Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Cabra marcado para viver

Um cabra marcado para viver. Esta tragédia grega não acaba com a biografia de um dos cabras mais criativos e independentes da cena cultural brasileira.

Jornalista puro-sangue.

Trabalhamos juntos na revista Visão nos idos dos 50. Depois quando estava perseguido veio trabalhar no copidesque do Jornal do Brasil.

 A entrevista que reprisamos na última terça-feira (28/1) em nosso programa foi uma das mais empolgantes que fiz na temporada de depoimentos a propósito dos 15 anos do Observatório da Imprensa na TV.

Foram 52 minutos com um homem-verdade.

>> Veja aqui a entrevista de Eduardo Coutinho ao Observatório da Imprensa

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Cineasta Eduardo Coutinho é morto a facadas no Rio

[Reproduzido do G1. 2/2/2014]

O cineasta Eduardo Coutinho, de 80 anos, foi morto a facadas neste domingo (2), em sua casa, na Lagoa, zona sul do Rio. Segundo a polícia, o filho do documentarista, Daniel Coutinho, 41 anos, é o principal suspeito. A mulher do cineasta, Maria das Dores Coutinho, 62 anos, também foi ferida e está internada em estado grave no Hospital Miguel Couto. A Divisão de Homicídios da Polícia Civil investiga o caso.

O filho, que supostamente sofre de problemas mentais, também foi levado para o hospital. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, ele passou por cirurgia e está internado na unidade intermediária do hospital. Daniel levou duas facadas no abdômen e tem quadro estável. De acordo com policiais do batalhão do Leblon, que foram ao apartamento do cineasta, na Rua Lineu de Paula Machado, moradores disseram que o filho surtou, esfaqueou os pais e depois tentou o suicídio.

A mãe dele levou duas facadas nos seios, três no abdômen e teve ainda uma lesão no fígado. Ela também já passou por cirurgia e seu estado de saúde é grave, segundo o Hospital Miguel Couto. O corpo do cineasta foi levado para o Instituto Médico Legal (IML).

O Corpo de Bombeiros informou que a chamada para a ocorrência no apartamento do cineasta foi feita às 11h48. Homens do quartel do Humaitá constataram que o cineasta já estava morto ao chegar no local, e levaram os outros dois feridos para o Miguel Couto.

Um dos primeiros a se manifestar sobre a morte do diretor foi o também cineasta Cacá Diegues. “Era um homem muito inteligente, muito sereno, fácil de lidar. É uma perda muito grande, ele era o maior documentarista brasileiro de todos os tempos”, declarou.

Carreira

Considerado um dos maiores documentaristas do Brasil, o paulistano Coutinho é ganhador do Kikito de Cristal, principal premiação do cinema nacional, pelo conjunto da obra. Entre seus principais filmes estão “Edifício Master”, “Jogo de cena”, “Babilônia 2000” e “Cabra Marcado para Morrer”.

Em junho do ano passado, ele e o também cineasta José Padilha (autor dos filmes “Tropa de Elite 1 e 2”) foram convidados a integrar a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, responsável pela premiação do Oscar.

Entrevista exclusiva

Ao G1, em 2013, o cineasta contou não ser uma pessoa tímida e disse ser fácil se apresentar para grandes plateias, como ocorreu no Festa Literária Internacional de Paraty de 2013. Ele também deu detalhes de seus filmes e de como conseguia tirar o máximo de cada entrevistado.

Coutinho explicou que seus temas principais sempre foram os mais simples do dia a dia. “O que é viver? Para quê estudar? Para quê dinheiro?”, afirmou, dizendo que as perguntas mais básicas sempre são as mais interessantes.

Na entrevista, o diretor também deu uma sugestão do que poderia ser um bom documentário atual. Segundo Coutinho, as manifestações de rua vistas em junho de 2013 no país também valeriam um filme, desde que ele se propusesse a discutir o assunto. “Bom é o filme que faz perguntas, o que tem respostas, você joga no lixo”, comentou

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“Eduardo Coutinho era um dos maiores diretores do Brasil”

[Reproduzido do iG , 2/2/2014]

morte de Eduardo Coutinho chocou o cinema brasileiro. André Sturm, diretor do Museu da Imagem e do Som (MIS), se diz chocado com a tragédia.

“Não há na história do País qualquer outro cineasta que tenha feito tantos filmes desse nível”, afirma.

Para Sturm, a principal contribuição de Coutinho está na virada que ele promoveu no gênero. “Ele abriu uma porta importante para o documentário no Brasil. Antes só tínhamos filmes nesse perfil a cada três ou quatro anos.”

O cineasta Fernando Meirelles, de “Cidade de Deus”, afirma: “Encontrei o Coutinho apenas uma vez na vida mas vi quase todos os seus filmes. O tipo de cinema que ele faz ninguém mais faz no Brasil, sua morte deixa um vazio de fato, não ha ninguém para ocupar seu lugar. Uma morte trágica destas faz ser ainda mais difícil aceitar a perda”.

Já o diretor Marco Dutra, de “Quando Eu Era Vivo”, disse ao iG: ”Eu estou muito devastado, não sei nem o que te dizer. As pessoas sempre disseram que era um grande documentarista, mas para mim era um dos maiores diretores de cinema do Brasil. Ele entendia o cinema como ninguém, e é muito triste, porque ele estava bem, e a gente estava esperando um novo filme, um novo olhar dele”.

Kleber Mendonça Filho, diretor de “O Som ao Redor”, afirmou que “Coutinho me mostrou que os filmes podem ser pessoais e respeitosos com as pessoas, desde 'Cabra Marcado para Morrer'. É basicamente isso, e acho que isso é muita coisa.”

Para Marcelo Galvão, carioca diretor de “Colegas”, a sensibilidade refinada de Coutinho era o maior diferencial de seu trabalho. “Ele sabia mostrar os dramas de forma verdadeira sem apelação, sem pieguice”, afirma. “Ele sempre foi um exemplo para quem segue a carreira no cinema, especialmente no gênero de documentário.”

Embora trabalhe com gêneros ficcionais, Galvão afirma buscar um pouco da verdade de Coutinho para depositar nas suas obras. “Eu procuro dar liberdade, ouvir as pessoas verdadeiramente, dar espaço para que se expressem. Essa é uma das referências que eu trago dele”, conta. “É uma perda imensa para o cinema nacional, mas o que ele criou não morre. Coutinho fica eternizado na sua obra.”

Nando Olival, diretor de 'Os 3', disse que “no cinema nacional a gente tem poucos faróis, poucas pessoas que eu cultivo como mestres. Coutinho para mim era isso: um farol do cinema nacional, não só do documentário. No Brasil, o documentário é tão mais forte do que a ficção, está num momento tão melhor, e um dos caras que impuseram isso foi o Courinho. É uma perda brutal. A sorte é que ele deve ter deixado muitos filhotes, muita gente que vai tentar continuar o que ele fez, ou racionar como ele raciocinava”