Quinta-feira, 6 de novembro de 2025 ISSN 1519-7670 - Ano 2025 - nº 1363

Influenciadores transformam a natureza da informação e da democracia

 

A forma como as pessoas se informam, feliz ou infelizmente, mudou. Não raro eu recebo pedido de verificação de informação do meu networking a partir de links de Instagram ou LinkedIn. Raramente recebo links de fontes primárias de conteúdo e de notícia.

Isso foi o que me comprovou em fatos e dados o “Mapping News Creators and Influencers in Social and Video Networks”, do Reuters Institute for the Study of Journalis, que analisou 24 países. As pessoas estão se informando por influenciadores muito mais do que pela imprensa profissional em países como o Brasil.

Para entender a profundidade desta transformação, precisamos primeiro estabelecer o que significa realmente quando dizemos que alguém é um “criador de notícias” ou “influenciador”. Estas não são apenas pessoas que postam vídeos online. São indivíduos ou pequenos grupos que, operando principalmente em redes sociais e plataformas de vídeo, conseguiram construir audiências próprias e exercem influência real sobre como essas audiências entendem o mundo.

O que torna este fenômeno particularmente significativo é que esses criadores operam de forma independente das grandes instituições jornalísticas, sem estar sujeitos aos mesmos sistemas de verificação, padrões éticos ou responsabilidades editoriais que tradicionalmente governavam a produção de notícias.

O que estamos testemunhando agora é a gradual substituição desse sistema institucional por algo fundamentalmente diferente: um ecossistema de informação baseado em indivíduos, operando sem as mesmas estruturas de responsabilidade e incentivado não pela busca da verdade, mas pela necessidade de construir e manter audiências. Alguns desses indivíduos são talentosos, éticos e se esforçam genuinamente para informar. Outros não são. Mas o ponto crucial é que não há nenhum sistema confiável para distinguir entre os dois.

E as consequências já são visíveis. Vemos sociedades se fragmentando ao longo de linhas ideológicas, com diferentes grupos habitando realidades informativas cada vez mais separadas. Vemos desinformação se espalhando mais rápido do que nunca, amplificada por influenciadores com audiências massivas e sem freios efetivos. Vemos líderes políticos contornando o escrutínio jornalístico tradicional, comunicando-se diretamente com eleitores através de canais de criadores. E vemos um enorme desequilíbrio de gênero, com o discurso público sendo dominado esmagadoramente por vozes masculinas.

Mas talvez a consequência mais profunda seja algo mais sutil. Quando as pessoas obtêm suas informações principalmente de indivíduos com quem têm uma conexão emocional, em vez de instituições que, pelo menos aspiram à objetividade, a própria natureza do que conta como conhecimento começa a mudar. A verdade torna-se cada vez mais personalizada, uma questão de em quem você confia em vez de o que pode ser verificado. E isso corrói a possibilidade de uma esfera pública compartilhada onde cidadãos podem deliberar juntos sobre questões comuns.

Precisamos de reconhecimento público de que isto é um problema que merece atenção séria. Não podemos simplesmente deixar este novo ecossistema de informação evoluir sem nenhuma supervisão ou orientação, esperando que tudo dê certo. Os riscos são grandes demais.

A questão fundamental que enfrentamos é esta: podemos preservar os benefícios da diversidade de vozes e da democratização da mídia que os criadores representam, enquanto evitamos os perigos da fragmentação, desinformação e erosão da realidade compartilhada?

Esta é a questão que definirá não apenas o futuro do jornalismo, mas o futuro da própria democracia. Porque, no final, democracias funcionam apenas quando os cidadãos podem deliberar juntos com base em alguma compreensão compartilhada da realidade. E essa compreensão compartilhada está se tornando cada vez mais difícil de manter.

O futuro dependerá de três fatores interconectados. Primeiro, as plataformas de tecnologia precisarão decidir se estão dispostas a priorizar a qualidade da informação sobre a maximização do engajamento. Segundo, precisaremos desenvolver novos modelos de negócio que tornem o jornalismo de qualidade sustentável na era digital. E terceiro, o público precisará desenvolver maior sofisticação em avaliar fontes e reconhecer quando está sendo manipulado.

Estamos em um momento de transição. O velho sistema de mediação de informação está claramente quebrado ou pelo menos profundamente enfraquecido. Mas o novo sistema que está emergindo ainda não desenvolveu os mecanismos de responsabilidade e verificação de que as sociedades democráticas precisam. Navegar neste espaço intermediário será um dos grandes desafios dos próximos anos. E as escolhas que fazemos agora, sobre como respondemos à ascensão dos criadores de notícias, ajudarão a determinar que tipo de sociedade de informação teremos no futuro.

Os números que emergem de pesquisas recentes não deixam margem para dúvida sobre a escala desta mudança. Quando o Pew Research Center descobriu que 21% dos adultos nos Estados Unidos já consomem notícias regularmente por meio de criadores de conteúdo, isso não representava apenas uma estatística interessante. Significa que mais de um em cada cinco adultos americanos está obtendo sua compreensão dos eventos atuais não de jornalistas profissionais trabalhando dentro de organizações de mídia estabelecidas, mas de indivíduos que criaram suas próprias plataformas.

Para compreender por que esta mudança é significativa, precisamos pensar sobre o papel que a mídia sempre desempenhou nas sociedades democráticas. O jornalismo profissional não é apenas um negócio ou uma profissão, mas uma instituição fundamental que serve como um sistema de verificação da realidade compartilhada.

Quando essa instituição é gradualmente substituída por um ecossistema fragmentado de vozes individuais, cada uma com suas próprias motivações, vieses e padrões de verificação, as consequências vão muito além da simples mudança de hábitos de consumo de mídia. Estamos falando sobre a própria base sobre a qual as sociedades democráticas constroem consenso e tomam decisões coletivas.

A pesquisa do Reuters Institute nos ajuda a quantificar essa mudança de uma forma que torna sua magnitude inescapável. Quando observamos o comportamento de pessoas com menos de 35 anos que usam redes sociais, descobrimos que 48% delas prestam mais atenção a criadores de notícias do que a marcas de mídia tradicional, que recebem apenas 41% da atenção desse grupo.

Isso pode parecer que essa é uma diferença pequena, de “apenas” sete pontos percentuais. Mas pense no que isso significa em termos práticos. Significa que, para a geração que está entrando na idade adulta agora, para os futuros eleitores, trabalhadores e líderes, a fonte primária de compreensão sobre o mundo não é mais o jornalismo institucional, mas sim indivíduos operando de forma independente.

Essa mudança não está acontecendo uniformemente em todos os lugares. Em países como Brasil, México, Indonésia, Filipinas e Tailândia, os criadores já exercem influência massiva, frequentemente superando a mídia tradicional. Mas em lugares como o norte da Europa e o Japão, a mídia tradicional ainda mantém sua posição dominante. Isso significa que diferentes sociedades ao redor do mundo estão desenvolvendo ecossistemas de informação fundamentalmente diferentes, o que terá consequências de longo prazo que ainda estamos começando a compreender.

Quando usamos o termo “criadores de notícias”, é tentador pensar neles como um grupo homogêneo. Mas não é. São indivíduos que produzem análise e opinião sobre eventos atuais, frequentemente com uma perspectiva política clara. Pense em figuras como Tucker Carlson ou Joe Rogan, nos Estados Unidos, cuja audiência bate milhões por episódio.

O que torna esses comentaristas particularmente poderosos, e potencialmente problemáticos, é que eles operam sem as restrições que governam os meios de comunicação tradicionais. Eles não precisam apresentar múltiplos lados de uma questão. Não têm que seguir padrões de imparcialidade. E, crucialmente, muitos deles são ex-jornalistas que agora se posicionam explicitamente como críticos da mídia tradicional, o que lhes confere credibilidade junto a audiências que já desconfiam das instituições estabelecidas.

Há ainda uma categoria inteira de criadores cujo conteúdo é “adjacente às notícias”. Estes incluem comediantes satíricos, podcasters de celebridades focados em bem-estar ou negócios, streamers de games e influenciadores de estilo de vida. Virginia Fonseca no Brasil, por exemplo, é principalmente uma influenciadora de lifestyle e moda, mas, com mais de 53 milhões de seguidores no Instagram, quando ela compartilha uma opinião sobre um tema atual, isso tem peso real. Ela pode não se considerar uma fonte de notícias, e sua audiência pode não estar seguindo-a para se informar, mas o tamanho de sua plataforma significa que ela inevitavelmente influencia como milhões de pessoas pensam.

O que torna essa diversidade de criadores particularmente desafiadora é que diferentes tipos exigem diferentes respostas. Os riscos colocados por comentaristas partidários são diferentes dos riscos colocados por explicadores bem-intencionados, mas potencialmente simplistas. E os influenciadores de lifestyle que ocasionalmente comentam sobre política apresentam um conjunto completamente diferente de desafios. Qualquer esforço para entender ou responder a este fenômeno precisa reconhecer essas distinções.

Para entender verdadeiramente como os criadores ganharam tanto poder, precisamos falar sobre as plataformas onde eles operam. YouTube, TikTok, Instagram, Facebook e X (anteriormente Twitter) não são apenas canais neutros de distribuição. São sistemas complexos, cada um com seus próprios algoritmos, culturas e dinâmicas que moldam profundamente que tipo de conteúdo prospera.

O YouTube, que emergiu como a plataforma mais importante para criadores de notícias no geral, favorece formatos de vídeo mais longos, o que permite análises aprofundadas, entrevistas extensas e explicações detalhadas. Isso cria um espaço onde criadores podem realmente desenvolver argumentos complexos e construir relacionamentos mais profundos com suas audiências.

Mas aqui está o que é crucial entender: o algoritmo do YouTube, o sistema que decide quais vídeos recomendar a quem, é otimizado para maximizar o tempo de visualização. Isso cria incentivos poderosos para que os criadores produzam conteúdo que mantenha as pessoas assistindo, que pode ou não ser o mesmo conteúdo que as informa melhor.

Agora compare isso com TikTok e Instagram, plataformas que priorizam vídeos curtos e conteúdo visual. Estas plataformas valorizam algo diferente: a capacidade de capturar atenção instantaneamente e transmitir informação de forma visualmente atraente. E aqui está um dado revelador dos estudos do Reino Unido: é precisamente nestas plataformas de vídeo curto onde os criadores superam mais consistentemente as organizações de notícias tradicionais.

Por quê? Porque os criadores individuais mostraram-se muito mais ágeis em adaptar seu conteúdo para esses formatos. Eles podem experimentar rapidamente, iterar com base no feedback, e desenvolver estilos que ressoam com as normas culturais dessas plataformas.

Para a mídia tradicional, adaptar-se a essas plataformas tem sido como tentar forçar uma forma quadrada em um buraco redondo. Organizações de notícias são construídas para produzir certos tipos de conteúdo: reportagens escritas, segmentos de televisão de formato padrão, podcasts produzidos profissionalmente. Quando elas tentam transpor esse conteúdo para plataformas como TikTok, o resultado muitas vezes parece desajeitado ou desconectado. Enquanto isso, um jovem criador com um smartphone e um entendimento intuitivo do que funciona nessas plataformas pode produzir conteúdo que se sente nativo e autêntico.

Mas há diferenças importantes entre as plataformas que precisamos entender. O X, por exemplo, continua sendo a plataforma-chave para comentaristas políticos e para seguir políticos em tempo real. Sua importância é particularmente pronunciada em mercados como Estados Unidos, África do Sul e Japão. O X favorece textos curtos e rápidos, respostas instantâneas e debates em tempo real. É um espaço onde as notícias se quebram e onde as conversas políticas acontecem de forma muito pública.

O Instagram, por sua vez, demonstra importância desproporcional no Brasil e na Indonésia para conteúdo político. Isso nos diz algo importante sobre como diferentes culturas e contextos políticos moldam o uso das plataformas. No Brasil, o Instagram tornou-se um campo de batalha central para distribuição de conteúdo político, um espaço onde figuras públicas de todos os espectros competem por atenção e influência. Esta não é uma dinâmica universal, mas específica de certos contextos nacionais.

E então há o Facebook, que muitas pessoas em mercados desenvolvidos podem assumir que está em declínio. Mas aqui está o que os dados mostram: o Facebook permanece um canal de distribuição absolutamente crítico em países como Filipinas e Tailândia, onde mantém uma base de usuários massiva e engajada com notícias. Isso é um lembrete importante de que nossa própria experiência com essas plataformas pode não ser representativa de padrões globais.

Há um padrão que emerge repetidamente quando olhamos para o ecossistema de criadores, e entendê-lo é crucial para compreender como esse sistema realmente funciona. É o que os pesquisadores chamam de “lei de potência”. Para explicar o que isso significa, vamos pensar em como a atenção e a influência são distribuídas neste novo mundo.

Um pequeno número de “super-criadores”, figuras como Joe Rogan nos Estados Unidos ou Dhruv Rathee na Índia, comandam audiências verdadeiramente massivas. Estamos falando de milhões de seguidores, dezenas de milhões de visualizações. Estes são os equivalentes digitais das grandes redes de televisão do passado. Então há uma vasta “cauda longa” de criadores menores, cada um com suas próprias audiências de nicho que podem variar de milhares a centenas de milhares. A maioria dos criadores opera neste espaço da cauda longa.

E aqui está um detalhe que deveria nos dar uma pausa: 85% por cento dos principais criadores de notícias identificados em 24 países são homens. No Canadá, a lista dos 15 principais criadores é 100% masculina. No Reino Unido, 14% são homens. Mesmo no Brasil, 13 dos 15 principais são homens. Isso não é um acidente ou uma coincidência estatística. Reflete vieses sistemáticos sobre quem ganha plataformas, quem é levado a sério como comentarista, e quem consegue construir as audiências necessárias para sustentar um empreendimento de criação de conteúdo em tempo integral.

Nos Estados Unidos, a pesquisa mostra que o público de direita cita criadores de notícias políticas com muito mais frequência do que o público de esquerda. Isso sugere que conservadores desenvolveram uma dependência maior de fontes de informação alternativas, uma rede de comentaristas, podcasters e personalidades do YouTube que fornece uma visão do mundo que é fundamentalmente diferente daquela apresentada pela mídia tradicional. E crucialmente, essas audiências de direita e esquerda têm muito pouca sobreposição. Elas não estão apenas priorizando fontes diferentes, mas habitando ecossistemas informativos completamente separados.

O Brasil apresenta um padrão similar. Entrevistados de esquerda tendem a seguir figuras como âncoras da Globo e ativistas como Erika Hilton. Entrevistados de direita seguem predominantemente personalidades conservadoras e libertárias, sendo muito mais propensos a citar influenciadores de notícias. E, novamente, há pouquíssima sobreposição entre esses universos. Essas não são apenas preferências diferentes sobre como consumir informação. São mundos informativos paralelos.

Mas aqui está o que torna isso particularmente grave no contexto dos criadores: enquanto a mídia tradicional, apesar de seus vieses, geralmente faz algum esforço para reconhecer a existência de múltiplas perspectivas, os criadores não têm tal obrigação. Um comentarista pode construir uma narrativa inteira sobre política sem nunca reconhecer que existem pontos de vista legítimos que diferem do seu. E porque suas audiências os escolheram ativamente, há uma autoafirmação incorporada: “Eu escolhi seguir esta pessoa, então eles devem estar me dizendo a verdade”.

A fragmentação é ainda mais profunda quando consideramos a divisão geracional: 48% das pessoas com menos de 35 anos prestam mais atenção a criadores, enquanto 44% por cento das pessoas com mais de 35 anos prestam mais atenção à mídia tradicional. Isso significa que diferentes gerações não estão apenas usando plataformas diferentes, mas desenvolvendo relações fundamentalmente diferentes com autoridade e informação. Os jovens estão aprendendo a confiar em indivíduos com base em autenticidade percebida e conexão pessoal. Os mais velhos mantêm algum nível de respeito pela autoridade institucional. Essas não são apenas diferenças de gosto, mas diferenças epistemológicas sobre como sabemos o que sabemos.

A desinformação não é um fenômeno novo. Rumores, propaganda e informações falsas existem há tanto tempo quanto a comunicação humana. Mas o ecossistema de criadores cria condições que tornam a desinformação particularmente problemática de maneiras que precisamos entender cuidadosamente.

Primeiro, há a questão de escala e velocidade. Quando um influenciador com milhões de seguidores compartilha informação falsa ou enganosa, essa informação pode se espalhar exponencialmente mais rápido do que qualquer mecanismo de verificação de fatos pode acompanhar. E porque essas audiências têm uma relação de confiança com o criador, elas são mais propensas a aceitar a informação acriticamente.

Segundo, há a ausência de sistemas de correção formais. Quando um jornal tradicional publica informação falsa, existem mecanismos estabelecidos: correções devem ser publicadas, há responsabilidade editorial, há potenciais consequências legais. Criadores operam sem essas estruturas. Se eles compartilham desinformação, podem ou não corrigi-la, dependendo inteiramente de sua própria inclinação. Não há ninguém que possa forçá-los a fazê-lo.

Terceiro, e talvez mais insidiosamente, há o que podemos chamar de “desinformação por omissão”. Um criador não precisa fazer afirmações factualmente falsas para desinformar sua audiência. Eles podem simplesmente nunca mencionar certos fatos, nunca reconhecer certas perspectivas, nunca contextualizar eventos de certas maneiras. Ao longo do tempo, isso cria uma compreensão distorcida que pode ser tão prejudicial quanto mentiras diretas, mas é muito mais difícil de identificar e combater.

Os números do Brasil são surpreendentes: 33% da atenção do público nas redes sociais vai para criadores individuais, o oitavo maior índice entre 24 países analisados. Isso já supera os 30% que vão para marcas de notícias tradicionais. Cerca de 700 personalidades específicas foram mencionadas pelos entrevistados brasileiros, um número significativamente maior do que em países comparáveis como Alemanha ou Canadá. Este é um ecossistema incrivelmente rico e diverso de vozes.

Mas o que torna o caso brasileiro particularmente interessante é a heterogeneidade das figuras influentes. A lista mescla âncoras de televisão consagrados como William Bonner, que representam a mídia tradicional; políticos em exercício como Lula da Silva e Jair Bolsonaro, que usam suas plataformas para comunicação direta; criadores ativistas como o deputado Nikolas Ferreira, que se descreve como cristão de direita, pró-armas, defensor da família; e influenciadores de lifestyle como Virginia Fonseca, com mais de 53 milhões de seguidores no Instagram, cujo foco primário não é política, mas cuja enorme plataforma lhe confere influência inevitável.

Vamos examinar alguns casos específicos para entender o que estes números significam:

Brasil: 33% da atenção nas redes sociais vai para criadores individuais, colocando o país em oitavo lugar entre vinte e quatro. Marcas de notícias tradicionais recebem 30%. Os criadores já superaram a mídia tradicional. E o número de personalidades mencionadas? Cerca de 700, significativamente maior do que Alemanha ou Canadá.

Estados Unidos: Posicionado no meio do espectro, em décimo primeiro lugar, com 27% cento prestando atenção a criadores e outros 27% focando em marcas tradicionais. Um empate perfeito que simboliza uma sociedade em transição.

Reino Unido: Um outlier na direção oposta. Apenas 12% prestam mais atenção a criadores, enquanto 16% priorizam marcas de notícias. Vigésimo primeiro de vinte e quatro países, refletindo um ecossistema onde a mídia tradicional ainda mantém considerável influência.

Japão: Similar ao Reino Unido, com a mídia tradicional ainda dominante e impacto de criadores relativamente limitado.

A lista brasileira dos principais mencionados é notavelmente diversa em termos de tipo de figura, se não em termos de gênero:

Âncoras de TV tradicionais: William Bonner e César Tralli da Globo mantêm audiências substanciais no Instagram, representando a mídia tradicional que ainda tem influência significativa.

Ex-jornalistas tornados comentaristas: Alexandre Garcia migrou da mídia tradicional para focar em conteúdo digital first e partidário.

Políticos como criadores: Lula da Silva (presidente atual) e Jair Bolsonaro (ex-presidente) utilizam ativamente suas plataformas para engajar suas bases, borrando completamente as linhas entre político e criador de conteúdo.

Criadores ativistas: Nikolas Ferreira, deputado que se descreve como “cristão de direita, pró-armas, defensor da família”, representa uma nova categoria de político-influenciador.

Influenciadores de Lifestyle: Virginia Fonseca, com mais de 53 milhões de seguidores no Instagram, exemplifica como figuras cujo foco primário não é política ainda exercem influência significativa simplesmente devido ao tamanho de suas plataformas.

Esta mistura reflete algo importante sobre como os limites entre diferentes tipos de figuras públicas estão se dissolvendo. Um político já não é apenas um político, mas também um criador de conteúdo. Um jornalista de televisão não é apenas um âncora, mas também uma personalidade do Instagram. E uma influenciadora de lifestyle pode se tornar uma voz política significativa simplesmente por causa do tamanho de sua plataforma.

No Brasil, o Instagram tornou-se o espaço onde a política acontece online, onde figuras públicas de todos os espectros competem por atenção e onde as narrativas políticas são construídas e compartilhadas.

O público brasileiro é profundamente polarizado ao longo de linhas ideológicas, e isso se reflete completamente em quais criadores e figuras eles seguem. Entrevistados que se identificam como de esquerda tendem a seguir um conjunto de figuras: âncoras da Globo, ativistas progressistas. Entrevistados de direita seguem um conjunto completamente diferente: personalidades conservadoras, libertárias, criadores que se posicionam explicitamente contra o establishment. E crucialmente, há pouquíssima sobreposição. Estas são câmaras de eco quase perfeitas.

Há também um padrão revelador em termos de qual grupo é mais propenso a citar influenciadores. O público de direita no Brasil cita influenciadores de notícias com mais frequência do que o público de esquerda. Isso sugere que conservadores desenvolveram uma dependência maior ou um engajamento mais intenso com fontes de informação alternativas. Eles construíram um ecossistema de informação que existe em paralelo, e em oposição, à mídia estabelecida.

E como em outros lugares, há o problema do desequilíbrio de gênero. Dos 15 principais indivíduos mencionados na pesquisa brasileira 13 são homens. Isso não é único ao Brasil, mas é parte de um padrão global onde o espaço de criadores de notícias e comentário político é esmagadoramente dominado por vozes masculinas.

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Aline Sordili é jornalista e especialista em inovação com mais de 30 anos de experiência em mídia, negócios digitais e transformação tecnológica. Foi uma das pioneiras na digitalização de grandes grupos de comunicação no Brasil. Lançou a Folha Online, o UOL News, Portal Exame e Veja SP. É cofundadora do R7 e do Record Plus, onde liderou projetos de integração entre jornalismo, tecnologia e novos modelos de negócio. É mestranda em Inteligência Artificial pela PUC-SP e pós-graduada em ESG (EADA, em Barcelona) e em negócios com a China (CKGSB). Participa de comitês de IA em instituições como ABRIA (Associação Brasileira de Inteligência Artificial), SET (Sociedade de Engenharia de Telecomunicações), além de ministrar treinamentos e workshops sobre IA aplicada ao jornalismo e à comunicação.