Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Imprensa e as mudanças climáticas

Grande parte dos brasileiros está há quase seis meses olhando angustiada para o céu – por que ficaram religiosos de repente? Esperam um milagre dos deuses ou de São Pedro, o porteiro do reino do céus?

Parte dos aflitos examina as nuvens à espera de chuva forte, de preferência prolongada – o Sudeste vive a pior estiagem das últimas décadas. Em compensação, os brasileiros que vivem no Norte, às margens do rio Madeira, não desgrudam os olhos das suas nuvens pois o rio transbordou e está encharcando perigosamente uma região já encharcada.

A verdade é que a meteorologia, a previsão do tempo, é uma ciência que sucede a ecologia, a relação do homem com o ambiente. De nada adianta acender velas suplicando pela formação de nuvens negras se as nossas cidades são cada vez mais cinzentas, transformadas em fábricas de toxinas e nossas matas perdem suas árvores e viram pastos. A natureza é obediente, faz exatamente o que determinamos que faça.

Antes de olhar o céu convém examinar as páginas dos jornais e as telas da tevê. Enquanto a mídia não nos convencer de que quem faz o tempo somos nós, enquanto não aprendermos que quem faz o clima é a humanidade, continuaremos sujeitos às angústias por causa de secas e dilúvios. A água pode ser bênção ou maldição, a dose certa depende da nossa capacidade de entendê-la e de conservá-la. Ser verde não é uma opção cromática, é uma forma de garantir a nossa sobrevivência.

O verdadeiro mandachuva é o próprio homem contemporâneo. 

 

A mídia na semana

>> Nesta era dos ícones, dos virais e das simplificações, a nutritiva e saborosa banana converteu-se em símbolo do racismo. A onda veio da Europa que já foi a pátria do humanismo e agora é o lixão das intolerâncias. O contra-ataque engendrado pelo marqueteiro de Neymar inspirou-se na genial reação do brasileiro Daniel Alves, jogador do Barcelona, que insultado por uma banana jogada contra ele, simplesmente descascou-a e a comeu inteirinha durante o jogo. Famosos e celebridades aderiram entusiasmados – não se ganha cachê. Mas pega bem, sobretudo antes de uma Copa. É preciso, porém, levar em conta que o combate contra o preconceito e os ressentimentos exige muito mais do que fazer um selfie mordendo uma banana. Mais corajosa e muito mais efetiva foi a atitude da NBA americana, que expulsou do seu convívio o dono dos Los Angeles Clippers, surpreendido ao fazer comentários estúpidos e racistas.

>> Está muito mal contada a história do assassinato do tenente-coronel Paulo Malhães, torturador confesso e notório violador dos direitos humanos durante a ditadura. A polícia civil do Rio parece cautelosa demais, a mídia nacional parece tão intimidada como nos tempos da autocensura e a cobrança que vem do Brasil e do exterior lembra os tempos em que a Polícia Federal parecia desatenta e desativada. (Leia também: “Uma história mal contada”)

>> Dois heróis: um está sendo premiado pela bravura na defesa da liberdade de imprensa no Brasil, outro foi um campeão na luta contra a repressão do regime militar. Lúcio Flávio Pinto, colaborador regular do Observatório da Imprensa, foi escolhido pela entidade Repórteres Sem Fronteiras como um dos cem heróis da informação mundial pelo trabalho que desenvolve contra o conluio entre o gangsterismo político, os madeireiros e a grande imprensa do Pará. O jornalista e escritor Rodolfo Konder foi o primeiro a denunciar as torturas sofridas por Vladimir Herzog, de quem era vizinho de cela no DOI-Codi de São Paulo. Obrigado a escapar do país, quando retornou foi presidente da seção brasileira da Anistia Internacional, baluarte mundial na defesa dos direitos humanos. Morreu aos 76 anos.