Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Exclusão e falta de transparência

A composição do Fórum do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD-T), oficializada dia 23/11, confirma a política excludente que rege as escolhas da implantação da nova tecnologia no Brasil. Inconformado com o pouco espaço para a comunidade acadêmica na composição, Sérgio Bampi, representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) retira-se do grupo recém-criado e da Câmara Executiva do SBTVD. Completamente de fora deste debate fica a sociedade civil, que não tem representante nesse formação.

Foi realizado dia 23/11 o lançamento do Fórum do SBTVD-T em São Paulo. A composição do grupo confirma a política adotada em relação à TV Digital desde a posse do ministro Hélio Costa. O Fórum será formado por 13 integrantes. Tanto os radiodifusores quanto a indústria de receptores têm quatro vagas no Comitê do Fórum, enquanto a indústria de transmissores tem duas, as instituições de pesquisa outras duas e as empresas de software apenas uma.

Sérgio Bampi, professor da UFRGS, decepcionado com o pequeno espaço da academia nessa formação, se retirou tanto da Câmara Executiva quanto do Fórum. ‘Eu pedi para sair do Fórum. Propus uma maior participação das instituições universitárias, mas não foi aprovado’, revela. O Decreto n.º 5.820, de 29/6, previa a criação desse Fórum, ‘mas não estabelecia a proporcionalidade de cada setor’, lembra o professor.

A inexistência de representantes da sociedade civil nesse processo é lamentada por entidades do setor e integrantes do FNDC, que compreendem esse capítulo como a confirmação da política que impera nas decisões acerca da TV digital, onde mandam os radiodifusores e representantes da indústria.

As emissoras serão representadas pela Rede Globo, Rede TV!, SBT, Record, tendo a TVE e TV Cultura como suplentes. Gradiente, Philips, Samsung, Semp-Toshiba compõem o espaço da indústria de receptores, tendo como suplentes CCE, LG, Sony e Panasonic. Da indústria de transmissores, estão Linear e Telavo, enquanto as instituições de pesquisa LSI-USP, UFPB são titulares e UFRGS e UFRJ, suplentes. Das empresas de software apenas a Potis foi chamada.

Para Celso Schröder, coordenador-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) esta formação é o coroamento da lógica que tomou conta desse debate desde a posse do ministro Hélio Costa. ‘Representa um domínio da técnica sobre o conteúdo. É uma política desconectada das macroquestões e que beneficia exclusivamente aos radiodifusores’, lamenta.

Na opinião de Edson Amaral, da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (Fitert) e da Coordenação Executiva do FNDC, os radiodifusores só falam em qualidade porque interessa a eles ocupar todo o espectro disponível, impedindo a entrada de novos canais, que poderiam ser divididos com as emissoras comunitárias e movimentos da sociedade civil, numa melhor representação da população.

Na reunião realizada ontem, foi lido um documento assinado por 15 instituições acadêmicas defendendo a ampliação do número de vagas do setor no Fórum, de duas para quatro. O site Telesíntese informa que por parte dos empresários, Victor Blatt, da Elsys, manifestou-se contra os valores das anuidades que serão pagas pelos sócios do Fórum, sobre as quais disse ter sido comunicado só na última sexta-feira, dia 17/11. Essa contribuição irá variar de acordo com o número de funcionários de cada empresa, variando de R$ 10 mil a R$ 30 mil.

Câmara Executiva

O jornalista Diogo Moyses, coordenador-executivo do Coletivo Intervozes, revela que isso já era esperado, desde a posse do ministro Hélio Costa. ‘É importante lembrar que os debates da Câmara Executiva foram feitos sem uma transparência mínima. A sociedade não sabe o que foi discutido’, aponta.

O pesquisador em TV Digital Marcus Manhães, diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa, Ciência e Tecnologia de São Paulo (SinTPq), avalia que esta formação indica a continuidade da definição tomada em relação ao sistema do SBTVD, que excluiu a opinião da sociedade brasileira. ‘A discussão agora, em torno do formato de conteúdos e de tecnologias tem que passar pela sociedade pois é ela que vai pagar a conta, sendo ou não subsidiado pelo Governo’, afirma.

Comitê Consultivo

Rosane Berttoti, Secretária de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), também não se surpreende com a formação deste Fórum, porque ele representa a continuidade da política que impera atualmente no Ministério das Comunicações, no processo da TV Digital. ‘A exclusão da sociedade civil se deu quando se esvaziou intencionalmente o Comitê Consultivo do SBTVD, que não foi mais convocado. Não há interesse em levar esse debate à sociedade civil’, conclui.

Também para a cineasta Berenice Mendes, da Associação Nacional das Entidades de Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões (Aneate), do Conselho de Comunicação Social e da Coordenação Executiva do FNDC, a exclusão da sociedade civil desse processo significa a continuidade de um política autoritária que vem condicionando a digitalização da TV aberta, onde se esquece que a televisão é uma concessão pública, e deveria ser desenvolvida para a sociedade civil. ‘As conseqüências são muito sérias, à medida que a TV atinge mais de 90% da população brasileira e tem grande influência sobre os campos da política, social e moral da população, cada vez mais sujeita ao poder das grandes empresas, que não se sabe até quando se manterão de propriedade de brasileiros’, lamenta.

Política contraditória

O presidente da Associação Brasileira de TVs Universitárias (ABTU), Gabriel Priolli, avalia que esses encaminhamentos entram em conflito com o espírito do Decreto nº 4.901/03, que tinha entre suas metas a inclusão digital. ‘Nós lamentamos o fato. É a política excludente de sempre’, declara. O Decreto n.º 4.901, de 26 de novembro de 2003 instituiu o Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD) e estabeleceu como um dos benefícios desse novo meio para a sociedade e para os usuários as inclusões digital e social, e a democratização do acesso à informação.

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Da Redação FNDC