunda Guerra Mundial. Aos 79, Konrad Adenauer foi escolhido primeiro-ministro da Alemanha Ocidental, devastada pela guerra. Recuperou o país, criou laços com a França, inimiga histórica dos alemães, lançou as bases da União Europeia e deixou o poder, por sua livre e espontânea vontade, aos 94 anos, elegendo o sucessor. Já o imperador Nero botou fogo em Roma com menos de 30 anos de idade.

 

Por falar em idade

Os meios de comunicação informaram que Ariano Suassuna morreu aos 73, aos 83 e aos 87 anos. A última data era a correta: ele nasceu em 16 de junho de 1927, conforme uma rápida consulta ao Google pode revelar. E não morreu no dia em que sua morte foi divulgada, mas no dia seguinte.

 

Nome? Que é isso?

Sexagenário atropelado. E não é só isso: surgiu também a moda de identificar as pessoas por sua profissão. “Nutricionista assaltada”, “engenheiro ajudou idosa a recuperar seu gato” – tudo sem que a profissão tenha a menor importância no desenrolar dos fatos. O time de preferência também virou identificador: “Corintiano pode ter sido morto por vingança”. Vingança por algo que disse no estádio ao torcedor do time adversário? Não: por qualquer outro motivo, sem nenhuma relação com seu time favorito. Personagens sem nome, notícias desumanizadas.

 

Onde estamos

O assunto passou batido pela imprensa em geral, mas é um dos fatos mais importantes dos últimos tempos: a Justiça autorizou a Polícia Civil do Rio a grampear o telefone de advogados voluntários que prestavam assistência a manifestantes. É um fato intolerável: primeiro, porque advogados têm o direito legal de conversar com seus clientes em particular; segundo, porque há autoridades se arvorando em decidir, antes de qualquer julgamento, quem são os réus e os advogados de primeira e de segunda classe. Alô, OAB! A lei 8.906, Estatuto da Advocacia, foi violada. Vai ficar por isso? E a autorização judicial, será contestada?

 

Maldade bem dita

Coluna “Diário do Poder“, de Cláudio Humberto:

“Aécio Neves telefonou a José Serra para tranquilizá-lo de que não acredita na tese, que ganha corpo no PSDB, de que tem dedo do paulista nas denúncias sobre aeroporto construído na fazenda de seu tio, em MG”.

 

Ahn?

De um grande portal noticioso:

“Suassuna é o terceiro integrante da Academia Brasileira de Letras a morrer em três semanas. No dia 3 de julho foi Ivan Junqueira e no dia 18, João Ubaldo Ribeiro. Apesar de não integrar o órgão, o escritor Rubem Alves morreu no dia 19.”

Este colunista até hoje não sabia que, para morrer, é preciso ser imortal.

 

Ahn? 2

De uma grande e importante revista:

** “(…) insinua novos produtos (…)”

Este colunista também nunca tinha ouvido falar de insinuação de produtos.

 

Baratinho, baratinho

Ao contrário do que dizem os pessimistas, o papel de imprensa não deve onerar de forma alguma os custos de produção de um jornal. Pois, não estivesse o papel tão baratinho, não seria dada meia página de um jornal de circulação nacional á tragédia que assolou o lar de conhecido profissional: a manta de grife de um de seus cachorros foi inadvertidamente colocada na máquina de lavar roupa – ficou um tra-po! Enfim, mais uma coisa que este colunista acaba de aprender: a qualidade de certos produtos caros e famosos é bem discutível.

Nem lavagem a máquina eles aguentam.

 

A origem da palavra

O escritor e professor Deonísio da Silva, excelente filólogo, conta-nos a origem da palavra “capivara” como sinônimo de folha-corrida de marginais:

É simples. No prontuário dos cavalheiros habituados a frequentar camburões, havia o timbre Delegacia de Captura da Vara (…). Com o tempo, o prontuário passou a “puxa a ficha de captura da Vara tal” e abreviada para “puxa a capivara”. Muitos pais da Pátria, que antigamente tinham currículo, acabaram por substituí-lo pela capivara.

 

Claudius, sempre ótimo

Claudius Ceccon, um dos maiores cartunistas brasileiros, chega às livrarias em grande estilo: no dia 1º, na Livraria das Marés, em Paraty, RJ, sai seu livro Claudius. Prefácio de Janio de Freitas, textos de Millôr Fernandes (seu colega de O Pasquim), do poeta e velho amigo Ferreira Gullar, do cartunista Loredano. E 50 anos da produção de cartuns de altíssima qualidade, instigantes, engraçados, que fazem pensar. Vale comprar, ler, raciocinar.

 

Como…

De um portal noticioso importante, sobre a morte do ator James Garner: “Astro original do seriado Maverick (…) que misturava comédia e humor”.

E, certamente, misturava também cenas cômicas, humorísticas e engraçadas.

 

…é…

De uma publicação dedicada a jornalistas:

** “Os bastidores por trás do trânsito e da notícia”.

Ainda bem que os bastidores estão por trás. Se estivessem na frente, ninguém veria nada.

 

…mesmo?

De um grande portal noticioso:

** “Errata: evolução patrimonial de Kassab foi de 146%, e não de 398%”

Os cálculos abrangem 16 anos. Uma pequena variação – só que o número correto mostra que, em números atualizados, o patrimônio de Kassab não se alterou, e o número inicialmente divulgado multiplica o valor de seus bens. Quem será que fez a conta?

 

A não notícia

A notícia é publicada, provoca uma despesa em papel ou eletricidade, consome banda larga, toma o tempo do consumidor de informação – que, a propósito, não consome nada, já que informação é o que não há. Um bom exemplo:

** “Marido de mulher que teve relógio e celular roubados teria atirado em criminoso”.

Mas atirou ou não? Foi o marido ou outra pessoa? Um policial, talvez?

 

Frases

>> Do jornalista Cláudio Humberto: “Lula desafia o PSDB a provar que alguém criou mais mecanismos anticorrupção do que ele, mas não abre o bico sobre a amiga Rose.”

>> Do jornalista Palmério Dória: “Marin merece uma medalha pela escolha de Dunga. Se não derem, ele pega.”

>> Do jornalista Ancelmo Góis: “Dunga é um Felipão piorado, sobretudo em termos de grosseria e falta de educação.”

>> Do jornalista Cláudio Tognolli: “Ao devolver a seleção a Dunga, a CBF homenageou uma velha prática do brasileiro: a de entregar os berçários ao rei Herodes.”

>> Do jornalista Idelber Avelar: “Em época eleitoral, de fraturas e antagonismos nas redes sociais, eu sou a favor do Dunga por motivos de: nos une a todos na cornetagem.”

>> Do tuiteiro Zé Palhano: “‘Flu preocupado em dar carinho a Fred’. O que é mais extraordinário? A carência do mané ou a notícia?”

>> Do jornalista Marco Lacerda, editor do Dom Total: “Ouvir Lula falar é como tomar Óleo de Fígado de Bacalhau em jejum.”

 

E eu com isso?

Uma pausa para respiração. Aqui é aquele mundo maravilhoso descrito por todos os políticos que estão no governo em qualquer lugar do planeta. Aqui a segurança é ampla, não há falta d’água nem de luz, a alta dos preços é um fenômeno que passa à distância. Preocupações existem: onde passar as férias, que roupa vestir na festa maravilhosa, saber, para evitar gafes, quem está com quem.

** “Sertanejo que já traiu a mulher resolveu se separar por ter sido traído”

** “Mila Kunis domou Ashton Kutcher com muito sexo, diz revista”

** “Márcio Garcia apresenta o caçula e diz não ser fã de trocar fralda com cocô”

** “Golfista que largou musa do tênis tem novo affair”

** “MC Pedrinho se lançou cantando funk proibidão, mas nunca beijou na boca”

** “Selena Gomez quase deixa calcinha à mostra ao desembarcar de iate em Saint-Tropez”

** “Patrícia Jordano, modelo processada por Neymar, usa blusa transparente e chama a atenção”

** “Ricky Martin estaria namorando o nadador australiano Ian Thorpe”

** “Carol Nakamura sai no tapa com Sidney Sampaio e é expulsa de avião”

** “Miley Cyrus contrata médium para falar com seu cachorro morto”

** “Sem camisa, David Luiz passeia de bote com a irmã e o sobrinho”

** “Lionel Messi faz selfie em família após a Copa”

** “Patrícia Poeta toma sol com marido na praia”

** “Ex de Marc Jacobs almoça com ele em Paris”

** “Após término de namoro, Zilu tenta espantar solidão e desabafa na web”

** “Richard Gere pode estar namorando morena misteriosa”

 

O grande título

A safra é boa! Varia desde a frase impensada até o erro de digitação que fica engraçado. E passa, claro, por aquele título que alguém certamente irá entender.

Comecemos com a frase impensada, numa reportagem sobre o fechamento da maternidade de um grande hospital:

** “O Hospital (…) vai encerrar as atividades da maternidade, uma das principais privadas de São Paulo”

E passemos para outro título cujas implicações não foram bem avaliadas:

** “Justiça abre brecha para proibir universidade pública de cobrar por pós”

Quanto será cobrado por pós?

Uma frase notável:

“Futuro presidente da CBF defende Dunga: ‘Ele foi humilhado em 2010’”

Se esta é a defesa, imagine o ataque.

Uma frase bem difícil:

“Uso indevido de R$ 3 bi na gestão Aécio torna MG réu”

Claro que faz sentido. É só encontrar quem entenda o que está escrito.

E agora, o grande título – um grande título involuntário:

“Criança sul-coreana junto com caixas contendo pedidos (…)”

Pois não é que, por falha de digitação, faltou publicar uma consoante na última palavra?

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Carlos Brickmann é jornalista, diretor da Brickmann&Associados Comunicação